09 maio 2007

Luta pela terra no Pará – dias de tensão

O grito, o muque, a bala ainda são instrumentos utilizados em demasia para se aplacar as diferenças nos rincões do país. A eleição da petista Ana Júlia Carepa ao governo do Pará, parece ter incomodado os coronéis e acendido as chamas do velho autoritarismo das Casas Grandes. Represália?
Eleita graças a uma frente ampla, a administração realizou pela passagem do 11º aniversário do Massacre de Eldorado, a mea culpa do Estado. Lá na “Curva do S”, no local do crime. O gesto nobre que saneou uma série de pendências jurídicas parece ter acendido o estopim de uma série de ações contra os sem terra. Não bastasse a sinalização aos militantes do MST, a chefe do executivo ainda garantiu uma infra-estrutura para o acampamento de Belém. Demais para os pecuaristas?
Na primeira semana de maio num dos berços da União Democrática Ruralista (UDR) no Pará, a região nordeste, o trabalhador rural Antonio Santos do Carmo foi morto e sete feridos. O ataque foi produzido por jagunços e pistoleiros do fazendeiro conhecido como Zé Anésio. Suposto proprietário da fazenda São Felipe, no município de Irituia, cortado pela BR-010, a Belém-Brasília. Área ocupada por 300 famílias.
É o terceiro atentado contra os militantes do MST no Pará. O primeiro tem registro no município de Terra Alta, próximo a Belém. O segundo ocorre no sudeste do estado, no município de Parauapebas. Todos obedecendo ao mesmo molde. Caminhões e carros invadem a área e disparam em quem estiver pela frente.
No mesmo sudeste foram detidos dois pistoleiros que rondavam o Sindicato de Trabalhadores Rurais de Rondon do Pará. O intento era executar a presidente do sindicato dos trabalhadores rurais, Maria Joel. A dirigente é viúva do sindicalista José Dutra da Costa. “Dezinho”, assassinado em 2000.
Agora há informes de atentado contra militantes da maior rede de organizações sociais do campo democrático da Amazônia, o Grupo de Trabalho Amazônico (GTA). O atentado à bala contra militantes do GTA ocorreu na região do Xingu.
A casa do representante do GTA foi alvejada por vários tiros. Os militantes participam de audiências públicas promovidas pelo Estado. As audiências integram a agenda do planejamento territorial e participativo do governo. Ninguém foi ferido. O GTA promete mais informações logo.
Uma sugestão perigosa para aplacar as ocupações. Em entrevistas dadas pelo titular da Ouvidoria Agrária do estado, o desembargador aposentado Otávio Maciel, este sugeriu a organização de milícias pelos fazendeiros. Quando no judiciário, ficou conhecido pela agilidade na expedição de liminares de reintegração de posse. Maciel é uma herança do governo anterior.
Uma outra peripécia de Maciel, lembrada, é sobre o processo do principal acusado pela morte do sindicalista José Dutra da Costa (Dezinho), o fazendeiro Décio José Barroso Nunes, “Delsão”. No caso, arbitrou de forma equivocada pela soltura do acusado. Conforme avaliação da assessoria jurídica da Comissão Pastoral da Terra (CPT) de Marabá. Recentemente o fazendeiro teve o nome retirado do processo.
Jagunçagem não é novidade na disputa pela terra na fronteira. O chicote da UDR imortalizou o sudeste e sul do Pará como onde mais se elimina alinhado na defesa da reforma agrária no Brasil. No ano de 2001, em audiência pública em Marabá, da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal, foi denunciada a presença de milícias travestidas de empresas de segurança, como a Máster.
A tensão transparece ainda na lista de ameaçados de morte, que beira a casa dos 60. Entre os eleitos a adversários dos latifundiários vários religiosos alinhados a luta camponesa. Entre eles os nomes estão: Frei Henri dês Roziers, Pe. Edilberto Sena, José Boeing, Dom Erwin e Amaro de Sousa.
Outros elementos somam para o conflito na disputa pela terra. Como a agenda de grandes projetos, a monocultura de grãos, o pólo de gusa de Carajás, a ampliação dos projetos da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD). Tudo ocorrendo às vésperas do julgamento de Vitalmiro de Bastos, “Bida”, um dos fazendeiros acusados pelo assassinato da missionária Dorothy Stang, da expedição de um pacote de reintegração de posse, estimado em 40 e concomitante ao Grito da Terra em Belém.

Rogério Almeida é autor do livro Araguaia-Tocantins: fios de uma história camponesa/2006. Mestre em Planejamento do Desenvolvimento pelo Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA) da Universidade Federal do Pará (UFPA), e colaborador da rede Fórum Carajás: www.forumcarajas.org.br
Correio eletrônico: araguaia_tocantins@hotmail.com