30 outubro 2007

Sete arrozeiros permanecem na reserva indígena Raposa Serra do Sol

Dois anos depois que o presidente Lula assinou um decreto homologando as terras da reserva Raposa Serra do Sol, no estado de Roraima, reconhecendo-a como de posse dos mais de 16 mil indígenas que vivem na região, aproximadamente sete arrozeiros ainda não desocuparam o local. No decreto, são garantidos aos índios mais de 1,7 milhões de hectares. Ele foi assinado em abril de 2005 e questionado na justiça pelos arrozeiros, que tiveram outra derrota no Supremo Tribunal Federal (STF) em junho deste ano.
Dionito José Souza, coordenador geral do Conselho Indígena de Roraima, afirma ter cobrado várias vezes da polícia e do governo a retirada dos produtores de arroz. Além disto, ele aponta os problemas de violência que estão se intensificando pela persistência dos arrozeiros e a morosidade do poder público.
A polícia alega que ainda não recebeu nenhuma ordem para efetuar a retirada. O exército já admitiu que pode participar desta ação. Os arrozeiros ocuparam esta área na reserva na década de 90 quando ela já era identificada como indígena. O ministro da Justiça, Tarso Genro, admitiu nesta segunda-feira (29) que a desocupação será rigorosa, mas também não estipulou em que prazo ela será feita.

Gisele Barbieri, da Radioagênica NP
Fonte: http://www.radioagencianp.com.br/index.php?option=com_content&task=view&id=3243&Itemid=1

27 outubro 2007

Desmatamento volta a crescer na Amazônia

Cinqüenta e nove por cento no Pará, mais de 84% no Mato Grosso, inacreditáveis 602% em Rondônia. Não dá mais para contestar: após três anos sucessivos de queda, o ritmo do desmatamento da Amazônia brasileira voltou a crescer no segundo semestre de 2007. Fatores econômicos objetivos, como o aumento da demanda e dos preços da soja no mercado internacional e o início da construção das usinas hidrelétricas do Rio Madeira, e até mesmo subjetividades políticas, como o início das negociações visando às eleições municipais, são os motores da retomada do desmatamento, que já é admitida pelo governo federal.
De acordo com os dados divulgados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), baseados em imagens de satélite obtidas pelo sistema de Detecção de Desmatamento em Tempo Real (Deter), a área total devastada na Amazônia entre junho e setembro deste ano foi 8% maior do que no mesmo período em 2006. No entanto, se levado em conta somente o mês de setembro, o aumento da devastação é, segundo as informações do Deter, de significativos 107%. De posse dessas informações, o governo afirmou que pretende rever o Plano de Combate ao Desmatamento de modo a intensificar o número de operações nos três estados mais problemáticos.
O caso mais espantoso é o de Rondônia que, nos últimos doze meses, teve um aumento do desmatamento de 602% em comparação ao período anterior, passando de 42 km² de área devastada em setembro de 2006 para 295 km² em setembro deste ano. De acordo com as imagens do Inpe e os relatórios produzidos pelo Ibama [Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis], o desmatamento no estado se concentra em uma região que começa na capital, Porto Velho, e passa pelos municípios de Jaciparaná, Nova Mamoré, Guajará-Mirim e Costa Marques, ao longo da fronteira com a Bolívia.
Além dessas cidades, segundo o Ibama, a grilagem de terras em Rondônia teve um aumento considerável nos últimos meses nas áreas conhecidas como Nova Dimensão, União Bandeirantes, Taquara e Pau D’arco. Técnicos do Ibama e militantes do movimento socioambientalista creditam o enorme aumento do desmatamento no estado à proximidade do início da construção das usinas hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio, no Rio Madeira. Outro fator que permitiu esse aumento, segundo os críticos, foi o afrouxamento no licenciamento e na fiscalização ambientais desde que a responsabilidade por ambos saiu da esfera do governo federal e passou para o governo de Rondônia.
Em Mato Grosso, o aumento do preço da soja já se faz sentir na carne da floresta, que viu o desmatamento crescer 84% nos últimos doze meses, em comparação ao período anterior. Alguns dos municípios campeões da devastação - Alta Floresta, Nova Bandeirante, Novo Mundo e Apiacás, entre outros - estão situados no chamado Portal da Amazônia, na fronteira norte do estado. Outros, como São Félix do Araguaia e Colniza, ficam logo ao lado. As áreas desmatadas recentemente, no entanto, não servirão diretamente ao plantio de soja, sendo transformadas, a princípio, em meras pastagens. É a segunda etapa do perverso trinômio madeira-gado-soja que destrói a Amazônia.
O Pará teve um aumento de 59% do desmatamento nos últimos doze meses, em comparação ao período anterior. O mais preocupante na situação paraense, de acordo com as imagens coletadas pelo Inpe, é que o desmatamento recrudesceu sobretudo na chamada Terra do Meio e ao longo da BR-163 (Cuiabá-Santarém), duas áreas consideradas historicamente vulneráveis, e também dentro das Unidades de Conservação. Tudo indica que a agressão às UCs está se intensificando, pois cerca de 25% da devastação ocorrida no Pará nos últimos três meses se deu em áreas teoricamente protegidas.

“Desmatamento Escandaloso”
O aumento do desmatamento parece pegar de surpresa alguns setores do governo. Em visita à Rondônia na semana passada, o ministro Nélson Jobim (Defesa), após percorrer e sobrevoar regiões de fronteira com a Bolívia ao lado dos comandantes do 6º Batalhão de Infantaria de Selva, classificou de “escandaloso” o desmatamento que viu com os próprios olhos: “Eu achava que era exagero da mídia, mas não imaginava ver o que vi. Há um completo desconhecimento no resto do país sobre o que está acontecendo em Rondônia”, disse.
De volta à Brasília, Jobim anunciou que vai elaborar um relatório sobre o que viu na Amazônia. O documento trará uma série de sugestões que, promete, serão entregues pessoalmente à colega Marina Silva (Meio Ambiente) e ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva: “O Estado tem de ocupar o seu espaço para eliminar o vazio de poder que existe na Amazônia”, avalia o ministro, que pretende contar com a ajuda das Forças Armadas.
A ministra Marina Silva, por sua vez, afirmou que nos próximos dias irá discutir medidas adicionais de combate ao desmatamento com Lula e Jobim, e também com os ministros Dilma Rousseff (Casa Civil), Tarso Genro (Justiça) e Guilherme Cassel (Desenvolvimento Agrário): “Com o aquecimento da economia e as eleições municipais, a Amazônia enfrentará dois testes de fogo em 2008”, disse, sem esconder sua preocupação.

Maurício Thuswohl – Carta Maior
Fonte: http://www.agenciacartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=14688&boletim_id=372&componente_id=6959

24 outubro 2007

O Sistema de ensino e a educação popular, uma experiência possível

O Brasil, ao longo de seu desenvolvimento histórico, sempre apresentou no seu processo educativo um modelo voltado para a manutenção de uma estrutura autoritária, delimitada sob os marcos do capitalismo, onde a educação assumiu o papel de atender a uma demanda mercadológica, na qual o saber escolar determina a acessibilidade aos espaços produtivos da lógica capitalista.
Portanto, é sintomático que a educação popular tenha desempenhado um papel relevante nas iniciativas não formais no processo de valorização, qualificação e efetivação de ações educacionais, sobretudo a partir da década de 70 do século XX.
Entretanto, o debate sobre o processo educativo no Brasil requer uma reflexão sobre a importância do papel do professor na formação de sujeitos críticos e reflexivos dentro do seu trabalho como educador. O trabalho de formação deve ser desenvolvido a partir da análise e da reflexão do formador quanto a sua atuação, uma relação constante entre a teoria e a prática. A educação popular, portanto pode ser pensada como campo fértil para o desenvolvimento de uma ação democrática libertadora, envolvendo uma opção política com base na luta pela cidadania, expressando um processo educativo permanente e cotidiano.
Giroux (1997) [1], ao analisar o sistema de ensino destaca o papel do professor no processo de formação e da necessidade deste de se integrar ao processo de produção do conhecimento como intelectual que não se limita a executar as demandas tecnocráticas, mas que intervenha no sistema de ensino a partir de sua produção intelectual de forma que venha a contribuir com sua análise e participação no processo de escolarização.
É partindo dessa visão que se busca uma formação de professores compatível com as necessidades específicas de cada contexto social em que está inserido esse profissional, considerando as diversidades regionais e locais. Desta perspectiva partiu o trabalho de formação de educadores desenvolvido pelo Instituto Amazônia Solidária e Sustentável, experiência ocorrida no período de 2005 e 2006, no município de Gurupá-PA.
O Instituto AMAS realizou um trabalho de formação continuada em Gurupá-PA, com ênfase na concepção freireana, acreditando na educação como um dos instrumentos para transformação social. Este Instituto, em parceria com a Secretaria Municipal de Educação de Gurupá, participou do “Projeto EJA - Oficinas de formação continuada para professores e professoras da EJA”, daquele município.
O objetivo proposto pelo Instituto, para o projeto, foi o de possibilitar a formação continuada de professores e professoras da EJA (Educação de Jovens e Adultos), na perspectiva de construir uma base teórica, “a fim de desencadear uma reflexão crítica e propositiva a cerca do fazer pedagógico, visando a construção de uma proposta educacional pública, popular e libertadora” [2], tendo como eixos temáticos: Organização social e participação popular; Educação ambiental: uma perspectiva interdisciplinar; Educação popular na concepção Freireana; Educação popular e economia solidária; Legislação da educação de jovens e adultos; Língua Portuguesa e Artes.
As atividades foram desenvolvidas através de discussões e debates; atividades em pequenos grupos; palestras interativas e laboratório pedagógico. Houve também trabalho de campo que incluiu pesquisa e elaboração de texto sobre as temáticas trabalhadas.
As oficinas ministradas pelo Instituto AMAS contribuíram com a atuação dos professores no processo de planejamento e elaboração do sistema municipal de educação ocorrido naquele município posteriormente às oficinas de formação. Um outro ponto importante a ressaltar é o nível de politização existente entre aqueles professores(as), os quais buscaram, por meio da organização e da reivindicação, garantir meios de qualificar a sua atuação profissional e melhorar as suas condições de trabalho. Isto se configura no processo de organização do sistema de ensino daquele município, cujos professores(as) desempenham um papel fundamental com a sua participação nos debates e elaboração das políticas. Ainda que estas possivelmente não venham a atender todas as suas demandas, efetivamente.

[1] GIROUX, Henry. Os professores como intelectuais: rumo a uma pedagogia crítica da aprendizagem. Porto Alegre: Artes médicas. 1997. Trad. Daniel Bueno.
[2] AMAS, Instituto. Relatório Geral – Projeto EJA. 2006, p.4.

Elen Pessôa é Economista, especialista em Desenvolvimento de Áreas Amazônicas, mestranda em Planejamento do Desenvolvimento-NAEA/UFPa. É associada do Instituto Amazônia Solidária e Sustentável (AMAS). elenpessoa@yahoo.com.br

Ivaneide C. Santos é Geógrafa, especialista em Educação, Cultura e Organização Social - Centro de Educação/UFPa. É associada do Instituto Amazônia Solidária e Sustentável (AMAS). neidecoelho@yahoo.com.br

OBS: Esta é uma versão reduzida do artigo original. Para receber a versão completa, em PDF, envie mensagem para institutoamas@yahoo.com.br

Comissão do Senado paralisa atividade e marca reunião com Lupi

Integrantes da comissão externa do Senado Federal que analisa a operação que libertou 1.064 trabalhadores rurais de situação análoga à de escravidão na fazenda de cana-de-açúcar Pagrisa, em Ulianópolis (PA), decidiram suspender a coleta de depoimentos de envolvidos - paralisada em 2 de outubro - e marcaram uma audiência com o ministro do Trabalho e Emprego, Carlos Lupi.
Seis dos 11 senadores da comissão deliberaram, em encontro informal ocorrido na última quarta-feira (17), que uma comitiva formada por quatro representantes - Flexa Ribeiro (PSDB-PA), Cícero Lucena (PSDB-PB), José Nery (PSol-PA) e Paulo Paim (PT-RS) - se reunirá com o ministro na próxima terça-feira (23) à tarde para tentar dar um desfecho ao assunto.
Adiada por várias vezes nas duas últimas semanas, a sessão que retomaria os depoimentos do auditor fiscal Humberto Célio Pereira e do procurador Luiz Antônio Fernandes, integrantes do grupo móvel de fiscalização que esteve em junho na Pagrisa, e dos diretores executivo, adjunto e presidente da empresa autuada, Murilo, Fernão e Marcos Villela Zancaner, respectivamente, não será mais convocada pela comissão externa. Requerimentos convidando outras pessoas que trabalham com o tema também haviam sido aprovados, mas não devem ser cumpridos pela instância parlamentar.
Presidente da comissão externa, o senador Jarbas Vasconcelos (PSDB-PE) foi procurado pela Repórter Brasil para comentar a suspensão dos trabalhos, mas preferiu não se pronunciar. A pressão provocada pela visita de senadores da comissão externa à Pagrisa, quase três meses depois da fiscalização do grupo móvel, fez com que a Secretaria de Inspeção de Trabalho (SIT) do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), com base na alegação de risco e de insegurança para o trabalho dos fiscais e procuradores, suspendesse temporariamente as operações do grupo móvel. Houve reação dos senadores que estiveram na Pagrisa e condenação da interferência por parte de entidades da sociedade civil.
Em conseqüência disso, o ministro Carlos Lupi chegou a divulgar o relatório de inspeção da fazenda. Foram colhidos os depoimentos iniciais dos principais envolvidos e parlamentares contrários à intervenção dos senadores aproveitaram para se rearticular em torno da necessidade de aprovação da PEC 438/2001, que prevê o confisco de terra onde a prática do trabalho escravo for constatada. Depois de firmar um termo de cooperação técnica com a Advocacia-Geral da União (AGU), o MTE restabeleceu normalmente as operações do grupo móvel na última segunda-feira (15).
"Os membros da comissão chegaram a conclusão que não há razão para continuar com os trabalhos", declara José Nery. "Montou-se uma parafernália sobre um assunto que estava sendo encaminhado normalmente pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Os fiscais têm que fiscalizar e a empresa tem que melhorar as suas condições e voltar a produzir", opina Paulo Paim, outro articulador da audiência com Carlos Lupi. "O ministro é a autoridade maior neste tema", completa o senador petista, ressaltando que o objetivo da audiência da próxima semana é dar um encaminhamento final ao imbróglio.
Segundo senadores que participaram da reunião, os membros da comissão externa devem levar - a pedido de Kátia Abreu (DEM-TO) e de Flexa Ribeiro (PSDB-PA), principais propositores da criação da comissão externa - pelo menos três demandas para a audiência com o ministro do Trabalho e Emprego: um pedido para que a empresa fosse excluída da "lista suja" do trabalho escravo, uma consulta sobre a possibilidade de assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o Ministério Público do Trabalho (MPT) estabelecendo metas e prazos para que a empresa sane os problemas constatados pelo grupo móvel e uma sugestão para que uma nova fiscalização do governo federal verifique depois as condições de trabalho na propriedade.
A Pagrisa, contudo, ainda não faz parte da "lista suja" de empregadores que passaram por um processo administrativo depois de ter explorado trabalho escravo. E o MTE não tem a prerrogativa nem para firmar um TAC para a "correção" dos crimes praticados pela empresa e não pode atender pedidos específicos de novas fiscalizações para casos como o da Pagrisa. Uma nova averiguação pode ocorrer com base em novas denúncias ou como acompanhamento das empresas relacionadas na "lista suja", cadastro em que a Pagrisa não foi sequer incluída, pois o procedimento administrativo referente à empresa (que garante a defesa plena dos autuados) ainda está em curso.
Paralelamente à movimentação da comissão externa do Senado Federal, a juíza Carina Cátia Bastos de Senna, da Vara Federal de Castanhal (PA) recebeu a denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal que referenda o conteúdo do relatório da fiscalização do grupo móvel e recomenda a prisão dos donos da Pagrisa pela prática de trabalho escravo.

Por Maurício Hashizume e Leonardo Sakamoto, da Repórter Brasil
Fonte: http://www.reporterbrasil.org.br/exibe.php?id=1209

21 outubro 2007

Senador paraense propõe recuperação de áreas degradadas com plantio de dendê

O projeto de lei em tramitação no Congresso que permite recuperar com dendê áreas desmatadas na Amazônia é uma ameaça à integridade dos ecossistemas e, na prática, reduz a proteção legal à floresta. A opinião é de nove organizações ambientalistas, que estão exigindo a revisão da proposta.
O substitutivo ao PL 6.424, que deve ser votado nos próximos 15 dias em duas comissões na Câmara dos Deputados, muda o Código Florestal Brasileiro, lei que prevê que 80% da área de propriedades rurais na Amazônia devem ter a floresta preservada.
O código determina, ainda, que produtores rurais cuja propriedade tenha sido desmatada além do limite devam recuperar a reserva legal plantando espécies nativas ou comprando áreas com floresta para ampliação de unidades de conservação.
O projeto que altera a lei, proposto pelo senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA), com um anexo do ex-deputado José Thomaz Nonô e substitutivos do deputado Jorge Khoury (DEM-BA), prevê que até 30% da reposição florestal possa ser feita por meio do plantio de espécies exóticas de palmeira para aproveitamento comercial.
Ou seja, em vez de reflorestar, o proprietário poderá plantar dendê, planta usada na produção de biodiesel.
“Na prática, esse dispositivo significa a redução da reserva legal na Amazônia para 50%, pois o uso de espécies exóticas reduz as funções ecossistêmicas das florestas nas propriedades privadas’’, afirmam as ONGs, em uma análise do texto legal.
Segundo os ambientalistas, “a proposta, tal como apresentada, contribui para a redução da cobertura florestal em um momento em que surgem os primeiros sinais de um aumento nos índices de desmatamento’’.
O projeto foi encaminhado pelo presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), à Comissão de Agricultura, que pediu para analisá-lo. O Ministério do Meio Ambiente quer ganhar tempo e votá-lo juntamente com mecanismos que incentivem a produção em áreas degradadas.

Fonte: Jornal “Diário do Pará”, on-line, caderno Brasil, 21 de outubro de 2007.

19 outubro 2007

Veroca meu amor

Os abastados da província costumam virar o nariz quando se afirma que o Veroca (Mercado do Ver-o-Peso) é uma espécie de síntese do povo do Pará, que nesta época do festejo do Círio de Nazaré pulsa a todo vapor. O Veroca é chique, arquitetura de ferro secular de origem belga abriga o setor dedicado a peixe e carne. Cada um em canto oposto.
Santa Maria do Grão Pará, nome oficial de Belém, nasceu às margens do rio Amazonas, lá num distante 1616, quando imperava nestas terras o povo Tupinambá. Os (as) pesquisadores (as) dedicados (as) na investigação sobre o urbano sinalizam que é junto aos postos de troca de mercadoria que as cidades germinam. Lá pertinho o forte do Castelo aguarda os novos saqueadores. Ainda hoje os canhões estão apontados para a baía.
A cidade é quase uma ilha. Pena ter crescido de costas para o rio, subjugado pela corrida imobiliária, assim como Manaus, que rivaliza a hegemonia política e tragédias urbanas na Amazônia: a concentração de palafitas, problemas de trânsito e saneamento.
Os territórios do Veroca são múltiplos e os senhores (as) deles diversos conforme o horário do dia, da noite ou da madruga: o setor de venda de peixe, praça de alimentação, praça de birita, vendedoras de ervas, feira do açaí e o mercado de carne. Ao varar do sol estivas, vendedores de hortifrutigranjeiro, compradores, as barraqueiras do café controlam o pedaço. Ao meio dia os (as) comerciários (as) afrontam a cidadela, que ganha outros entes (encantados e reais) com a aproximação da noite, tais como “as meninas”.
Os barcos atracados no porto balançam sobre as águas na baía do Guajará, onde os urubus disputam vísceras dos peixes, celebrados pelo casario colonial. Um secular relógio marca o tempo, anseia a passagem da imagem da Santa sempre a cada segundo domingo de outubro. Isso faz mais de duzentos anos. Já a cada sábado a romaria é fluvial, onde afluem os ribeirinhos.
Vendedores (as) de badulaques, policiais, profissionais liberais, poetas, funcionários públicos, “as meninas” os (as) malandros (as) oxigenam a vida do lugar, em demasia barulhento quando apita as seis da tarde.
Ferve o lugar, peixes ardem nas frigideiras encardidas, vendedores de churrasquinho, queijo, amendoim. “As meninas” sorriem serelepes, como se declarassem uma paixão antiga a quem acabaram de conhecer. Penso em Itararé, - o Barão-, Lima Barreto, João Antonio, no teatro de Plínio Marcos, nos vencidos de Dalton Trevisan, nos marginais de Genet. Aqui soa um mundo solidário na alegria e na dor.
Quantas amazonias ocultam a ignorância e preconceito da metrópole? O mundo das feiras, da terra firme, várzea, igarapés e o rio-mar (Araguaia, Tocantins, Xingu, Tapajós). Os filtros em que tentam tratar da região transitam pelo exótico: eldorado, inferno verde ou um imenso almoxarifado.
O barro desta terra gerou gente do quilate do escritor Dalcídio Jurandir, Benedito Nunes, um dos mais expressivos críticos de literatura do país, a romancista Eneide de Moraes, o poeta Max Nunes, homenageado na derradeira feira do livro, dedicada a Cuba.
O Veroca tem a cor, a dor, a alegria, o cheiro, o perfume e o fedor dos humildes. Ao redor do Veroca um universo paralelo flutua. Os inferninhos – ou seriam paraísos - encravados nas ruas estreitas se agitam. Meninos (as) cheiram cola, assaltam, repartem com os pares e policiais a renda.
Uma terra farta em imagem e signos os mais variados abriga um pólo de fotografia, que tem entre os animadores o coletivo FOTOATIVA. Belém é uma metrópole sonora, sedia um dos antigos conservatórios, o Carlos Gomes, mas também tem punk e hard-rock, instrumentais, orquestras e o arrastão do Pavulagem, que anima a quadra junina há 20 anos, e muito engarrafamento, que sempre atrasa a chegada até o Veroca, coração e sexo da cidade. Ainda que uma pequena parte da população torça o nariz.

Rogério Almeida é autor do livro Araguaia-Tocantins: fios de uma história camponesa/2006. Mestre em Planejamento do Desenvolvimento pelo Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA) da Universidade Federal do Pará (UFPA), e colaborador da rede Fórum Carajás: www.forumcarajas.org.br
Correio eletrônico: araguaia_tocantins@hotmail.com

18 outubro 2007

Porque estamos nos mobilizando?

REIVINDICAÇÕES COMUNS DA SOCIEDADE EM DEFESA DA REFORMA AGRÁRIA E DAS RIQUEZAS NATURAIS DO POVO BRASILEIRO

Ao Governo Federal, Governo Estadual, Governo Municipal e Companhia Vale do Rio Doce.
Estamos na Amazônia brasileira, envolto a maior província mineral do planeta, seguramente área de maior concentração de capital natural (floresta, água, minério e biodiversidade) e de populações tradicionais, para o grande capital não passa de uma fronteira em expansão.
De um lado o “progresso” oficial organizado pelo Estado a partir da atuação dos seus organismos e do capital internacional aliado aos interesses dos empresários locais. Um modelo de desenvolvimento sócio-econômico baseado no latifúndio e na pecuária extensiva, no desflorestamento para produção de carvão vegetal, na monocultura do eucalipto e da soja, na mineração e siderurgia.
Do outro lado, - apesar da riqueza natural da região -, uma população pobre e miserável desprotegida das condições que proporcione uma vida digna e dos serviços públicos que deveriam ser oferecidos pelo Estado. Dados do IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - demonstram a insustentabilidade desse modelo, de má distribuição de riqueza e renda: 295 mil pessoas dominam 11% de toda a riqueza enquanto 11 milhões de habitantes, ou seja, metade da população da Amazônia possuem 16% da renda percapita.
Alienada da sua condição política, a sociedade paraense padece de males comuns: a falta de infra-estrutura social, moradia, saúde, segurança, emprego e reforma agrária. Estes, são demonstrativos de como esse modelo de desenvolvimento inviabiliza a sociedade de ascensão sócio-econômica ao mesmo tempo em que nega a ela mecanismos de controle e gestão sobre suas riquezas naturais.
Diante disso, as Organizações sociais do campo e das cidades (camponeses Sem Terra, Garimpeiros, Associação de moradores, estudantes), mobilizados na Jornada de luta pela reforma agrária e em defesa dos recursos naturais do povo brasileiro apresentam aos governos Federal, Estadual e Municipal e a Companhia Vale do Rio Doce a pauta política e econômica a ser atendida de forma imediata, pois representa os interesses da sociedade que não pode e não tem mais porque esperar.
1.Reestatização da Companhia Vale do Rio Doce como forma de devolver ao Estado nacional e ao povo brasileiro uma empresa de caráter estratégico para a economia e a soberania nacional.
2.Que o governo do estado do Pará (governadora Ana Julia Carepa) assuma uma outra postura em relação a Companhia Vale do Rio Doce.
- Articule uma frente de Estados mineradores onde a CVRD atua para que seja construído um novo imposto sobre a mineração e ao mesmo tempo estabeleça uma campanha para o fim da lei Kandir que beneficia apenas as empresas exportadoras.
- Que defenda o Departamento Nacional de Política Mineral (DNPM) como órgão responsável pela liberação de concessões minerais e não seja repassada as empresas privadas esse papel.
- Que os municípios mineradores se articulem na luta pelo aumento dos Royat´s, (CFEM- Contribuição Financeira pela Exploração Mineral ) hoje entorno de 4%, muito aquém dos lucros da Companhia. Que Chegue até 10% de toda a riqueza produzida.
- Que a SECTAM (secretaria de meio ambiente do Estado do Pará) revise periodicamente os impactos ambientais nas áreas de influência do grande projeto Carajás.
3. Que Companhia Vale do Rio Doce corte o repasse de ferro as (Empresas de Ferro Gusa) instaladas no Pará e no Maranhão que não cumpram responsabilidade ambiental e social.
4. Que o governo Federal através das suas instituições, Governo do Estado, CVRD, e Governos municipais, sejam responsáveis por um programa social de caráter emergencial nas áreas:
- Construção de moradias populares.
- Construção de postos de saúde, construção do hospital regional de Parauapebas e Tucuruí, fortalecimento do hospital regional de Marabá e Redenção com profissionais capacitados para atender as necessidades da sociedade.
- Implementação de um amplo programa de educação: de erradicação do analfabetismo ao acesso a universidade pública.
- Instalação de unidades produtivas que garantam a geração de mais empregos e diversificação da economia.
- Segurança social.
5. Que o Distrito Florestal de Carajás colocado em pauta pelos governos Federal e Estadual para ser implementado nessa região (baseado no plantio de eucalipto para carvão vegetal e uso da floresta natural) seja substituído pelo Distrito Agroflorestal Sustentável (que significa reflorestar com arvores nativas da região e garantia da biodiversidade)
6. Que os governos Federal e Estadual resolvam o problema histórico dos garimpeiros de Serra Pelada:
- Aprovação no congresso nacional do estatuto do garimpeiro (a)
- Que o Estado brasileiro devolva aos garimpeiros (as) recursos depositado em forma de ouro na caixa econômica federal há mais de 20 anos.
- Que os garimpeiros tenham autonomia sobre o território de Serra Pelada, que seja cessada a ingerência da CVRD sobre a forma de cooptação e repressão das organizações dos garimpeiros.
7. Que os Governos, Federal e Estadual construam a curto prazo a Escola Agrotécnica Federal, em Marabá; e o campus Avançado da UFPA (Universidade Federal do Pará) e da UEPA (Universidade Estadual do Pará.) em Parauapebas.
8. Que os processos trabalhistas em que a Companhia Vale do Rio Doce esteja citada sejam imediatamente julgados, assim como ressarcidos os direitos trabalhistas dos trabalhadores. Como também seja revisto pela justiça do trabalho o salário praticado pela Companhia Vale do Rio Doce e as empresas terceirizadas que são hoje os salários mais defasados do país.
9. Que seja criado um Conselho Deliberativo com representantes do Estado, da CVRD e da sociedade civil para discutir e deliberar sobre os projetos de mineração e de uso de recursos ambientais da região. Que acompanhe e decida o programa de investimentos dos recursos destinados pela CVRD aos municípios, com apresentação de projetos de acordo com os interesses locais.
10. Implementação de um pólo industrial na região de Carajás para verticalização da produção (que agregue valor industrial aos recursos naturais extraídos na região) na transformação de produtos manufaturados de interesse da sociedade, com a produção de utensílios eletrodomésticos, peças industrias que atendam a demanda local.
11. Que seja realizado um amplo programa de Reforma Agrária na região, considerando o bioma regional e as características da agricultura amazônica. Que sejam criados assentamentos de forma imediata em todas as fazendas ocupadas pelas famílias Sem Terra. Que o INCRA venha ter uma regularidade na liberação de recursos para ATES.
12. Que a Companhia Vale do Rio Doce repasse sistematicamente os recursos dos acordos estabelecidos entre ela e as Comunidades indígenas impactadas pelo grande projeto Carajás.
13. Que o governo Federal através da ELETRONORTE estabeleça a tarifa social de energia para a sociedade e um amplo projeto de “LUZ PARA TODOS” para os camponeses (as) da região. Aqui está estabelecida a maior hidrelétrica do Brasil (hidrelétrica de Tucuruí) e a sociedade paga a tarifa de energia mais cara do país. Que sejam suspensos os subsídios de energia para os grandes projetos em detrimento dos interesses da sociedade.
14. Que os governos Federal, do Estado do Pará e dos municípios da região, estabeleçam um conjunto de medidas visando aparelhar e resignificar a atuação da EMBRAPA e, assim direcionar a atuação da mesma no fortalecimento da produção das comunidades rurais e assentamentos de reforma agrária.
15. Que a Companhia Vale do Rio Doce estabeleça junto com os movimentos sociais uma agenda para discussão de todos os projetos minerais já implantados e a serem implantados na região.

Assentamentos Palmares
Parauapebas-Pará
15 de outubro de 2007

MST- CPT – MAB –MPA –VIA CAMPESINA/PA – UJCC – Sindicato dos Garimpeiros de Serra Pelada – Articulação de Mulheres do Campo e da Cidade – ASSOCIACOES DE MORADORES DE PARAUAPEBAS – GRUPO UNIAO PALMARES

15 outubro 2007

Carajás: distrito florestal e outros trens

O catatau de intelectuais que já queimou pestanas sobre a “conquista” da Amazônia pontua a organização recente do saque aos recursos naturais da região ao apagar das luzes da década de 1950, que tem como um dos marcos a construção de rodovias. Incentivar o desenvolvimento, gerar emprego, renda e arrancar a região das “trevas” tem sido o apelo dos defensores dos grandes projetos junto às populações locais. Isso faz tempo. Num rincão marcado por limites de toda ordem, quem não cai ao canto da sereia?
Um Estado intervencionista e autoritário alinhado ao capital privado nacional e internacional semeou uma série de políticas para a “conquista” da fronteira, ainda que farta em população indígena, foi considerada um vazio demográfico. E são os indígenas os que mais socializam as mazelas da inserção da “civilização” no front amazônico.
Na região dos Carajás, a parte oriental da Amazônia, a atividade siderúrgica [1] soma duas décadas e internaliza passivos de toda ordem: destruição da floresta, trabalho escravo, poluição de igarapés e rios, indiferença a acordos de reflorestamento, sem falar nas condições insalubres de trabalho. Uma das costelas do projeto Carajazão, como ficou conhecido o Programa Grande Carajás (PGC), na década de 1980.
No PGC tudo era estratosférico, os números na casa de bilhões de dólares. Dizia-se que o Carajazão serviria até para sanar a dívida externa. A siderurgia consolida a base do que tem regido a economia da região, o extrativismo, ou o melhor seria saque?
O setor siderúrgico de Carajás, maioria oriundo do Vale do Rio Doce, Minas Gerais, onde destruiu a cobertura vegetal, encontra-se numa encruzilhada. De um lado os mercados chinês e indiano demandam o produto; do outro, a pressão internacional por conta dos passivos sociais e ambientais produzidos pela cadeia produtiva ganham visibilidade internacional.
Assim, uma vez mais resta apelar ao Estado. Se nas décadas pretéritas a Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM), serviu de aporte, hoje o apelo é para o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que exerce papel estratégico na política de eixos de integração Latino-Americano, onde a região do Araguaia-Tocantins configura uma das pernas para a geração de energia, monoculturas e transporte multi-modal (rodovias, ferrovias e hidrovias).
Alguns números do pólo siderúrgico
O consumo de madeira pelo setor guseiro em Carajás é estimado entre 12 a 14 milhões de m³, conforme o Instituto Brasileiro dos Recursos Renováveis e do Meio Ambiente (IBAMA). Dados produzidos pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) Amazônia Oriental, sinaliza que até 2005, o pólo siderúrgico de Carajás acumulou a exportação de 20 milhões toneladas de ferro gusa.
O pólo é constituído de 14 empresas, divididas nos municípios de Açailandia, oeste do Maranhão e Marabá, sudeste do Pará, que são alimentadas pela mina da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), na região de Carajás, município de Parauapebas. A CVRD pressionada pela opinião pública internacional, enfim percebeu, após 20 anos, que há passivos de toda ordem na cadeia, e ameaça a suspensão de matéria prima.
Tendo como base os números de exportação, os pesquisadores coordenados pelo Dr. Alfredo Homma, calculam que 100 mil hectares de floresta foram derrubados em 2005. O que equivale a 100 mil campos de futebol. Debitar toda a responsabilidade do mundo degradado da região nas costas das siderúrgicas seria injusto. As mesmas dividem a responsabilidade com outros pólos, como o madeireiro e o de pecuária. Sob tal matriz, de pólos, a Amazônia foi ocupada.
A dúbia ação do Estado
A dubiedade tem marcado a ação do Estado. Em sua dimensão regional fez pela primeira vez uma série de investigações sobre as irregularidades das empresas siderúrgicas de Marabá e indicou uma bateria de sanções entre multas e suspensão de atividade produtiva.
Já na esfera federal o setor florestal realizou um pacote de audiências públicas onde visa incentivar a monocultura de 25 milhões de hectares de floresta na delicada tríplice fronteira do Bico do Papagaio (Maranhão, Pará e Tocantins), com ênfase na grande propriedade. Lembremos que a região é celebrizada pelo conflito de terras.
Estima-se que a autonomia do setor só será possível num prazo de 15 anos. Em oposição o campesinato da região realizou um seminário em setembro em Marabá e lançou manifesto contra o projeto do distrito florestal. Outra preocupação dos movimentos sociais tem sido o debate para a construção da hidrelétrica de Marabá.
A ação dúbia do Estado se revela em diferentes dimensões. Ao mesmo tempo em que reconhece o campesinato através de efetivação de projetos de assentamento, políticas de crédito, estabelece uma linha de projetos que estão em oposição às demandas dos mesmos. Uma outra polêmica assanhou o debate recentemente, com a visibilidade de financiamento de políticos do Partido dos Trabalhadores (PT) pelas empresas guseiras. É do PT a governadora do Pará, Ana Júlia Carepa, que tem sinalizado para o combate do trabalho escravo.
Em tal contexto, resta a pergunta emprestada do povo da Nação Zumbi, banda pernambucana: “De que lado você samba? Você samba de que lado? De que lado você vai sambar?”.

[1] O setor ajudou a impulsionar a economia norte americana no século XIX, surgiu no mundo lá no século VII.

Rogério Almeida é autor do livro Araguaia-Tocantins: fios de uma história camponesa/2006. Mestre em Planejamento do Desenvolvimento pelo Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA) da Universidade Federal do Pará (UFPA), e colaborador da rede Fórum Carajás: www.forumcarajas.org.br
Correio eletrônico: araguaia_tocantins@hotmail.com

12 outubro 2007

Líder comunitário é ameaçado de morte por madeireiros no PA

A Pastoral Social da Diocese de Santarém (PA) lançou uma nota na última semana alertando as autoridades públicas sobre os conflitos na região do Pacoval (Rio Curuá Una e Curuatinga). De acordo com a nota, empresas madeireiras exploram sistematicamente os recursos naturais de assentamentos da região, deixando diversas comunidades sem acesso a estes recursos. A Pastoral afirma que a resistência comunitária à invasão das terras está sendo respondida com ameaças e violência pelos madeireiros.
Nesta quarta-feira (10), o líder comunitário de Curuá II, Valdecir Gomes, denunciou à Radioagência NP que os madeireiros estão armando um esquema para matá-lo.
“Por causa de muitas denúncias que a gente fez eles garantem que brevemente vão me fazer [matar]. Inclusive eles me chamam de linguarudo, que eu estou avançando onde não deveria. E eles citam o seguinte: somando cada metro de madeira de ipê que é preso lá, vai ser o valor da minha vida. Minha preocupação maior é com a minha família, com o pessoal do assentamento e as outras lideranças, até porque a gente não vai parar de lutar pelo que é nosso”.
Valdecir disse que, recentemente, houve uma morte muito estranha de um rapaz que trabalhava para uma empresa madeireira.
“Não entregaram o corpo para a família, falaram que o rapaz tinha morrido de derrame e, quando o caixão chegou, eles mesmos fizeram o enterro e não deixaram a família denunciar. Este rapaz parece que falou alguma coisa com relação ao esquema lá dentro”.
A Pastoral manifestou apoio às lideranças e pediu punição para a comercialização ilegal de madeiras.

Vinicius Mansur, da Radioagência NP.
Fonte: http://www.radioagencianp.com.br/index.php?option=com_content&task=view&id=3128&Itemid=1

Madeireiros devastam 90% da terra Canabrava/Guajajara no MA

Representantes da Comunidade Indígena Guajajaras reuniram-se na manhã de ontem com a presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos da Assembléia Legislativa, deputada Helena Barros Heluy. Os índios estão cobrando, mais uma vez, a criação de uma Administração Executiva Regional no município de Barra do Corda - Ma, e outra no município de Jenipapo dos Vieiras, conforme ficou acertado com a Funai e Ministério da Justiça desde a extinção do Núcleo de Apoio Local Mardônio Amorim Pompeu que assistia às comunidades indígenas, mas foi considerado ilegal pela Fundação Nacional do Índio.
A deputada Helena Barros Heluy ocupou a tribuna para lembrar que a Assembléia já tem conhecimento da realidade apresentada à Comissão pelos índios Osvaldo Guajajara, Galeno Guajajara e cacique Josemir Guajajara.
O documento apresentado à Assembléia tem o mesmo teor da denúncia enviada à Procuradoria da República, e vem chancelado por diversas entidades representantes da causa indígena no Maranhão, informou Helena. Segundo relato dos indígenas, no dia 9 de abril de 2007 foi publicada uma portaria extinguindo a autonomia financeira dos núcleos em todo o país, ficando o Núcleo de Apoio Local maranhense subordinado à Administração Executiva Regional de São Luís. A distância, cerca de 500 quilômetros, provocou revolta entre os indígenas que bloquearam a BR 226 e desligaram uma linha de alta tensão da Eletronorte.
Uma comissão de deputados formada em São Luís se deslocou até Brasília e em audiência com o presidente da Funai ficou decidido que seriam criadas duas Administrações Executivas Regionais [AER], uma no município de Barra do Corda e outra no município de Jenipapo dos Vieiras. Ofício assinado pelo presidente da Funai substituto, Aloysio Antônio Castelo Guapindaia, decidiu pela criação das AER e elaboração, em conjunto com as lideranças Guajajaras, de um Plano de Ação a ser cumprido pelas administrações.
A decisão, entretanto, jamais saiu do papel e a Funai acabou exonerando todos os profissionais que exerciam suas atividades no âmbito dos núcleos de Barra do Corda e Mardônio, deixando as comunidades indígenas Guajajara em total abandono.
Os índios denunciam ainda que a terra indígena canabrava/guajajara encontra-se com 90% de sua área queimada e invadida por madeireiros e caçadores que distribuem bebidas alcoólicas entre os índios, contribuindo para o aumento de acidente e doenças e comprometendo a subsistência das comunidades.
A deputada Helena Heluy ainda lembrou que a Assembléia Geral das Nações Unidas, com o voto favorável de 143 países, 11 abstenções e 4 votos contra, aprovou, em 13 de setembro de 2007, a Declaração sobre os Direitos dos Povos Indígenas. Votaram a favor todos os países da América Latina, à exceção da Colômbia que se absteve. Votaram contra Estados Unidos, Canadá, Austrália e Nova Zelândia.
Helena recebeu apoio do deputado Rigo Teles que, inclusive, compôs a Comissão de parlamentares que esteve em Brasília negociando a criação das AER. Rigo Teles reafirmou que os compromissos assumidos pela Funai e Ministério da Justiça não foram cumpridos e prometeu se empenhar, junto com a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos, para que seja encontrada uma solução para o problema.

Fonte: http://www.forumcarajas.org.br/noticias2.php?id=714

09 outubro 2007

Comissão do Senado prossegue investigações no caso Pagrisa

Uma nova audiência pública que será realizada nesta terça-feira (09) dará prosseguimento às investigações sobre o caso da Fazenda Pastoril Agrícola S/A (Pagrisa) no estado do Pará. A audiência será realizada pela Comissão externa de investigação do Senado Federal, que foi criada a pedido dos proprietários da fazenda localizada no município de Ulianópolis, para analisar se houve ou não, abusos em uma operação do grupo móvel de fiscalização contra o trabalho escravo do Ministério do Trabalho.
Na ação, realizada em julho deste ano, mais de mil trabalhadores foram encontrados em situação semelhante à de escravidão na fazenda Pagrisa. Na reunião desta terça-feira, serão ouvidos o chefe da operação, o auditor Humberto Célio, o procurador do trabalho que acompanhou a fiscalização, Luiz Antônio Fernandes e os irmãos Fernão e Marcos Villela Zancaner, proprietários da fazenda.
Na audiência realizada na última semana, enquanto os proprietários classificavam como abusiva a operação do grupo móvel, os fiscais mostraram aos senadores fotos e vídeos que comprovavam a situação em que os trabalhadores foram encontrados. Os registros mostravam a falta de água potável para beber, consumo de alimentação estragada e dormitórios não adequados. Mesmo com as investigações desta comissão, o Ministério público já ajuizou uma ação contra a Pagrisa que está sendo analisada pela Vara federal de Castanhal.

Gisele Barbieri, da Radioagência NP
Fonte: http://www.radioagencianp.com.br/index.php?option=com_content&task=view&id=3118&Itemid=1

08 outubro 2007

Canaviais e queimadas já desafiam Amazônia

A indústria sucroalcooleira, que assumiu a tarefa mundial de curar o planeta do 'vício do petróleo', continua a avançar rumo ao Norte. Nascida no planalto paulista e no Nordeste brasileiro, a cultura da cana já encontra fôlego para levar seus tentáculos para além da fronteira agrícola, no coração da maior floresta do mundo, a Amazônica. O plantio de cana para produção de açúcar e álcool, apesar de ainda modesto, recorre ao desmatamento e às queimadas e usa 65% da força manual para a colheita.
A cana desafia a Amazônia. Mais do que isso, a ousadia humana já encontrou formas de driblar a hostilidade do ambiente. Somado ao ciclo de prosperidade do álcool combustível no Brasil e no mundo, tem não só ressuscitado projetos do Proálcool como atraído dinheiro para novas usinas, tanto na gigante Amazônia Legal quanto na frágil e exuberante área do bioma amazônico, região que cobre cerca de 4% do planeta e de onde se conhece apenas 50% das espécies que ali vivem.
O tema é a mais nova batalha entre os integrantes do governo Lula. A definição de um zoneamento agroecológico que indique vocações no País no próximo ano pôs em choque o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, e a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. A pasta da Agricultura admite a produção de cana-de-açúcar em escala na Região Amazônica. A ministra reagiu e parece disposta a não ceder.
A velocidade dos investimentos em produção de cana e derivados na região está longe de ser equivalente aos programados para o Centro-Sul do Brasil, área que até o final do primeiro biênio da próxima década deverá receber US$ 17 bilhões, o suficiente para erguer 90 usinas de etanol.
Além de projetos no norte de Mato Grosso, a Região Amazônica tem planos de produção de álcool no Acre (que pode começar a operar em 2008 e alcançar 3 milhões de toneladas) e no Pará. Há dois novos projetos previstos para Roraima. Mas a prova de que a Amazônia, apesar de tudo, tem condições de produzir cana está em Presidente Figueiredo, 100 quilômetros ao norte de Manaus, localizada às margens da BR-174, que liga a capital do Amazonas a Boa Vista, capital de Roraima. A estrada, de piso novo, corta a mata fechada. O clima é úmido ao extremo, em alguns momentos acima de 80%.
A chuva é freqüente, principalmente a partir de agora. Mas quis a natureza que o céu desaguasse mais a partir de agosto. 'Este ano choveu demais. Os canaviais ficaram encharcados, não havia como colher. Teve dia que a usina ficou parada', diz Waltair Prata Carvalho, superintendente da Agropecuária Jayoro, em Presidente Figueiredo. Em toda a Amazônia, é o projeto que mais desafia o ambiente. E, apesar das apostas de que é um projeto inviável, tem conseguido sobreviver.
A reportagem do Estado [O Estado de São Paulo] esteve na área, uma imensidão de 59 mil hectares, 4 mil deles cobertos com cerca de 8 variedades de cana mais adaptadas às condições. 'Apesar de todas as dificuldades de se produzir cana na região, o projeto sobrevive, já encontrou o equilíbrio econômico-financeiro e precisa somente ampliar a escala para alcançar rentabilidade', assegura Carvalho.
A Jayoro é a parceira da Coca-Cola e só está de pé graças a um acordo assinado pelos controladores e a multinacional, em 1996. Todo o açúcar usado pela Recofarma, a indústria responsável pela produção da base da Coca-Cola, localizada em Manaus, sai da cana produzida naquelas glebas. Sai de lá também todo o extrato de guaraná que a companhia utiliza para a produção do refrigerante Kuat.
A Jayoro é a maior agroindústria do Amazonas. Emprega, neste momento, período de safra, 900 trabalhadores, tanto na usina quanto na colheita manual e mecânica da cana. A Jayoro tem cinco colhedoras de cana que rasgam os canaviais às margens da imensidão da floresta. 'Já vi onça, veado, todo o tipo de bicho nesse canavial', diz Osvaldino Santos de Oliveira, o operador de uma das máquinas há oito safras.
Criada no final da década de 70, a agroindústria surgiu no Proálcool. Tinha uma missão: levar o novo combustível para Manaus. O desconhecimento do ambiente, os custos elevados de manutenção e o declínio do programa no fim da década de 80 transformaram a Jayoro numa mera produtora de cachaça. O novo ciclo do etanol, referendado agora pelo mundo, reacendeu expectativas e pode, em pouco tempo, fazer a Jayoro elevar em mais de 50% a capacidade de produção, de 300 mil toneladas por ano para 450 mil.
'Não vamos derrubar uma árvore. Toda a produção de cana até agora ocorreu rigorosamente no mesmo espaço desmatado na década de 70. E assim continuará a ser', garante Arislando Prado, diretor da empresa contratada pela família Magid (controladora do projeto) para gerir o negócio.
A polêmica entre a ministra Marina Silva e seu colega Reinhold Stephanes reverberou na floresta. 'Essa discussão nos preocupa. Não podem proibir o plantio de cana aqui. Não vamos tomar nenhuma decisão sobre expansão sem saber o que o governo vai decidir sobre a cana na Amazônia', explica Prado.
Uma área de 2,6 mil hectares, no limite da imensa gleba da Jayoro, pode se tornar uma opção para o plano de expansão. Ali, um pasto degradado descansa sob os olhos da Amazônia. Como no resto do País, é uma área candidata a se tornar um canavial, apesar de o endereço ser 'bioma amazônico'.

Agnaldo Brito
Fonte: http://www.ecodebate.com.br/Principal_vis.asp?cod=6465&cat=
OBS: Matéria de “O Estado de S.Paulo” - 07/10/2007, publicada na Ecodebate.