16 dezembro 2007

Camponeses (as) do oeste e sul do Maranhão animam escola agro-extrativista

Os cerrados do oeste e sul do Maranhão são marcados pela implantação de inúmeras experiências que afetam o meio ambiente, concentram terra e renda, onde se destacam a monocultura de eucalipto, o pólo de gusa e o pólo de soja. Tais cadeias econômicas definharam o uso do território, expropriaram várias famílias camponesas e democratizaram entre os mais pobres os passivos sociais e ambientais. Tal plano do desenvolvimento ganhou corpo graças a uma associação do capital privado com o Estado, através de uma generosa política de renúncia fiscal.
Na década de 1980, considerada a mais aguda na disputa pela terra na região do Bico do Papagaio, oeste do Maranhão, sul do Pará e norte do Tocantins, era impossível avaliar que as famílias camponesas fossem se territorializar através do reconhecimento de inúmeras áreas ocupadas como projetos de assentamentos rurais, escolas, central de cooperativas de produtores rurais, centro de difusão de tecnologia, ocupação de cargos públicos, conquista de assentos em diferentes frentes do poder público municipal e estadual.
A caminhada de mais de duas décadas de oposição aos projetos de homogeneização ganhou mais uma página no último dia 12 de dezembro de 2007, no município de João Lisboa, com o lançamento do projeto “Agro-extrativismo: Alternativa Sustentável e Solidária aos Povos do Cerrado Maranhense”, uma escola técnica que visa trabalhar com 120 famílias, cerca de 360 pessoas, entre jovens e adultos na faixa de 18 a 32 anos. A ponta de lança é uma ONG coordenada pelos (as) trabalhadores (as) rurais, o Centro de Educação do Trabalhador Rural do Maranhão (CENTRU), que tem a frente uma representação histórica da luta camponesa no Brasil, Manoel Conceição Santos.
Ancorado nas orientações do agro-extrativismo e da economia solidária, o projeto foi aprovado no âmbito do Edital Petrobras Fome Zero 006. A iniciativa envolverá, prioritariamente, seis municípios: Amarante, Imperatriz e Montes Altos (Pólo Oeste), Estreito, São Raimundo das Mangabeiras e Loreto (Pólo Sul), além dos municípios de João Lisboa, Buritirana, Senador La Roque e Cidelândia, que compõem a área de abrangência do trabalho do Centru-MA.
Conhecimento e tecnologia – Inverter a agenda das academias é um dos desafios para a construção de um projeto de desenvolvimento que redirecione o centro de prioridade do Estado. Nesse sentido a Escola Técnica Agro-Extrativista (ETA) descortina uma nova fase na trajetória dos camponeses (as) do sul do Maranhão, sublinhou Manoel Conceição, em saudação às representações dos setores da educação, economia e política do estado no ginásio poli-esportivo do município.
A escola integra o Plano de Desenvolvimento Sustentável e Solidário, política de orientação das ações do CENTRU e da Central de Cooperativas do Maranhão (CCAMA), e tem como objetivo o fortalecimento da economia solidária. O curso que terá duração de um ano será ministrado a partir da pedagogia da alternância. No intervalo de dois meses os alunos passaram seis dias na escola, onde acessaram fundamentos sobre manejo sustentável do bioma cerrado, associativismo, cooperativismo, desenvolvimento sustentável e meio ambiente, gênero, gerações e etnias, viabilidade econômica e gestão democrática dos empreendimentos associativos.
Joaquim Sousa, dirigente sindical de São Raimundo das Mangabeiras destacou a importância da escola para a construção de tecnologia voltada para as demandas dos trabalhadores rurais. O dirigente ressaltou ainda a criação da UNICAFES, União das Cooperativas da Agricultura Familiar e Economia Solidária.
O professor da Universidade Estadual do Maranhão, Expedito Barroso ressaltou o nascimento da escola como grande possibilidade de extensão que vai aglutinar uma diversidade de atores sociais de variados campos e uma possibilidade de aprender um pouco sobre o conhecimento dos homens e mulheres do campo maranhense. Além da UEMA prestigiaram o evento representantes da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Maranhão (FETAEMA), Banco do Nordeste, IBAMA, MDA, governo do estado, prefeito de João Lisboa, entre outros.

Rogério Almeida é autor do livro Araguaia-Tocantins: fios de uma história camponesa/2006. Mestre em Planejamento do Desenvolvimento pelo Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA) da Universidade Federal do Pará (UFPA), e colaborador da rede Fórum Carajás: www.forumcarajas.org.br
Correio eletrônico: araguaia_tocantins@hotmail.com

Tribunal julga Curió por crime de homicídio

O prefeito de Curionópolis, Sebastião Curió Rodrigues de Moura (DEM), 72 anos, o major Curió, como ficou nacionalmente conhecido após administrar por vários anos o garimpo de Serra Pelada, no sudeste do Pará, será julgado amanhã, em Belém, perante as Câmaras Criminais Reunidas do Tribunal de Justiça do Estado. Ele é réu em ação penal movida pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, que o denunciou pelo duplo crime de homicídio qualificado e lesões corporais. Curió será julgado pelo TJE porque tem prerrogativa de foro, já que é prefeito.
Curió é acusado de haver praticado os crimes em 2 de fevereiro de 1993, há 14 anos, em uma chácara de propriedade dele, no condomínio Sobradinho dos Melos, cidade satélite de Brasília (DF). O prefeito vai responder pela acusação de homicídio qualificado contra o menor Laércio Xavier da Silva, 16 anos, abatido a tiros pelas costas no interior da chácara, e pelo crime de lesões corporais contra Leonardo Xavier da Silva, 17 anos, irmão de Laércio.
O processo criminal contra Sebastião Curió será relatado pelo desembargador Raimundo Holanda Reis. O Ministério Público, por delegação do procurador-geral de Justiça, Geraldo de Mendonça Rocha, será representado pelo promotor de Justiça Miguel Baía, responsável, no MPE, pelos processos contra prefeitos. Embora a ação penal contra Sebastião Curió venha se arrastando há quase 15 anos, entre o Tribunal de Justiça do DF e o Superior Tribunal de Justiça (STJ), no Pará, onde a ação foi admitida em abril de 2007, o processo ganhou celeridade. Isso porque o promotor Miguel Baía solicitou ao relator que todos os atos da denúncia fossem mantidos. Raimundo Holanda deferiu o requerimento e Baía pôde apresentar as alegações finais, providência que conduziu o processo imediatamente ao julgamento.

Assassinato teve participação de filhos do réu
O crime de que é acusado o prefeito de Curionópolis, Sebastião Curió (DEM), ocorreu na tarde do dia 1º de fevereiro de 1993. Nesse dia, Curió, seus dois filhos, Sebastião Curió Rodrigues de Moura Júnior, o 'Curiozinho', e Antonio César Nóbrega de Moura, acompanhados de dois policiais da 10ª Delegacia Policial de Brasília, João Bosco Frajorge e Erycson Boueri Coqueiro, teriam perseguido sem sucesso os menores Laércio e Leonardo Xavier da Silva.
Os dois irmãos eram acusados de roubo em chácaras do condomínio Sobradinho dos Melos, entre elas a que pertencia a Curió. Não conseguindo alcançar os menores, o grupo resolveu voltar à noite para surpreendê-los. Na madrugada do dia seguinte, 2 de fevereiro, Sebastião Curió, auxiliado pelos quatro acompanhantes, seus dois filhos e os dois policiais, localizou os menores e não lhes deu qualquer chance de fuga, segundo afirma a denúncia.
Armado com uma espingarda escopeta, calibre 12, e uma pistola Beretta 9mm., Curió teria disparado três tiros. Um dos disparos atingiu nas costas Laércio Xavier, que morreu no local. Outro tiro atingiu a mão de Leonardo, que, capturado pelo grupo e mesmo ferido, foi obrigado a mostrar quais as chácaras que haviam sido furtadas e onde estavam guardados os objetos subtraídos. O Ministério Público denunciou a todos por homicídio qualificado, pela morte de Laércio, e pelo crime de lesões corporais, causado pelo disparo que atingiu Leonardo Xavier.

DEFESA
Os réus alegaram legítima defesa, afirmando que havia outra pessoa com as vítimas e foram efetuados disparos de arma de fogo contra eles, momento em que Sebastião Curió teria efetuado um disparo com a escopeta e dois com a pistola 9 mm. O juízo de primeiro grau, porém, rejeitou a tese de legítima defesa, por considerar a inexistência, nos autos, de qualquer indício de que haveria uma terceira pessoa no local dos disparos ou mesmo que as vítimas estivessem armadas.
Com relação aos policiais, a sentença concluiu que haveria indícios de que estariam atendendo a um pedido pessoal do ex-militar e ex-parlamentar Curió (que havia sido deputado federal, eleito com o voto dos garimpeiros de Serra Pelada), pois não havia situação de flagrante e nenhuma investigação policial poderia contar com a colaboração de um cidadão comum portando armamento pesado, no caso, o próprio Curió, armado com escopeta calibre 12, capaz de derrubar até um elefante. (R.T.)

Prefeito alega que agiu em legítima defesa
As Câmaras Criminais Reunidas do Tribunal de Justiça do Estado (TJE) decidiram, em sessão no dia 9 abril deste ano, julgar o processo criminal contra o coronel reformado do Exército e atual prefeito de Curionópolis, Sebastião Curió (DEM). O réu vem alegando legítima defesa. 'Agi em legítima defesa contra uma quadrilha que invadiu minha propriedade e atirou em um filho meu. Acionei a polícia e fomos recebidos a tiros', declarou Curió, dias atrás, à Imprensa, em Curionópolis. Porém, para o promotor de Justiça Miguel Baía, que apresentará o libelo acusatório contra Sebastião Curió, os autos processuais e a denúncia do Ministério Público de Brasília demonstram a existência de indícios suficientes do envolvimento, responsabilidade e intencionalidade do réu na morte e lesão praticadas contra os dois adolescentes.
Os filhos do prefeito, Sebastião Curió Rodrigues de Moura Júnior e Antonio Cesar Nóbrega de Moura, e os dois policiais civis já foram julgados pelo Tribunal do Júri em Brasília e absolvidos. Resta apenas o julgamento de Sebastião Curió, que, na condição de atual prefeito do município de Curionópollis, goza da prerrogativa de foro privilegiado, razão pela qual será julgado, em julgamento técnico, pelos desembargadores das Câmaras Criminais Reunidas do TJE. Ex-deputado federal, de 1983 a 1987, Sebastião Curió Rodrigues de Moura foi um dos chefes militares que atuou na repressão à guerrilha do Araguaia durante o regime militar. No início da década de 80, foi nomeado interventor do garimpo de Serra Pelada pelo então presidente da República, general João Baptista Figueiredo.

Raul Thadeu, da Redação.
Fonte: Jornal “O Liberal” on-line. Edição: ANO LXII - Nº 31.965. Belém, Domingo, 16/12/2007.

12 dezembro 2007

Leilão no rio Madeira se aproxima e preocupa ribeirinhos

A construção de duas hidrelétricas no rio Madeira, em Rondônia, fará com que dois povoados desapareçam. O primeiro será Teotônio, que será inundado pelo reservatório da hidrelétrica Santo Antônio, a primeira a ser licitada. A licitação ocorrerá por meio de leilão no próximo dia dez [vencido pelo Consórcio Madeira Energia, liderado pelo Grupo Odebrecht e pela estatal Furnas]. A usina Jirau deverá ter seu leilão no início de 2008.
A proximidade dos leilões preocupa o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB). O movimento estipula que as hidrelétricas do Rio Madeira deverão desalojar mais de dez mil pessoas. Os Estudos de Impacto Ambiental e o Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima) elaborados pelas empresas Furnas e Odebrecht previam apenas três mil pessoas. De acordo com o coordenador nacional do MAB, Wesley Lopes, as famílias ainda não sabem para onde irão.
“As audiências públicas não deram garantia de nada. O que eles prometem, que é promessa, é uma indenização financeira. Mas não fala que área vai ser, onde vai ser. Eles não apresentam isso. E aqui em Rondônia não há área de assentamento, eles não prometeram assentamento. E há muita insegurança das famílias, porque de garantia não tem nada”.
Além do desalojamento, a população ribeirinha também deve sofrer com a proliferação do mosquito da malária e com impactos na pesca. O próprio EIA/Rima prevê que 21 espécies de peixes vão desaparecer.
Wesley lembra que a população urbana também será impactada. Haverá o deslocamento de milhares de pessoas para a cidade. Poderá haver infiltração de mercúrio nos lençóis freáticos que fornecem água para Porto Velho. As construções no leito do Rio Madeira deverão remexer o mercúrio depositado no local, poluído devido às atividades de garimpo.

Vinicius Mansur, da Radioagência NP
Fonte: http://www.radioagencianp.com.br/index.php?option=com_content&task=view&id=3491&Itemid=1

Desmatamento no Pará avança inclusive em áreas protegidas

O Sistema de Alerta de Desmatamento do Instituto Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) mostra que o desmatamento no estado do Pará aumentou nos meses de agosto a outubro, comparado com o mesmo período do ano passado. Nestes três meses, foram desmatados quase 800 quilômetros quadrados de áreas de florestas.
Segundo um dos coordenadores do Imazon, Adalberto Veríssimo, o fato é preocupante principalmente porque a devastação ocorre em áreas protegidas.
“O desmatamento está ocorrendo inclusive em unidades de conservação e em terras indígenas que é onde não deveria ocorrer nenhum desmatamento. A nossa maior preocupação é com o comportamento do desmatamento absolutamente ilegal nessas áreas”.
Só no mês de setembro, 21% de toda área desmatada no estado do Pará ocorreu dentro das reservas. O desmatamento está ligado principalmente à expansão da pecuária na região.
Segundo Adalberto, o único desmatamento permitido seria dentro de áreas privadas com licenciamento ambiental. Neste caso é permitido desmatar 20% da propriedade. No entanto, o pesquisador afirma que a prática de devastação de florestas no Pará ocorre de forma bem diferente.
“Todo desmatamento do Pará é ilegal. Só pode fazer desmatamento autorizado com licenciamento ambiental. Desmatamento em unidades de conservação e terras indígenas é por lei, ilegal. E nas outras áreas, que seria as áreas privadas, não há nenhum sistema que autorize porque as maiores partes dessas propriedades não estão cadastradas”.

Juliano Domingues, da Radioagência NP
Fonte: http://www.radioagencianp.com.br/index.php?option=com_content&task=view&id=3494&Itemid=43

04 dezembro 2007

Governo ajuda madeireiras a devastar a Amazônia (Parte 1)

A enorme maioria das terras na Amazônia são públicas. E a enorme maioria das terras públicas na Amazônia está grilada. O roubo de terras, de tão comum, banalizou-se e, não raro, é tido como ato heróico: a prova de espírito desbravador e bandeirante, do empreendedor que desafia as maiores adversidades para levar à selva o progresso e o desenvolvimento.
Mesmo quando esse “empreendedor” rouba territórios indígenas e de outros povos da floresta, valendo-se sempre de muita violência, há quem defenda que, ao expropriar essas populações e relegá-las a um subemprego, fazem um grande bem, salvando-as de seu modo pré-histórico de mísera existência e promovendo-as à moderna condição de empregadas. Ou seja, ao roubarem-lhes tudo, os “empreendedores” da Amazônia estariam desempenhando uma ação “civilizatória”.
Em Mato Grosso, a tomada de grande parte dos territórios das populações originárias – e um longo enredo de massacres testemunha a “metodologia” adotada – acabou sendo legitimada por tortuosos caminhos. Aliás, nesse enredo, foi expedida a documentação a muitas áreas onde hoje estão os campos da soja, nosso “orgulho nacional”, o paradigma do agronegócio.
Em estados como o Pará e o Amazonas, apesar de imensas extensões estarem controladas por grileiros, eles ainda não conseguiram “esquentar” a apropriação. A terra continua formalmente em nome da União ou dos estados. Isso não lhes causa maiores problemas. Vendem seus bois, soja, arroz ou qualquer outra coisa que plantem ou criem sem que ninguém pergunte se a área onde isso foi produzido é documentada ou se é terra pública ilegalmente tomada. Até para a obtenção de financiamentos, a grilagem não é empecilho. Quando os bancos públicos endurecem um pouco, pode-se obter recursos com a Cargill, por exemplo, que patrocinou na região de Santarém a derrubada de florestas primárias e o plantio de soja em áreas sem nenhuma documentação de propriedade, no mais claro incentivo à grilagem e ao crime ambiental.
Nesse sentido, a extração madeireira seria diferente do boi e da soja: para derrubar e transportar madeira há que se ter a devida licença e, para isso, teoricamente, seria necessária a documentação fundiária. Porém, a complacência de sucessivos governos com a grilagem decidiu que seria rigor excessivo exigir a prova de propriedade da terra para se conceder a autorização para extração madeireira. Assim foi até 2003. O saque das florestas públicas em benefício de uma meia dúzia de madeireiros era oficialmente licenciado.
A partir de 2004, o Ibama altera sua conduta, de modo que qualquer Plano de Manejo Florestal (PMF) só será aprovado caso o requerente apresente o título de propriedade da terra. Aliás, nada além do que determina a lei. No final desse ano, a direção nacional do Ibama recomenda ainda o cancelamento dos PMF que houvessem sido aprovados em terras não tituladas.
O então gerente do Ibama em Santarém-PA, Paulo Maier, foi o único a cumprir a recomendação, enfrentando, por conta disso uma enorme pressão de madeireiros e grileiros. Os madeireiros queixavam-se de que o setor mergulharia em uma terrível crise por conta do posicionamento do Ibama. Ironicamente, a própria queixa era uma auto-declaração de que todo o setor atuava na ilegalidade, roubando madeira de terras públicas.
A “solução final” para perenizar o saque das florestas públicas e efetivar sua entrega definitiva ao madeireiro já estava a caminho: a Lei de Gestão de Florestas Públicas. Porém, todos sabiam que ainda se demorariam alguns anos para pô-la em prática. Assim, o milionário e ilegal agronegócio da madeira no oeste do Pará começa o ano 2005 em xeque. O que ninguém sabia era que, em bastidores, costurava-se, sob o manto da reforma agrária, uma nova forma para garantir ao agronegócio, maneira para que seguisse se apoderando das florestas públicas.

“Um uso criminoso da reforma agrária”

Em 2005, o Incra inaugura a Superintendência Regional de Santarém (SR-30) e inicia uma colossal criação de assentamentos. Pedro Aquino de Santana, o superintendente, alardeia ser conhecido por Lula pela alcunha de “o homem da reforma agrária”. A maioria dos assentamentos criados são da modalidade Projeto de Desenvolvimento Sustentável (PDS), que, entre outras particularidades, mantém no mínimo 80% do assentamento como área de uso coletivo e administrado por uma associação (teoricamente) formada pelos assentados.
Simultaneamente à produção em massa de assentamentos, os madeireiros voltam à cena como os grandes paladinos da reforma agrária. A imprensa local registra as mais curiosas declarações: “presidente do Sindicato de Indústrias Madeireiras do oeste do Pará (Simaspa) diz que o setor madeireiro é o maior interessado na implantação dos PDS”; “madeireiros concordam em abrir mão do direito às suas posses para a criação de PDS”; “madeireiros disponibilizam 100.000 hectares para a criação de PDS”; “Segundo o Simaspa, as indústrias madeireiras já passaram ao Incra as coordenadas para a implantação dos PDS”; (Jornal de Santarém e Baixo Amazonas, dez. 2005).
A devoção dos madeireiros à causa da reforma agrária chega ao ponto desses abnegados oferecerem-se a dividir com o Incra os custos para criação de assentamentos. Segundo um servidor da SR-30 que pediu para não ser identificado, “para que as equipes fossem a campo fazer os trabalhos para criação de assentamentos, os madeireiros ofereciam e garantiam a verba para combustível, manutenção de veículos e mais o que fosse preciso”.
Por trás de tamanho altruísmo, ocultava-se um pacto que o geógrafo Ariovaldo Umbelino de Oliveira qualificou como “um uso criminoso da reforma agrária”: seriam usados assentamentos como área regularizada em termos fundiários para a extração de madeira. O governo federal conseguia a façanha de usar a reforma agrária para um fim diametralmente oposto: garantir a apropriação dos recursos pelo madeireiro, mesmo que isso viesse em prejuízo de camponeses sem-terra e povos da floresta.

Maurício Torres é pesquisador e trabalha na região oeste do Pará.
Fonte: http://carosamigos.terra.com.br/nova/ed128/so_no_site_geral_torres.asp

Obs 1: Foto/Imagem capturada da fonte acima citada (O PDS Brasília, no distrito de Castelo dos Sonhos, em Altamira (PA), foi batizado em homenagem ao sindicalista assassinado, Jorge Bartolomeu (o Brasília), o assentamento contorna toda á área já desmatada por grileiros (áreas rosas) e é implantado completamente em área de florestas virgens).

Obs 2: Este artigo foi dividido em 3 partes, leia abaixo a segunda parte do mesmo.

Governo ajuda madeireiras a devastar a Amazônia (Parte 2)

“Olha, os assentamentos podem resolver o problema do setor madeireiro lá na região”
Diretor do Incra abre esquema em gravação.
Os bastidores do esquema são explicados pelo próprio diretor Nacional de Programas do Incra, Raimundo Lima. Na conversa gravada e transcrita abaixo, Lima conta de uma reunião, em novembro de 2004, envolvendo madeireiros e o primeiro escalão do Incra e do Ministério do Meio Ambiente, onde tudo foi tramado:
“No momento daquela reunião foi provada a inviabilidade de a Lei de Gestão de Florestas Públicas resolver de imediato o problema dos madeireiros e foi efetuada uma sugestão. Primeiro: o, hoje, diretor geral do Serviço Florestal Brasileiro, o Tasso [Azevedo] [...] e também o doutor Paulo Capobianco, que hoje é secretário-geral do Ministério [do Meio Ambiente] e na época era secretário de Biodiversidade, fizeram uma sugestão: ‘quantos assentamentos o Incra tem lá na região?’ O superintendente respondeu e aí eles disseram: ‘Olha, os assentamentos podem resolver o problema do setor madeireiro lá na região’. Aí, os madeireiros disseram: ‘Olha, mas nesses assentamentos que tem lá no Pará não existe mais madeira, não vai cobrir as nossas necessidades, não vai resolver o nosso problema... Mas o Incra vai criar assentamentos lá?’ [...] Aí, o Rolf já anunciou a criação da nova superintendência. E o Incra cria assentamentos lá na região, em terras públicas, e esses assentamentos serão as áreas que vão ofertar legalmente madeira para o setor madeireiro.”
Consultado sobre as palavras de Raimundo Lima, Tasso Azevedo é taxativo: “Não partiu de mim a idéia de socorrer o setor madeireiro do oeste do Pará por meio da criação de novos assentamentos em áreas com cobertura florestal primária”. Difícil saber quem mente, mesmo porque, na época da reunião mencionada por Lima, a imprensa registrou inúmeras declarações de Tasso em defesa dos madeireiros que exploravam madeira em terra pública. De qualquer forma, é impressionante como tudo o que ronda o Incra no Pará é obscuro e contraditório, sequer se harmonizando com o que diz o próprio governo federal.
Embora a autarquia oficialmente continue a fingir que nada disso existe, o Ministério Público Federal (MPF) já conhece bem a ligação promíscua entre o Incra e os madeireiros no oeste do Pará. O procurador da República, Felipe Fritz Braga, conta que em setembro último, em reunião envolvendo o MPF e representantes do Incra, ficou evidente a adoção de uma política para potencializar a exploração madeireira revestindo-a falaciosamente de reforma agrária: “Raimundo Lima disse ali abertamente para os quatro procuradores da República presentes que, na verdade, a política de criação de assentamentos pelo Incra em Santarém se inseria numa política mais ampla da autarquia, de aumentar de 2 por cento para 10 por cento a participação do Brasil no mercado internacional de madeira tropical”.

Madeireiro: “cliente da reforma agrária”
Nessa reforma agrária voltada à insaciável voracidade dos madeireiros, o Incra ignorou, até, a incompatibilidade entre os interesses dos madeireiros e dos trabalhadores sem terra. Para os primeiros, era necessário que os assentamentos fossem implantados em áreas com estoques ainda intocados de madeiras nobres, ou seja, nas distantes florestas primárias ainda não saqueadas. Porém, justamente essa condição eliminava qualquer chance de as famílias se instalarem no local.
Basta sobrepor o mapa dos novos assentamentos a uma imagem de satélite para se ver a que lado pendeu o Incra. Os PDS foram criados em distantes áreas inabitadas, e, também por serem de muito difícil acesso, cobertas por florestas virgens. A situação é absurda. Saindo-se de Santarém, por exemplo, viajam-se centenas de quilômetros atravessando áreas completamente desmatadas por gado e soja. Nesses locais não foram criados assentamentos. São latifúndios onde, muitas vezes, unem-se crime ambiental, trabalho escravo e grilagem de terras públicas, terras do Incra que foram federalizadas para a reforma agrária. A retomada dessas terras e sua destinação à reforma agrária é a mais evidente – e a mais negligenciada – obrigação do Incra. São áreas próximas aos centros urbanos e às estradas, com melhores condições de infra-estrutura e logística, onde a criação de assentamentos, além de viável, não traria dano ambiental e ainda poderia gerar alguma recuperação, como a das matas ciliares, por exemplo.
O problema é que isso não atenderia o madeireiro. Em 2005 e 2006, não há um único assentamento no oeste do Pará que tenha sido resultado da retomada da posse de terras griladas e desmatadas. A própria base cartográfica do Incra mostra como os assentamentos contornam o pasto do grileiro com preciso cuidado e ficam limitados à área coberta por florestas onde o grileiro não desmatou.
Os madeireiros determinaram os locais onde deveriam ser implantados os assentamentos. Caso exemplar é o processo em que a madeireira Precious Woods Belém Ltda. manifesta interesse pela criação de um assentamento e indica as coordenadas geográficas para tal.
Na área indicada pela madeireira suíça e em seu entorno, foi criado o gigantesco PDS Liberdade I, com 450.000 hectares, capacidade para 3.500 famílias, das quais 942, segundo o Incra, já estão assentadas. Porém, o que acontece é um perfeito caso de assentamento fantasma. A área é ocupada por florestas primárias e não há nenhuma das famílias "assentadas" em seu interior, mas apenas a madeireira em plena atividade.
A madeireira manda. Escolhe e determina, de acordo com a sua conveniência, o local do assentamento, o modo de uso da terra e o número de famílias que devem ser assentadas. Ao Incra resta acatar as determinações e providenciar o necessário à sua efetivação.

Compromissos de campanha
Ariovaldo Umbelino de Oliveira aponta também para o envolvimento do governo do estado do Pará. “A governadora Ana Júlia Carepa assumiu uma série de compromissos políticos com os madeireiros durante sua campanha eleitoral. Isso está fartamente registrado na imprensa do Pará e mostra uma articulação política a partir do Incra, do Ministério do Desenvolvimento Agrário e do governo do estado do Pará”, comenta o geógrafo.
O MPF também levantou fatos que sinalizavam o próximo envolvimento entre o governo estadual e as madeireiras. “Em meados deste ano, em ação civil pública do MPF, foi suspenso um acordo entre o Incra e a Secretaria Estadual de Meio Ambiente do Pará, pelo qual seria possível a exploração de madeira em assentamentos que não tivessem qualquer licença ambiental. Portanto, o governo federal deixa o assentamento inviável, mas a exploração de madeira nele é garantida. É a política de reforma agrária na Amazônia garantindo o estoque madeireiro das empresas, mas criando o minifúndio governamental e jogando a população rural em áreas onde a ocupação é inviável”, explica o procurador Braga.
A tomar pelas declarações de Valmir Ortega, secretário do Meio Ambiente do Pará, realmente, parece não haver lei – do céu ou da terra – que o governo estadual não esteja disposto a descumprir para que, de qualquer forma, seja liberada a exploração madeireira.

Maurício Torres é pesquisador e trabalha na região oeste do Pará.
Fonte: http://carosamigos.terra.com.br/nova/ed128/so_no_site_geral_torres.asp

Obs: Este artigo foi dividido em 3 partes, leia abaixo a terceira e ultima parte do mesmo.

Governo ajuda madeireiras a devastar a Amazônia (Parte 3)

Os números da reforma agrária
Não foi somente o madeireiro que lucrou com o grande esquema. O governo Lula divulgou números recordes de famílias assentadas pelo Incra referentes ao seu primeiro mandato. Os assentamentos de papel da SR-30 tiveram participação capital nas metas anunciadas como cumpridas pelo governo. Em 2006, 25% das famílias beneficiadas pelo reforma agrária foram homologadas pela SR-30.
A demencial criação de assentamentos em áreas de floresta primária foi al´me de contentar o madeireiro, esse importante financiador de campanha, e também alimentou a burlesca fantasia dos números de assentados no II Programa de Reforma Agrária (PNRA) do governo Lula.
O programa Fantástico (TV Globo) e um Relatório Denúncia publicado pelo Greenpeace revelaram, em agosto último, que muitas famílias assentadas pela SR-30, na verdade, simplesmente não existiam. Eram mentira. Os assentamentos foram criados apenas no papel e um número imenso de famílias foi homologado em assentamentos que factualmente não existem, ou existem em lugares dos quais nunca ouviram falar e a dias de viagem de onde vivem. Muitas delas sequer sabem que constam como assentadas nos cadastros do Incra. Enfim, a terra não foi entregue às famílias que o Incra computou como assentadas. No interior dos assentamentos só se encontra uma voraz exploração das madeireiras.
Nos processos de criação dos assentamentos, as normativas que regulamentam a criação de assentamentos foram gritantemente ignoradas. Para Braga, esse atropelo cumpriu a função de suprir a inatividade de outras superintendências. “Toda a estrutura da superintendência foi usada para gerar números artificiais de assentados em 2005 e 2006. O Incra assumiu certas metas no II Plano Nacional de Reforma Agrária que não vinham sendo atendidas por outras superintendências Brasil afora”, explica o procurador da República.
Um servidor da SR-30 que pediu para não ser identificado conta que “as metas da SR-30 foram crescendo durante o ano de 2006. Inicialmente eram 15.000 famílias, depois aumentaram para 20.000 e pouco depois para 30.000. Na última semana do ano chegaram a 36.000. O objetivo sempre foi muito claro, era simplesmente para o governo dizer para a sociedade que tinha cumprido as metas do II PNRA”. O procurador Felipe Fritz Braga confirma a informação: “a cada viagem a Brasília, o superintendente trazia um novo aumento das metas”.
Os próprios servidores da SR-30, por meio de sua associação, a Assera (Associação dos Servidores da Reforma Agrária), confirmam o quadro generalizado de caos: “O mais absurdo de tudo é que assentamentos foram criados sem nenhuma das peças técnicas obrigatórias. Há processo em que há um oficio pedindo a formalização do próprio processo e logo em seguida a portaria de criação. O trâmite normal do Incra envolve desde a vistoria da área, consecução dos laudos de vistoria, mapas temáticos, pareceres de chefes, pareceres jurídicos, parecer de cartografia para evitar sobreposição de áreas de reservas ambientais, de terras indígenas, de unidades de conservação. A direção do Incra sabia disso e fingia que não sabia. Antes de os técnicos entregarem qualquer coisa dizendo se o assentamento era viável ou não, já existia uma portaria dizendo: ‘criado’ ”.

“Uma clara demonstração de desconsideração dos normativos internos”
“O nível de irregularidades nos processos de criação de assentamentos é assustador”, relata o Procurador da República, Felipe Fritz Braga, “a pressão sobre técnicos e servidores para que atropelassem todas as normas internas da autarquia foi tremenda”.
Apesar dos diretores nacionais, do Presidente do Incra e do ministro do MDA continuarem fingindo que nada acontece, para o Incra de Brasília, isso não é novidade alguma. Em junho último, um relatório interno do próprio Incra sobre a situação da SR-30, documenta um quadro surreal. No lugar dos diversos estudos de viabilidade e procedimentos formais, encontrou-se processos de criação de assentamentos “constituídos por apenas 3 páginas (memorando de formalização do processo, folha escrita ‘confere’ e cópia da Portaria de criação do projeto) numa clara demonstração de desconsideração dos normativos internos”, conforme o relatório do Incra.
Enquanto o presidente da autarquia e o ministro do MDA continuam o “faz de conta” que não existe nada, um grande grupo de servidores recém-ingressos no Incra e lotados na SR-30 reconhece o quadro de tramóias e se opõe a ele. À medida que foram tomando consciência das irregularidades em curso, assumiram, por meio da sua associação (Assera), uma postura de obediência às normas de execução da reforma agrária e recusaram-se a cumprir ordens que as contrariassem. Não fosse a postura desses jovens servidores, haveria um quadro ainda mais grave e, pior, em plena atividade.
Por conta de uma ampla gama de irregularidades, em 27 de agosto, a Justiça Federal atende liminarmente um pedido do MPF e interdita 99 assentamentos no oeste do Pará, que somam 30.000 km2, área equivalente ao estado de Alagoas.
Em 17 de setembro, o MPF tem atendido outro pedido de liminar e a Justiça Federal afasta do cargo cinco funcionários da SR-30, entre eles o próprio superintendente, Pedro Aquino de Santana, “homem da reforma agrária” de Lula. Acusação: envolvimento em toda sorte de improbidades administrativas.

“É por acreditar na legitimidade dos trabalhos executados na região que continuaremos...”
Toda a enorme tramóia é mais do que evidente e a situação do Incra no Pará perante a Justiça é, no mínimo, desconfortável. Ainda assim, o presidente do Incra, Rolf Hackbart, em comunicado oficial acerca do afastamento do superintendente da SR-30, Pedro Aquino de Santana, declara que: “É por acreditar na legitimidade dos trabalhos executados na região que continuaremos as ações planejadas e vamos recorrer da liminar expedida”. A nota soa como ameaça, especialmente quando se sabe que “ações”, para a SR-30, têm significado a fabricação de números para a reforma agrária, atropelando as leis e as normativas da autarquia e, principalmente, criando assentamentos de papel para suprir a demanda do setor madeireiro no oeste do Pará.
O procurador da República em Altamira (PA), Marco Antonio Delfino, frente ao posicionamento de Hackbart, questiona como pode ser considerado legítimo uma situação que demandou, no último mês, a alocação de cerca de R$ 3 mi para que se corrigissem as inúmeras irregularidades cometidas. “A declaração de Hackbart comprova a improbidade: seja nos vícios cometidos na criação dos assentamentos; seja na liberação dos recursos para corrigir o que não está irregular”, completa o procurador.
Mas os sinais de que a política de reforma agrária voltada ao madeireiro irá continuar não fica na retórica de Hackbart. Com o afastamento de Pedro Aquino de Santana, o diretor Nacional de Programas, Raimundo Lima, foi nomeado como superintendente interino. O mesmo Raimundo Lima que participara em 2004 da reunião comentada acima, onde germinou o projeto de fazer assentamentos para resolver o problema dos madeireiros do oeste do Pará.
A nomeação é mais uma manifestação da postura de não reconhecimento do Incra nacional quanto às evidentes e públicas ilegalidades da SR-30. Como explica Braga, “reunimos depoimentos que apontam inclusive para a presença de Raimundo Lima na superintendência de Santarém ao longo dos trabalhos de criação desenfreada dos assentamentos nos dois últimos anos. Elogiava, na presença de todos os servidores, laudos agronômicos de péssima qualidade, como modelo de trabalho”.
Logo que acumulou o cargo de superintendente interino, Raimundo Lima anunciou que um dos objetivos do Incra é o desmatamento zero nos assentamentos. Mais um desaforo ao raciocínio de todos. Ora, como pensar em desmatamento zero se os assentamentos foram criados em meio a florestas virgens? Acaso o Incra pensa em transformar toda a agricultura familiar e a relação com a terra dos beneficiários da reforma agrária em uma atividade madeireira?
O desmatamento zero nos assentamentos seria absolutamente viável caso fosse feita “reforma agrária” no oeste do Pará. Caso o Incra retomasse as imensas porções de terras públicas ocupadas e já desmatadas por grileiros e lá criasse os assentamentos. Porém, parece que isso geraria dois grandes problemas: desagradaria aos grileiros e não atenderia a necessidade dos madeireiros.

Maurício Torres é pesquisador e trabalha na região oeste do Pará.
Fonte: http://carosamigos.terra.com.br/nova/ed128/so_no_site_geral_torres.asp

25 novembro 2007

Pará – Comunidades Quilombolas debatem sobre direitos na semana da Consciência Negra

Na Amazônia existem infinitas amazônias, com seus redemoinhos de gentes, igarapés, rios, um mundo em recursos naturais, história de vida, morte, violações e pelejas. Muitas “gentes” existem na Amazônia, que por ignorância, desconhecimento ou puro preconceito permanecem marginais, sem reconhecimento dos direitos que lhes cabem, filtrados sob a lente do exótico aos olhos dos estrangeiros de cá e de lá. Ou tratados como meros ícones do atraso ante a dinâmica do capital, apenas para gastar palavra em voga.
Na perspectiva de aprofundar o conhecimento na defesa de seus territórios, manifestações culturais e informações neles gerados, cerca de 50 remanescentes de escravos da região guajarina e vizinhança (Acará, Moju, Abaetetuba, Igarapé Mirim, Tailândia, Concórdia, Bujaru, Tomé Açu) passaram o dia 16 de novembro numa oficina com ênfase sobre direitos das comunidades negras.
A oficina integra o projeto Nova Cartografia Social da Amazônia. A reunião ocorreu no espaço Sagrada Família, cravado no município de Ananindeua, região metropolitana de Belém. O advogado Aton Fon Filho, ligado a Rede Social de Justiça e Direitos Humanos, organização com sede em São Paulo, foi o facilitador. A Comissão Pastoral da Terra (CPT) e a UNAMAZ, Associação de Universidades da Amazônia, agência multi-lateral de cooperação organizaram o evento. A cartilha “Quilombolas Direito ao Futuro”, serviu de apoio no estudo sobre os aspectos legais que conformam os direitos quilombolas na Constituição, além de estudos sobre os tratados internacionais em que o Brasil é signatário.
No mesmo dia, só que no Palácio dos Despachos do Governo, a governadora Ana Júlia Carepa assinava o termo de adesão ao Fórum Intergovernamental de Promoção da Igualdade Racial, ladeada pela ministra Matilde Ribeiro da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República e representantes de entidades do movimento negro.
Territórios em disputa – O geógrafo, negro e baiano, Milton Santos ao analisar o totalitarismo do capital em escala planetária revela que a cada dia a sanha do mesmo tende a subjugar territórios e os recursos naturais neles existentes em qualquer canto. No debate sobre os direitos dos quilombolas no Pará a questão foi o centro do debate. Os depoimentos de quilombolas da região de Jambuaçu, que reúne 14 comunidades do município de Moju é a melhor expressão sobre o assunto. As obras de infra-estrutura e grandes projetos despontam como agentes contrários a garantia dos territórios das populações consideradas tradicionais na Amazônia.
No caso particular de Jambuaçu que é um afluente do rio Moju, a refrega com grandes empresas data da década de 1980, com a implantação de grandes empresas, como a Capim Caulim, a Pará Pigmentos e a monocultura do dendê pela empresa Marborges. Nos anos mais recentes a tensão tem se desenvolvido com a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD). O centro nervoso reside no mineroduto que transporta bauxita oriunda do município de Paragominas, matéria prima para a produção de alumina, que é usada para a produção de alumínio, e a ampliação da linha de energia.
O mineroduto e o linhão alimentam as fábricas da CVRD no município de Barcarena. No caso do mineroduto a construção ocorreu entre os anos de 2000 a 2004, já o linhão de energia data de 2005. Estima-se em 15 km a área afetada e que 58 famílias perderam terras agricultáveis. A invasão da companhia foi realizada à revelia dos moradores. A matriz dessa modalidade de projeto tem sido a democratização das mazelas sociais e ambientais onde são instalados.
Tensões no quilombo - Os quilombolas informaram que por conta da poluição do rio pelas empresas que exploram caulim, houve redução do pescado e a água é imprópria para uso. No caso da CVRD o indicador foi a derrubada de 150 castanheiras produtivas. Os militantes das comunidades negras estimam em 674 famílias afetadas pelos empreendimentos da companhia. O ápice da tensão entre as partes foi registrado em janeiro de 2006 com a derrubada de uma torre de transmissão.
Uma nova questão desponta como tensão no mundo do povo de Jambuaçu. Trata-se da relação entre os quilombolas e pesquisadores. Na reunião do dia 16, alguns representantes tornaram público o descontentamento sobre o resultado do curta-metragem “Filhas de Jambuaçu”. Militantes da comunidade informaram que deram depoimentos sem a devida informação que as mesmas seriam para a mineradora.
O curta indicado para o concurso internacional sobre etnografia não foi apresentado à comunidade, que só veio a conhecer o resultado após mediação de um militante que acessou uma cópia do mesmo em Belém. Uma moradora da área declarou que todas as informações sobre as tensões entre a companhia e os quilombolas não são tratadas no filme. Os quilombolas informaram ainda que não autorizaram uso de seus depoimentos e imagens para o professor Silvio Figueiredo, autor do curta. A polêmica deve ganhar a justiça, prometem os quilombolas. O curta integra projeto do Museu Paraense Emilio Goeldi de Educação Patrimonial, com apoio financeiro da companhia.
Aparando as arestas e outras tensões - Com mediação do Ministério Público Federal (MPF), vários órgãos estaduais e a CPT, a empresa encontra-se obrigada a garantir manutenção da Casa Família Rural (CFR), produção de estudo através da Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA) sobre as potencialidades produtivas do território quilombola, assistência para o funcionamento do posto de saúde e pagamento de dois salários mínimos por dois anos para as 58 famílias afetadas diretamente pelo linhão e garantia de outras obras de infra-estrutura.
Outras tensões entre grandes companhias e as comunidades quilombolas ocorrem a oeste do estado, com o projeto de exploração de bauxita da empresa estadunidense ALCOA, no município de Juruti. A voz dissonante no processo de licenciamento tem sido do promotor estadual Raimundo Moraes, que tem lançado luz sobre as omissões nos estudos de impacto ambiental.
Na região do arquipélago do Marajó a situação de tensão ocorre com os fazendeiros que costumam impedir a circulação dos quilombolas através de cercas. Já no quilombo do Cacau, localizado no município de Colares, o impasse gira em torno da empresa Empasa, que explora palmito na região. Os moradores informam que desde 1999, quando o proprietário da empresa soube do reconhecimento da área como remanescente de quilombo, ergueu cercas e contratou capataz.
A titulação das terras é o grande desafio na caminhada de garantia dos direitos das comunidades. Avelino da Conceição Almeida, neto e filho de escravos, morador do Cacau declara que “não largo o lugar por nada. Aqui nasci e cresci, criei meus 17 filhos”. É ele que informa a derrubada de pelo menos 450 árvores, entre elas samaúma, marupá, atamã, pela Empasa.
Quilombos no Pará – Faz 12 anos que a comunidade quilombola de Boa Vista recebeu a titulação do seu território de 1.125 hectares localizado no município de Oriximiná, oeste do Pará, que concentra boa parte das 295 comunidades estimadas no estado. Foi a primeira comunidade a ser reconhecida no Brasil. Conforme o boletim Terra de Quilombo da Comissão Pró-Índio de São Paulo, datado de outubro de 2007, no Brasil há 79 territórios reconhecidos num total de 929.317,6437 hectares , que aglutina 9 mil famílias.
O Pará desponta em primeiro lugar com 34 titulações, seguido do Maranhão, com 22. 44 processos solicitando reconhecimento dos territórios tramitam no Instituo Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) do Pará até setembro de 2007. O processo costuma ser demorado por causa de um conjunto de exigências, como o estudo antropológico para verificar a legitimidade da reivindicação. O estado do Pará mantém o projeto Raízes direcionado para as comunidades, onde não raro há confrontos entre as demandas da comunidade e os técnicos do governo.
Na avaliação dos participantes da oficina do dia 16, o reconhecimento do território é apenas o primeiro passo no processo de efetivação dos seus direitos. Os quilombolas salientam para a necessidade de ação conjunta em inúmeras frentes para a efetivação dos direitos e a emancipação dos negros (as) no país.
Um dos impasses pontuados é a lentidão do estado. Conforme dados do Instituto de Estudos Sócio-econômicos (INESC), o projeto Brasil Quilombola do governo federal até 13 de junho havia aplicado apenas 6,39% do orçamento de 2007 para ações em favor dos moradores de comunidades remanescentes de quilombo, do total de 202 milhões.

Rogério Almeida é colaborador da rede www.forumcarajas.org.br
Correio eletrônico:
araguaia_tocantins@hotmail.com

17 novembro 2007

Índios de países vizinhos buscam refúgio no Brasil

Índios que antes costumavam vagar livremente pela Amazônia em países vizinhos agora buscam no Brasil refúgio contra guerrilheiros, madeireiros e empresas de petróleo.
Tribos de Peru, Colômbia e Venezuela estão deixando para trás suas terras ancestrais para viver com parentes distantes por aqui. Segundo líderes indígenas e funcionários do governo, eles acabam perdendo seus direitos básicos e enfrentam problemas com as autoridades.
No alto Rio Negro, extremo noroeste do Amazonas, pelo menos 400 índios entraram no território brasileiro fugindo da violência e do recrutamento pelas Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), segundo autoridades.
"As Farc dizem para eles: ou vocês aderem ou vamos matar sua família", afirmou Mauro Sposito, diretor da Polícia Federal para questões de fronteira. "Está ficando bastante feio para eles por lá, então eles vêm para o nosso lado."
Autoridades dizem que as Farc costumam recrutar índios para servirem de guias, mas a guerrilha raramente cruza a fronteira, para evitar as patrulhas brasileiras, e por isso as tribos se sentem mais protegidas saindo da Colômbia.
"Eles não têm documentos, então seus filhos não podem ir à escola e eles não têm qualquer outro benefício - não são cidadãos nem daqui nem de lá", disse André Fernando, diretor da Federação Indígena do Rio Negro.
Segundo ele, já houve casos de índios presos com documentos colombianos, mas sem os vistos necessários para ficarem no Brasil. Ele prevê um aumento no número de refugiados nos próximos meses, porque recentemente as Farc entraram em território venezuelano e começaram a provocar a saída dos índios de lá também.

PERUANOS NO ACRE
Quase 1.500 quilômetros a sudoeste dali, outros índios, com pouco ou nenhum contato com o mundo exterior, fugiram das empresas de petróleo e madeira para o Parque Nacional da Serra do Divisor, no Acre.
"Pode não haver uma guerra, mas há refugiados cujas vidas estão em perigo", disse Wellington Figueiredo, da Fundação Nacional do Índio (Funai) em Brasília.
Dois grupos de índios isolados do Peru, um deles com 100 membros, saqueou assentamentos ao longo do alto rio Envira, buscando roupas e comidas, segundo relatou por telefone José Carlos dos Reis Meirelles, que administra um posto da Funai na região da fronteira.
Meirelles teme confrontos violentos entre os caçadores e coletores nômades, expulsos de seus territórios habituais, e os índios sedentários e os brancos do lado brasileiro.
"Estamos perto de um desastre envolvendo mortos e feridos - precisamos agir rápido", disse ele.
A Funai disse ter alertado as autoridades peruanas para a situação, mas não recebeu resposta.
Em outubro, o presidente do Peru, Alan García, disse que a exploração de petróleo não deve ser prejudicada porque "criaram essa figura dos nativos não-contatados da Amazônia - presumidos, mas desconhecidos."
O Brasil oferece refúgio, mas seus próprios índios também perdem terras para agropecuaristas, madeireiros e garimpeiros. Muitas vezes são expulsos pela ameaça das armas para reservas superpovoadas ou favelas urbanas. "É triste o pouco espaço que há neste vasto continente para seus habitantes originais", disse a socióloga indígena Azelene Kaingang.

Por Raymond Colitt, da Reuters Brasil
Fonte: http://br.reuters.com/article/topNews/idBRB27937620071116?sp=true

15 novembro 2007

O MDA/INCRA e a reforma agrária no Pará (capítulo 02 – os personagens e os crimes)

No último artigo informei a todos que a reforma agrária do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (MDA/INCRA) está sendo usada criminosamente no estado do Pará (PA) e em toda a Amazônia. A reforma agrária transforma-se assim, em uma política do governo Lula para beneficiar os grileiros de terras públicas daquela região: os madeireiros e os pecuaristas.
Esta política está sendo objeto de processo na Justiça Federal do Pará e, o último ato da ação judicial foi o afastamento por 60 dias de seus cargos e funções do superintendente do INCRA no município de Santarém Pedro Aquino de Santana, e de quatro outros funcionários: Sílvio Carneiro de Carvalho (superintendente-adjunto), Bruno Lourenço Kempner (executor de Altamira), Luiz Edmundo Leite Magalhães (chefe da Divisão de Desenvolvimento), e Dilton Rego Tapajós (chefe da Procuradoria Jurídica). São “acusados pelo Ministério Público Federal de suposta prática de improbidade administrativa”, “tiveram quebrados seus sigilos bancário, fiscal e telefônico” e, “durante o período de afastamento, eles não poderão permanecer nas dependências privativas de funcionários e ficarão proibidos de acessar os sistemas de dados informatizados”. (www.pa.trf1.gov.br/noticias).
O Ministério Público Federal justifica a ação porque nestes projetos de assentamentos “os trabalhos eram executados de forma apressada, por conta da pretensão do superintendente de atingir metas ambiciosas, que inclusive tinham por finalidade suprir o fraco desempenho em outras superintendências do INCRA. Na cautelar, o MPF diz que os trabalhos do Incra estavam de tal forma vinculados ao cumprimento incondicional das metas que o superintendente Pedro Aquino chegou ao ponto de assinar, em outubro de 2006, diversas portarias de criação de assentamentos, tudo para que o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, então em campanha presidencial, pudesse mencionar em debate o alto desempenho do cumprimento de metas de reforma agrária. Quem assumiu o encargo de levar ao superintendente de Santarém a demanda de números de assentados foi a servidora Beronice Barros Freitas, da diretoria da autarquia em Brasília.”
Entre os exemplos dos desmandos está o PDS Cocalino, que “além de se sobrepor ao Parque Nacional da Amazônia, das 100 famílias homologadas na relação de beneficiários (RB), na comunidade há apenas 41 famílias ocupantes, sendo que destas, na realidade, apenas 26 ou 27 estão na relação de beneficiários (RB) efetivamente. E mais grave: embora a área reivindicada pela comunidade seja de 5.200 ha, com 52 famílias, o PDS, tal como criado, tem pouco mais de 2.600 ha, sendo que o mapa do assentamento feito pelo agrônomo responsável excluiu da área da comunidade uma área que vem sendo invadida pelo fazendeiro Valmir Climaco!” Por causa destes problemas denunciados, este assentamento foi cancelado em agosto último.
Em continuidade às denúncias dos crimes contra a reforma agrária que estão sendo feitos pelo INCRA, a revista Carta Capital em sua edição de 31 de outubro último, denunciou que “existem ao menos dois casos de beneficiários que não se encaixam no perfil de assentados. Maria Gorete Dantas Xavier é prefeita de Aveiro, no sudoeste do Pará, e teria recebido terras em 2005. Nélio Aguiar, médico e ex-secretário de Saúde de Santarém, foi contemplado em 2006. O fato é que tanto Maria Gorete quanto Aguiar afirmam nunca terem sido informados pelo Incra da homologação dos terrenos. O mais grave é que nenhum dos dois poderia ser contemplado, pois a prefeita é funcionária pública e o ex-secretário não é agricultor. E o pior: ela aparece como tendo recebido um financiamento de 5 mil reais, além de três liberações de 2,4 mil cada de uma mesma linha de crédito.” (Carta Capital, ano XII, n. 468, p. 36)
Dessa forma, a intervenção do MPF visa impedir estas ações “uma vez que a prática irregular pode eventualmente camuflar a obtenção de vantagens ilícitas como meio de agilização da distribuição de parcelas das terras públicas.” (www.pa.trf1.gov.br/noticias) Portanto, está envolvida de forma direta nos acontecimentos do Pará a direção nacional do INCRA.
Tanto este envolvimento é verdadeiro que o presidente do INCRA nomeou como substituto temporário do afastado superintendente de Santarém, ninguém mais, ninguém menos do que o senhor Raimundo de Araújo Lima, seu próprio Diretor Nacional de Programas. (DOU, Caderno 2, 19/10/2007, p. 33). Assim, assiste-se o próprio INCRA nacional “intervindo” na Superintendência de Santarém, para tentar garantir a continuidade de sua equivocada política de reforma agrária para o agronegócio.
Esta política foi apresentada pelo próprio Raimundo de Araújo Lima na 6ª Reunião da Comissão de Gestão de Florestas Públicas – CGFLOP, realizada na sala D do Anexo I do Palácio do Itamaraty, em Brasília, nos dias 08 e 09 de maio de 2007: “não existe, por parte do INCRA, nenhum problema com relação às empresas que se fixaram na Amazônia. E fomos extremamente tolerantes com relação à exploração florestal em terras públicas sem nenhuma autorização, algumas griladas e outras ocupadas irregularmente. Primeiro, nós verificamos, (que) ao invés de tratarmos da questão fundiária pura e simples, que aí teríamos que ter entrado com reintegração de posse, esse é (nosso) dever de ofício, (mas) não fizemos, discutimos (então) com o Ministério do Meio Ambiente, discutimos com o IBAMA, discutimos com as lideranças da região, analisamos a questão social e a questão econômica e elas, com certeza, sobrepuseram a questão fundiária, que era o fato de que você tem uma demanda por oferta legal de madeira, uma necessidade... Municípios como de Novo Progresso, com certeza, 90% da renda gerada ali vem do setor madeireiro e precisava encontrar uma forma de transição que possibilitasse as empresas manejar dentro das terras públicas e fizemos.” (Ata da 6ª. Reunião da Comissão de Gestão de Florestas Públicas – CGFLOP, Anexo 4) www.mma.gov.br
Como se pode ver “a raposa foi tomar conta do galinheiro”. E por quê? É que os madeireiros, diretamente interessados nesta política, estão cobrando a fatura. Mas, este é assunto para nosso próximo artigo, pois na Assembléia Legislativa do Pará já se discute a formação de uma CPI para o caso, e agora, a questão não é só do MDA/INCRA é também do MMA/IBAMA e do governo estadual do PT naquele estado.

Ariovaldo Umbelino de Oliveira é professor titular de Geografia Agrária pela Universidade de São Paulo (USP). Estudioso dos movimentos sociais no campo e da agricultura brasileira é autor, entre outros livros, de "Modo capitalista de produção (Ática, 1995)", "Agricultura camponesa no Brasil" (Contexto, 1997).
Fonte: http://www.radioagencianp.com.br/index.php?option=com_content&task=view&id=3335&Itemid=43font

11 novembro 2007

Inquietações sobre o Fórum Amazônia Sustentável

Na ilha São Luís, Maranhão, existe uma fábrica de alumínio da ALCOA há mais de duas décadas. O Sindicato dos Metalúrgicos tem denunciado abusos de toda ordem por parte da multi-nacional estadunidense. Há passivos sobre problemas de saúde oriundos de praticas laborais, assédio moral e ainda impactos ambientais. A coerção pública e privada contra ações do sindicato tem sido pauta constante do boletim da entidade dos trabalhadores. Quem melhor conhece os passivos ambientais é a população rural vizinha à fábrica, que padece com problemas de poluição dos recursos hídricos e redução da quantidade de peixes.
No município de Barcarena, Pará, a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), mantém duas fábricas da cadeia produtiva do alumínio, a Alunorte, que transforma a matéria prima bauxita em alumina, e a ALBRAS, que transforma a alumina em alumínio. Uma associação em defesa dos operários e ex-operários das fábricas tenta a todo custo encaminhar passivos na área da saúde laboral. Há registros de problemas neurológicos e cardíacos entre outros.
Segundo a coordenação da associação há cerca de 120 pessoas com graves problemas. Ao se constatar os problemas de saúde, a demissão tem sido o atalho mais comum. Quando ainda possuía uma direção de caráter combativo o Sindicato dos Químicos de Barcarena cumpria o papel de encaminhar nas mais diversas esferas as questões de assédio moral, saúde e ambiental contra as empresas da CVRD.
Na derradeira eleição, que teve como resultado a derrota da chapa cutista, até coerção física foi registrada contra a ex-diretoria do sindicato, que segundo a direção da CUT Pará, só perdeu a eleição por conta do aporte da empresa. No aspecto trabalhista, a companhia contabiliza mais de 8 mil denúncias na região de Carajás, município de Parauapebas, sudeste do Pará. Nos estados onde as empresas atuam não se noticia nada contra as mesmas, que graças a uma eficiente política de marketing neutraliza a imprensa.
Nas academias é vasto o material que aborda o caráter de enclave que conforma a atividade de mineração na Amazônia, onde se maximiza os louros em outras plagas e se socializa todos os tipos de mazelas no entorno dos grandes projetos. As duas empresas em questão, a CVRD e a ALCOA patrocinaram o lançamento e integram o Fórum Amazônia Sustentável, lançado em Belém, no derradeiro dia 05 de novembro. O cordão ganha robustez com a adesão da maior rede de setores populares da região, o Grupo de Trabalho Amazônia (GTA) e também ONG´s. É a força da grana que predomina?

Recursos naturais e a sustentabilidade
As duas empresas em relevo possuem abissais interesses nos recursos da região e estão em processo de ampliação das respectivas fábricas. Bem como são associadas em vários empreendimentos de produção de energia, hidrelétricas, como a localizada na tensa fronteira do Maranhão com o Tocantins, no município de Estreito. A energia é o principal insumo na produção do alumínio. Por isso tornou-se comum enfatizar que lingote de alumínio é exportação de energia concentrada e subsidiada pela sociedade. A CVRD tem um vasto portfólio em logística que passa por hidrelétricas, termelétricas e ferrovias, além da ampliação de exploração de várias frentes de mineração.
Já a ALCOA, além do interesse na geração de energia, pleiteia a exploração de bauxita no oeste do Pará, no antes pacato município de Juruti. As peças sobre os impactos sociais e ambientais (EIA/RIMA), exigências no processo de licenciamento de exploração, são um capítulo à parte. Comumente verdadeiras pérolas de omissão e manipulação de dados. Sem falar nas audiências públicas, onde as mesmas são apresentadas, de causar inveja a qualquer performance do circo de Soleil.
Nada mais estratégico para a “boa imagem” das empresas que criar um espaço de “debate” sobre sustentabilidade da região. Ainda mais quando à cada dia o debate sobre o tema transborda diversas agendas. O marketing tem aflorado como a principal dimensão na apropriação sobre a categoria sustentável quando se analisa a perspectiva das empresas. Sobre a questão, o professor de semiótica Edílson Cazeloto em artigo intitulado: “Entre ecorrevolucionários e ecorreformistas o papel da mídia”, publicado na edição 36, setembro/2007 da revista Democracia Viva/IBASE, esclarece com sobriedade a disputa sobre a categoria.
Em um trecho da análise o professor enfatiza: “Enquanto a maior parte da humanidade vê no aquecimento global a iminência de uma tragédia ímpar, os bens aventurados do capital, já sentem no ar o cheiro de oportunidades para o lucro. Para essa parcela, a sustentabilidade tornou-se uma forma de agregar valor às marcas de seus produtos e ao capital de suas empresas. É o chamado capitalismo verde, que vem ganhando a adesão de empresas (na maioria, corporações globais) como um novo Eldorado.”

Rogério Almeida é mestre em Planejamento do Desenvolvimento pelo Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA), da Universidade Federal do Pará (UFPA), autor do livro Araguaia-Tocantins: fios de uma História camponesa (2006), e colaborador da rede www.forumcarajas.org.br
Correio eletrônico:
araguaia_tocantins@hotmail.com

Falecimento Jorge Terena

A nota da COIAB [Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira]
O Movimento Indígena está de luto pela morte inesperada de uma de suas maiores lideranças, Jorge Miles da Silva, conhecido no meio indígena como Jorge Terena, que faleceu na tarde do dia 09 de novembro de 2007, por volta das 16:00 horas, na UTI (Unidade de Tratamento Intensivo) do Hospital Santa Júlia, na cidade de Manaus, capital do Estado do Amazonas. Jorge Terena, homem simples, de fala ponderada e precisa, com seu sotaque destoado e seu espírito guerreiro, escolheu em vida a defesa intransigente dos direitos mais elementares da gente indígena. Sempre lutando contra as injustiças cometidas contra o seu povo. Tendo sido um dos fundadores do Movimento Indígena Nacional, posicionou-se sempre a favor dos interesses mais nobres – das causas mais elevadas, prestando, nos últimos tempos, importantes serviços aos Povos Indígenas da Amazônia. Como sociólogo, defendeu uma participação mais ativa da juventude indígena nos movimentos de lutas sociais. Incentivou as práticas desportivas como um dos instrumentos de inclusão e enfrentamento das problemáticas indígenas. Porém, agora, Jorge Terena atendeu ao chamado para morar na Casa do Grande YURIKOYUVAKÁI (DEUS), deixando para todos nós, Povos Indígenas do Brasil, uma rica herança de relevantes trabalhos. Para sua família enlutada fica a lembrança de um Pai carinhoso e de um marido sempre presente. Para seus amigos deixa a saudade de vários momentos de luta e resistência à dianteira dos memoráveis embates do Movimento Indígena. Para as gerações futuras o exemplo e a lição de um indígena guerreiro, inteligente e ilustre, que não era nem maior e nem menor que a causa que carregou no peito, mas dela fazia parte sentindo na pele as angustias e sofrimentos da população indígena brasileira.
Neste momento de dor, a COIAB convida todos os amigos de Jorge Terena e aliados da Causa Indígena a confortarem sua família entristecida e a prestarem sua gratidão àquele que estará sempre presente na memória coletiva dos Povos Indígenas. Seu corpo será velado na sede da COIAB à Avenida Ayrão, 235 – Presidente Vargas – Manaus. Manaus, 09 de novembro de 2007.

Jecinaldo Barbosa Cabral – Sateré – Mawé Coordenador Geral da COIAB
Marcos Apurinã Vice-coordenador - COIAB
Saturnino Wapotowé Rudzane'edi Coordenador / Secretário - COIAB
Genival de Oliveira Santos Coordenador / Tesoureiro - COIAB

Indio com diploma não é indio?
31/8/2006 - Jorge Terena - Revista Galileu - Brasil

Algumas pessoas ainda acham estranho um índio ter bacharelado, mestrado e doutorado, mas muitos deles já são formados em áreas como história, direito, ciências sociais, engenharia, pedagogia e outras. A maioria dos que conseguiram essa formação não tiveram ajuda do governo para tal, e continuam não tendo.
Os estudantes indígenas às vezes passam por dificuldade nas cidades, mas por compromisso com suas comunidades insistem em adquirir ferramentas científicas e tecnológicas. Isso os permite discutir de igual para igual com os governos um planejamento de políticas públicas indígenas condizente com a realidade. Mas por que tanta dificuldade para ajudar um pequeno número de indígenas a concluir os estudos? Índio não precisa estudar?
Há 20 anos, o governo militar achava que lugar de índio era só na aldeia e queria mandar os estudantes indígenas de Brasília de volta para casa. Na época, os alunos adotaram uma frase de protesto: "Posso ser o que você é sem deixar de ser o que sou!". Contudo, a visão de que o índio que sai da aldeia abandona a própria cultura ainda persiste como preconceito. Ele não pode ter diploma e continuar sendo índio?
As escolas indígenas têm várias faces hoje. Podem ser mera imposição de modelos educacionais ou podem adotar métodos que não desprezam o pluralismo e a identidade cultural dos povos. Por isso é preciso fazer uma distinção entre educação indígena e a educação escolar indígena.
A educação indígena é o processo com que cada povo transmite conhecimento (em língua nativa) para garantir a sobrevivência e a reprodução cultural. Não é uma educação dentro de quatro paredes como todos estão acostumados, mas uma educação cotidiana. Quando um pai indígena leva o filho para caçar ou coletar material de artesanato, a criança passa por um processo de transmissão cultural de valores, história e crenças.
Já a educação escolar indígena deve congregar tanto o conhecimento tradicional dos povos quanto a cultura técnica e científica da sociedade brasileira como um todo. Um choque entre as educações escolar e indígena se deu por conta da existência de concepções de mundo diferentes.
A educação escolar seguia modelos dominantes, num incentivo à acumulação de bens, à competição e ao individualismo, contrária aos processos pedagógicos dos povos indígenas, que enfatizam diferentes formas de organização social. Mas a educação escolar indígena deve servir como um instrumento a serviço da autonomia de cada povo, que deve decidir o que é uma escola verdadeiramente indígena.
É difícil para o Ministério da Educação integrar ações de ensino indígena nos três níveis de aprendizado. Se a educação escolar indígena ainda é capenga, imagine a superior. Existem algumas poucas experiências em universidades com licenciaturas específicas para atender à demanda de estudantes indígenas por cursos superiores. Mas será que estes cursos podem ajudar a solucionar os problemas enfrentados pelos povos no cotidiano?
Como os índios têm dificuldades para ingressar em universidades públicas, eles estão buscando o ensino particular, e a Funai não dispõe de verba para atender à demanda. Só um sistema integrado de educação escolar indígena, desde a educação básica até a superior, poderá garantir os princípios da especificidade, diferenciação e autonomia, que respeite a diversidade cultural, lingüística e as pedagogias próprias dos povos indígenas.

Jorge Terena é Sociólogo formado pela Universidade de Maryland (EUA), integrante do povo Terena (MS) e consultor etnoambiental da Coiab (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira).
Fonte: http://www.amazonia.org.br/noticias/noticia.cfm?id=255677

07 novembro 2007

Pauta à Companhia Vale do Rio Doce (CVRD)

PAUTA À COMPANHIA VALE DO RIO DOCE - CVRD DA
JORNADA DE LUTA PELA REFORMA AGRÁRIA E
EM DEFESA DOS RECURSOS NATURAIS DO POVO BRASILEIRO!

A Direção
Da Companhia Vale do Rio Doce - CVRD

Não é novidade as notícias que saem na imprensa em nível nacional e internacional sobre a lucratividade e a influência política e econômica da Companhia Vale do Rio Doce na região, no Brasil e no mundo, quando a província mineral de Carajás completa 40 anos (1967-2007), e a mina de Carajás atinge o recorde de 1 bilhão de toneladas ao mesmo tempo que a empresa é líder mundial no mercado de minério de ferro.
Também não é novidade os bilhões que empresa lucrou, principalmente em 2007, ano que marca o 10º aniversário de sua privatização pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso, ano que inicia uma campanha popular para a sua reestatização como empresa estratégica para a soberania nacional.
Não é novidade que a “CVRD seja a maior companhia de mineração diversificada das Américas, líder mundial do mercado de ferro e pelotas, segunda maior produtora global de manganês e ferroligas, além de maior prestadora de serviços de logística do Brasil. E que está presente em 13 Estados e em mais de 20 países nos continentes”.
Não é novidade que a “CVRD vá investir US$ 20 bilhões nos próximos cinco anos, sendo, que em 2008 investirá US$ 4,2 bilhões no Pará. Investir no níquel nos projetos Onça Puma e Vermelho, no cobre do Salobo e 118; no ferro, com projeto Serra Leste e aumento da Serra Norte e Serra Sul; e no alumínio, na mina de Paragominas e uma refinaria em Barcarena”.
Não é novidade que a “CVRD esteja participando com 30% dos investimentos na construção da hidrelétrica de Estreito no Maranhão e que construirá uma usina termelétrica
em Barcarena. Que vão passar de 32.600 empregos em 2007 para 68.000, em 2012”.
Não é novidade a marca histórica de 1 bilhão de toneladas, suas ações sócio-ambientais, os nove (09) projetos que a Fundação Vale desenvolve em municípios que a companhia atua no Pará. Que os trens transportam minério da mina no município de Parauapebas no Pará até São Luis no Maranhão numa distância de 892 kilomentros de estrada de ferro. Que o complexo Carajás tem capacidade para exportar 100 milhões de toneladas ano. Que os investimentos da companhia dobrarão para o próximo período.
Sabemos de tudo isso e, nos causa espanto que por trás desses números, cifras bilionárias e um alto padrão de desenvolvimento tecnológico nos seus empreendimentos é medíocre a responsabilidade social da empresa em relação ao Estado do Pará e a população local do Sul e Sudeste, onde estão montado e previsto os maiores investimentos da Empresa.
Se destacam numa lista de contradições desse modelo de produzir riquezas; os crimes ambientais da qual a empresa é citada, os processos trabalhistas, os salários mais defasados do Brasil, a ingerência nas comunidades Indígenas e Quilombolas e camponeses sem terra, a falta de parcerias mais profundas em infra-estrutura social, uma vez que a empresa é a principal beneficiária da Lei Kandir que lhe isenta de pagar um único centavo pela exportação de ferro ao mesmo tempo que repassa aos municípios mineradores CFEM – Contribuição financeira pela exploração mineral - mais baixo do mundo 2% comparado as outras mineradoras a nível internacional, que chegam até 7,5% de toda a riqueza produzida. Que compromissos tem a CVRD com o desenvolvimento social e econômico da região com comportamento dessa natureza, de não se achar responsável pelas contradições sociais hoje tão prementes em todos os níveis da vida social?
A pauta que agora apresentamos para negociação com a direção da Companhia não é imaginária, inventada em laboratório, ela é síntese das contradições criadas pela natureza dos investimentos e a forma de gestão da empresa em relação aos recursos naturais, a geração de riquezas e a política de investimentos sociais que afetam os Trabalhadores do Campo e da Cidade.
1.Que a Companhia Vale do Rio Doce como empresa que monopoliza a extração de ferro e outros minerais do subsolo do Estado do Pará, aumente o repasse da –Contribuição financeira pela exploração mineral- de 2% para 6% como forma de compensar os municípios mineradores e o Estado, que recebem os impactos da migração, do desemprego e etc na sua infra-estrutura social.
2.Que a Companhia Vale do Rio Doce corte o repasse de ferro as (Empresas de Ferro Gusa) instaladas no Pará e no Maranhão que não cumpram responsabilidade ambiental e social.
3. Que a CVRD, os governos, federal Estadual e municípios mineradores onde a companhia atua, sejam responsáveis por um programa social de caráter emergencial nas áreas:
a) Construção de moradias populares em especial nos municípios impactados pela migração provocado pelos investimentos da CVRD como assegura seu próprio diagnostico.
b) Construção de Unidades de Saúde, em proporção as demandas provocadas em buscas desses serviços e dos critérios de sua universalização.
c) Construção do hospital regional de Parauapebas e Tucuruí, devidamente equipados com profissionais e tecnologia médica apropriada para alta e baixa complexidade.
d) Implementação de um amplo programa de educação para a erradicação do analfabetismo e garantia de acesso a universidade publica, gratuita e de qualidade.
e) Instalação de unidades produtivas e programas que garantam a geração de mais empregos, renda e diversificação da economia no campo e na cidade.
f) Implementação de um amplo programa de Segurança Social que oriente desde projetos sociais preventivos, até a repressão organizada contra todos que atente a vida dos indivíduos e a coletividade.
g) Construção de uma Escola Técnica Profissionalizante que as atenda as diversas áreas: Agricultura (agroflorestal). Industria e Comercio, como condição de inserção produtiva de milhares de homens e mulheres num novo modelo de desenvolvimento.
4. Que o Distrito Florestal de Carajás colocado em pauta por força da Companhia aos governos Federal e Estadual para ser implementado nessa região (baseado no plantio de eucalipto para carvão vegetal e uso da floresta natural) seja substituído pelo Distrito Agroflorestal Sustentável (que significa reflorestar com arvores nativas da região e garantia da biodiversidade).
5. Que os garimpeiros tenham autonomia sobre o território de Serra Pelada, que seja cessada a ingerência da CVRD sobre a forma de cooptação e repressão das organizações dos garimpeiros.
6. Que seja criado um Conselho Deliberativo com representantes da CVRD, do Estado e da sociedade civil para discutir e deliberar sobre os projetos de mineração e de uso de recursos ambientais da região. Que acompanhe e decida o programa de investimentos dos recursos destinados pela CVRD aos municípios, com apresentação de projetos de acordo com os interesses locais.
7. Implementação de um pólo industrial na região de Carajás para verticalização da produção que agregue valor industrial aos recursos naturais extraídos na região, na transformação de produtos manufaturados de interesse da sociedade, com a produção de utensílios eletrodomésticos, peças industrias, espécie de Zona Especial de Produção orientada por um novo modelo de produção.
8. Que a Companhia Vale do Rio Doce repasse sistematicamente os recursos dos acordos estabelecidos entre ela e as Comunidades indígenas impactadas pelo grande projeto Carajás.
9. Que a Companhia Vale do Rio Doce estabeleça junto com os movimentos sociais uma agenda para discussão de todos os projetos minerais já implantados e a serem implantados na região.
10. Que as comunidades Camponesas, áreas de reforma agrária, indígenas e Quilombolas sejam ressarcidas em forma de investimentos em infra-estrutura social pelos impactos sócio-ambientais advindos das atividades do projeto Carajás.

Assentamentos Palmares
Parauapebas-Pará
6 de novembro de 2007

MST- CPT – MAB –MPA –VIA CAMPESINA:-PA – UJCC – Sindicato dos Garimpeiros de Serra Pelada – Articulação de Mulheres do Campo e da Cidade – ASSOCIAÇÕES DE MORADORES DE PARAUAPEBAS – GRUPO UNIÃO PALMARES -

05 novembro 2007

Em 15 dias Grupo de Combate ao Trabalho Escravo liberta quase 90

Após 15 dias de retorno ao trabalho, o Grupo Móvel de Combate ao Trabalho Escravo, do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), libertou um total de 88 trabalhadores mantidos em situação de escravidão. Foram resgatadas 45 pessoas no estado do Maranhão, 23 no Pará e 20 em Mato Grosso.
As atividades do Grupo Móvel foram interrompidas durante quase um mês, depois que uma ação realizada, que na ocasião liberou 1800 trabalhadores na fazenda Pará Pastoril Agrícola (Pagrisa), no Pará, no dia 2 de julho, foi questionada pelos donos do local e por parlamentares ligados à bancada ruralista no congresso [1.064 trabalhadores optaram por romper o contrato de trabalho].
A caracterização de trabalho escravo que guia as ações do Grupo Móvel, se dá pelo uso de trabalho forçado, a servidão por dívida, condições degradantes de trabalho e jornada exaustiva acima de dez horas. Os ruralistas no entanto, consideram o conceito exagerado.
Apesar do esforço do MTE, o combate ao trabalho escravo ainda é pouco no país. Existem apenas oito unidades do Grupo Móvel no Brasil. De acordo com a Comissão Pastoral da Terra (CPT), das aproximadamente 200 denúncias de trabalho escravo feitas anualmente, menos da metade são averiguadas.
A Comissão afirma ainda que a impunidade é o fator responsável pela perpetuação do trabalho escravo. O código penal brasileiro estabelece pena de dois a oito anos de prisão para a prática de trabalho escravo. No entanto, nunca um fazendeiro foi preso devido à prática do crime.

Juliano Domingues, da Radioagência NP.
Fonte: http://www.radioagencianp.com.br/index.php?option=com_content&task=view&id=3254&Itemid=1

01 novembro 2007

Manifesto das famílias Sem Terra acampadas às margens da Estrada de Ferro Carajás

Escrevemos a vocês do acampamento as margens da Estrada de Ferro Carajás - Ponta da Madeira, no Assentamento Palmares II no município de Parauapebas no sudeste do Pará.
Estamos em milhares, vindos de outros acampamentos, do garimpo, de lugarejos distantes, dos assentamentos, das cidades, das periferias, enfrentamos as terríveis contradições do modelo imperante da fronteira.
Não somos estrangeiros e nem famintos ainda que a miséria seja algo sempre insuportável, estigma que os dominantes utilizam sempre para nos deslegitimar, dispensamos tratamento desse nível, tacanho preconceito e vil obscurantismo cultural.
O que queremos? Numa única palavra, exercer soberania sobre nossas riquezas. Decidimos ser gente, cidadãos nessa região onde o capital quer que seja apenas sua fronteira em expansão!
Por isso, enfrentamos os impasses da terra, da floresta e das águas. As negações de direitos. Os agiotas. O Estado. Os governos. Os Tecnocratas, que seqüestram pela força e violência a nossa soberania e vendem para o capital internacional nossa região.
Vivemos a mercê das circunstancias no segundo maior Estado da federação, região norte do país. Para o mundo, a Amazônia maior área de floresta nativa do planeta hoje impactada por projetos econômicos altamente erosivos à sua biodiversidade. Aqui estamos mobilizados a mais de 20 dias na – Jornada de luta pela Reforma Agrária e em Defesa dos Recursos Naturais do Povo Brasileiro.
Escrevemos para que nos ouçam e recoloquem a verdade onde ela foi deturpada, desmoralizada. Saibam, o que chega sutil dos centros de poder é o que esmaga silenciosamente. É o que nos faz ignorar, comungar pela coletividade o que é justo e verdadeiro. Os meios de comunicação social e a direita ideológica desse país satanizam a pauta política dos trabalhadores, suas formas de luta e resistência.
Ensinam à sociedade que não é assunto de Sem Terra, de Garimpeiros, estudantes, pequenos produtores e aos pobres: o funcionamento da economia, a instabilidade política, a lei de patentes, as sementes geneticamente modificadas, as altas taxas de juros, o neoliberalismo.
Ensinam à sociedade que não é assunto de Sem Terra, de Garimpeiros, de estudantes, dos pobres: à extrema desigualdade social do povo, a soberania nacional, a bolsa de valores, os destinos da nação, o desenvolvimento da ciência e da tecnologia, o aquecimento global, a agricultura e a defesa da Amazônia.
Estamos fartos das mentiras e anunciamos:

  1. A nossa pobreza é um problema do Estado brasileiro e de quem governa suas instituições. Queremos que seja resolvida e não aceitamos mais saídas individuais.
  2. A nossa fome é problema do Estado brasileiro e de quem manipula em favor de uma classe social - a burguesia -, toda a riqueza. Queremos resolvido o desemprego e não aceitaremos mais o nervosismo do mercado e do capital internacional determinando sobre o destino do povo.
  3. A nossa ignorância é problema do Estado brasileiro, da elite medíocre e subserviente. Não aceitaremos mais as altas taxas de juros, a ditadura do modo de vida capitalista, o pensamento único e imperialista. Queremos resolvido o analfabetismo.
  4. A reforma Agrária é problema do Estado brasileiro e de quem impõem o agronegócio. Não aceitaremos mais esse modelo de exportação e de acumulação de riqueza baseado na morte da nossa biodiversidade. Queremos resolvida a desapropriação dos latifúndios que praticam violência, trabalho escravo e crime ambiental. Não aceitamos mais a representação política do congresso nacional.
  5. A nossa favela – pré-cidades - é um problema do Estado brasileiro, da elite “donatária” e especulativa que hoje através dos serviços públicos se apropriam da mais-valia social. Queremos resolvida pela vontade popular a reestatização da CVRD e que se estabeleça o seu controle social. Não aceitamos mais o superávit primário como fórmula perfeita de governabilidade.
  6. A nossa doença é um problema do Estado brasileiro e de quem mantém subjugado pela indiferença e pela força a vontade do povo. Queremos resolvida a falta de soberania nacional e não aceitamos o poder judiciário contrariando os interesses da sociedade.
  7. A nossa dor é problema do Estado brasileiro, de uma elite que joga a sociedade numa crise sem precedentes na história e na barbárie social. Queremos resolvida em forma de expulsão todas as empresas multinacionais que atuam no Brasil e, não aceitamos as falácias palacianas, queremos direitos.

Contra o Imperialismo; Soberania Popular na Amazônia!
Reforma Agrária: Por Justiça Social e Soberania Popular!

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra MST-PA

Acampamento permanente

Ás Margens da Estrada de Ferro Carajás.

Assentamento Palmares

Parauapebas, sudeste do Pará.

31 de outubro de 2007