30 março 2007

O debate campesino na Amazônia

Na Amazônia, o camponês é todo aquele que se relaciona com a água, a terra e a floresta: o indígena, a comunidade ribeirinha, os pescadores, quilombolas e outros. Aqui na Amazônia, toda e qualquer luta que se fizer vai adquirir um caráter anti-imperialista, pois é necessário colocar para a sociedade uma outra pauta política e econômica, pensando a luta para além das organizações próprias de cada movimento.
Para tanto é necessário ter uma unidade de análise e de ação, de modo a permitir que toda a luta produza os efeitos esperados para o nosso povo, acumulando forças para um projeto de sociedade que queremos. Para enfrentar esses desafios e fortalecer a organicidade da luta, se realizou entre de 03 de fevereiro aos dias 06 de março de 2007, no Centro de Formação Mártires de março, no bairro de São Félix em Marabá/PA a formação da 1ª turma de militantes da VIA CAMPESINA – Pará.
Em um espaço ainda por ser construído encontraram-se, pela primeira vez, indígenas das etnias Tembé (NE/PA) e Arapium (Santarém), pescadores, pequenos agricultores, Sem-Terra, jovens do Campo e da cidade e de outros segmentos ameaçados pelos projetos exógenos à região, para debater e aprofundar questões sobre o Estado, a Amazônia, organização política e trabalho de base.
O curso de militantes destinou-se a jovens a partir de 15 anos, o que resultou no entrelaçamento das idéias de luta em favor de uma nova Amazônia. É certo que houve no início um certo estranhamento, natural quando povos tão diversos que defendem seus territórios se encontram e passam a conviver em um mesmo espaço. Mas a exuberância da juventude logo pôs por terra todas as barreiras. E pode-se, então, ver esses povos da Amazônia, vindos de diversas partes do Pará e até do Tocantins, aplicando suas energias aos estudos para a compreensão dos mecanismos da sociedade e como se constituiu a desigualdade em nosso país.
Para trabalhar essa questão foi convidado Claudemir Monteiro, Cientista Social e coordenador do CIMI Regional Norte II. O tema trabalhado sugeriu uma reflexão por parte de todos: O que é a Sociedade? De forma simples, foi possível apresentar as diversas explicações de como funcionam as sociedades humanas.
O Estado e sua constituição também foram estudados, o seu funcionamento, sua estrutura e o peso que significa para a sociedade. Contamos para isso com Raimundinho, do Movimento Consulta Popular em Marabá.
Daí, passamos a estudar a Amazônia, sua constituição histórica e geográfica, focalizando no tema dos grandes projetos despejados sobre a região a partir da década de 1950. Fomos assessorados por Neide Coelho do instituto AMAS [Amazônia Solidária e Sustentável].
O esforço dos estudos continuou com a assessoria de Ulisses Manaças e Charles Trocatte, ambos do MST, que apresentaram a história das lutas dos trabalhadores no mundo e a teoria da organização política.
A notícia do atentado contra a vida do cacique Dadá , coordenador do CITA, deixou tristes e preocupados os indígenas e a todos os demais militantes do curso. Por questão de segurança, receberam orientação para que permanecerem no curso e tiveram notícias que felizmente o cacique já estava de volta a sua aldeia.
Prosseguimos com a apresentação das diversas formas de organização política, das organizações e movimentos que compõem a VIA CAMPESINA no Pará e as demais entidades convidadas. MST, MPA, MAB, MMC, CPT, CIMI, CPP, CRB, PJR, Cáritas e ainda GCI, CITA, UJCC, FDA.
A organização da VIA CAMPESINA, sua estrutura e como está espalhada no mundo foi apresentada por Galego, da CPT nacional.
Um dos dias de lazer da turma foi aproveitado pelos indígenas para visitar os parentes que moram próximo a Marabá. Foram até a aldeia dos índios Guarani em Jacundá, e foram recebidos por Regina Guarani, liderança do povo. Foram convidados a dormir na aldeia, o que não puderam fazer devido ao compromisso com o curso.
A lição apreendida nesses dias de convivência foi consolidada com a assessoria de Ranulfo Peloso, do CEPIS, que orientou os militantes no trabalho de base. Ainda tivemos nesta semana oficinas de comunicação, pintura indígena, Capoeira, confecção artesanal de redes de pesca, teatro do oprimido.
Já na última semana do curso, a turma passou a denominar-se Amâncio dos Santos Silva, uma forma de homenagear o primeiro a tombar no massacre da curva do S em Eldorado dos Carajás, no Pará, no ano de 1996. Deste modo, a 1ª turma de militantes da VIA CAMPESINA, Amâncio dos Santos Silva, encerrou esta etapa do curso e os jovens militantes seguiram rumo a Belém para montar o acampamento das mulheres, uma jornada de quatro dias de debates e discussões promovido por movimentos sociais da cidade e do campo durante a semana .

Luiz Cláudio (CIMI Norte II)
Fonte: http://www.cimi.org.br/?system=news&action=read&id=2399&eid=142

Ambientalistas pedem que bancos impeçam danos da Petrobras em reserva da Unesco, no Equador

Cientistas e ambientalistas de treze países enviaram para dez grandes bancos internacionais, incluindo o BNDES, um dossiê sobre os riscos do projeto da Petrobrás para extração de petróleo no chamado Bloco 31, que compreende áreas chave do Parque Nacional de Yasuní, componente importante do sistema de parques nacionais do Equador. O parque, que é uma área de importância biológica e científica única, está inserido no conjunto de Reservas da Biosfera da Unesco e é adjacente a territórios, decretados intocáveis, onde populações indígenas vivem em isolamento voluntário.
Em programa de rádio nacional em 3 de fevereiro, o presidente equatoriano Rafael Correa afirmou que o governo suspenderia os contratos com as companhias petrolíferas que causassem danos desnecessários ao meio ambiente. Entretanto, o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) do atual projeto da Petrobrás, viola requisitos básicos de boa conduta aceitos internacionalmente, bem como os Princípios do Equador - um compromisso dos principais bancos privados internacionais e companhias de investimentos de não financiar grandes projetos em países em desenvolvimento, quando eles não alcançarem padrões ambientais e sociais básicos da Corporação Financeira Internacional (IFC, na sigla em inglês) do Banco Mundial.
Dois bancos brasileiros, ambos estatais, estão com certeza envolvidos na polêmica operação. Trata-se do BNDES e da Caixa Econômica Federal, ambos detentores de importantes blocos, tanto de ações ordinárias quanto preferenciais, da Petrobras. Quatro bancos signatários dos Princípios do Equador (Bradesco, Citigroup, BBVA e HSBC) também estão envolvidos, mesmo que indiretamente, e correm um forte risco apesar de não necessariamente terem tomado conhecimento do projeto. É este o caso também de outros bancos que integram a Petrobras Participações, ou que realizaram cartas de crédito para Petrobras Energia (subsidiária argentina da Petrobras e principal financiadora do projeto do Bloco 31) ou que ainda emitiram obrigações da Petrobras International Finance Company (PIFCo).
Uma aliança internacional de 43 cientistas do Equador, América do Norte e Europa propôs, ano passado, várias alternativas plausíveis que mitigariam muitos desses riscos e impactos. De especial preocupação é o reconhecimento explícito no EIA de que existe um provável e substancial risco de que as comunidades indígenas Kawymeno e Kichwa, afetadas pelo projeto, promoverão protestos que podem levar à violência e a paralisações do trabalho. Há também o risco de que as plantas de processamento que serão construídas próximo ao Rio Tiputini, na fronteira do nordeste do parque, possam ser atingidas por um vazamento de petróleo catastrófico.
A continuidade do projeto, sem a incorporação das alternativas propostas, terá expressivos impactos ambientais e sociais, diretos e secundários, levando provavelmente a profundas mudanças culturais entre as populações indígenas da região. Especificamente, os impactos ambientais incluem desmatamento, caça predatória e poluição. Qualquer contaminação ou poluição será particularmente devastadora para o Rio Tiputini, abrigo para mamíferos raros, como a globalmente ameaçada Lontra Gigante (Pteronura brasiliensis), os globalmente vulneráveis (e, no Equador, criticamente ameaçados) Peixe-Boi Amazônico (Trichechus inunguis) e Boto Rosa (Inia geoffrensis), e o Boto Cinza (Sotalia fluviatilis), que também está ameaçado no Equador.
O projeto também aumentará as pressões nas comunidades indígenas que vivem em isolamento voluntário em áreas adjacentes ao Bloco 31. O contato forçado e a dependência da sociedade podem levar a novos ciclos agudos de guerras tribais, internas e externas, com danos irreparáveis para esses povos.

Fonte: http://www.amazonia.org.br/noticias/noticia.cfm?id=239235

29 março 2007

Internauta é denunciado por preconceito contra índios no Pará

O Ministério Público Federal (MPF) no Pará ajuizou nesta quarta-feira (28) uma denúncia na Justiça Federal do estado contra o portuário Reinaldo Almeida dos Santos Júnior, de Belém, pela prática e disseminação de preconceito contra indígenas. As manifestações racistas foram feitas pela internet, na página virtual de relacionamentos Orkut.
De acordo com ação do procurador regional da República José Augusto Torres Potiguar, entre dezembro de 2004 e janeiro de 2005, por diversas vezes Santos Júnior defendeu o extermínio de povos indígenas. As mensagens foram publicadas na comunidade "Índios... eu consigo viver sem", do Orkut. "Deveríamos matar todos e passar a estudar a sua história", escreveu o internauta. Em 17 de março do ano passado, a comunidade contava com 69 integrantes.
A representação contra a página da internet foi feita ao MPF em 2004 pelo então membro do conselho indigenista da Fundação Nacional do Índio (Funai), Noel Villas Bôas. A Procuradoria da República em São Paulo investigou informações dos perfis dos integrantes da comunidade virtual e conseguiu, na Justiça Federal, a quebra do sigilo de dados do site de fotos pessoais (fotolog) do internauta.
"Esta denúncia faz parte de uma série de investigações feitas em conjunto pelas polícias e Ministérios Públicos estaduais e federal, com o intuito de frear o notório avanço de diversas comunidades nazistas, anti-semitas, antiindigenistas e todos os outros tipos de congregações que preguem a inferiorização arbitrária de qualquer grupo social através do estigma de raça inferior, criminosa ou qualquer outro tipo de adjetivo de cunho eminentemente pejorativo", diz o procurador na ação.
"Com o advento das novas tecnologias, essas comunidades encontraram na internet uma forma eficaz de espalhar o ódio e fomentar a violência", ressalta Potiguar. Caso a Justiça aceite a denúncia, o acusado será convocado para depoimento pode ser processado. O crime de racismo contra indígenas prevê multa e pena de dois a cinco anos de reclusão. Os demais componentes da comunidade continuam sob investigação.
As informações são do MPF.

Da Redação - Carta Maior
Fonte: http://cartamaior.uol.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=13804

25 março 2007

Documentário aborda trabalho escravo e conflitos de terra no Pará

"Nas Terras do Bem-Virá", que estréia segunda-feira (26[março/07]) no festival É Tudo Verdade, mostra através de depoimentos e histórias de vida a situação de afronta aos direitos humanos e à floresta amazônica paraense.

O Pará é o campeão brasileiro em trabalho escravo: só em 2006, fiscalizações do governo federal libertaram no estado 1.180 trabalhadores da escravidão - desde 1995, quando elas começaram, foram 8.177 libertações ali: 36,5% do total.
O estado também está em primeiro lugar nos rankings de desmatamento ilegal e de conflitos de terra - segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e a Comissão Pastoral da Terra (CPT), respectivamente. Estes dados ganham vida e mostram relações estreitas no longa-metragem "Nas Terras do Bem-Virá", que estréia no festival É Tudo Verdade na segunda-feira (26) em São Paulo (SP), e no dia 28 no Rio de Janeiro (RJ). Histórias de peões, imagens de arquivo, depoimentos de autoridades e pessoas de movimentos sociais que atuam na região costuram a teia de conflitos e desrespeito ao meio-ambiente e aos direitos humanos no estado.
Segundo documentário do diretor Alexandre Rampazzo e da produtora Tatiana Polastri, o filme acompanha alguns trabalhadores desde as suas saídas de casa, em cidades pobres do Nordeste, até a chegada ao Pará, invariavelmente esperançosos com as promessas do "gato" (aliciador de mão-de-obra a serviço do fazendeiro). Outros peões são retratados pelas câmeras de Alexandre no momento em que uma ação dos grupos móveis de fiscalização chega para libertá-los - e então demonstram toda a decepção de quem descobriu que a empreita nas carvoarias ou fazendas não era nada do que lhes foi prometido.
O filme também se preocupa em demonstrar que a situação atual do Pará remonta à ditadura militar, tempo de uma campanha pelo desenvolvimento da Amazônia - "terra sem homens para homens sem-terra" - que promoveu a migração e a concentração fundiária a despeito de uma defesa do meio-ambiente e das populações mais pobres. E sugere o quanto os peões de hoje tendem a cair ciclicamente na rede da escravidão, enquanto uma mudança estrutural na divisão das terras e no modelo excludente de agronegócio não acontece.
O diretor revela um mecanismo comum que desencadeia conflitos de terra: muitos peões, cansados de ter patrão, entram na luta para conquistar seu próprio chão e viver dignamente, ou, outros, posseiros, índios e ribeirinhos que viram suas casas varridas por grileiros virar pasto, começam a brigar para reconquistar a base de seu sustento. Um dos mais famosos desses confrontos, o Massacre de Eldorado dos Carajás, de 1996, é revisitado, em imagens e depoimentos.
"Nas Terras..." chega também a Anapu, no norte do Pará, onde a freira Dorothy Stang foi assassinada em 2004 a mando de fazendeiros locais. "Quando vemos na televisão o caso da Dorothy, de Eldorado dos Carajás ou de uma fiscalização, eles parecem fatos isolados. E nós juntamos tudo para mostrar que estão relacionados", comenta a produtora Tatiana. O filme termina ressaltando a importância dos que dão a vida pelas causas da floresta e de seu povo, indo contra interesses de grandes latifundiários e poderosos regionais: "mais de 100 pessoas estão ameaçadas de morte hoje no Pará. Dez delas aparecem no filme", diz o letreiro branco em fundo preto ao final da exibição.

Pesquisa e intenções
A pesquisa que gerou o filme começou em 2004, depois de um seminário do frei Xavier Plassat - coordenador nacional de trabalho escravo da CPT. Em agosto de 2005, a equipe ficou quase quatro meses no Pará, contabilizando mais de 150 horas de filmagem. Além disso, utilizaram imagens de arquivo, de Eldorado dos Carajás, da irmã Dorothy e até de propagandas da época da ditadura.
A dupla Alexandre e Tatiana leva pela segunda vez uma produção conjunta ao É Tudo Verdade. O documentário produzido anteriormente, Ato de Fé, sobre o envolvimento dos dominicanos na luta armada durante a ditadura militar, foi exibido no festival em 2005. Quanto à Nas terras..., ainda não há previsão de entrada em circuito comercial.
Tatiana defende que o longa-metragem, narrativo e didático, pode atingir trabalhadores da região e contribuir para a erradicação da escravidão de hoje. "Mas o filme é também para as pessoas que estão em São Paulo, no Rio ou na Europa, que nunca pararam para pensar que elas também contribuem para essa situação comprando produtos com mão-de-obra escrava. A gente sempre quer o mais barato, não importando de onde veio a mercadoria", ressalta.

Ficha Técnica
Nas terras do Bem-Virá
Documentário, Brasil, 2007.
Duração: 110 minutos
Direção: Alexandre Rampazzo

Produção: Tatiana Polastri

Por Beatriz Camargo – Repórter Brasil
Fonte: http://www.reporterbrasil.org.br/exibe.php?id=960

Foto: Reproduzida da fonte acima observada (Fiscalizações do trabalho do governo federal já libertaram 8.177 peões da escravidão no Pará).

Archimedes, Consulta e outras nostalgias

Grande parte de sua vida, mais de 40 anos, meu pai Valdemarzinho catou e cortou castanha nas terras de Pedro Marinho de Oliveira. Enquanto Don’Ana lavava roupas no Itacayunas, Valdemarzinho remava sua canoa Tocantins acima e ia embora: entrava pelas sinuosas curvas do Tauaryzinho até desfazer-se por longos meses nas matas do castanhal Consulta. Solitário e corajoso, meu pai gostava mesmo era de trabalhar e estar só naquelas matas de tempos verdes e duendes.
Em 1974, já adulto, e meu pai mesmo idoso ainda escarafunchando a mata, fui de penta, nos primeiros meses do ano, época de cheias, conhecer a colocação. Só de ida a viagem, que seria de seis a oito horas, durou dia e meio. Celso “Pato” Brasil, Seu Rico e aquele monstruoso par de óculos escuros Fittipaldi, Zezé Rosa, seu Edésio, Tunico Braga, Ademir Martins, o piloto Diodésio, eu e outros que me fogem à memória (mas juro que Nego Quinca estava lá!), bebemos neste escasso período uma caixa, um engradado, duas sacas de sarrapilheira atulhadas de garrafas cheias até o gogó e mais alguns litros avulsos de cachaça enquanto navegávamos numa algazarra de espantar as jaçanãs.
Tauaryzinho acima, quase em frente à morada de Mané Pifeiro o motor empacou. Anoitecia e tivemos de aportar na ribanceira porque era impossível continuar escuro a dentro, entre galhos que desciam de bubuia ou avançavam ameaçadores das margens estreitas do igarapé. Aparecera alguma encrenca no Archimedes, máquina sueca maravilhosa que desde os tempos épicos empurrava barcos carregados de castanha, e surpreendeu-me a coincidência: fomos dar prego bem em frente à casa do maior festeiro das redondezas. E prego dos bons, justo no martelete do cabeçote de ignição, o que forçou seu Edésio a vir de cavalo, no meio da noite, buscar peça nova em Marabá.
O defeito era pura invenção! Diodésio armara a coisa para a gente passar a noite em casa do Mané Pifeiro, longe dos olhos de camiranga de seu Edésio, homem sério e da confiança do patrão.
Armadas as redes, barriga cheia de frito, garrafa de cachaça ao alcance da mão, naquela noite até gato voou. Um monte de carvão ocupava praticamente metade do barracão de Pifeiro, onde as redes foram atadas à luz de uma poronga. Já meio bicados, contávamos piadas deitados e ríamos por qualquer coisa quando começaram a voar e a cair enormes pedaços de carvão sobre nossas cabeças. Penso ainda hoje que foi Tunico Braga quem iniciou os arremessos. Em resposta, planou para todos os lados uma revoada de chinelos, precatas, congas, e no meio de tanto granizo um gato caiu dentro da rede e em cima do peito de Celso Brasil. Qual dos dois uivou mais assustado dentro da noite não se sabe.
Nem bem apeou da montaria, seu Edésio soube de tudo por Mané Pifeiro, o linguarudo. A cabroeira, o magote de porre, não tinha princípios cristãos nem de cidadania, disse ele. Esparramaram meu carvão de encomenda, o barracão está imundo e ainda rebolaram meu gato de estimação, onde já se viu?! Aquilo não era mesmo proceder de gente, admitiu seu Edésio, fôlego ainda célere da cavalgada noturna. Tinha a voz pausada e macia, de pelica, mas as lapadas da língua queimavam como umbigo-de-boi. E já que era para jogar rebolo, ia sapecar n’água aquela sandália que acabara de acertar-lhe o ouvido. “A sandália é minha, mestre, mas não fui eu que joguei. Até me acertaram um gato e não sei o que vou dizer em casa quando a mulher me ver todo arranhado no peito”, reclamou Celso Brasil. E o Tunico Braga ali, na bucha: “Diz que foi o gato e ela te mata!” Até seu Edésio riu do jogo de palavras.
Levantamos cedo e jogamos Zezé Rosa dentro d’água. Como ele não sabia nadar, amarramos o manilhão do barco por baixo de seus braços e ele veio algum tempo a reboque, a ressaca de molho.
O castanhal Consulta ficava logo após a curva do rio. Uma prainha de areias brancas, uma ponta de terra com alguma grama, o barracão meio cheio de castanha e o ressôo da mata virgem por detrás. Pulamos na água fria, cor de ouriço, e comemos galinha caipira. O arroz era muito alvo na panela de ferro, e em torno da mesa de madeira dividimos alguns goles com o cozinheiro. Da mata vinha o cheiro de seivas, folhagens e por trás do canto das aves um enorme silêncio. O sol estalava sobre as folhas do verde oceânico. Encontrei meu pai e ficamos ali, juntos, terremotos de silenciosa ternura a desmantelar o coração – sempre foi assim.
Desde então a Consulta me é uma referência mágica, tal qual os extintos garimpos de diamante do Tocantins, abaixo do Itupiranga – Bagagem, Piranheira, Sumaúma, Urubuzinho – onde a saudade em correnteza levou-me certo dia em busca do meu pai também naqueles anos 70, quando ele, Zé Garimpeiro, Pedro Cascalho e outros septuagenários levaram sua nostalgia em viagem de despedida às corredeiras e seus diamantes que seriam afogados para sempre sob a represa. Se o castanhal era parte da vida do meu pai, a outra parte aflorava entre pedrais, ternos de peneira, farrachos, guriatãs e córregos por onde subiam levas de matrinchãs.
Tantos anos depois e me vem esta vontade de tornar à Consulta, hoje um povoado de camponeses. Tudo porque dia desses encontrei no terminal rodoviário do km-6 o Elvan do Vale (Sadôba), que me apresentou Siliveste, daquela comunidade. Eles então me falaram que na Consulta são já moradores antigos (e me deu vontade de ir conhecê-los) o João Magro, o Chico Galinha, Rofé, Xará, Emoge, Conceição Castanheira, Maria Buchéca, Raimundo Bulacha, Maria Godóia, Antônio Neite “Mosquito”, e um artista da voz chamado Gabilanha. Tudo gente da mais fina estirpe. Como meu pai. (16nov06)

Ademir Braz é jornalista e advogado militante em Marabá, sudeste do Pará, BR
Fonte: http://quaradouro.blogspot.com/search?updated-max=2007-03-23T17%3A25%3A00-07%3A00&max-results=7

24 março 2007

Maior área grilada no país será desapropriada

A Justiça Federal do Pará determinou que a empresa Incenxil (Indústria, Comércio, Exportação e Navegação do Xingu Ltda) terá que se retirar de uma área de aproximadamente 5 milhões de hectares na região da Terra do Meio, centro do Estado. A decisão foi tomada a pedido do Ministério Público Federal que considera que a fazenda Curuá foi apropriada indevidamente, ou seja, foi grilada. O Incra apontou que a propriedade é a maior área grilada já encontrada no país e equivale à soma dos territórios de Bélgica e Holanda. A procuradoria da República em Altamira, Pará, denuncia, ainda, que a área da fazenda incide sobre unidades de conservação do Governo Federal e sobre terras indígenas e, de acordo com o Ministério Público Federal, há também extração ilegal de madeira pela empresa.

Fonte: http://www.cptnac.com.br/?system=news&action=read&id=1811&eid=8

Tribunal da Terra - memória de sangue

A década de 1980 é considerada a mais violenta na região na tríplice fronteira do Pará, Maranhão e norte de Goiás, hoje o estado do Tocantins. Os anos registram várias chacinas e execução de dirigentes sindicais camponeses e seus aliados, e mesmo de família, como no caso dos Canuto de Rio Maria. O Tribunal da Terra, uma instância de caráter simbólico, surgiu a partir de tal demanda. A iniciativa foi da Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SPDDH), e contou com o apoio da CPT, OAB, MMCC, CNBB, CUT e CEDENPA. Ocorreu em Belém, entre os dias 18 e 19 de abril de 1986, no Palácio da Justiça. Teve como objetivo levantar denúncias contra multinacionais, Estado e o latifúndio. O advogado e deputado federal/PT/SP, Luiz Eduardo Greenhalgh, o cutista Jair Menegheli, Pe. Josimo Tavares, Avelino Ganzer e o advogado José Carlos Castro constavam como representação da sociedade civil. O Pe. Ricardo Rezende trabalhou como advogado de acusação. As chacinas Surubim e Ubá constavam no rol de casos, que somou 83 mortes no ano de 1985, na região. Registrou-se ainda o assassinado do sindicalista Benedito Bandeira, no município de Tomé Açu, onde a comunidade revoltada com a execução destruiu a delegacia e matou os três pistoleiros, que receberam CR$ 5.000,00 do fazendeiro Acrino Breda, que nunca chegou a ser preso pelo caso. A área em disputa era a fazenda Colatina. A execução da missionária Adelaide Molinari e do sindicalista Arnaldo Deocídio também foram pontuadas. O Pe Josimo que coordenou a CPT de Imperatriz, Maranhão, morto no dia 10 de maio de 1986, participou do Tribunal para denunciar o atentado que sofrera. Um mês depois foi executado com tiros dados pelas costas. A sentença decidiu: que o Estado deveria ser controlado pelos operários; já as multinacionais seriam nacionalizadas, sendo controladas pelo Estado; e o latifúndio deveria acabar, sendo as terras distribuídas de forma igualitárias para os trabalhadores rurais. O advogado José Carlos Castro, assim avaliou o Tribunal: “Esse Tribunal é um Tribunal porque não pode ser considerado apenas uma informação, porque tem uma expressão política muito forte para a consciência do povo, para a divulgação do que ocorre no campo. É um material de propaganda de novas idéias” (Jornal Resistência, Ano VIII, Nº 71, abril-maio de 1986).

Rogério Almeida é colaborador da rede www.forumcarajas.org.br
Correio eletrônico: araguaia_tocantins@hotmail.com

21 março 2007

Distrito florestal de Carajás

Ainda que o número não chegue nem perto dos que seguem Nossa Senhora de Nazaré em outubro, em Belém, os que tentam compreender o modelo de ocupação da Amazônia estão carecas e barrigudos de saber que a equação é cruel. Um saque. Em que se capitalizam as riquezas e se socializam os mais variados passivos sociais e ambientais. Numa linguagem mais accessível, miséria.
Desde os militares a promessa de arrancar a fórceps a região das “trevas” ilumina discursos e slogans. Na derradeira semana de fevereiro uma exuberante fauna de atores deu o pontapé inicial no debate sobre uma perspectiva de ocupação de parte do território degradado nas terras dos Carajás, que compreende Maranhão, Pará e o Tocantins. Lá no Bico do Papagaio. Uma terra amansada no cano do trinta e oito, público e privado.
Além de representações do governo federal e estadual, predominou a presença dos agentes envolvidos na cadeia da siderurgia: produtores de carvão, dirigentes do setor siderúrgico e a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD). Ainda que em minoria, uns pingados felinos do movimento social estiveram no debate.
A sugestão da saída da situação medieval imposta sob a régua e compasso dos grandes projetos na região, onde um dos vetores de propulsão tem sido a siderurgia, é a efetivação de um distrito florestal. Na proposta da CVRD, a homogeneização de plantio de árvores exóticas (eucalipto) é a redenção para colorir a aquarela de destruição ambiental e degradação humana. A fala do diretor da CVRD é como se a companhia não tivesse colaborado com os tons sombrios da paisagem.
O setor que ajudou a impulsionar a economia norte americana no século XIX, a siderurgia, surgida lá no século VII, cimentou uma cadeia produtiva do crime organizado do trabalho escravo nas terras dos Carajás no século XX. Uma das chagas da ocupação marcada pelo autoritarismo e o patrimonialismo. Vertente que concentrou terra e renda. Um fruto do enlace do Estado com o capital privado nacional e internacional.
No complexo tapete que conforma a região de Carajás, inúmeras redes econômicas, sociais e culturais esgrimam na disputa de definição do uso dos recursos naturais e do território. Uma possibilidade para se observar a proposta do distrito pode ser por tal viés.
No atual xadrez da região os projetos de assentamento rural predominam com pouco mais de cinqüenta por cento. Há ainda terras indígenas e reservas ambientais e minerais. Seguido por latifúndios com mais de dez mil hectares, que ocupam trinta e poucos por cento.
É justo com o setor que a CVRD deseja fazer par. Ainda que o coração da companhia pulse pela responsabilidade social. Assim, a principio, caso se efetive tal ângulo, teríamos a legitimação de extensas áreas improdutivas. O representante da companhia proclamou que uma floresta de eucalipto já existe no Maranhão.
Só não informou que a mesma resultou de um projeto que visava a produção de papel celulose. E que por conta de sinal negativo do parceiro estrangeiro não vingou. Nem mesmo pontuou que a exótica floresta subjugou sem dó ou piedade o cerrado maranhense, que ainda padece com a monocultura da soja e os fornos “rabo quente” das carvoarias.
Outros projetos com a mesma envergadura, ou maior ainda, espocam dos computadores de última geração das grandes companhias nacionais e internacionais. Uma estrutura logística que aperta o cerco contra camponeses, indígenas, e outras modalidades de populações tradicionais da região.
A exemplo do transporte multi-modal, hidrovias, ferrovias, rodovias, das monoculturas e hidrelétricas. Se a minha muscular miopia não me trai, o mesmo filme já esteve em cartaz décadas atrás, onde se lia Programa Grande Carajás (PGC). A diferença talvez resida na nova geopolítica, no papel do Estado e no recente estágio do capitalismo, em uma outra modalidade de divisão internacional do trabalho.
E mesmo no mapa social da região que, a contragosto de muitos, registra ainda a presença de camponeses, indígenas, pescadores e extrativistas. Como que se exclamassem: a coisa pode ser diferente. Ói nós aqui. Feito bambu, que verga, mas não quebra.

Rogério Almeida é colaborador da rede www.forumcarajas.org.br
Correio eletrônico: araguaia_tocantins@hotmail.com

08 março 2007

Homenagem do Instituto AMAS as mulheres da Amazônia

Foto: http://www.mst.org.br/mst/especiais.php?ed=36

Mulheres Camponesas na Luta por Soberania Alimentar, contra o Agronegócio

Todo o ano é assim. Chega o 8 de Março e se multiplicam as manifestações pelo Dia Internacional da Mulher. No campo dos movimentos sociais sempre são atos de luta ou protesto. É que não há coisas a comemorar. O que se faz, então, é refletir sobre a realidade feminina, sempre tão relegada num mundo dominado pela lógica patriarcal (espaço do macho provedor). Um segmento que não foge a esse compromisso é o das mulheres camponesas. Elas sempre fizeram suas lutas específicas, como agricultoras e como mulheres, mas nunca deixaram que o particularismo do gênero ou da categoria apagasse a luta maior, que é a da classe trabalhadora e da comunidade das vítimas do sistema-mundo consubstanciado no modo de produção capitalista. Por isso, todo 8 de Março elas botam a cara na rua, a dizer ao mundo: existimos, estamos em luta e queremos nosso espaço de liberdade.
Não é sem razão que este ano a discussão do 8 de Março levantada pelo Movimento de Mulheres Camponesas está visceralmente articulada com a Campanha Nacional pela Produção de Alimentos Saudáveis, que ganha contornos mundiais a partir da Via Campesina (movimento de articulação dos movimentos camponeses de todo o planeta). Porque comida sadia significa cuidado com a vida e com a natureza. E, sendo assim, inclui, na mesma luta, toda a vida que vive.
Essa capacidade de articular o singular (sua condição específica) com o universal (toda a gente) é o que torna o Movimento das Mulheres Camponesas uma referência no que diz respeito às lutas no Brasil. Desde há 24 anos que mulheres agricultoras de todos os cantos do país iniciaram uma caminhada rumo a conquistas até então impensáveis como o reconhecimento profissional e direitos trabalhistas, entre eles o salário-maternidade e a aposentadoria. Nesta batalha por questões pontuais, as mulheres foram se reconhecendo como força, capaz de provocar outras mudanças, muito mais profundas.
Hoje já estão organizadas em 19 dos 26 estados brasileiros e realizaram seu primeiro congresso nacional em 2004, articulando a pluralidade das mulheres, respeitando as diferenças e unificando o movimento sob uma única bandeira. Desde então, quilombolas, indígenas, ribeirinhas, quebradeiras de coco, agricultoras familiares, pescadoras artesanais, enfim, todo o universo das mulheres cultivadoras, caminham juntas para transformar a sociedade, em busca de um mundo justo e de riquezas repartidas. E fazem isso sem nunca esquecer sua condição feminina, que muito mais enriquece a arena das lutas.
Pois neste oito de março de 2007, as mulheres ligadas ao MMC estão em luta pela alimentação saudável. E isso não quer dizer apenas que elas tenham em sua pauta de reivindicações a afirmação do Projeto de Agricultura Camponesa, construído em comunhão, nestes anos todos de caminhada. Junto com a idéia de reforma agrária, uma agricultura de auto-sustento, que respeita a terra, que busca formas alternativas de energia, que valoriza o trabalho coletivo e o respeito entre os seres que vivem, as mulheres do campo querem discutir a soberania alimentar, as relações sociais, as relações de poder que dão primazia do controle da vida ao homem, o domínio do agro-negócio que expulsa o camponês e só tem olhos para o mercado exportador, a violência contra a natureza, a falta de uma reforma agrária. Ou seja, trazem dentro do seu caldeirão de esperanças, uma diversidade de temas polêmicos totalmente ligados a vida de cada ser neste país e neste mundo.
Ao trazer para a luz a discussão de uma alimentação saudável, as mulheres do campo querem entrar na cidade e sentar à mesa com as mulheres urbanas. Pois é, afinal, na mesa, que se consagra o milagre da fome saciada. É ali que se depositam os produtos cultivados por homens e mulheres nos fundões da terra, gente que nunca é percebida por quem come o que está na mesa transformado em comida, mas que, se não existisse, quanta falta faria. As mulheres camponesas querem olhar nos olhos das mulheres urbanas, tocar-lhes as mãos, abraçar-las, rir com elas. Chorar, quem sabe. Compartilhar a vida. Fazer-se conhecer. Estabelecer uma relação de amor. Para que todas saibam que umas não vivem sem as outras. Que todas fazem parte de um grande e infinito cordão alimentar. A que produz e a que dá de comer.
É por isso que a proposta deste dia da mulher vai mais longe que um protesto ou um ato público. Ela é comunhão! As mulheres do campo chegarão às capitais de todos os estados e se sentarão à mesa com as famílias urbanas. Dormirão nas suas casas, viverão um dia de partilha. E, para que o mundo trema: contarão segredos umas às outras. Segredos de força, de união, de encontros, de mudanças, de possibilidades, tal qual nos antigos tempos em torno da fogueira ancestral. Depois, nascerão os frutos que virão em forma de luta conjunta, não só pela comida saudável, mas por uma outra sociedade, em que a mulher será igual em poder e direitos. Por um mundo em que o mercado não seja a medida de todas as coisas e que a ciência possa ser aproveitada para o bem de todos e não só de alguns. Um mundo em que as pessoas cuidem do planeta. Mas não com o discurso ideológico do chamado desenvolvimento sustentável. Que esse cuidado vingue em forma de uma nova sociedade, com outros valores, outras medidas.
Em Santa Catarina mais de 500 mulheres camponesas entrarão na capital com suas mochilas, sacos de dormir e sementes. Elas virão para um encontro único, com mulheres trabalhadoras de vários bairros da periferia de Florianópolis. Vão fazer debates, conversas e atos públicos. Chegam no dia sete e parte no dia nove. Elas ainda nem sabem, mas também levarão sementes. Sementes das lutas cotidianas das mulheres da cidade que não plantam a comida de todos, mas que, com suas mãos, guerreiras e ágeis, abrem caminhos para esse novo amanhã tão sonhado. As mulheres do campo entrarão na cidade... E as mulheres urbanas estarão esperando, braços abertos. Depois, talvez, nada mais seja como antes!

Elaine Tavares é jornalista no OLA
Fonte: http://www.mst.org.br/mst/pagina.php?cd=2954

06 março 2007

Agricultores ocupam agência do Basa

Cerca de 100 integrantes da Federação dos Trabalhadores da Agricultura Familiar (Fetraf), sediada em Redenção, sul do Pará, ocupam desde a manhã de ontem a agência do Banco da Amazônia (Basa), instalada no município. A ocupação é pacífica e eles querem a liberação de mais de R$ 10 milhões provenientes do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf).
De acordo com o coordenador da Fetraf, Pedro Alcântara, a decisão de ocupar a agência bancária foi tomada após uma assembléia realizada entre as mais de 40 associações que formam a federação dos agricultores no sul do Pará. Segundo ele, atualmente existem mais de 600 projetos apresentados pela federação para que o Basa faça a liberação do dinheiro oriundo do Pronaf, e que há mais de sete meses não é liberado por conta da burocracia por parte do banco. “Nós vamos a Belém, eles falam que o problema é aqui, viemos para cá, eles dizem que o problema é em Belém. Então nós resolvemos fazer essa ocupação”, disse Alcântara.
Os trabalhadores rurais exigem a presença dos representantes do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e do Banco da Amazônia, para que só então eles possam negociar as reivindicações feitas pelos agricultores. “A nossa presença aqui é por tempo indeterminado”, frisou Alcântara, acrescentando que faz parte das reivindicações um melhor atendimento por parte da agência do Basa em Redenção.
Segundo Pedro Alcântara, o mau atendimento na agência do Basa em Redenção é evidente. Faltam analistas na agência, o que segundo ele tem contribuído para o acúmulo de processos de agricultores requerendo os recursos do Pronaf. Além disso, Alcântara vai pedir também a substituição do gerente da agência local.
PRECONCEITO
Ainda de acordo com o sindicalista, mais de R$ 10 milhões estão disponíveis na agência do Basa, mas que não são liberados porque o banco se nega a examinar os processos. Ele diz que isso se trata de preconceito para com os pequenos agricultores. “Enquanto grandes fazendeiros são beneficiados com esses recursos, nós ficamos a mercê dessa burocracia”, protesta Pedro.
Uma comissão formada por representantes do MDA e Basa vinda de Belém está sendo aguardada pelos agricultores. Enquanto isso, a agência permanece ocupada e todos os atendimentos bancários continuam suspensos. Por conta disso, muita gente protestou por não poderem entrar na agência. Eles estão sendo impedidos pelos trabalhadores rurais. Essa é a segunda vez que a agência do Basa em Redenção é tomada pelos agricultores.

Paulo Carrion – Jornal Diário do Pará
Fonte: http://www.diariodopara.com.br/Regional/Re_03.asp

04 março 2007

E a Amazônia continua campeã em homicídios

Ontem foi divulgado estudo da Organização dos Estados [Ibero] Americanos (OEI), que anualmente compila dados sobre mortes violentas no país com base nos registros de óbitos do Ministério da Saúde. Quem pesquisa a área de violência no Brasil sabe que as informações do Datasus são das mais confiáveis.
Onde estão os municípios com o maior número de homicídios? Dos dez primeiros, cinco ficam na região conhecida como o "Arco do desflorestamento" - onde a Amazônia perde terreno para os empreendimentos agropecuários. Colniza (1º), com 165,3 mortes por 100 mil habitantes entre 2002 e 2004, Juruena (2º), com 137,8, São José do Xingu (5º), com 109,6, Aripuanã (8º), 98,2 - todos no norte do Mato Grosso - e Tailândia (7º), com 104,9, no Pará. Para efeito de comparação, os municípios do Rio de Janeiro e de São Paulo estão na 107º e 182º colocações, com uma taxa de homicídios por 100 mil habitantes de 57,2 e 48,2, respectivamente.
O mapa da violência divulgado mostra que há uma concentração de homicídios nesse arco que vai de Rondônia até o Pará e Maranhão também se for considerada a região e não o município.
O estudo vem a se somar aos dados já existentes que apontam que há uma relação entre a expansão agrícola na Amazônia com assassinatos rurais, desmatamento e trabalho escravo. Estudo publicado pela Organização Internacional do Trabalho no ano passado já havia apontado a ocorrência dessa relação tripla com base em dados da Comissão Pastoral da Terra, Ministério do Trabalho e Emprego e Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. Na época, o município campeão em área desmatada, São Félix do Xingu (PA), também era o primeiro em número de ações de libertação de trabalhadores escravos. A região da fronteira agrícola leste do Pará possui 12 municípios entre os 150 com maiores índices de homicídios.
As discussões que começam a ser feitas após a publicação do estudo colocam a responsabilidade por isso na impunidade e na ausência do Estado na região. Na verdade, o problema é mais embaixo. Passa pela forma agressiva e predatória através da qual o capital ocupa a região, sem se preocupar com as conseqüências para o meio ambiente, para a vida das populações residentes no local e dos trabalhadores rurais que servem de mão-de-obra para esse avanço. Esse capital derruba o que estiver no seu caminho, sejam árvores ou pessoas.
O prefeito de Colniza, Adir Ferreira (sem partido), em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo afirmou: "Aqui há crime organizado, que age na grilagem de terras (...) Matam para extrair madeira".
No Norte do Mato Grosso, cresce a presença da soja e da pecuária bovina. Mais à leste, temos incidência de cana-se-açúcar. No Pará Oriental e Maranhão, aumentam as áreas destinadas à pecuária, à soja e à produção de carvão vegetal para as siderúrgicas do Pólo Carajás. O Estado está presente sim nessas regiões para grandes produtores, grandes grileiros, grandes industriais, estimulando através de crédito e favorecendo a produção através de políticas agrícolas para o latifúndio que gera "desenvolvimento" e saldos na balança comercial. Que faz do Brasil o país das commodities. E ausente ao restante da população. É um Estado que atua, portanto, como um restaurante "self-service", que escolhe o que lhe agrada e deixa na bandeja, às moscas, o que não.
As mesmas respostas aos problemas continuam a serem ouvidas: aumentar policiamento, condenar os criminosos, endurecer a legislação penal. Considerando que há um grande número de policiais na Amazônia que atuam também como jagunços em fazendas (são muitas as histórias dos que, nas horas vagas, caçam escravos fujões), isso seria um favor aos fazendeiros. Considerando que parte desses criminosos possui assento ou representação política em câmaras municiais, assembléias e no Congresso Nacional condená-los seria muito difícil e fazer com que aprovassem leis que atuem nas causas do problema, ou seja, dêem um tiro nos seus próprios pés, seria um sonho distante.
Agora, ver do Estado ações efetivas e não cosméticas que apontem mudanças no modelo de desenvolvimento para a região amazônica já seria considerado um verdadeiro milagre.

Leonardo Sakamoto – Repórter Brasil
Fonte: http://www.reporterbrasil.com.br/box.php?id_box=217

03 março 2007

Mulher, terra e água

O que faz a camponesa quando perde o encanto pela terra?
O tolo sobre o telhado segue a água a vazar a terra.
Já o bobo espia a água a atravessar o vão das pedras, acertar sementes.
No vão dos dias cantiga de lavadeiras do Tocantins-Araguaia.

Na fresta das noites ladainhas velam filhos e parceiros tombados.
Faz muito tempo não mutirão.
Dias de calor água mata a sede.
Dias de fome água na comida pra multidão.
Banho de chuva não amansa coração.
Nem indignação.

Rosas não falam. Melhor assim.
A gritar no silêncio. Fortes. Belas.
Vermelhas como a vida.

A agasalhar: companheiros, crias, amantes, namorados,
amigos, irmãos, irmãs, mães e pais.
Gigantes. Como o poder da água.
Canto de Iemanjá e Iara.
Terra que um dia nos acolherá em definitivo.

Rogério Almeida é jornalista, escritor, poeta, amazônida e colaborador da rede
www.forumcarajas.org.br
Correio eletrônico:
araguaia_tocantins@hotmail.com

01 março 2007

Depois de 20 anos, um dos acusados do assassinato de Josimo será ouvido

Acusado de participar do conluio para assassinar padre Josimo Morais Tavares, o juiz aposentado e procurador do município de Araguaína, João Batista de Castro Neto, será interrogado no próximo dia 2 de março, sexta-feira, a partir das 14 horas, no Fórum de Justiça de Araguaína, Tocantins (Rua Ademar Vicente Ferreira, nº 1.255, Centro, na sala de audiência da Vara de Precatórias), sob presidência do juiz Edson Paulo Lins.
A 1ª Promotoria Criminal de Imperatriz, Maranhão, apresentou denúncia que aponta João Batista de Castro Neto e os fazendeiros José Elvécio Vilarino e Pedro Vilarino Ferreira como mandantes do crime. Consta ainda que os três acusados, juntamente com Osmar Teodoro da Silva e Geraldo Paulo Vieira, reuniram-se várias vezes na residência deste último para acertarem os detalhes da encomenda da morte de Josimo. A partir desta denúncia, o juiz da 1ª Vara Criminal de Imperatriz, onde foi instaurada ação penal em abril de 2006, expediu Carta Precatória para o interrogatório do acusado.
O crime: Padre Josimo Morais Tavares foi assassinado no dia 10 de maio de 1986 por Geraldo Rodrigues da Costa, enquanto subia as escadas do prédio onde funcionava a sede da Comissão Pastoral da Terra, CPT. Josimo era coordenador da CPT na região do Bico do Papagaio e ajudava na luta contra a grilagem e em defesa dos trabalhadores rurais. Na época, o crime teve grande repercussão nacional e internacional, pois Josimo havia solicitado providências às autoridades federais quando sofreu atentado em 15 de abril de 1986.
Ação Judicial: Este novo processo é resultado da reabertura do inquérito em conseqüência das declarações feitas no ano 2000 por um dos réus (Guiomar Teodoro da Silva), já condenado pelo mesmo crime. Para o promotor denunciante, Dr. Arnoldo Jorge de Castro Ferreira, os depoimentos do inquérito policial demonstram que o juiz aposentado e os dois fazendeiros organizaram-se com outros acusados para assassinar o padre em virtude de sua atuação como coordenador da Pastoral da Terra na região. Na época, João Batista de Castro Neto era juiz de Direito em Araguaína, então norte de Goiás. Ainda, conforme os autos do inquérito, as armas usadas no atentado praticado contra Padre Josimo no dia 15 de abril de 1986 e no assassinato no dia 10 de maio foram fornecidas pelos 3 últimos acusados.

A situação dos demais envolvidos
Geraldo Rodrigues da Costa – executor do crime. Situação: condenado a 18 anos e seis meses de prisão. Fugiu várias vezes da penitenciária de Goiânia e conforme noticiado foi morto ao fugir de uma perseguição policial.
Vilson Nunes Cardoso – co-participe (motorista que levou o executor até o local do crime). Situação: Foragido desde a data do crime.
Osmar Teodoro da Silva – mandante. Situação: condenado a 19 anos de prisão e encontra-se cumprindo pena.
Geraldo Paulo Vieira – mandante. Situação: condenado a 18 anos de prisão. Morreu poucos meses após iniciar o cumprimento da sentença.
Adailson Vieira – mandante. Situação: condenado a 18 anos de prisão. Cumpriu parte da pena e obteve progressão de regime, estando hoje em liberdade.
Guiomar Teodoro da Silva – mandante. Situação: condenado a 14 anos de prisão. Cumpriu parte da pena e obteve progressão de regime, estando hoje em liberdade.
Nazaré Teodoro da Silva e Osvaldino Teodoro da Silva - mandantes. Situação: Julgados e absolvidos pelo Tribunal do Júri. Sentença reformada pelo Tribunal de Justiça do Maranhão. Aguardando designação de um novo júri.
O acompanhamento dos processos vem sendo feito por advogados de São Paulo e do Tocantins, contratados pela CPT e Federação dos Trabalhadores da Agricultura do Estado do Tocantins (FETAET).

Informações
Comissão Pastoral da Terra Araguaia -Tocantins: Edmundo e Trindade (63) 3412.3200 ou 9214.8965 e Sávio Barbalho, advogado (63) 3351.3742 - 8402.9993.

Fonte: http://www.cptnac.com.br/?system=news&action=read&id=1756&eid=8