Integrantes da comissão externa do Senado Federal que analisa a operação que libertou 1.064 trabalhadores rurais de situação análoga à de escravidão na fazenda de cana-de-açúcar Pagrisa, em Ulianópolis (PA), decidiram suspender a coleta de depoimentos de envolvidos - paralisada em 2 de outubro - e marcaram uma audiência com o ministro do Trabalho e Emprego, Carlos Lupi.
Seis dos 11 senadores da comissão deliberaram, em encontro informal ocorrido na última quarta-feira (17), que uma comitiva formada por quatro representantes - Flexa Ribeiro (PSDB-PA), Cícero Lucena (PSDB-PB), José Nery (PSol-PA) e Paulo Paim (PT-RS) - se reunirá com o ministro na próxima terça-feira (23) à tarde para tentar dar um desfecho ao assunto.
Adiada por várias vezes nas duas últimas semanas, a sessão que retomaria os depoimentos do auditor fiscal Humberto Célio Pereira e do procurador Luiz Antônio Fernandes, integrantes do grupo móvel de fiscalização que esteve em junho na Pagrisa, e dos diretores executivo, adjunto e presidente da empresa autuada, Murilo, Fernão e Marcos Villela Zancaner, respectivamente, não será mais convocada pela comissão externa. Requerimentos convidando outras pessoas que trabalham com o tema também haviam sido aprovados, mas não devem ser cumpridos pela instância parlamentar.
Presidente da comissão externa, o senador Jarbas Vasconcelos (PSDB-PE) foi procurado pela Repórter Brasil para comentar a suspensão dos trabalhos, mas preferiu não se pronunciar. A pressão provocada pela visita de senadores da comissão externa à Pagrisa, quase três meses depois da fiscalização do grupo móvel, fez com que a Secretaria de Inspeção de Trabalho (SIT) do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), com base na alegação de risco e de insegurança para o trabalho dos fiscais e procuradores, suspendesse temporariamente as operações do grupo móvel. Houve reação dos senadores que estiveram na Pagrisa e condenação da interferência por parte de entidades da sociedade civil.
Em conseqüência disso, o ministro Carlos Lupi chegou a divulgar o relatório de inspeção da fazenda. Foram colhidos os depoimentos iniciais dos principais envolvidos e parlamentares contrários à intervenção dos senadores aproveitaram para se rearticular em torno da necessidade de aprovação da PEC 438/2001, que prevê o confisco de terra onde a prática do trabalho escravo for constatada. Depois de firmar um termo de cooperação técnica com a Advocacia-Geral da União (AGU), o MTE restabeleceu normalmente as operações do grupo móvel na última segunda-feira (15).
"Os membros da comissão chegaram a conclusão que não há razão para continuar com os trabalhos", declara José Nery. "Montou-se uma parafernália sobre um assunto que estava sendo encaminhado normalmente pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Os fiscais têm que fiscalizar e a empresa tem que melhorar as suas condições e voltar a produzir", opina Paulo Paim, outro articulador da audiência com Carlos Lupi. "O ministro é a autoridade maior neste tema", completa o senador petista, ressaltando que o objetivo da audiência da próxima semana é dar um encaminhamento final ao imbróglio.
Segundo senadores que participaram da reunião, os membros da comissão externa devem levar - a pedido de Kátia Abreu (DEM-TO) e de Flexa Ribeiro (PSDB-PA), principais propositores da criação da comissão externa - pelo menos três demandas para a audiência com o ministro do Trabalho e Emprego: um pedido para que a empresa fosse excluída da "lista suja" do trabalho escravo, uma consulta sobre a possibilidade de assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o Ministério Público do Trabalho (MPT) estabelecendo metas e prazos para que a empresa sane os problemas constatados pelo grupo móvel e uma sugestão para que uma nova fiscalização do governo federal verifique depois as condições de trabalho na propriedade.
A Pagrisa, contudo, ainda não faz parte da "lista suja" de empregadores que passaram por um processo administrativo depois de ter explorado trabalho escravo. E o MTE não tem a prerrogativa nem para firmar um TAC para a "correção" dos crimes praticados pela empresa e não pode atender pedidos específicos de novas fiscalizações para casos como o da Pagrisa. Uma nova averiguação pode ocorrer com base em novas denúncias ou como acompanhamento das empresas relacionadas na "lista suja", cadastro em que a Pagrisa não foi sequer incluída, pois o procedimento administrativo referente à empresa (que garante a defesa plena dos autuados) ainda está em curso.
Paralelamente à movimentação da comissão externa do Senado Federal, a juíza Carina Cátia Bastos de Senna, da Vara Federal de Castanhal (PA) recebeu a denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal que referenda o conteúdo do relatório da fiscalização do grupo móvel e recomenda a prisão dos donos da Pagrisa pela prática de trabalho escravo.
Fonte: http://www.reporterbrasil.org.br/exibe.php?id=1209