Dion Márcio Carvaló Monteiro*
Mário Jorge Brasil Xavier**
1 - POR UMA OUTRA PROPOSTA DE EDUCAÇÃO
Vive-se numa sociedade letrada, na qual a leitura e a escrita são elementos indispensáveis para o processo de socialização e comunicação humana. A leitura e a escrita, portanto, não devem ser reduzidas ao ato de decodificação das palavras em sílabas, das letras em sons, ou ainda ao ato mecânico da escrita, enquanto cópia, sem significado. Trata-se de um modo de ler e escrever com autonomia para interpretar, discutir e produzir textos com qualidades e características que favoreçam o entendimento e a comunicação tanto por parte de quem escreve, como por parte de quem lê.
No processo de alfabetização de jovens e adultos, esse ler e escrever com autonomia e qualidade, deve estar fundamentado na realidade do(a) educando(a), pois é dessa realidade que ele(a) extrai seus significados e constrói sua compreensão de mundo. Daí a necessidade do(a) educador(a) ter consciência e conhecimento dessa realidade. No dizer de Paulo Freire (1981), “a leitura do mundo precede a leitura da palavra”. Nesse sentido a alfabetização deve oferecer as condições para que o(a) alfabetizando(a) desenvolva a capacidade de ler criticamente a realidade, como um processo sistemático de ensino-aprendizagem, no qual o(a) educando(a), a partir da compreensão do mundo, possa intervir sobre ele, consciente da sua participação nas mudanças sociais.
A obra de Paulo Freire e, sua concepção da centralidade do conhecimento popular na educação de jovens e adultos, caracteriza-se como uma verdadeira antropologia da educação. Sem dúvida, as pedagogias inspiradas no pensamento freireano partem do conhecimento do sujeito, obtido tanto de suas experiências singulares quanto das suas vivências coletivas, no que diz respeito à vida, ao trabalho e às lutas sociais.
Desta forma e, partindo do entendimento da antropologia enquanto uma forma de conhecimento sobre a diversidade cultural, isto é, a busca de respostas para entender o que somos a partir do espelho fornecido pelo “outro”; uma maneira de se situar na fronteira de vários mundos sociais e culturais, abrindo janelas entre eles, através das quais se podem alargar nossas possibilidades de sentir, agir e refletir sobre o que, afinal de contas, nos tornam seres singulares, humanos, traça-se uma análise sobre o conhecimento enquanto um processo social entre conhecedores, tanto os(as) que são denominados(as) educadores(as) quanto os(as) educandos(as), em que estarão presentes relações sociais de troca, em sua maioria desiguais e certamente diferentes.
Observa-se que, a cultura deste outro, construída cotidianamente nestes processos de produção e reprodução social, não é constituída apenas de artefatos “exóticos” pela sua artesanalidade, mas de um conjunto de saberes codificados em ritos, mitos e outras formas de expressão, que precisam passar para as próximas gerações. Isto quer dizer que, mesmo numa comunidade rural “isolada”, os processos identitários não são uniformes e são compostos pela diferença. Comunidades rurais apresentam, entre si, formas diferenciadas de apropriação e reprodução do conhecimento e no processo escolar tradicional acabam anulando-se deste saber local, que tanto utilizam no cotidiano.
Na realidade atual do campo no Brasil, a divisão sexual do trabalho e a preservação do conhecimento ancestral por mulheres e/ou idosos(as) contrasta com um índice de analfabetismo total que beira a 80% nas faixas etárias acima de 50 anos. Ao mesmo tempo, cada vez mais, jovens agricultores(as) avançam, ainda que precariamente, no processo educativo, mas os conhecimentos adquiridos praticamente não contribuem com uma maior qualidade de vida de suas famílias no campo, pelo contrário, favorecem sua migração para as grandes cidades.
É preciso, pois, vislumbrar, que a educação tão negada a estas populações, tão subjugada enquanto projeto individual e coletivo está sendo resignificada através das educadoras e educadores comprometidos com uma educação popular do campo. Não mais um sonho distante ou uma dádiva, mas um direito, ao contrário de ser mais uma imposição de forasteiros iluminados, ser construída coletivamente, com a participação dos próprios educandos, deixando de ser algo para preencher um vazio, e tornando-se uma ação para revelar e confrontar o que se sabe na vida diária do(a) trabalhador(a) rural.
Neste sentido, é imprescindível construir uma concepção de alfabetização que seja uma iniciativa no sentido de colaborar para que os ditos não letrados tenham a oportunidade de adquirir as noções de leitura e escrita ou outro conhecimento, além daqueles que já possuem, apresentando um caminho a percorrer na direção do que aqui se entende ser desenvolvimento local.
Uma alfabetização cidadã deve levar em frente uma metodologia que tenha uma lógica, que pode ou não fazer parte de uma prática consciente do alfabetizando. O jeito de fazer, a prática utilizada, influenciará, sobremaneira, no resultado alcançado. É importante considerar na alfabetização de jovens e adultos que os mesmos são indivíduos, trabalhadores responsáveis pela sua própria existência; possuem idéias formadas sobre a realidade, e tem necessidades específicas a serem supridas.
2 – OS PRINCÍPIOS DO PROJETO ALFA-CIDADÃ
O Projeto Político Pedagógico do Alfabetização Cidadã na Transamazônica – ALFA-CIDADÃ sustenta-se em uma concepção de educação com parâmetros no paradigma da educação popular. Assim, todos os seus referenciais, inclusive seus princípios norteadores, são pautados por esta concepção. A seguir serão analisados sinteticamente e, na compreensão dos autores deste texto, cada um dos 05 (cinco) princípios que compõem este projeto sócio-educacional.
O primeiro princípio é o que se refere à Luta Social na Direção de um Outro Projeto de Sociedade. Aqui se compreende que a participação de homens e mulheres nos processos de construção e reivindicação social, através de suas entidades representativas ou como expressão comunitária espontânea, ajuda no desenvolvimento de uma nova concepção de sociedade, com novos valores.
Este processo de lutas coletivas certamente contribui com um incremento na formação social e educacional das pessoas envolvidas, levando conseqüentemente a uma leitura diferenciada da usual, principalmente no que se refere à compreensão das relações econômicas, sociais e políticas que se fazem presente na superestrutura, ou seja, grosso modo, na concepção ideológica vigente.
O segundo princípio é a Prática Social como Fio Condutor de Partida e Chegada. É este preceito, que se expressa, entre outras coisas, a partir das experiências de vida das pessoas, que vai ligar o processo de ensino aos resultados esperados, ou seja, a possibilidade de que seja feita uma leitura crítica da realidade social. Verifica-se que estas experiências de vida podem apresentar-se tanto no âmbito das relações pessoais, quanto no das relações profissionais, através do desenvolvimento de suas atividades de labor.
É importante implementar um processo de interação entre as ações pedagógicas e a historia de vida de cada trabalhador(a), tendo como elemento fundamental os momentos representativos experimentados pelos participantes destes processos educativos, sendo então, como afirmado anteriormente, a prática social realmente o principal elo entre a construção de práticas pedagógicas inovadoras, permanentemente diferenciadas, e uma possível transformação social.
O terceiro princípio se refere à Construção e Organização Coletiva do Conhecimento. A riqueza deste princípio está na compreensão da necessidade de apropriação, por todos, do conjunto de vivências acumuladas. A troca destas experiências contribui certamente no processo de construção coletiva do conhecimento, como expresso no enunciado deste preceito. Assim, os processos educacionais precisam disponibilizar momentos que propiciem este tipo de interação, entre todos os participantes.
É importante verificar que esta troca de experiências não significa desconsiderar, de forma nenhuma, a manutenção das diferenças e individualidades. Não sendo objetivo, portanto, a construção de uma única compreensão da realidade, devendo ser esta socializada e nunca inexoravelmente totalizada, ou seja, considerada como algo que, a partir das reflexões coletivas, deva ser vista como monolítica, fechada ou acabada e, não sujeita a dialética social.
O quarto preceito considera o Trabalho Como Princípio Educativo. Aqui se entende a vivência no “mundo do trabalho” como um dos principais elementos a ser considerado em um processo educativo diferenciado. Porém, torna-se necessário observar que este fator não está relacionado com o entendimento usual deste debate, ou seja, a educação como preparação para o mercado capitalista.
A compreensão das atuais relações sociais de trabalho, em suas particularidades, possibilita o debate, visualização e construção de saberes distintos, incluindo neste caso a elaboração de tecnologias que sejam mais adaptadas a uma concepção de manutenção da biodiversidade local, defendida. Assim, a utilização de exemplos educativos tendo como ponto de partida as atividades desenvolvidas no cotidiano da labuta, garante a elaboração de uma abordagem alternativa sobre a mesma.
O quinto e último princípio pauta-se no Respeito e Valorização a Pessoa e aos Seus Saberes. No processo educativo, os saberes populares e tradicionais devem ser considerados, pois, são fundamentais no desenvolvimento da compreensão e leitura do mundo em que os trabalhadores e trabalhadoras vivem. Assim, as atividades desenvolvidas em casa, na plantação, na colheita, na roça, no que se refere a cura a partir das ervas medicinais, a “leitura” do tempo, o conhecimento sobre os animais, tudo isso, deve ser utilizado e valorizado neste processo educativo.
O diálogo desse conhecimento com os saberes científicos e tecnológicos possibilitará uma ampliação da visão dos agricultores e agricultoras e, uma intervenção mais significativa desses sujeitos em suas realidades, buscando uma melhoria na qualidade de vida dos(as) trabalhadores(as), tanto do campo quanto da cidade, sempre inserindo as informações de uma maneira prática, devendo ser as mesmas facilmente identificadas no cotidiano comunitário.
Resgatando, verifica-se que a primeira parte deste artigo, publicado no número anterior desta revista, abordou sinteticamente o processo histórico de formação da região transamazônica e o surgimento da cidade de Pacajá, na região oeste do Pará. Esta segunda parte procurou delinear a concepção política do projeto ALFA-CIDADÃ. A terceira e última parte, a ser publicada no próximo número desta revista, explicitará os primeiros resultados verificados na referida cidade, a partir da implementação deste projeto.
BIBLIOGRAFIA
FREIRE, Paulo. Pedagogia da esperança: um reencontro com a pedagogia do oprimido. 6ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1999.
____. Pedagogia da indignação: cartas pedagógicas e outros escritos. São Paulo: UNESP, 2000.
____. Pedagogia do oprimido. 10ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981.
GIROUX, H. A. e SIMON, R. Cultura popular e pedagogia crítica: a vida cotidiana como base para o conhecimento curricular. In: MOREIRA, A. F. e SILVA, T. T. (org.). Currículo, Sociedade e Cultura. 3ª ed. São Paulo: Cortez, 1999.
MACEDO, R. S. A Etnopesquisa crítica e multireferencial nas ciências humanas e na educação. Salvador: EDUFBA, 2000.
* Economista, Mestrando em Planejamento do Desenvolvimento – PLADES/NAEA/UFPA e Professor da UNAMA. E-mail: dion@ufpa.br
** Cientista Social, Mestre em Antropologia – UFPA e Professor do UEPA. E-mail: mjbrasil@uol.com.br
Mário Jorge Brasil Xavier**
1 - POR UMA OUTRA PROPOSTA DE EDUCAÇÃO
Vive-se numa sociedade letrada, na qual a leitura e a escrita são elementos indispensáveis para o processo de socialização e comunicação humana. A leitura e a escrita, portanto, não devem ser reduzidas ao ato de decodificação das palavras em sílabas, das letras em sons, ou ainda ao ato mecânico da escrita, enquanto cópia, sem significado. Trata-se de um modo de ler e escrever com autonomia para interpretar, discutir e produzir textos com qualidades e características que favoreçam o entendimento e a comunicação tanto por parte de quem escreve, como por parte de quem lê.
No processo de alfabetização de jovens e adultos, esse ler e escrever com autonomia e qualidade, deve estar fundamentado na realidade do(a) educando(a), pois é dessa realidade que ele(a) extrai seus significados e constrói sua compreensão de mundo. Daí a necessidade do(a) educador(a) ter consciência e conhecimento dessa realidade. No dizer de Paulo Freire (1981), “a leitura do mundo precede a leitura da palavra”. Nesse sentido a alfabetização deve oferecer as condições para que o(a) alfabetizando(a) desenvolva a capacidade de ler criticamente a realidade, como um processo sistemático de ensino-aprendizagem, no qual o(a) educando(a), a partir da compreensão do mundo, possa intervir sobre ele, consciente da sua participação nas mudanças sociais.
A obra de Paulo Freire e, sua concepção da centralidade do conhecimento popular na educação de jovens e adultos, caracteriza-se como uma verdadeira antropologia da educação. Sem dúvida, as pedagogias inspiradas no pensamento freireano partem do conhecimento do sujeito, obtido tanto de suas experiências singulares quanto das suas vivências coletivas, no que diz respeito à vida, ao trabalho e às lutas sociais.
Desta forma e, partindo do entendimento da antropologia enquanto uma forma de conhecimento sobre a diversidade cultural, isto é, a busca de respostas para entender o que somos a partir do espelho fornecido pelo “outro”; uma maneira de se situar na fronteira de vários mundos sociais e culturais, abrindo janelas entre eles, através das quais se podem alargar nossas possibilidades de sentir, agir e refletir sobre o que, afinal de contas, nos tornam seres singulares, humanos, traça-se uma análise sobre o conhecimento enquanto um processo social entre conhecedores, tanto os(as) que são denominados(as) educadores(as) quanto os(as) educandos(as), em que estarão presentes relações sociais de troca, em sua maioria desiguais e certamente diferentes.
Observa-se que, a cultura deste outro, construída cotidianamente nestes processos de produção e reprodução social, não é constituída apenas de artefatos “exóticos” pela sua artesanalidade, mas de um conjunto de saberes codificados em ritos, mitos e outras formas de expressão, que precisam passar para as próximas gerações. Isto quer dizer que, mesmo numa comunidade rural “isolada”, os processos identitários não são uniformes e são compostos pela diferença. Comunidades rurais apresentam, entre si, formas diferenciadas de apropriação e reprodução do conhecimento e no processo escolar tradicional acabam anulando-se deste saber local, que tanto utilizam no cotidiano.
Na realidade atual do campo no Brasil, a divisão sexual do trabalho e a preservação do conhecimento ancestral por mulheres e/ou idosos(as) contrasta com um índice de analfabetismo total que beira a 80% nas faixas etárias acima de 50 anos. Ao mesmo tempo, cada vez mais, jovens agricultores(as) avançam, ainda que precariamente, no processo educativo, mas os conhecimentos adquiridos praticamente não contribuem com uma maior qualidade de vida de suas famílias no campo, pelo contrário, favorecem sua migração para as grandes cidades.
É preciso, pois, vislumbrar, que a educação tão negada a estas populações, tão subjugada enquanto projeto individual e coletivo está sendo resignificada através das educadoras e educadores comprometidos com uma educação popular do campo. Não mais um sonho distante ou uma dádiva, mas um direito, ao contrário de ser mais uma imposição de forasteiros iluminados, ser construída coletivamente, com a participação dos próprios educandos, deixando de ser algo para preencher um vazio, e tornando-se uma ação para revelar e confrontar o que se sabe na vida diária do(a) trabalhador(a) rural.
Neste sentido, é imprescindível construir uma concepção de alfabetização que seja uma iniciativa no sentido de colaborar para que os ditos não letrados tenham a oportunidade de adquirir as noções de leitura e escrita ou outro conhecimento, além daqueles que já possuem, apresentando um caminho a percorrer na direção do que aqui se entende ser desenvolvimento local.
Uma alfabetização cidadã deve levar em frente uma metodologia que tenha uma lógica, que pode ou não fazer parte de uma prática consciente do alfabetizando. O jeito de fazer, a prática utilizada, influenciará, sobremaneira, no resultado alcançado. É importante considerar na alfabetização de jovens e adultos que os mesmos são indivíduos, trabalhadores responsáveis pela sua própria existência; possuem idéias formadas sobre a realidade, e tem necessidades específicas a serem supridas.
2 – OS PRINCÍPIOS DO PROJETO ALFA-CIDADÃ
O Projeto Político Pedagógico do Alfabetização Cidadã na Transamazônica – ALFA-CIDADÃ sustenta-se em uma concepção de educação com parâmetros no paradigma da educação popular. Assim, todos os seus referenciais, inclusive seus princípios norteadores, são pautados por esta concepção. A seguir serão analisados sinteticamente e, na compreensão dos autores deste texto, cada um dos 05 (cinco) princípios que compõem este projeto sócio-educacional.
O primeiro princípio é o que se refere à Luta Social na Direção de um Outro Projeto de Sociedade. Aqui se compreende que a participação de homens e mulheres nos processos de construção e reivindicação social, através de suas entidades representativas ou como expressão comunitária espontânea, ajuda no desenvolvimento de uma nova concepção de sociedade, com novos valores.
Este processo de lutas coletivas certamente contribui com um incremento na formação social e educacional das pessoas envolvidas, levando conseqüentemente a uma leitura diferenciada da usual, principalmente no que se refere à compreensão das relações econômicas, sociais e políticas que se fazem presente na superestrutura, ou seja, grosso modo, na concepção ideológica vigente.
O segundo princípio é a Prática Social como Fio Condutor de Partida e Chegada. É este preceito, que se expressa, entre outras coisas, a partir das experiências de vida das pessoas, que vai ligar o processo de ensino aos resultados esperados, ou seja, a possibilidade de que seja feita uma leitura crítica da realidade social. Verifica-se que estas experiências de vida podem apresentar-se tanto no âmbito das relações pessoais, quanto no das relações profissionais, através do desenvolvimento de suas atividades de labor.
É importante implementar um processo de interação entre as ações pedagógicas e a historia de vida de cada trabalhador(a), tendo como elemento fundamental os momentos representativos experimentados pelos participantes destes processos educativos, sendo então, como afirmado anteriormente, a prática social realmente o principal elo entre a construção de práticas pedagógicas inovadoras, permanentemente diferenciadas, e uma possível transformação social.
O terceiro princípio se refere à Construção e Organização Coletiva do Conhecimento. A riqueza deste princípio está na compreensão da necessidade de apropriação, por todos, do conjunto de vivências acumuladas. A troca destas experiências contribui certamente no processo de construção coletiva do conhecimento, como expresso no enunciado deste preceito. Assim, os processos educacionais precisam disponibilizar momentos que propiciem este tipo de interação, entre todos os participantes.
É importante verificar que esta troca de experiências não significa desconsiderar, de forma nenhuma, a manutenção das diferenças e individualidades. Não sendo objetivo, portanto, a construção de uma única compreensão da realidade, devendo ser esta socializada e nunca inexoravelmente totalizada, ou seja, considerada como algo que, a partir das reflexões coletivas, deva ser vista como monolítica, fechada ou acabada e, não sujeita a dialética social.
O quarto preceito considera o Trabalho Como Princípio Educativo. Aqui se entende a vivência no “mundo do trabalho” como um dos principais elementos a ser considerado em um processo educativo diferenciado. Porém, torna-se necessário observar que este fator não está relacionado com o entendimento usual deste debate, ou seja, a educação como preparação para o mercado capitalista.
A compreensão das atuais relações sociais de trabalho, em suas particularidades, possibilita o debate, visualização e construção de saberes distintos, incluindo neste caso a elaboração de tecnologias que sejam mais adaptadas a uma concepção de manutenção da biodiversidade local, defendida. Assim, a utilização de exemplos educativos tendo como ponto de partida as atividades desenvolvidas no cotidiano da labuta, garante a elaboração de uma abordagem alternativa sobre a mesma.
O quinto e último princípio pauta-se no Respeito e Valorização a Pessoa e aos Seus Saberes. No processo educativo, os saberes populares e tradicionais devem ser considerados, pois, são fundamentais no desenvolvimento da compreensão e leitura do mundo em que os trabalhadores e trabalhadoras vivem. Assim, as atividades desenvolvidas em casa, na plantação, na colheita, na roça, no que se refere a cura a partir das ervas medicinais, a “leitura” do tempo, o conhecimento sobre os animais, tudo isso, deve ser utilizado e valorizado neste processo educativo.
O diálogo desse conhecimento com os saberes científicos e tecnológicos possibilitará uma ampliação da visão dos agricultores e agricultoras e, uma intervenção mais significativa desses sujeitos em suas realidades, buscando uma melhoria na qualidade de vida dos(as) trabalhadores(as), tanto do campo quanto da cidade, sempre inserindo as informações de uma maneira prática, devendo ser as mesmas facilmente identificadas no cotidiano comunitário.
Resgatando, verifica-se que a primeira parte deste artigo, publicado no número anterior desta revista, abordou sinteticamente o processo histórico de formação da região transamazônica e o surgimento da cidade de Pacajá, na região oeste do Pará. Esta segunda parte procurou delinear a concepção política do projeto ALFA-CIDADÃ. A terceira e última parte, a ser publicada no próximo número desta revista, explicitará os primeiros resultados verificados na referida cidade, a partir da implementação deste projeto.
BIBLIOGRAFIA
FREIRE, Paulo. Pedagogia da esperança: um reencontro com a pedagogia do oprimido. 6ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1999.
____. Pedagogia da indignação: cartas pedagógicas e outros escritos. São Paulo: UNESP, 2000.
____. Pedagogia do oprimido. 10ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981.
GIROUX, H. A. e SIMON, R. Cultura popular e pedagogia crítica: a vida cotidiana como base para o conhecimento curricular. In: MOREIRA, A. F. e SILVA, T. T. (org.). Currículo, Sociedade e Cultura. 3ª ed. São Paulo: Cortez, 1999.
MACEDO, R. S. A Etnopesquisa crítica e multireferencial nas ciências humanas e na educação. Salvador: EDUFBA, 2000.
* Economista, Mestrando em Planejamento do Desenvolvimento – PLADES/NAEA/UFPA e Professor da UNAMA. E-mail: dion@ufpa.br
** Cientista Social, Mestre em Antropologia – UFPA e Professor do UEPA. E-mail: mjbrasil@uol.com.br