29 junho 2007

Transamazônica – integração e desenvolvimento: um campo profícuo para as religiões

Na década de setenta, a Amazônia brasileira por suas vastas dimensões, somando-se ao potencial de recursos naturais e minerais desponta como uma alternativa para a política de modernização e desenvolvimento econômico do Brasil. O Governo Federal investiu num programa de ocupação e distribuição de terras na região amazônica, visando ocupar os seus espaços “vazios” com trabalhadores de outras regiões do país, que viviam nas cidades em precárias condições sociais ou trabalhavam no campo em terras de terceiros, sem que tivessem qualquer expectativa de melhorar suas condições de vida. Com este fim implantou um projeto de “colonização” (1) que tinha como eixo a abertura da rodovia Transamazônica no sentido leste-oeste, o que possibilitaria a integração e o desenvolvimento dessa região interligando-a ao restante do país (2).

A abertura da rodovia Transamazônica e o projeto de colonização governamental foram amplamente divulgados por todos os meios de comunicação da época, impulsionando assim, a migração de milhares de familias para a região norte do país, sobretudo, para o estado do Pará que é cortado por essa rodovia no sentido leste e oeste.
O “projeto modelo de colonização” sistematizado e implementado de acordo com os interesses politicos/econômicos e, condicionado à idéia de Integração e Desenvolvimento da região e do país, revelava sua face capitalista tal como discute Max Weber. No controle metódico e funcional sobre o homem, repousa sorrateiramente alguns pressupostos do capitalismo
(3).
A discussão Weberiana será articulada com as concepções racionalistas e desenvolvimentistas que subsidiaram o projeto de colonização governamental, bem como às prerrogativas e motivações das familias que migraram para essa região, na perspectiva de melhorar suas condições de vida.
Com a dita colonização espontânea aumentou significativamente a presença das igrejas evangélicas naquela região, visto que a colonização coordenada pelo Governo priorizou em princípio, a arregimentação de famílias nordestinas. A maioria dessas famílias professava uma religiosidade mística, de devoção aos santos, às crenças e supertições populares. Enfim, uma tradição religiosa característica da igreja católica e que não condiz com as doutrinas pregadas pelas Igrejas protestantes.

Neste contexto a diversidade religiosa se configura como um elemento fundamental, considerando que as principais filosofias cristãs, representadas pela Igreja Católica e pelas congregações evangélicas, têm forte relação com as familias da Transamazônica, influenciando-as nas suas formas de existência, de produção e de organização social.
Esta realidade aponta para uma análise sócio-cultural de acordo com a leitura de GEERTZ, “A Interpretação das Culturas”
(4) que mostra como os símbolos e rituais religiosos oferecem uma garantia cósmica ao homem, não apenas para sua capacidade de compreender o mundo, mas também porque o compreendendo dê precisão a seu sentimento e as sua emoções. Por isso que o homem tem uma dependência tão grande em relação aos símbolos e sistemas simbólicos, ao ponto, de serem eles decisivos para sua viabilidade como criatura. p.114.
Neste sentido as trajetórias das famílias na Transamazônica revelam que num projeto de colonização não se deve levar em conta apenas os aspectos econômicos, mas também, os sistemas simbólicos e culturais que são suportes fundamentais para a existência humana. A diversidade de valores e de comportamentos não impediu que as familias migrantes construíssem os espaços sociais necessários para a fixação na terra e para o desenvolvimento da região. Através de suas experiências e práticas culturais, instituíram outras dinâmicas de trabalho e de organização social, indo de encontro a sistemática do projeto governamental e subvertendo assim, a predominante ótica capitalista.

Ivonete Coutinho é professora da UFPA (Campus de Altamira) e doutoranda do Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais, linha de pesquisa Antropologia/UFPA. Atualmente realiza estagio doutoral na Université Paris 13. Correio eletrônico: ivonet@ufpa.br

Notas:
1 - Colonização é uma categoria forjada por aqueles que planejam e realizam a ocupação de um território que, a seu ver, precisa ser integrado, controlado e desenvolvido por meio de agentes externos ao território. Partindo desta concepção, o governo nomeia o projeto de distribuição de terras na Transamazônica, e os migrantes que se instalaram nessa região se apropriaram desta categoria, denominando-se de colonos.
2 - O projeto de colonização da Transamazônica foi traçado de acordo com o Plano de Desenvolvimento da Amazônia - PDA, 1972-1974, elaborado pela SUDAM que preconizava à valorização e o desenvolvimento dessa região a partir de sua ocupação e integração econômica e social ao sudeste brasileiro.
3 - WEBER, Max. A ética protestante e o espírito do Capitalismo. (texto integral). São Paulo: editora Martin Claret. Edição revisada, 2004. (trad. Pietro Nassetti).
4 - GEERTZ, Clifford. A Interpretação das Culturas. Rio de Janeiro. Editora Guanabara Koogan S. A. 1989.

Foto: Ivonete Coutinho (Igreja Evangélica na Transamazônica)

Obs: Este texto é um resumo do artigo original. Para receber a versão integral do mesmo (em PDF) envie mensagem para institutoamasblog@yahoo.com.br

Estudo de impacto, peixes e Bolívia no caminho das hidrelétricas

Apesar da impaciência de setores do governo, é provável que a licença ambiental das hidrelétricas Santo Antonio e Jirau, no rio Madeira, em Rondônia, não saia também em junho. Em evento promovido pela Associação Brasileira de Infra-Estrutura e Indústrias de Base (Abdib) no último dia 15, o ministro interino de Minas Energia, Nelson Hubner, tinha afirmado que até final do mês o licenciamento prévio seria liberado pelo Ibama. Problemas com a complementação ao Estudo de Impacto Ambiental, pedido pelo órgão às empreendedoras Furnas e Odebrecht, no entanto, podem atrasar o processo, apesar de o Ibama não se pronunciar sobre o assunto.
Na análise dos estudos ambientais complementares das hidrelétricas, publicada na página do Ibama no último da 21, o hidrólogo Carlos Tucci, pesquisador do Instituto de Pesquisas Hidráulicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e contratado pelo órgão para avaliar as respostas de Furnas, apontou uma série de poréns em todos os itens postos.
Grosso modo, Tucci afirma que “torna-se necessário examinar a tendência evolutiva da bacia hidrográfica quanto à produção de sedimentos”, sobre sedimentação; sobre o assoreamento do rio, o pesquisador vê “incerteza do prognóstico”, e sugere estudos posteriores “mais precisos que os atuais antes de entrar em operação a Usina”; “o exame da distribuição dos sedimentos nos dois reservatórios deve ser aprimorado quanto aos resultados atualmente existentes”, continua; e ainda: “a avaliação das condições à jusante ainda é limitada; mesmo que os impactos potenciais esperados sejam pequenos, é necessário um exame técnico mais completo sobre o assunto”, sendo que “estudos específicos devem ser realizados no projeto para mitigar os impactos potenciais” sobre este ponto e sobre a sedimentação. Por fim, ele recomenda que “as fases seguintes deste projeto sejam acompanhadas por um painel de especialistas com reconhecido conhecimento”.
De acordo com o coordenador da ONG International Rivers Network para a América Latina, Glenn Switkes, fato é que as respostas complementares aos questionamentos do Ibama, elaborados por Furnas e Odebrecht - e às quais teve acesso -, são insípidas e não poderiam ser aceitas como saneamento das pendências ambientais. Nesse sentido, caso os aspectos técnicos sejam de alguma forma ignorados e a licença ambiental seja concedida, o Ministério Público Federal deverá acionar o Ibama judicialmente, adverte Switkes, hipótese também levantada pelos técnicos do órgão.

Peixes
No início desta semana, a Sociedade Brasileira de Ictiologia divulgou um manifesto no qual reafirma a importância da conservação dos grandes bagres do Madeira.
“Nos últimos meses, a mídia vem dando publicidade ao fato de que um bagre foi eleito como pivô de um suposto conflito de interesses entre setores do Governo (...). É importante frisar que o citado bagre – a dourada (Brachyplatystoma rousseauxii) – é uma espécie de grande importância comercial na região amazônica, destacando-se os Estados do Pará, Amapá, Amazonas e Rondônia, no Brasil, e extensas regiões da Colômbia, Bolívia, e Peru. (...) Cardumes desses bagres migram anualmente da Amazônia Oriental para a Ocidental, percorrendo ao todo uma distância de 4 a 5 mil quilômetros. No rio Madeira, os cardumes levam de quatro a cinco meses para percorrer 3.100 km anualmente, distância do estuário do Amazonas às cachoeiras de Teotônio (situadas nas proximidades de Porto Velho, RO). (...) Deste modo, as alterações ambientais e a interposição de barreiras aos movimentos migratórios decorrentes da construção de barragens colocam em risco a sobrevivência das populações de grandes bagres migradores no rio Madeira”, diz o manifesto.
E conclui: “Finalmente, deve-se ter sempre em mente que a imensa diversidade biológica da região amazônica é de uma natureza frágil, e representa uma importante vitrine nacional aos olhos do mundo. Danos à natureza dessa região, e especialmente quando envolvem recursos naturais utilizados por mais de uma nação, podem se transformar rapidamente em uma crise de visibilidade mundial, prejudicando a imagem do Brasil”.
Segundo o pesquisador do Museu Paraense Emilio Goeldi, Ronaldo Barthem, um dos mais respeitados especialistas em ictiofauna do país, a proposta de construção de um canal que correria lateralmente ao rio e permitiria o livre trânsito dos peixes poderia ser uma solução, mas o projeto teria que ser muito bem estudado para não criar problemas ainda maiores.
“O canal pode resolver, mas tem que ser perfeito - quem subia, tem que subir, quem não subia, não pode subir, e todos os peixes têm que descer. O perigo do canal é que espécies que não migravam passem a migrar, causando assim a introdução de peixes exóticos em ambientes onde seu impacto é imprevisível. Como não ha experiência compatível, o canal será uma grande incógnita”, pondera Barthem.
Já Glenn Switkes é pessimista. “Eles [Furnas e Odebrecht] dizem que vão construir um canal. O problema é que os peixes estão no rio, e a maior parte da água, da vazão, precisa passar pelas turbinas das usinas para gerar energia. Como garantir que principalmente os alevinos não serão sugados para dentro das turbinas? Alguns devem sobreviver, a maioria deverá ser triturada”.

Bolívia
A preocupação de Barthem com o impacto das hidrelétricas sobre a migração dos peixes que sobem para a Bolívia e a possibilidade de uma crise entre os dois países faz sentido. Na última semana, durante um evento que reuniu organizações e movimentos sociais indígenas, de agricultores e ambientalistas – o Primeiro Fórum Amazônico, realizado na cidade amazônica de Guayaramerín -, o presidente Evo Morales teria rechaçado, segundo a imprensa oficial do governo, “a intenção do governo brasileiro de construir mega-represas no rio Madeira, que poriam em risco a integridade ambiental e social de grande parte da Amazônia boliviana”.
No início de 2006, a denúncia de que as usinas do Madeira deverão impactar no país vizinho geraram protestos de organizações sociais da Bolívia. Em setembro, o governo boliviano solicitou oficialmente informações sobre o Complexo Madeira ao governo brasileiro, e em fevereiro deste ano, na visita do presidente Evo Morales ao país, o tema voltou a ser pauta. De lá pra cá, ambos os governos evitaram falar no assunto. Segundo fontes do governo boliviano, a questão estaria sendo vista como extremamente delicada, mas as declarações de Morales este mês revelam um endurecimento da posição boliviana, que terá que ser considerado pelo Brasil.

Verena Glass - Carta Maior
Fonte: http://www.agenciacartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=14418

27 junho 2007

Duas novas hidrelétricas na Amazônia dão entrada em processo de licenciamento ambiental

De acordo com a documentação disponível na página do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), dois novos projetos para a geração de energia na Amazônia deram início ao processo de licenciamento ambiental. Os empreendimentos são a Usina Hidrelétrica de Teles Pires, no Rio Teles Pires, entre Jacareacanga (PA) e Paranaita (MT), e a Usina Hidrelétrica de Barra do Palma, no Rio Palma (TO), entre os municípios de Paranã e Conceição do Tocantins.
Segundo informações preliminares, ambos os projetos estão aguardando análise dos formulários de abertura de processo, mas já dispõem de autorização da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para sua apresentação às autoridades competentes.
O projeto de hidrelétrica em Teles Pires prevê uma potência instalada de cerca de 1.450 MW e uma barragem cerca de um quilômetro de extensão. O responsável pela abertura do processo de licenciamento ambiental é a Consultoria de Engenheiros em Barragens e Obras Hidrelétricas Intertechne, do Paraná.
A Usina Hidrelétrica de Barra do Palma é um projeto da Eletronorte a ser construído na bacia Tocantins-Araguaia, estado do Tocantins. A previsão de geração do empreendimento é de 90 MW e ainda não há informações sobre a barragem.
No momento o processo dos dois projetos está na primeira fase do licenciamento ambiental. Durante esse tempo, empreendedores e Ibama se reunirão para definir o Termo de Referência de cada um dos empreendimentos, segundo os quais mais tarde as empresas terão que providenciar o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e Relatório de Impacto ao Meio Ambiente (Rima), os principais documentos do processo.

Mariane Gusan
Fonte: http://www.amazonia.org.br/noticias/noticia.cfm?id=247807

25 junho 2007

Índios do Alto Rio Negro acusam Funasa de omissão no atendimento

As denúncias sobre as deficiências no tratamento da saúde indígena já não são mais novidades. A Federação das Organizações Indígenas do Alto Rio Negro (Foirn), o Conselho Distrital de Saúde Indígena do Distrito Sanitário Especial Indígena do Alto Rio Negro (Condisi) e o Departamento de Controle Social divulgaram uma carta na qual acusam a Funasa (Fundação Nacional da Saúde), órgão do Ministério da Saúde, e o Ministério Público Federal de Brasília de serem omissos em relação aos problemas que as comunidades do Alto Rio Negro (AM) têm enfrentado nos últimos seis meses.
A carta afirma que “a saúde dos indígenas continua se deteriorando”. Em março do ano passado, as lideranças indígenas já haviam enviado um documento relatando a situação dos índios aos órgãos públicos. “A gente não recebeu nenhuma resposta dos órgãos e nem um relatório do que irão fazer. É um descaso”, considera André Fernando, da etnia Baniwa, presidente do Condisi e vice-presidente do Foirn.
A região do Alto Rio Negro compreende cerca de 500 aldeias, que somam mais de 25 mil pessoas de 22 etnias diferentes. A maior parte desses povos tem pouco contato com os brancos. Partindo do município de São Gabriel da Cachoeria (AM), cidade-sede da região, a viagem de barco pode levar até cinco dias para chegar às comunidades mais distantes.
De acordo com o documento, há uma demanda não sanada por meios de transporte, insumos e medicamentos. Fernando explica que os motores de popa e ‘voadeiras’ (pequenas e rápidas embarcações) são essenciais, porque é apenas pela navegação que as equipes médicas, responsáveis pelo atendimento e pelos programas de saúde, conseguem chegar às comunidades. “Nesses últimos meses, as equipes não puderam seguir com os programas de saúde. Eles são de grande importância, porque a prevenção é parte fundamental da saúde indígena”, explica o líder Baniwa. Os programas são voltados para informar a população sobre questões de saúde bucal, prevenção contra tuberculose e educação sanitária.
“Todas as ações são realizadas normalmente e as atividades relacionadas aos programas de saúde, preconizadas pelo Ministério da Saúde, estão em plano funcionamento”, contraria a Funasa, em nota à imprensa. Segundo o órgão, o período das secas também atrapalha a navegabilidade dos rios e o acesso às populações.
A assessoria de imprensa do órgão explica que encerrou todos os antigos convênios de repasse de verbas no estado do Amazonas, inclusive o que mantinha com o Foirn. O motivo seria a falta e os equívocos nas prestações de contas feitas pelas conveniadas. Atualmente, um novo convênio foi estabelecido com uma organização sem vínculos com o movimento indígena, a Asterg, mas que é responsável por repassar a verba vinda da Funasa na infra-estrutura e atendimento das comunidades.
Os números sobre o índice de mortalidade neste semestre são díspares. A Funasa informa que entre janeiro e abril, 44 indígenas morreram. Para o órgão, esse índice é aceitável de acordo com a taxa de mortalidade dos últimos três anos.
Já segundo as lideranças, neste mesmo período, houve 55 mortes de índios na região do Alto Rio Negro. De acordo com o Condisi, 66% desses casos não obtiveram assistência médica por conta dos problemas de locomoção das equipes de saúde. “Dos 34% de óbitos que tiveram acesso à assistência de saúde, apenas 5% tiveram auxílio dos profissionais do Distrito Sanitário Especial Indígena, agora sob gestão da FUNASA, os 95% restantes foram assistidos por agentes indígenas de saúde, pela família ou removidos ao Hospital de Guarnição do Exército em São Gabriel da Cachoeira”, contabiliza o documento.

Natália Suzuki - Carta Maior
Fonte: http://www.agenciacartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=14379
Foto: a partir da fonte acima especificada

MPF e Funai retomam processo contra CVRD

Depois de mais de dois meses de negociações, ficou inviável qualquer possibilidade de acordo entre a Companhia Vale do Rio Doce e as associações indígenas do povo Xikrin, do sudeste do Pará. Em conseqüência, será retomado o processo judicial em que o Ministério Público Federal e a Funai querem obrigar a CVRD a regularizar os repasses aos índios e, por outro lado, garantir que o dinheiro seja bem utilizado dentro da reserva indígena.
A questão entre a Vale e os Xikrin chegou à Justiça Federal em dezembro do ano passado, quando a empresa suspendeu os pagamentos e acabou obrigada a retomá-los por ordem judicial. Em janeiro de 2007, foi ajuizada uma ação civil pública pedindo uma solução definitiva para o longo conflito entre as partes, assinada pelo procurador da República Marcelo Ferreira, de Marabá e pela procuradoria federal da Fundação Nacional do Índio.
Em abril, o juiz federal Carlos Henrique Borlido Haddad determinou a suspensão do processo porque, em audiência de conciliação, ficou evidente interesse das partes em fazer acordo para implantação de um projeto integrado de gestão da área indígena, financiado pela empresa, como compensação pelos impactos da atividade mineradora.
Duas reuniões se seguiram, entre índios e representantes da mineradora, sempre com intermediação de MPF e Funai. Na terceira reunião, no último dia 04 de junho, ficou claro que o acordo era impossível, com a empresa se recusando a financiar a recuperação de uma estrada de 167 quilômetros que corta a área indígena. De acordo com a Funai, sem a estrada não será possível realizar os estudos necessários para a implantação do programa de gestão.
“Um acordo é fruto de concessões mútuas e recíprocas, mas a CVRD, aproveitando-se de sua posição de superioridade econômica apenas quis impor a sua vontade, conforme melhor lhe conviesse, a todo momento alegando o caráter de liberalidade do repasse de recursos, o que não se verifica verdadeiro”, avalia Marcelo Ferreira, procurador da República responsável pela questão. Ele se refere ao repasse mensal de R$ 569 mil, que a empresa é obrigada a fazer aos índios.
Para o MPF, o repasse é indiscutível ônus da atividade mineradora, além de ter sido expressamente determinado no decreto presidencial que liberou a exploração do minério. A empresa entende que o repasse de recursos às comunidades indígenas é mera obrigação moral, mas a Justiça já se posicionou, em liminar de 04 de dezembro de 2006, obrigando a Vale a fazer o depósito em conta judicial.
Para o juiz Carlos Haddad, o mesmo decreto presidencial que concedeu à CVRD o direito de usar 411 mil hectares na província mineral de Carajás a obriga a pagar compensações aos povos indígenas afetados. “A coerência determina ou a desconsideração do título que autoriza a CVRD a utilizar gratuitamente as terras da União, assim como das eventuais obrigações a ela impostas, ou o reconhecimento do direito real de uso, em face da autorização do Senado e do Poder Executivo, bem como das obrigações, direitos e deveres a ele inerentes, arrolados no decreto presidencial”.
Agora, cabe a Haddad decidir sobre as futuras relações entre a mineradora e os Xikrin: as partes se retiraram da mesa de negociações e o pedido de retomada do processo judicial será formalizado pelo MPF nos próximos dias.

Helena Palmquist
Procuradoria da República no Pará

Assessoria de Comunicação
Fones: (91) 3299.0148 / (91) 3222.1291 / (91) 9999.8189

24 junho 2007

Abuso de poder público em prol das usinas no rio Madeira

Uma verdadeira força-tarefa, que conta com uma articulação entre o setor público e o privado, está sendo posta em marcha em Rondônia, especialmente na capital Porto Velho. O objetivo: coletar, através de intimidação, o maior número possível de assinaturas para um abaixo-assinado favorável à construção das usinas hidrelétricas Jirau e Santo Antônio, no rio Madeira.
Quem denuncia o clima de coação e o uso da máquina pública para atingir as metas de “adesões” é o Fórum Independente Popular do Madeira (FIPM), entidade que reúne organizações como o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), associações ribeirinhas e a Comissão Brasileira Justiça e Paz.
Na quarta-feira (13), estas e outras entidades divulgaram carta na qual explicam sua oposição à construção das usinas e critica “o uso da máquina pública para fins particulares pelo Governo do Estado, pela Prefeitura Municipal, bem como pelos legislativos municipal, estadual e federal”.

Computador, TV de tela plana...
Luís Massimo, inspetor de educação da Escola Coronel Carlos Aloísio Weber, na capital, atesta que o governador do Estado, Ivo Cassol (PPS), e o prefeito de Porto Velho, Roberto Sobrinho (PT), “estão usando a máquina pública para forçar os funcionários a votarem a favor das hidrelétricas”. Segundo Massimo, os professores levam para as escolas o abaixo-assinado e dão para os alunos assinarem. Além disso, estudantes também estão sendo recrutados para a coleta, recebendo brindes em troca: “o aluno que levar mais assinaturas ganha um computador, o segundo ganha uma TV de tela plana”.
Massimo revela que Cassol viajou o Estado inteiro e convocou reuniões com todos os diretores de escolas estaduais, entregando a cada um 50 folhas com espaço para 25 assinaturas cada. Os diretores, por sua vez, pressionados a alcançarem as metas, envolvem professores e alunos. O inspetor conta que não aceitou participar da coleta e levou o caso ao Ministério Público Estadual.

Capacitação
Segundo o FIPM, o prefeito de Porto Velho foi o primeiro a anunciar uma meta de assinaturas: 50 mil. Em seguida, foi a vez do governador do Estado prometer 200 mil. Para tal, determinou que suas secretarias fizessem o esforço que fosse necessário. Pontos de atendimento ao público dos órgãos estaduais foram orientados nesse sentido e os funcionários públicos, além de obrigados a assinar, também foram instruídos a fazer assinaturas. Segundo a denúncia do Fórum, Ivo Cassol escalou as secretarias da Casa Civil e de Finanças para centralizar o processo.
Mas, como se não bastasse o peso dos governos estadual e municipal, o governo federal participa ativamente das pressões pelo início das obras das hidrelétricas. Mesmo sem o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) ter concedido a licença prévia ambiental para o projeto, mais de 3 mil trabalhadores de Porto Velho começaram, no final de abril, a receber capacitação para atividades relacionadas à construção das usinas, como armador e operador de máquinas pesadas. Trata-se do Plano Setorial de Qualificação (Planseq) Hidrelétrica, do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Estão sendo oferecidos também cursos nas áreas de comércio, agricultura familiar e empreendedorismo já que, segundo o órgão, com a obra de infra-estrutura podem ser criados novos negócios na região.
Os cursos contarão com investimentos de R$ 1,3 milhão, recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). São parceiros no Planseq Hidrelétrica a Prefeitura de Porto Velho, o governo de Rondônia, a Federação do Comércio (Fecomércio-RO), a Central Única dos Trabalhadores de Rondônia (CUT-RO) e o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac), que ministra as aulas.
Para o FIPM, “como as usinas sequer alcançaram a Licença Prévia, a antecipação desse processo de qualificação direcionado constitui uma forma de pressão indevida sobre o processo de licenciamento no interior do próprio governo”. Como demonstração disso, destaca-se a declaração do ministro do Trabalho, Carlos Lupi: “A qualificação do trabalhador não tem nada a ver com a licença. Tem a ver com uma necessidade futura. Se não tiver a licença, aquele trabalhador pode ficar qualificado e não ter emprego, isso é muito ruim. Mas eu espero que tudo acabe se organizando”.

Campanha aberta
O Fórum denuncia ainda que a assinatura do abaixo-assinado pró-usinas faz parte do ato de inscrição dos candidatos a uma vaga nas eventuais obras. A participação em programas como o Fome Zero e o Bolsa Família, do governo federal, e em benefícios às comunidades ribeirinhas executados pela Prefeitura de Porto Velho também são condicionados ao apoio às usinas.
Na esfera privada, a campanha também é grande. De acordo com a FIPM, empresas vinculadas à Federação das Indústrias do Estado de Rondônia (Fiero), Fecomércio-RO, Sindicato Nacional da Indústria da Construção Pesada de Rondônia (Sinicon-RO) e Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de Rondônia (Sinduscon-RO) estão coagindo seus funcionários, fornecedores e clientes a registrar o apoio às usinas.
Além disso, a mídia também vem sendo amplamente usada. “Tem uma vinheta em todas as rádios e televisões, quase todas comerciais, que fala, basicamente, que o Brasil precisa da energia de Rondônia, que sem ela viria o apagão. Mostra que as usinas significam progresso, emprego e desenvolvimento para o Brasil e para Rondônia”, conta Luis Fernando Novoa Garzón, sociólogo e professor da Universidade Federal de Rondônia (Unir).

Igor Ojeda e Luís Brasilino, da redação (Agência Brasil de Fato)
Fonte: http://www.brasildefato.com.br/v01/agencia/nacional/governador-e-prefeito-utilizam-maquina-publica-para-pressionar-a-favor-de-usinas-em-rondonia

Carta ao povo brasileiro e à comunidade internacional

Nós moradores de Porto Velho e de todo Estado de Rondônia denunciamos a tentativa do governo brasileiro, associado a grandes construtoras e transnacionais do setor elétrico, de licenciar de forma irregular e inescrupulosa duas mega-hidroelétricas no maior tributário do rio Amazonas, o rio Madeira.
O rio Madeira é um rio de formação recente que sequer tem um leito definido. De sua nascente à sua foz, há um desnível de aproximadamente 65 metros. São pelo menos 20 trechos de corredeiras, tombos e cachoeiras no seu alto curso que sustentam um regime hidrológico complexo e delicado. A alteração da dinâmica do rio e da bacia com a construção das barragens pode acarretar níveis imprevisíveis de alagamento, de assoreamento e de erosão.
A construção de usinas em Santo Antonio e Jirau afetaria de forma irreversível a biodiversidade regional, especialmente a relativa aos peixes, comprometendo a atividade pesqueira em toda a bacia do Madeira. Grandes áreas de vegetação densa seriam alagadas permanentemente por essas barragens, criando condições propícias para a emissão de gases estufa, para a multiplicação dos vetores da malária e para a contaminação por mercúrio. A qualidade da água para fins de abastecimento urbano também seria afetada por tempo indeterminado. É inaceitável que o risco de vida da população de Porto Velho e de Rondônia paguem os riscos financeiros do empreendimento.
A cidade de Porto Velho se tornaria um apêndice, uma parte acessória dessas gigantescas obras, em detrimento de sua memória e identidade, incluindo a inundação da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré – E.F.M.M., e da Vila de Santo Antônio, marcos históricos do processo de ocupação da região. Prevê-se que mais de 100 mil pessoas afluiriam para o município nos próximos quatro anos por conta dessas obras. Menos de 2% da cidade de Porto Velho tem saneamento básico. A rede hospitalar pública é incapaz de atender minimamente a população hoje residente. Os índices de desemprego e de criminalidade estão entre os maiores entre as capitais de estado. Junto com as usinas viriam mais caos urbano, mais crime, mais violência e corrupção. Estudos de impacto de vizinhança que produzissem indicadores para o adequado planejamento urbano não foram realizados, e nem há previsão para tanto.
Denunciamos governantes e representantes parlamentares que resolveram se tornar empregados e porta-vozes das empresas e bancos patrocinadores das usinas, em flagrante prática de abuso de autoridade e de improbidade administrativa, durante a condução do licenciamento do projeto das usinas de Santo Antonio e Jirau.
Denunciamos o uso da máquina pública para fins particulares pelo Governo do Estado, pela Prefeitura Municipal, bem como pelos legislativos municipal, estadual e federal. Recursos essenciais para a população estão sendo desviados para abastecer uma milionária campanha publicitária a favor das obras. O Poder Público deveria antes de tudo procurar informar a população e exigir reais esclarecimentos dos empreendedores. Os três níveis de governo deveriam ter garantido um amplo debate social e técnico sobre o projeto, com a convocação de painéis de especialistas e de audiências públicas, para que todas as dúvidas, falhas e lacunas nos estudos apresentados pudessem ter sido discutidas amplamente.
Por tudo isso e em nome de nossas vidas e das nossas futuras gerações, exigimos o cancelamento do licenciamento do projeto das usinas Santo Antonio e Jirau, com base no parecer técnico do Ibama que atestou sua completa inviabilidade.

Comunidade de Santo Antonio, cidade de Porto Velho, Estado de Rondônia, 13 de junho de 2007.

Assinam esta carta:
Comunidade da Cachoeira de Santo Antônio, Associação de Pescadores de São Carlos, Movimentos dos Atingidos por Barragens – Rondônia, Via Campesina - Rondônia, Associação Arirambas, Associação dos Amigos da Estrada de Ferro Madeira - Mamoré, Faculdade Católica de Rondônia, Comissão de Justiça e Paz - Arquidiocese de Porto Velho, Comissão de Justiça e Paz – Zona leste, Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior - ANDES – SN - Regional Norte 1, Fórum Independente Popular do Madeira - FIPM

20 junho 2007

Nota Pública Contra a Criminalização das Rádios Comunitárias

Denunciamos a todos os cidadãos e cidadãs, às entidades e instituições democráticas de nosso País e a nível internacional, o escandaloso e truculento processo de criminalização e perseguição a que estão sendo submetidos os(as) militantes das rádios comunitárias no Estado do Pará e no Brasil.
Nos últimos anos, mais de 100 rádios comunitárias foram fechadas no Pará e seus equipamentos apreendidos por operações da ANATEL em conjunto com a Polícia Federal. O saldo dessas ações são dezenas de processos criminais abertos contra ativistas que buscam democratizar a informação e os meios de comunicação. As condenações já começam a surgir, inclusive com pesadas penas pecuniárias que alcançam R$ 10.000,00 por pessoa.
Este movimento reacionário e autoritário demonstra que, mesmo sendo perseguidas pelo Estado a partir do interesse do coronelismo midiático, as rádios comunitárias conseguiram crescer e se consolidar como instrumentos de comunicação das classes trabalhadoras e populares na luta pela liberdade de expressão e comunicação.
Historicamente, os grandes grupos de comunicação do Brasil vangloriam-se de possuir força política suficiente para atuar como um poder paralelo, usando a força da informação e da comunicação para determinar os destinos do nosso país. Um sistema de comunicação exclusivamente comercial onde o povo não se vê, não se ouve e nem se identifica, que só interessa à mídia do capital e do lucro.
A ABERT (Associação Brasileira de Empresas de Rádio e Televisão) e outras representações nacionais e locais são os representantes desse movimento de concentração da comunicação e da transformação da informação em negócios. Até mesmo a crise do apagão aéreo está atualmente sendo utilizada, pela grande mídia, nesse ataques às rádios comunitárias.
Essa estratégia de estrangulamento das Rádios Comunitárias conta com a criminalização como eixo principal, mas este combate se apresenta com outras formas perversas e retrógradas de atuação. Nessa direção denunciamos os procedimentos burocráticos pouco transparentes de legalização das rádios e o engavetamento dos processos que vagarosamente tramitam no Ministério das Comunicações, através dos quais as comunidades intentam obter, em vão, a autorização para o funcionamento das rádios comunitárias.
Ao lado disso, o Congresso Nacional - que concentra muitos latifundiários da comunicação - tem construído leis para dificultar o acesso das rádios comunitárias ao funcionamento regular, através da imposição de muitos limites. A lei 9.612, de 19 de fevereiro de 1998, restringe o raio de atuação a apenas 1km, o limite de míseros 25 watts de potência, a proibição de veicular anúncios de pequenos comerciantes e a indefinição, por outro lado, do conceito de apoio cultural, entre outras coisas. Como se não bastasse, há ainda noticias de concessões irregulares, com favorecimento para apadrinhados políticos de deputados, senadores e governantes.
Enfim, o excesso de burocracia e demora na concessão das outorgas estimulou a desobediência civil entre as comunidades, que precisam do serviço prestado pelas emissoras, afinal, a comunicação é um direito humano consagrado em vários pactos e tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário.
Não bastasse esse quadro, várias operações feitas pela ANATEL com o Apoio da Polícia Federal são ilegais uma vez que está em vigor uma liminar do STF que retira da ANATEL o poder de fechar rádios ou apreender equipamentos.
O Ministério Público Federal e o Poder Judiciário deveriam e devem apoiar a democratização da comunicação e da radiodifusão no Brasil, investigando inclusive eventuais abusos praticados pela ANATEL, e a omissão do Ministério das Comunicações nos processos de legalização das rádios comunitárias.
Dito isso, e profundamente indignados, repudiamos todo esse sistema de repressão às rádios comunitárias, reivindicamos políticas públicas e mudanças legislativas que propiciem o efetivo exercício do direito à comunicação. Exigimos também uma nova postura de nossas instituições, mantidas por cada uma e cada um de nós, merecedores do direito à informação, cultura, lazer e respeito por parte do Estado Brasileiro.
Ante o exposto, manifestamos nossa solidariedade a todas e todos os companheiros que, lamentavelmente encontram-se condenados ou respondendo a processos na Justiça Federal ou indiciados na Polícia Federal, e exigimos:
• O fim das ações de repressão às rádios Comunitárias.
• O fim dos processos de criminalização dos(as) ativistas das Rádios Comunitárias e Anistia às companheiras e companheiros condenados.
• Expedição imediata de licenças provisórias para as rádios que estão com processo de legalização em tramitação.
• Abertura de editais para habilitação para novas rádios comunitárias.
• Desburocratização e agilização dos processos de legalização das rádios comunitárias.
• Apoio e assessoramento técnico das rádios comunitárias.
• Apoio cultural, crédito e financiamento às rádios comunitárias.
• Devolução dos equipamentos apreendidos pelas operações da ANATEL e PF nas mesmas condições em que foram apreendidos.

Belém, 20 de junho de 2007

Assinam esta nota (aberta a novas adesões):
Rádio Comunitária Cidadania FM, Rádio Comunitária Resistência FM, Rádio Comunitária ERÊ, Rádio Comunitária Metropolitana FM, Rádio Revolução Pará FM, Rádio Capital FM, Rádio KM23, Rádio Sintonia FM, Rádio Metrópole FM, Rádio Riomar FM, Rádio Tropical FM (Marudá), Rádio Alternativa (Santa Maria), Rádio Cidade Nova FM (Aurora do Pará), Rádio Estilo FM (Ananindeua), Rádio Guajará FM (Ananindeua), Rádio Coração FM (Ananindeua), Rádio Continental FM (Ananindeua), Rádio Cabanos FM (Acará), Rádio Tauá FM (Santo Antônio do Tauá), Rádio Popular de Breves FM, Rádio Cristal FM (Barreiro), Rádio Mosqueiro FM (Carananduba), Rádio Guamá, Rádio Stúdio FM 103,7, Aldeia Cabana FM, Rádio Comunitária FM Cabana, Rádio Tupinambá (Mosqueiro), Rádio Maria Fumaça (Castanhal), Palmares FM (Parauapebas), Voz Camponesa (Castanhal), Rede Aparelho, Instituto Cultural Fala, SDDH - Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos, ABRAÇO - Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária, ARCA - Associação de Rádios Comunitárias da Amazônia, NAJUP Isa Cunha - Núcleo de Assessoria Jurídica Universitária Popular Isa Cunha, CJP - Comissão Justiça e Paz da CNBB, MST - Movimento de Trabalhadores Rurais Sem - Terra, CADEL - Centro Acadêmico de Direito Edson Luís, AMOR – Associação Movimento Reggae, Vereadora Marinor Brito, Fórum em defesa da educação, Sociedade Cultural Boi Marronzinho, MPDC – Movimento Popular pelo Direito à Cidade, Associação de moradores unidos na luta, Sindicato dos Radialistas, Senador José Nery

19 junho 2007

Imerys admite uso de produtos tóxicos

Depois de uma semana de negativas, diretores da Imerys Rio Capim Caulim admitiram o uso de pelo menos nove produtos químicos para beneficiar o caulim desde a mina, passando pelo transporte através do mineroduto, até a usina de beneficiamento, em Vila do Conde, município de Barcarena. Os produtos se esparramaram em toda a bacia hidrográfica do rio Pará, numa quantidade estimada de 60 mil metros cúbicos de caulim, poluindo toda a região. Segundo os diretores da empresa, os produtos químicos são usados desde a extração do mineral, no município de Nova Ipixuna, nordeste do Estado, até o beneficiamento.
As afirmações sobre o uso de produtos químicos foram feitas em depoimento ontem durante quase seis horas na Divisão Especializada em Meio Ambiente (Dema), ao delegado Marcos Lemos, que preside o inquérito policial sobre o caso. No domingo, 17, a empresa também afirmou em nota à imprensa que a coloração da água estava normalizada, mas foi desmentida por pescadores e moradores da ilha de São Marcos, que fica às margens dos igarapés poluídos pelo caulim que vazou da bacia 3 da fábrica. O vazamento de caulim contaminou os igarapés Curuperé e Dendê, e também atingiu as praias de São Marcos e do Caripi.
As declarações feitas pelos diretores da Imerys sobre o uso de produtos químicos deixaram surpresos alguns técnicos que acompanharam as vistorias feitas na fábrica e nas áreas contaminadas pelo caulim. 'Eles negaram o tempo todo a presença de ácido sulfúrico e sulfatos. Com essa afirmação (de ontem), é possível que as populações e o meio ambiente já estejam bastante afetados, uma vez que esses produtos são muito ácidos e alteraram as características das águas das bacias e do solo', disseram técnicos que preferem não se identificar. Se os laudos confirmarem a presença de ácido sulfúrico e sulfato de alumínio, é provável que a empresa esteja trabalhando e produzindo resíduos fora do permitido, inclusive pela legislação das águas e de resíduos.
Hoje, pela manhã, irão depor na Promotoria de Meio Ambiente em Barcarena o diretor Industrial, Milton Carlos Constantin, e o gerente de Meio Ambiente, Gleydson Souza, que ontem prestaram depoimento na Dema juntamente com o diretor Jurídico, Fábio Guilherme Louzada Martinelli. 'Os efeitos, a verdade sobre o que aconteceu e a realidade sobre os danos só vão aparecer quando todos os laudos ficarem prontos. Por enquanto não podemos afirmar nada', disse o delegado Marcos Lemos. A Promotora de Justiça de Meio Ambiente em exercício de Barcarena, Patrícia de Fátima de Carvalho Araújo, solicitou ontem ao Centro de Perícia Científica Renato Chaves perícia nos lençóis freáticos atingidos pelo vazamento de caulim e deverá pedir novas perícias para investigar todas as possibilidades de danos sociais e ambientais. A empresa poderá sofrer ação civil pública e será submetida a ajuste de conduta se os crimes ambientais e os danos sociais forem comprovados.

Produtos usados são nocivos à saúde humana
O diretor industrial da Imerys, Milton Constantin, falou em depoimento sobre o processo de produção e beneficiamento do caulim. Ele disse que a empresa usa carbonato de sódio (barrilha) e poliaclilato de sódio como 'agentes dispersantes', ainda na mina, para separar o caulim da areia. Para evitar que o mineroduto seja entupido pelo mineral, é usado sulfato de alumínio, que garante estabilidade durante o transporte até a fábrica. O glutasaldeído é usado no caulim para impedir a corrosão das paredes do mineroduto. Já na chamada planta da empresa, no pólo industrial de Vila do Conde, onde o caulim chega na forma de polpa, é novamente necessário o uso de química para separação dos resíduos de areia e de outros minerais que não interessam à empresa. São usados óxidos de ferro e de titânio. Em seguida é feita centrifugação, para separar o caulim muito fino, que a Imerys exporta, do caulim muito grosso, que por enquanto não é comercializado. Os rejeitos, em torno de 15% a 20%, vão para as bacias 2 e 3. O restante passa pelo processo chamado delaminação, quando é adicionado poliacrilito, e depois o caulim é alvejado com o uso de ácido sulfúrico, sulfato de alumínio e hidrosulfito de sódio. Depois disso vai para a secagem e é exportado. O diretor da Imerys informou que o Ph dos rejeitos das bacias 2 e 3 é entre 7 e 8, mas um especialista consultado pela reportagem informou que o Ph da bacia 1, para onde vão os outros resíduos, é 3, portanto, muito ácido e perigoso para a saúde humana e do meio ambiente.

Fonte: Jornal “O Liberal” - Edição: Ano LXI - Nº 31.785 - Belém, Terça, 19/06/2007
OBS: Mais informações sobre esta situação podem ser verificadas nos textos inseridos no blog no dia 16/06/07.

17 junho 2007

Maioria dos brasileiros é a favor da reestatização da Vale, diz pesquisa

A maioria dos brasileiros é a favor da retomada da Companhia Vale do Rio Doce pelo governo federal. Segundo pesquisa realizada entre os dias 19 e 22 de maio pelo Instituto GPP – Planejamento e Pesquisa, 50,3% dos brasileiros são favoráveis à retomada da empresa, que vem acumulando seguidos recordes em seus lucros, faturamento e investimentos. Outros 28,2% são contra a medida. E 21,5% disseram não saber responder.
De acordo com a assessoria de imprensa do instituto, a pesquisa ouviu duas mil pessoas em 17 Estados brasileiros no período citado. A margem de erro máxima é de 2,2%, para cima ou para baixo dos resultados obtidos. E o principal corte da pesquisa diz respeito à idade, de forma que todas as pessoas ouvidas possuíam 16 anos ou mais.
Carta Maior teve acesso aos dados completos, e pôde constatar que a pergunta era simples e direta, apresentada da seguinte forma: “agora gostaria que dissesse se é a favor ou contra da seguinte medida: o governo retomar a Vale do Rio Doce”.
Nas regiões, a pesquisa apontou que o Norte do Brasil é onde existe maior apoio à medida: 62,5% dos entrevistados são favoráveis à retomada da empresa. No Sul, o número fica em 47,6%, ante 49,7% no Sudeste, 37,3% no Centro-Oeste e 52,9% no Nordeste. Já os 28,2% contrários apontados pela pesquisa são 20,3% no Sul, 30,5% no Sudeste, 24,2% no Centro-Oeste, 31,1% no Nordeste e 24,6% no Norte.
A quantidade dos que não souberam responder é maior no Centro-Oeste (38,5%), ante 32,1% no Sul, 19,8% no Sudeste, 16,0% no Nordeste e 12,9% no Norte.
Por fim, a pesquisa aponta que o apoio à retomada da empresa é maior nas regiões metropolitanas do país (54,1%) do que nas capitais (52,5%) e interior (47,6%). Nas capitais, 29,2% são contra a medida, número próximo aos 29,4% nas regiões metropolitanas e 27,3% no interior. Os números apontam que no interior é maior a quantidade de pessoas que não souberam responder: 25,1%, ante 18,3% nas capitais e 16,5% nas regiões metropolitanas.
As informações reafirmam a avaliação crítica dos brasileiros em relação a diversos aspectos da política de privatizações empreendida no país nos últimos anos. Segundo analistas, durante as eleições gerais do país em 2006 essa agenda se mostrou rejeitada por boa parte da população. E agora, ironicamente, tal rejeição é reafirmada com a questão sobre a Vale em pesquisa encomendada justamente por um dos principais agentes da política de privatizações, o DEM (Democratas), antigo PFL.
A pergunta integrava levantamento de consumo interno dos Democratas, voltado a obter dados sobre a conjuntura política do país. Segundo nota publicada na coluna da jornalista Mônica Bérgamo na Folha de S. Paulo de quinta-feira (14), “o resultado, meio escondido entre várias outras perguntas do instituto GPP, está deixando deputados e senadores que tomaram conhecimento dos números de queixo caído”.
Além de ter gerado surpresa entre os parlamentares, a pesquisa também trouxe mais energia para os movimentos sociais e entidades do país que preparam para setembro deste ano a realização de um plebiscito popular sobre a privatização da Vale do Rio Doce, ocorrida em 1997. A empresa foi vendida à época por cerca de R$ 3,3 bilhões e hoje já possui valor de mercado de quase R$ 100 bilhões.
Alegando desde uma possível sub-avaliação no preço da empresa a problemas jurídicos no processo, inúmeras ações questionam a validade do leilão na Justiça, onde ainda aguardam julgamento, mais de dez anos após a privatização.

Antonio Biondi – Carta Maior
Fonte: http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=14331
Foto: Campanha de divulgação do Plebiscito Popular sobre a Privatização da CVRD

16 junho 2007

Suspeita é de vazamento de resíduos químicos

O presente e o futuro do meio ambiente em Barcarena estão ameaçados. Uma fonte que prefere não se identificar garantiu, ontem, que há fortes suspeitas de vazamento de resíduos químicos junto com os cerca de 60 mil metros cúbicos de caulim e água que atingiram a bacia hidrográfica do rio Pará, que inclui os igarapés Curuperé e Dendê e as praias de Caripi e de São Marcos naquele município, a 75 km de Belém. A fonte informou que em uma das três bacias são depositados resíduos químicos usados na fábrica da Imerys Rio Capim Caulim chamadas de 'bacias comunicantes', termo técnico usado para indicar a interligação entre elas, correspondentes a uma área dividida apenas por paredes de terra batida.
'Com certeza os resíduos químicos também vazaram junto com o caulim in natura', garantiu. Ontem mesmo, antes dos laudos da perícia sobre a possível contaminação das águas, pescadores já começaram a encontrar peixes, como o tuí e o mandií, comuns na região, mortos dentro dos igarapés Dendê e Curuperé.
As suspeitas sobre o vazamento de resíduos químicos também estão em um alerta do Relatório de Fiscalização nº 116/2007 da Divisão de Substâncias Perigosas (Disup) da Secretaria Executiva de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente (Sectam), onde os técnicos afirmam que as bacias 1 e 2, onde estão depositados rejeitos magnéticos e caulínicos, já estão em fase de exaustão há pelo menos três meses, segundo o 'Parecer Técnico' nº 15/2007 da Divisão de Mineração e Águas (Dimina), também da Sectam. Os rejeitos caulínicos passam por duas fases de tratamento. Na segunda fase saem rejeitos bastante ácidos por causa dos produtos químicos usados para beneficiamento do caulim, como a soda cáustica, e que, segundo a denúncia, acabariam atingindo o igarapé Curuperé.
O relatório e o parecer técnico foram feitos depois de uma inspeção da Sectam ainda na primeira quizena de março deste ano, quando foi recomendada à empresa mineradora buscar solução ao problema para a devida renovação da Licença de Operação da fábrica, que ainda está sendo analisada. A assessoria da Imerys nega desde segunda-feira qualquer tipo de vazamento de resíduo químico junto com o caulim.
A promotora de Justiça de Meio Ambiente de Barcarena, Patrícia de Fátima de Carvalho Araújo, em exercício na 1ª Promotoria, acompanhou de perto ontem a coleta de amostras de resíduos das três bacias da Imerys feita por pesquisadores do Instituto Evandro Chagas (IEC), que estão muito preocupados com a saúde da comunidade, e a perícia do Núcleo de Engenharia do Centro de Perícia Científica Renato Chaves (CPCRC). Ela vai aguardar os laudos para confirmar a denúncia de vazamento de resíduos químicos e se há riscos de novos rompimentos. 'Queremos saber a dimensão dos danos ambientais, se há riscos futuros, mas a nossa grande preocupação é com os danos sociais', disse ela, às margens do igarapé Dendê.

Iceberg
O levantamento feito pelo Centro de Perícias Científicas Renato Chaves já constatou a extensão dos impactos causados ao meio ambiente, com praias impróprias para o banho. Com o vazamento, a água dos igarapés da região ficou branca. A mancha de cor branca tem cerca de 8 quilômetros de extensão com cerca de um quilômetro de largura. Passa por localidades como vila do Conde, Itupanema e Caripi.
Até o momento, os peritos não constataram mortandade de peixes nos rios da região. Eles coletaram amostras para exames físico-químicos, cujos laudos devem ser emitidos no prazo máximo de vinte dias. Para o delegado Marcos Lemos, o que se pode perceber na região, no momento, é apenas 'a ponta do iceberg'.
'A poluição é mais intensa do que se imagina. O que se pode visualizar, no momento, é a contaminação da água e das plantas, mas não dá para dizer em curto prazo o tamanho do dano', afirmou Lemos.

Defesa Civil remaneja doze famílias das margens do igarapé Dendê
O vazamento de caulim que aconteceu desde domingo e poluiu grande parte da área onde pescadores e moradores ainda sobrevivem usando os igarapés para pescar e a água para uso doméstico, obrigou que outras famílias fossem remanejadas. Do bairro Industrial, bem ao lado da bacia 3 que vazou, mais 12 famílias foram retiradas de suas casas e levadas para o Centro Educacional Maurício Guida, em Vila do Conde, onde já estavam 73 pessoas, a maioria crianças pequenas.
Os moradores da Ilha de São João também foram obrigados a deixar suas casas por falta de condições e de água para uso doméstico. Ontem à tarde, 12 das 15 famílias que vivem às margens do igarapé Dendê foram retiradas pela Defesa Civil e levadas para a Creche Sítio do Pica-Pau, também na vila. As três famílias que ficaram se recusaram a sair do local porque estão desoladas e com medo de terem seus barcos e suas casas roubados.
A maior preocupação do pescador Emercindo Andrade dos Anjos, que, junto com os outros, ficou sem trabalho, é com seus quatro filhos. Dois deles foram para a creche com familiares e dois ficaram com ele e a esposa, dona Maria Madalena de Souza Vasconcelos. ' A situação é muito crítica: o vazamento de caulim afetou a vida da gente', lamenta seu Emercindo. Para ela, que está acostumada a ver o marido chegar com dois ou três quilos de camarão pescados em uma única noite, ver a família separada e o marido sem trabalho por causa da poluição do igarapé Dendê é um grande sofrimento. 'Eles pensam que a gente só precisa de água mineral e cesta básica? Precisamos da água, da pesca, de viver do nosso trabalho. Quem vai pagar nossas contas?', desabafou.

Depoimentos
Hoje pela manhã será realizada nova vistoria nas três bacias da fábrica de beneficiamento de caulim da Imerys, por técnicos da Secretaria Executiva de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente (Sectam), do Corpo de Bombeiros Militares do Pará (CBPM) e da Defesa Civil para verificar se não há mais vazamentos e nem risco de novo rompimento das paredes dos depósitos. A vistoria será acompanhada pelo Ministério Público.
Na Delegacia Estadual de Meio Ambiente, em Belém, começam os depoimentos de representantes da empresa, técnicos, peritos e moradores que tiveram suas áreas atingidas pelo vazamento de caulim. Além da expectativa para esclarecer as causas do acidente, a Polícia também quer realmente descobrir se há produtos químicos junto com todo o mineral que vazou e poluiu grande parte da bacia hidrográfica de Barcarena.

Jorge Herberth - Da Redação
Fonte: Jornal “O Liberal”, Caderno Atualidades - Edição: Ano LXI - Nº 31.781 (Belém, Sexta-feira, 15/06/2007)

Imerys pede desinterdição da fábrica. Sectam promete cumprir a lei

Em reunião, ontem, a direção da Imerys Rio Capim Caulim solicitou à Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Sectam) a suspensão da interdição da usina de beneficiamento de caulim imposta pela Secretaria na quarta-feira,13, devido aos problemas de contaminação ambiental causados pela empresa no município de Barcarena, nordeste do Estado.
A principal alegação da Imerys, segundo o seu diretor-presidente, Afonso Guerra, é que 'a paralisação da usina traz conseqüências danosas para os funcionários e tem reflexos no mercado exterior, para onde a empresa exporta 98% por cento da produção, sem esquecer os problemas com os acionistas', ressaltou.
O consultor jurídico da Imerys, advogado José Canto, sustentou que, segundo dados técnicos, a empresa 'pode funcionar, sem ameaças ao meio ambiente, com as duas bacias de rejeito que não foram afetadas', defendeu. O advogado ainda enfatizou que o pedido de reconsideração feito à Secretaria 'ainda não era a defesa da empresa', que tem 15 dias, a contar da última segunda-feira, 11, quando foi autuada pelo órgão ambiental do Estado, para recorrer da autuação e se defender.
Os técnicos da empresa voltaram a assegurou que o vazamento da bacia de rejeito número três, que rompeu na segunda-feira, 11, está controlado, e a mesma será fechada. Os diretores disseram que todas as providências de reparos podem ser realizadas paralelamente ao funcionamento da usina com as duas bacias de rejeito.
Foi a própria Imerys que solicitou ainda na quarta-feira, 13, a audiência à Secretaria, disse aos jornalistas o diretor de Meio Ambiente da Sectam, o geólogo Manoel Imbiriba Júnior, que recebeu os dirigentes da empresa, já que o secretário Valmir Ortega está cumprindo agenda fora do Estado.
O diretor de Meio Ambiente insistiu no encontro que a Secretaria só poderá permitir o funcionamento da usina de beneficiamento com 'a segurança total do sistema, após discussões técnicas com base em laudos geotécnicos e o resultado da perícia do Centro de Perícias Científicas do Instituto Renato Chaves.

PENDÊNCIA
Imbiriba lembrou que a Imerys tem uma pendência com Secretaria desde agosto de 2006, quando uma inspeção detectou problemas de fissuras na mesma bacia de rejeito que rompeu e causou poluição com o caulim no solo e águas na área de influência da usina.
Por enquanto, ficou apenas acertado que a Secretaria vai solicitar uma reunião com os técnicos do 'Renato Chaves', Corpo de Bombeiros e Defesa Civil para colher mais informações com as equipes que trabalharam no local. Também ficou acertado que será feita uma visita técnica à área da Imerys para novas observações. Esta visita foi uma das solicitações dos diretores da empresa.
A Sectam só voltará a discutir a possibilidade de suspender a interdição parcial e temporária, de acordo com o art. 119, item VIII da Lei Ambiental do Estado do Pará, nº 5.887/95, quando for realizada 'a correção da ruptura da bacia de rejeito, assim como a regularização do fornecimento de água para o bairro Industrial'. É a recomendação final do Relatório de Fiscalização nº 116 da Divisão de Substâncias Perigosas da Secretaria de Estado de Meio Ambiente. Por isso, a interdição na Imerys continua.

Fonte: Jornal “O Liberal”, Caderno Atualidades - Edição: Ano LXI - Nº 31.781 (Belém, Sexta-feira, 15/06/2007)

Imerys é autuada e indiciada pela Polícia

A Divisão Especializada em Meio Ambiente (Dema) autuou a empresa Imerys Rio Capim Caulim por crime ambiental causado pelo vazamento da Bacia de Rejeitos nº 3 na usina de produção de Vila do Conde, em Barcarena [Estado do Pará]. A Dema se baseou no artigo 54 da Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/98), segundo o qual é crime 'causar poluição de qualquer natureza em níveis que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora'. Pelo mesmo motivo, a Polícia Civil indiciou os responsáveis pela empresa. 'Além de prisão dos responsáveis, o crime prevê multa que pode chegar a R$ 50 milhões', anunciou o delegado Bertolino Neto, que esteve no município em companhia de peritos do Instituto de Perícias Criminalísticas Renato Chaves.
A bacia armazenava milhares de metros cúbicos de um composto de substâncias resultantes do processo de beneficiamento do caulim. O incidente ocorreu às 4 horas da última segunda-feira [11/06/07]. A gravidade dos danos ao meio ambiente e à vida humana e animal na região ainda é imprevisível, segundo os peritos.
Até as 18 horas de quarta-feira, quando a perícia foi encerrada, a emulsão esbranquiçada já cobria uma área de cerca de 10 quilômetros quadrados, incluindo parte do rio Pará, os igarapés Curuperé e Dendê e as praias de Caripi e Itupanema. 'Esse material se alastra no solo e na água. Com a maré, a tendência é que vá se espalhando e se diluindo cada vez mais, podendo atingir, através do rio Pará, até mesmo a Baía do Marajó', disse o diretor do Instituto de Criminalística, Rosivaldo Cantuária. 'Como nós ainda desconhecemos o nível de toxicidade dessas substâncias, não sabemos o que poderá ocorrer. Coletamos amostras da água para análise físico-química e só de posse desses resultados poderemos dizer se há risco de mortandade de peixes ou de doenças à população local', explicou Cantuária. Prevendo esses riscos, 18 famílias, cerca de 80 pessoas, entre ribeirinhos e moradores do bairro Industrial foram retiradas às pressas de suas casas e alojadas pela Defesa Civil em uma escola pública, em Vila do Conde.

RISCOS
Os peritos, acompanhados de militares do Corpo de Bombeiros e dos delegados Marcos Lemos, que preside o inquérito sobre o fato, e Bertolino Neto, diretor da Divisão Especializada em Meio Ambiente (Dema), passaram a terça e a quarta-feira passadas em Vila do Conde, periciando o local. Foram à empresa, onde constataram que o material vazado da bacia 3 foi parcialmente retido numa bacia provisória, onde um cano de 49 metros foi improvisado para drenar o líquido para a mata que passa atrás da empresa. Uma tentativa frustrada de impedir que o material escorresse para a pista do bairro Industrial, onde seria facilmente notado. 'Acontece que era tanto líquido (ainda não se sabe a quantidade certa), que não teve jeito de impedir que vazasse também para a rua', explicou o perito Fernando Dias.
Depois, a equipe sobrevoou a área fotografando o percurso da mistura de caulim pelos rios e igarapés. 'O primeiro atingido foi o igarapé do Dendê, que passa ao lado da empresa. A mistura chegou ali passando por uma área de várzea (também contaminada). Do Dendê, chegou ao Curuperé e, em seguida, ao rio Pará e às praias', descreveu Fernando.
Após o sobrevôo, os peritos usaram um bote para coletar 13 amostras de água. A análise das coletas ocorrerá no CPC Renato Chaves e na Universidade Federal do Pará (UFPA). 'Pretendemos concluir essas análises em 20 dias', diz Cantuária.
Hoje, a Polícia começa a ouvir os depoimentos de representantes da Imerys - o gerente Gleydson Souza, o diretor Milton Constantin e o engenheiro Natanael Mascarenhas, que teria sido a primeira pessoa a saber do vazamento.

Fonte: Jornal “O Liberal”, Caderno Atualidades - Edição: Ano LXI - Nº 31.781 (Belém, Sexta-feira, 15/06/2007)

15 junho 2007

Governo atrasa criação de reserva na área em que Dorothy morreu

O anúncio da criação da Reserva Extrativista (resex) do Médio Xingu, na bacia do rio Xingu (PA), pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA), estava previsto para o começo deste mês (5), mas a Casa Civil adiou a iniciativa ao enviar o processo para análise do Ministério de Minas e Energia (MME). O projeto da resex abrange uma faixa de 100 quilômetros ao longo do rio Xingu, totalizando uma área de 303 mil hectares.
A Reserva Extrativista do Médio Xingu é a última peça, que falta ser criada, do mosaico de áreas protegidas, que pretende resguardar a floresta da Terra do Meio, zona de intenso conflito fundiário, onde a missionária Dorothy Stang atuou e foi assassinada em 2005. Esse mosaico é composto por terras indígenas e Unidades de Conservação estaduais e federais e cobre uma área de 28 milhões de hectares, onde vive uma população de 12 mil pessoas, entre indígenas e não-indígenas. As comunidades e a preservação ambiental dessa região são ameaçadas pela pressão de grileiros e de madeireiros ilegais.
É também no rio Xingu, que está prevista a polêmica construção das hidrelétricas de Belo Monte 1 e 2, que fazem parte das obras de infra-estrutura do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo federal.
Alexandre Cordeiro, coordenador-Geral de Gestão e Criação de Reservas Extrativistas e de Reservas de Desenvolvimento Sustentável do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), explica que o trâmite normal para criação de Unidades de Conservação federais exige estudos técnicos e avaliação jurídica do Ibama e, posteriormente, do MMA, que seguem para a análise da Casa Civil, antes da assinatura do Presidente da República. “A participação de outros ministérios se dá durante o período de consulta pública. A Casa Civil mandar processo para análise do MME é algo bastante incomum”, afirma o coordenador do Ibama.
Em entrevista à Radiobrás (10/06), Cordeiro explica que há planos de instalação de unidades de geração de energia na calha do rio Xingu. Segundo ele, essa atividade seria incompatível com a criação da resex, por isso “Minas e Energia quer analisar mais detalhadamente a proposta da reserva”.
O impasse da resex foge da alçada do Ibama, porque o trabalho técnico já foi concluído pelo órgão ambiental. “Agora é uma questão entre o Ministério do Meio Ambiente (MMA) e a Casa Civil. Em caso de impasse político a única saída é o Ministério Público Federal”, diz Cordeiro.
“Da nossa parte, o processo foi concluído. Nós temos insistido na importância e na criação dessa reserva, que já deveria ter sido feita, porque ela é fundamental e urgente para as comunidades tradicionais e para a reprodução das suas atividades econômicas, sociais e culturais. Estamos aguardando as questões burocráticas da Casa Civil para o dia 28 de junho”, explica Maurício Mercadante, diretor do departamento de Áreas Protegidas do Ministério do Meio Ambiente.
Segundo a Casa Civil, a proposta da criação da Resex do Médio Xingu e de outras Unidades de Conservação chegou ao ministério no final de maio e, por isso não foi possível concluir os estudos até a data inicial. A assessoria da Casa Civil não soube informar se as hidrelétricas interferem na criação da reserva, mas afirmou que todos os aspectos da região serão considerados e analisados pelos técnicos do ministério.
De acordo com o diretor do MMA, não há nenhuma relação entre o projeto das hidrelétricas de Belo Monte e o atraso da criação da resex. Ele explica que a categoria de reserva extrativista não impede a exploração do potencial hidrelétrico do rio. “Não haverá impacto direto na resex, mas se eventualmente houver, ele será analisado, e as medidas mitigadoras serão previstas de acordo com o licenciamento ambiental. A criação da reserva não causa nenhuma contradição e nenhum constrangimento para a construção das hidrelétricas de Belo Monte”, afirma.
As outras áreas protegidas que seriam anunciadas junto com a Resex do Médio Xingu, mas terão que passar por análise da Casa Civil são as reservas extrativistas Chapada Limpa (MA), Montanha Mangabal (PA), Baixo Rio Branco/Jauaperi (RR e AM), Médio Purus (AM), Ituxi (AM) e Acaú-Goiana (PB e PE). De acordo com o Instituto Socioambiental (ISA), os Parques Nacionais do Mapinguari e do Lago Jarí (AM) e as Reservas de Vida Silvestre do Rio Tibagi (PR), do Una e do Rio dos Frades (BA) também estariam na fila de espera do ministério.

Sociedade civil
Entidades da sociedade civil reafirmam a necessidade e a urgência da Resex do Médio Xingu para garantir as condições ambientais e a sobrevivência das comunidades tradicionais. “A resex é fundamental para que esse território seja minimamente preservado e para que os ribeirinhos possam ficar livres da pressão da grilagem. Ela é a garantia para as populações tradicionais continuarem vivendo ali”, avalia Cristina Velásquez, assessora de políticas públicas do ISA. Ela afirma que o retorno das madeireiras e dos grileiros à região é um risco iminente.
“Foi feita uma promessa pública por parte do governo de que a Resex do Médio Xingu seria criada. Essa é uma prioridade para o Ministério do Meio Ambiente, mas que se conflita com os interesses de outros ministérios”, diz a assessora do ISA. Para ela, as demandas e outros projetos do PAC devem ser apresentados com maior clareza. “É preciso saber como outras iniciativas [da área ambiental] previstas anteriormente vão dialogar com as obras de infra-estrutura do PAC daqui pra frente”, diz.
Para Ana Paula Souza, coordenadora da Fundação Viver Produzir Preservar (FVPP) de Altamira (PA), há uma outra questão também não contemplada: apesar de o reconhecimento legal dessas áreas de preservação ser importante, não é suficiente para alcançar os objetivos socioambientais, já que a gestão e as condições das comunidades em reservas já existentes deixam muito a desejar. “Não há projeto político em execução para as reservas. A vida das pessoas ali não é diferente de outros lugares em que não se há reservas”, afirma.
De acordo com o ISA, a resex do Médio Xingu também está integralmente incluída em uma área de 1.12 milhão de hectares, cuja posse é reclamada pelo grupo empresarial de engenharia de obras CR Almeida. No ano passado, a Justiça Federal chegou a determinar a saída dos funcionários da Amazônia Projetos Ecológicos, subsidiária do grupo, de toda a região, mas as comunidades locais afirmam que eles resistem em deixar o local.

Natália Suzuki - Carta Maior
Fonte: http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=14320

12 junho 2007

MPF quer conter ação de aliciadores de trabalhadores rurais no Pará

Para conter a ação dos aliciadores - pessoas que levam trabalhadores de seus estados de origem para outros estados, com falsas promessas de trabalho - o Ministério Público Federal irá fiscalizar estas pessoas conhecidas também como "gatos". Ações como essas resultam em práticas como o trabalho escravo. Em 2006 no Pará, segundo a Comissão Pastoral da Terra (CPT) foram mais de mil trabalhadores libertados em 53 fazendas. Este número corresponde a 31,76% dos 3.343 trabalhadores libertados em todo o país. O Ministério Público terá o auxílio da Policia Federal e do Ministério do Trabalho.
A punição dos culpados poderá ser mais eficiente contando ainda com a recente decisão do Supremo Tribunal Federal de transferir a competência do julgamento de processos sobre trabalho escravo para a Justiça Federal. Na esfera estadual poucos deles eram julgados até o fim e apenas 1 fazendeiro foi punido. É o que explica o procurador da república no Pará, Felício Pontes.
"Umas das causas da impunidade com relação ao trabalho escravo era exatamente não se chegar o processo até o final, por conta do incidente que os advogados promoviam. O réu questionava se ele estava sendo julgado no lugar certo ou não. Com o que o Supremo decidiu isto ficou resolvido. Fazendo com que haja celeridade processual, a gente possa ter a condenação destas pessoas que cometem este crime tão hediondo que é o trabalho escravo, de uma maneira muito mais rápida e assim contribuindo para que não se tenha impunidade nestes casos no Brasil."
O Ministério Público constatou na análise de processos sobre trabalho escravo que os nomes dos aliciadores são os mesmos em grande parte deles. Os trabalhadores são trazidos de estados como Maranhão, Piauí e Mato Grosso e ao chegarem às fazendas encontram uma situação bem diferente da prometida pelos "gatos". Segundo a Delegacia regional do trabalho o número de libertações em abril deste ano no Pará já havia chegado a 223.

Gisele Barbieri - da Radioagência NP
Fonte: http://www.radioagencianp.com.br/index.php?option=com_content&task=view&id=2440&Itemid=1
Foto: a partir da fonte acima especificada

11 junho 2007

Em Altamira, indígenas do Pará declaram guerra a Belo Monte

Cerca de 150 caciques e lideranças das etnias Kayapó, Xicrin, Xipaya, Parakanã–Apyterewa, Asurini, Juruna, Kuruaya, Arara, Apinajé, Tembé, Gavião e Karitiana participaram no último fim de semana (1 a 3/06) de um encontro em Altamira, sudoeste do Pará, para discutir os impactos do projeto da hidrelétrica de Belo Monte sobre as populações indígenas e unificar posicionamentos políticos. Para os indígenas, tanto o governo quanto a Eletrobrás não têm repassado informações suficientes nem procurado saber a opinião dos potenciais atingidos.
De acordo com a Eletronorte (inicialmente responsável pelo projeto da usina, agora sob coordenação da Eletrobrás), Belo Monte impactaria diretamente 2 mil famílias na área urbana de Altamira, 813 na área rural de Vitória do Xingu e 400 famílias ribeirinhas. A empresa reconhece ainda, segundo seu representante em Altamira, impactos diretos e indiretos sobre cerca de 10 comunidades indígenas – antropólogos e pesquisadores, porém, falam em 14 comunidades.
Concretamente, segundo relato dos caciques, técnicos da Eletronorte e Eletrobrás procuraram apenas a comunidade Juruna da aldeia Pakisamba (única que, segundo as empresas, teria parte de seu território alagada pela barragem) para apresentar o projeto e discutir compensações. Segundo o coordenador do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Claudemir Monteiro, neste processo os técnicos estariam buscando angariar apoio à hidrelétrica através de doações de geradores, barcos e televisões.
No encontro de Altamira, realizado com apoio do Cimi, os indígenas convidaram pesquisadores, procuradores do Ministério Público Federal e dirigentes de movimentos sociais - como o Movimento dos atingidos por barragens (MAB) e o Movimento pelo Desenvolvimento da Transamazônica e Xingu (MDTX) – para destrinchar os vários aspectos do projeto de Belo Monte.
Segundo o especialista em hidrografia Glenn Switkes, que falou sobre os impactos no Xingu, o maior problema ocorrerá na chamada Volta Grande, uma “alça” do rio que será cortada no início e no fim para que as águas formem a barragem da usina na área central. Na época da seca – que ocorre de forma aguda entre os meses de setembro e dezembro -, a Volta Grande praticamente secaria, o que impossibilitaria a navegação e a pesca não apenas deste trecho do Xingu, mas afetaria também seus afluentes, como o rio Bacajá.
“Cerca de 450 indígenas que moram na Volta Grande seriam diretamente atingidos pela seca, mas há ainda as comunidades que moram às margens do Bacajá. A Eletronorte teria oferecido ao estado do Pará viabilizar uma ‘vasão ecológica’ do rio no verão, ou seja, liberar para o trecho 25% do volume de água registrado na menor vasão histórica do rio. Isso obviamente não resolve”, diz o especialista. Segundo ele, além de inviabilizar a navegação e os peixes, a seca formará grandes empoçamentos de água, onde proliferarão vetores de doenças como a dengue e a malária, e afetará o volume de água dos lençóis freáticos, alimentados pelo Xingu. “Tudo isso não consta dos estudos de impacto ambiental das empresas”, afirma.
Segundo Monteiro, coordenador do Cimi, as ameaças aos recursos naturais historicamente provedoras da subsistência e sobrevivência cultural e espiritual das várias comunidades elevou a temperatura dos discursos dos caciques contra o governo e as empresas empreendedoras, uma vez que, culturalmente, são as gerações atuais as responsáveis para garantir um futuro às gerações vindouras.
Por outro lado, segundo o procurador geral do Ministério Público Federal no Pará, Felício Pontes, o não cumprimento da norma constitucional que exige que os indígenas potencialmente atingidos por hidrelétricas sejam ouvidos pelo Congresso Nacional antes do processo de licenciamento da obra, também causou grande comoção. “O descumprimento, pelo poder público, das oitivas deixou os indígenas furiosos. Principalmente os mais velhos, que precisavam de tradução porque não falam português, ficaram muito revoltados”, relata Pontes.
Segundo o procurador, a reaglutinação dos índios é positiva. “O movimento indígena não vinha se posicionando sobre a hidrelétrica nos últimos anos porque desde 2001 o MPF assumiu os questionamentos legais do processo, principalmente a partir da perspectiva dos direitos indígenas. Agora que todos os procedimentos jurídicos contra a usina estão suspensos, a mobilização indígena deve voltar com mais força. Para o MPF é positivo, no sentido de que se comprovará que os procuradores não abraçaram uma causa ideológica, mas apenas cumpriram seu papel do ponto de vista legal e técnico”, diz Pontes.

Novo encontro
Além de fornecer mais informações sobre o projeto da hidrelétrica, na avaliação dos participantes o encontro de Altamira também alcançou o objetivo de iniciar uma rearticulação política do movimento indígena do Xingu, expressa em uma declaração conjunta contra a hidrelétrica divulgada no final do evento.
“(...) Queremos externar nossa preocupação quanto à possível construção do Complexo Hidroelétrico do Xingu, que anuncia a construção de barragens na Volta Grande do Xingu que caso sejam construídas irão atingir os povos indígenas, as comunidades de agricultores, a floresta e afetar a biodiversidade prejudicando a VIDA na Bacia do Rio Xingu. Somos totalmente contra Belo Monte, pois o Rio Xingu representa nossa vida e sua morte ameaça nossas vidas, nosso futuro, nossos parentes: filhos e netos. Qualquer intervenção no Xingu provoca a extinção da caça, do peixe e afeta profundamente nossas terras e nossa saúde. Nós, povos indígenas, queremos viver e respirar no Xingu, suas águas são fonte de vida e nós não queremos morrer, não vamos desistir da vida, não abandonaremos a luta, nosso canto de guerra estão na garganta para nos contrapor ao inimigo”, diz o documento.
Liderados pelos Kayapó, etnia que, em 1998, realizou um primeiro grande encontro contra o projeto de hidrelétricas no rio Xingu (à época chamado Kararaô), os indígenas do Xingu estão convocando agora um novo grande encontro contra Belo Monte, provavelmente no início do ano que vem, quando a cheia do rio permitirá a acorrida de um número maior de participantes.
“Queremos convocar os povos indígenas do Xingu, os Kayapó do Alto Xingu, os parentes do Parque Nacional do Xingu, da Amazônia e do Brasil, e convidar nossos aliados para um grande Encontro na cidade de Altamira, no qual mostraremos ao Governo Brasileiro nossa indignação e nossa posição contrária aos grandes projetos que estão implementados e que só destroem a Amazônia”, diz a declaração.
Em fevereiro de 1989, cerca de 3 mil pessoas participaram, em Altamira, do I Encontro dos Povos Indígenas do Xingu contra as barragens no rio. O evento ganhou as manchetes da mídia nacional e internacional quando a índia Kayapó Tuíra colocou um facão no rosto do então diretor da Eletronorte, José Antônio Muniz Lopes. Ocorrido pouco mais de dois meses após o assassinato do líder seringueiro Chico Mendes, em Xapuri (AC), o gesto teve repercussão internacional, dando ao encontro uma notoriedade que, segundo os indígenas, levou ao cancelamento do projeto inicial de Kararaô.

Verena Glass - Carta Maior
Fonte: http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=14269&editoria_id=2

09 junho 2007

Ação na Ilha de Marajó acaba com escravidão de 20 anos

O grupo móvel de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) encerrou uma ação que libertou 30 pessoas da escravidão, na última sexta-feira (1), na fazenda Santa Maria, no município de Soure, na Ilha do Marajó, Estado do Pará. O grupo cuidava da criação de búfalos e alguns dos trabalhadores moravam no local há 20 anos. O proprietário, Ovídio Pamplona Lobato, é médico e reside em Belém (PA).
De acordo com o auditor fiscal Humberto Célio Pereira, coordenador da ação, os trabalhadores estavam presos por intermédio de dívidas. "Eles tinham que comprar tudo na cantina, desde botas até comida", relata. Os trabalhadores não tinham sequer acesso ao valor dos produtos comprados, que era descontado diretamente de seus respectivos salários. Apenas sabiam que a dívida, na maioria das vezes, ultrapassava o valor do que deveriam receber. Pelo acordo verbal, eles deveriam receber mensalmente um salário mínimo (R$ 380,00). Em 2006, porém, o ganho anual de alguns trabalhadores foi de R$ 500,00.
A Santa Maria também praticava a retenção de documentos, outro elemento típico presente em casos de trabalho escravo. "O patrão pegava a carteira de trabalho para assinar e não devolvia", conta Humberto. Além disso, na sede da fazenda, foram encontradas nove armas de grosso calibre, entre elas dois fuzis de uso restrito das Forças Armadas.
Ainda de acordo com o coordenador da ação, os trabalhadores moravam em taperas com suas famílias. Não havia energia elétrica, condições sanitárias ou água potável. Toda a água vinha da chuva ou, na estação seca, dos igarapés. A que vem dos rios é barrenta e levemente salobra, mas era consumida, conforme relato de Pereira, sem nenhum tratamento.
A propriedade tem 30 mil hectares. Quatro peões faziam a limpeza do pasto e os demais cuidavam dos animais. Quatro adolescentes - um de 13 anos, dois de 15 e um de 16 - estavam entre o grupo que foi libertado. Crianças que moravam na propriedade não tinham acesso à escola.
Outro fator que contribui para caracterização do trabalho escravo é o isolamento do local. A Fazenda Santa Maria está a 12h de barco de Belém e a 1h de barco da cidade mais próxima. Cestas básicas e produtos para a cantina chegavam num barco enviado mensalmente pelo proprietário. Quando o grupo móvel chegou ao local, no entanto, os trabalhadores passavam fome, porque a embarcação do mês de maio ainda não havia chegado. "Eles estavam comendo camaleão com farinha e peixe pescado nos igarapés", discorre o coordenador da ação.

Morte
A fiscalização confirmou ainda que um homem que trabalhava na Santa Maria morreu afogado, há 11 anos, enquanto tentava navegar de um curral a outro da fazenda. Segundo o relato feito pelos moradores do local aos fiscais, a canoa não tinha condições de ser utilizada e o trabalhador foi substituído no serviço pela própria esposa, que não recebera qualquer tipo de indenização pelo acidente fatal que vitimou o marido.
Acordo
Ovídio Lobato firmou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o Ministério Público do Trabalho (MPT) no qual se comprometeu a pagar R$ 610 mil ao grupo dentro de um prazo de 60 dias. Nesta data, a equipe que fiscalizou a fazenda vai voltar ao local para acompanhar o acerto.
O Ministério Público deverá entrar com uma ação civil pública contra Ovídio, que também vai responder um processo criminal por trabalho escravo e posse ilegal de armas.
A reportagem entrou em contato com a advogada de Ovídio. Ela não quis dar declarações, mas afirmou que encaminhará à Repórter Brasil um depoimento escrito relatando a visão do empregador.

Por Beatriz Camargo - Repórter Brasil
Fonte: http://www.reporterbrasil.com.br/exibe.php?id=1073&name=A%E7%E3o-na-Ilha-de-Maraj%F3-acaba-com-escravid%E3o-de-20-anos