28 fevereiro 2007

Amazônia na agenda do PAC

Juscelino Kubitschek com o pé sobre uma árvore na Amazônia. Eis a imagem que ponteia quando se espia o retrovisor da colonização recente na região que concentra a maior biodiversidade do planeta. Um vazio aos olhos dos burocratas e executivos de então foi o diagnóstico. A lente da homogeneização hegemonizou a lógica que ficou conhecida como grandes projetos. O propósito foi integrar a região ao resto da nação. Há quem diga que a floresta foi amansada na pata do boi. Ainda não sabe se bípedes ou quadrúpedes.
Institucionalidades germinaram num horizonte marcado pelo patrimonialismo. Grandes porções de terras foram submetidas ao capital privado, selando a associação com o estado. Na prova dos nove os “nativos” não passaram (passam) de meros detalhes ou entraves a serem sanados. A renúncia fiscal foi a dorsal do programa de ocupação. Ou seria invasão? Assim empresas do centro-sul e multis dominaram territórios e definiram o uso da base natural. Era externa a bússola do projeto. Os passivos sociais e ambientais saltam aos olhos. Parecem nunca salientados nas pranchetas.
Se naquele momento as costelas da dorsal eram pólos de produção, o que se verifica atualmente são eixos. A matriz das instituições ainda segue o mesmo verniz conservador. Hierarquizado, indiferentes aos agentes locais, à diversidade social. A única possibilidade do desenvolvimento insiste na linearidade. Como se a mesma árvore não pudesse ser percebida por diferentes ângulos/olhares: indígena, ribeirinho, sem terra, assentado, madeireiro, pesquisador, artesão.
O ora debatido Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) parece seguir a mesma trilha já palmilhada na Amazônia. “Vão passar o rodo”, exercita um ente da base da pirâmide. Destravar é a palavra da cidade de Juscelino. Estão indiferentes ao Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) cevado ao longo dos anos de verticalização de projetos na região.
No caso do Pará, que ocupa posição relevante na balança de exportação por conta do minério, os males do modelo que insiste no uso intensivo dos recursos naturais, imprime desastres. É o estado top em trabalho escravo, execução de dirigentes sindicais e pares em defesa da reforma agrária. Não menos confortável é a posição na cota de desmatamento, onde com outros estados integra o arco de desmatamento. Destruição que tem na siderurgia um dos impulsionadores. Passagem no sul e sudeste do Pará e oeste e sul do Maranhão, as carretas de carvão serpenteiam a perder de vista. Ilegais em sua maioria.
O plantio do exótico segue a subjugar a floresta. A transformar modelos de reservas em ilhas cercadas de soja por todos os lados. Como ocorre no Parque do Xingu no Mato Grosso e no Parque do Mirador no Maranhão. Mas, quem vai se importar com alguns índios, trabalhadores rurais, pescadores, extrativistas e seus pares. Como declarou um planejador dos tempos do regime militar em revista do centro-sul.
A promessa de desenvolvimento é possível com a raquítica fatia de investimento em ciência e tecnologia? A região que concentra 61% do território nacional divide 1% dos recursos? É apenas com obras de infra, incentivo a monoculturas exóticas, que comprometem os recursos hídricos por conta do uso intensivo de venenos que alavancará a região da sua condição de periferia de um país periférico?
O diapasão dos grandes meios de comunicação segue o mesmo tom. Pena não ser Jobim. Destravar é o verbo. E que se danem os periféricos. Como já ocorre em Santarém no Pará por conta da soja, numa refrega entre multis e camponeses. Bem como em Moju, município do mesmo estado, numa peleja que envolve a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) e quilombolas, e ainda as hidrelétricas no Tocantins. Aspirinas e propaganda, que alguns chamam de responsabilidade social, tem sido o lençol para ocultar as feridas. É branco o lençol. E o sangue nódoa forte.
Mas, o mundo vai bem obrigado. Apenas nuvens cinza nublam o futuro do planeta. O que antes era coro de gente “chata” que “não tinha o que fazer”, “adeptos de agentes que não desejam o desenvolvimento do país” parece que bateu à porta dos definidores do modelo, que sentem cheiro de ameaça de redução de faturamento em suas planilhas.
O mundo grita. E até os ricos começaram a se importar com isso. Até os grandes meios de comunicação já agendam o assunto. Cada um a seu modo.


Rogério Almeida é autor do livro Araguaia-Tocantins: fios de uma história camponesa/2006. Mestre em Planejamento do Desenvolvimento pelo Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA) da Universidade Federal do Pará (UFPA), e colaborador da rede Fórum Carajás: www.forumcarajas.org.br

Correio eletrônico: araguaia_tocantins@hotmail.com
Foto: Roselene Portela (Árvores, em toras, derrubadas ilegalmente, e apreendidas no Pará)

27 fevereiro 2007

A “tsunami” na praia do Marahú, em Belém do Pará

Os moradores, os comerciantes, e os amantes da praia do Marahú, praia esta que se destaca por ser um dos últimos recantos preservados da ilha de Mosqueiro, uma das muitas ilhas que compõe o território do município de Belém, capital do Estado do Pará, no norte do Brasil, estão passando por momentos dramáticos neste início de ano ao verem a força das marés destruindo a estrada de acesso, os bares e restaurantes, as casas, as instalações elétricas e hidráulicas, enfim destruindo um pouco da vida daqueles que ali moram, ou freqüentam.
Segundo informações dos moradores, a Prefeitura de Belém, após ser procurada, primeiramente sinalizou que não faria nenhuma intervenção na área, alegando que seriam gastos recursos públicos em uma obra que não resolveria o problema diante da força inevitável das marés, indicando que seriam feitos estudos para a construção de uma estrada passando por trás das casas e edificações comerciais, construindo ainda acessos à praia.
Diante do estado de emergência em que vive, a comunidade se mobilizou, inclusive acionando a imprensa para proporcionar maior visibilidade ao dilema que está passando, cobrando das autoridades municipais ações imediatas para conter o referido problema, resultando esta medida em um mutirão para colocação de sacos com areia e cimento, buscando a contenção das águas, mutirão este que envolveu a comunidade e técnicos da prefeitura. Mas com o ritmo lento das obras, o processo de erosão só tem avançado.
Em um tempo onde às previsões quanto às mudanças climáticas no planeta são alarmantes, faz-se necessário que as autoridades constituídas unam-se para debater, com as comunidades envolvidas, soluções inteligentes, que de forma atenta à necessidade de preservação ambiental, restabeleça a trafegabilidade de vias de acesso, bem como a segurança de construções existentes nesses tipos de comunidades.
Ao invés da construção de muros de arrimo (demanda dos moradores da praia em questão) ou da abertura de outras estradas, cortando e arrasando as florestas de várzea existentes (ambas alternativas de alto impacto ao meio ambiente), pode-se imaginar a elaboração, coletiva, de outras saídas para este grave problema. Alternativas que necessariamente devem ser pensadas concebendo a natureza não como adversária, mas como sábia mestra.
A união dos poderes públicos constituídos, considerando-se as três esferas de governo, com a comunidade, e uma equipe multidisciplinar de técnicos, pode gerar outras soluções para este tipo de problema, como por exemplo à colocação de uma contenção verde, formada por uma zona de floresta entre a praia e a estrada, a plantação de grama na estrada ao invés de asfalto, a colocação de uma cerca com pedras para a redução da força das águas, etc.
O mais importante é conceber alternativas ambientalmente corretas, que inclusive podem servir de experiências piloto para a intervenção em outras áreas com problemas semelhantes. Pode-se dizer mesmo que as soluções concretas para se salvar o planeta passam necessariamente por ações pontuais, criativas e inovadoras.

Augusto Miranda, é Economista, Especialista em Gestão Pública e Planejamento pelo Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA) da Universidade Federal do Pará (UFPA) e pelo Centro Universitário do Pará (CESUPA), e morador da praia do Marahú.
Correio eletrônico: augusto@sefa.pa.gov.br
Foto: Nao Abe (Exemplo da força das marés na Amazônia)

26 fevereiro 2007

Justiça confirma ilegalidade do porto da Cargill em Santarém

O Greenpeace parabenizou hoje a decisão do Ministério Público Federal (MPF) de requisitar ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) inspeção urgente e imediata paralisação do porto da Cargill Agrícola S.A., em Santarém, no oeste do Pará. De acordo com o comunicado do MPF, “o embargo a ser imposto pelo Ibama é conseqüência de sucessivas derrotas judiciais da Cargill, que construiu e colocou em operação um terminal graneleiro no rio Tapajós sem elaborar Estudos de Impacto Ambiental (EIA/Rima)”.
A irregularidade foi apontada pelo MPF em processo iniciado em 2000, que obteve liminar favorável do então juiz federal em Santarém, Dimis da Costa Braga. A liminar não apenas suspendeu o alvará de autorização emitido pela Secretaria Estadual de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente (Sectam), como a proibiu de emitir qualquer outra autorização para funcionamento do porto da Cargill sem a aprovação do EIA-Rima demonstrando a viabilidade ambiental do projeto. Em vez de cumprir com a decisão, a multinacional norte-americana explorou as brechas da confusa legislação brasileira e, através de longa batalha judicial, ganhou tempo para construir e operar o terminal sem os Estudos de Impacto Ambiental. A Cargill impetrou sete recursos, mas foi derrotada em todas as instâncias e a ordem deve ser, agora, finalmente cumprida.
Desde 2003, o Greenpeace apóia a luta das comunidades locais que, junto com o Ministério Público Federal, iniciaram o processo contra a instalação do terminal graneleiro da Cargill sem que a empresa realizasse o EIA-Rima. Em 2006, a organização ambientalista publicou extensa investigação dos impactos negativos do avanço da soja na Amazônia. O relatório “Comendo a Amazônia” revela como a demanda mundial por soja produzida na região tem alimentado o desmatamento da maior floresta tropical do mundo.
“É importante lembrar que o porto da Cargill é um símbolo da expansão da soja na Amazônia e este motor tem impulsionado não apenas o desmatamento, como a grilagem de terras e a violência contra as comunidades locais”, disse Tatiana de Carvalho, do Greenpeace na Amazônia. “É escandaloso que a Cargill continue ignorando as decisões da justiça brasileira de realizar os estudos de impacto ambiental para o porto de Santarém”.
A monocultura de soja emprega apenas dois trabalhadores a cada 100 hectares, enquanto culturas típicas da agricultura familiar, como a mandioca, empregam 38 trabalhadores para a mesma área. A expansão da soja na Amazônia tem provocado aumento do êxodo rural e o inchaço das periferias de Santarém.

Fonte: http://www.greenpeace.org.br/amazonia/?conteudo_id=3129&sub_campanha=0
Foto: www.greenpeace.org.br

24 fevereiro 2007

Prêmio Prof. Samuel Benchimol 2007

O Prêmio Prof. Samuel Benchimol (www.amazonia.desenvolvimento.gov.br) é uma iniciativa do Governo Federal Brasileiro visando a identificação e o financiamento de projetos focados no desenvolvimento sustentável da Amazônia Continental (Brasil e demais países amazônicos). Esta iniciativa é apoiada pela OTCA (Organização do Tratado de Cooperação Amazônica), Sebrae, Federações de Indústria, Fundação de Tecnologia do Estado do Acre, Secretaria de Ciência e Tecnologia do Amazonas, Fapeam, Fucapi, Suframa, centros de pesquisa, universidades, empresários e sociedade civil organizada (ONGs).
O regulamento do Prêmio (até R$ 65 mil) prevê três categorias: social, ambiental e econômica-tecnológica.
Desde 2004 o Banco da Amazônia tem viabilizado o custeio de vários dos projetos distinguidos, especialmente aqueles com ênfase na promoção do empreendedorismo.
São inumeráveis os temas que podem ser focados. A título de exemplo: ordenamento do espaço rural amazônico, tecnologia de alimentos, artesanato, biofármacos, energias alternativas, sensoriamento remoto, controle de queimadas, certificação agrícola e florestal, questão indígena, quilombolas, agricultura sustentável, biodiversidade, tecnologias sociais, preservação do conhecimento tradicional, beneficiamento de produtos extrativistas, manejo florestal de múltiplo uso, difusão de tecnologias eco-compatíveis, educação ambiental, uso racional de recursos naturais, sistemas agroflorestais, promoção do empreendedorismo no meio urbano e rural, bioprospecção, turismo ecológico, etc.
O regulamento e a ficha de inscrição on-line estarão disponíveis no sítio www.amazonia.desenvolvimento.gov.br, a partir de 05.03.2007.
Dada a relevância desta iniciativa em prol do desenvolvimento sustentável da Região Amazônica, solicito a cooperação de Vossas Senhorias para que esta mensagem seja repassada aos potenciais interessados: formuladores de políticas públicas, ativistas sociais e ambientais, empreendedores e pesquisadores focados em temas amazônicos.

Márcia Antunes Caputo
Departamento de Articulação Tecnológica
Secretaria de Tecnologia Industrial
Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior
Esplanada dos Ministérios, Bl. J, sobreloja, sl. 105
70.053-900 - Brasília - DF
Tel: (61) 3425-7321 Fax: (61) 3425-7286

22 fevereiro 2007

Fraternidade na Amazônia, sob o signo da contradição

Sob o signo da contradição, tendo como tema a Amazônia, a Campanha da Fraternidade foi lançada no dia 21 de fevereiro em Belém, Pará, na lha do Combu. É a primeira vez que o lançamento da campanha ocorre fora de Brasília. Com o tema “Vida e Missão neste chão”, o documento base alerta para a condição periférica da região.
Sinaliza sobre o tratamento de autoridades, empresas e setores da economia em relação à diversidade da fauna social da região. Estão contemplados no documento migrantes, colonos, indígenas, sem terra, assentados, agricultores, quilombolas entre outros. As pelejas que empreitam para a manutenção do território e suas condições de reprodução da vida.
Ao pinçar sobre o processo de colonização da região, o texto da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) pondera sobre a associação do Estado com o capital privado nacional e estrangeiro na integração da região. Caminhada que cimentou a concentração de terra e renda, primou na violação de direitos humanos, escravizou e ainda escraviza homens, mulheres e crianças.

Jornada que elevou o Pará ao primeiro lugar no ranking da execução de dirigentes que defendem a reforma agrária, meio ambiente, direitos humanos e seus pares. Modelo de colonização que optou pelo uso intensivo dos recursos naturais, responsável pela devastação da floresta, a exemplo de pólos de siderurgia no Pará e Maranhão, e pelas monoculturas, como a da soja.

A contradição da campanha

A contradição reside nas peças publicitárias da campanha em Belém, que explicita o patrocínio da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD). Uma das maiores empresas de mineração do mundo, que domina uma fatia robusta do território do Pará, em particular no sudeste do estado, e que se encontra justo em oposição aos atores sociais que a CNBB preconiza defender. Uma nota divulgada por um conjunto de instituições, entre elas a Comissão Pastoral da Terra (CPT), alerta para a questão.

O rosário de projetos da CVRD, que tem investido pesado em logística, a exemplo de hidrelétricas, minerodutos, portos e ferrovias, vai de encontro às populações marginais da região. Em São Luís, capital do Maranhão, a empresa tem projeto de uma grande siderurgia em associação com capital estrangeiro.

Na ilha de São Luís tal modelo de projeto, além do grande impacto ambiental que provocará na cidade, que já padece de problemas com abastecimento de água, deverá afetar várias comunidades tradicionais. Algumas seculares. Lá estão pescadores, agricultores e extrativistas. A denúncia vem do coletivo de entidades sociais denominado Reage São Luís.

No Pará há uma peleja da CVRD com comunidades quilombolas no município de Mojú. No começo do mês um cabo de alta tensão provocou um acidente no quilombo. Um menino de 10 anos teve os dois braços quebrados e algumas costelas fraturadas. O cabo integra o linhão de energia de expansão de suas empresas de alumina e alumínio no município de Barcarena. Nenhum registro foi feito na mídia local.

No mesmo município uma associação de ex-técnicos vitimados no processo de trabalho nas fábricas busca por uma compensação. Segundo a Associação em Defesa dos Reclamantes e Vitimados por Doenças do Trabalho na Cadeia Produtiva do Alumínio no Estado do Pará (ADRVDT), há ex-operários com problemas mentais, respiratórios, na coluna e ossos. As doenças teriam como fonte o convívio com produtos químicos na produção do alumínio, e exaustivas jornadas de trabalho.

É indiscutível o poder da empresa, que no momento encontra-se no estágio de mundialização. Se no Canadá há todo um processo de garantir empregos e um guarda-chuva de segurança das populações locais, depoimentos de alguns técnicos e ex-técnicos, os atritos com alguns setores considerados tradicionais da região amazônica destoam. O peso da empresa privatizada em 1997, no processo considerado crime de lesa pátria, tende a submeter políticos e meios de comunicação locais a seus horizontes.

Se o vínculo com a CVRD não compromete a campanha, no mínimo deixa um profundo arranhão na proposta.

Rogério Almeida é autor do livro Araguaia-Tocantins: fios de uma história camponesa/2006. Mestre em Planejamento do Desenvolvimento pelo Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA) da Universidade Federal do Pará (UFPA), e colaborador da rede Fórum Carajás: www.forumcarajas.org.br
Correio eletrônico: araguaia_tocantins@hotmail.com
Foto: Dion Monteiro (Portão de entrada da Floresta Nacional de Carajás, Parauapebas/PA)

Arrozeiros ainda resistem na Raposa Serra do Sol

Após dois anos da homologação da terra indígena que abriga 17 mil índios, grandes produtores de arroz ainda investem normalmente em suas produções e insistem em manter plantios ilegais. Desintrusão deve ocorrer até final de abril.

Natalia Suzuki - Carta Maior
Para ver o texto completo acesse http://cartamaior.uol.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=13564

20 fevereiro 2007

Biodiesel: energia alternativa para a região amazônica?

Nos últimos anos, governos e a sociedade civil tomaram consciência da importância que as energias alternativas desempenham no contexto mundial. Sabendo-se que 1/5 de toda energia utilizada no planeta são de fontes renováveis e alternativas, e que por sua vez os combustíveis fósseis estão com suas reservas limitadas, originando grandes discussões mundiais sobre o uso de óleos vegetais como combustível, o tema tem merecido destaque no cenário geopolítico mundial.
A biomassa oleaginosa constitui uma alternativa possível com diversas opções técnicas aplicáveis para nossa sociedade, como a redução das importações de combustível diesel de petróleo, disponibilidade de energia elétrica para comunidades isoladas, o que no Brasil, principalmente na região amazônica, significa atender aproximadamente 10.000.000 de pessoas sem acesso à energia e combustíveis (MME, 2006), sendo que, apoiando-se nos atuais programas energéticos brasileiros, a energia para a região pode ser conseguida, passando também por soluções alternativas que afetem menos o meio ambiente e a comunidade, e com oportunidade de absorver um enorme contingente de mão-de-obra ociosa na região.
Realizando uma breve contextualização geral sobre os programas energéticos para a Amazônia, pode-se destacar o PROÓLEO, instituído pela resolução n° 07 de 22 de outubro de 1980, da Comissão Nacional de Energia, visando, primordialmente, a parcial substituição do óleo diesel através da utilização de óleos vegetais. Com objetivos comuns o governo brasileiro cria o PROBIOAMAZON – Programa de Biomassa Energética
em Assentamentos do INCRA na Amazônia, instituído entre o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) e o Ministério de Desenvolvimento Agrário (MDA), pela Portaria Interministerial de 11.10.2001.
No decorrer das atividades, em dezembro de 2001, é realizado o Termo de Cooperação Técnica para implantação do projeto-piloto de exploração da cultura do dendê no
assentamento de reforma agrária Tarumã-Mirim (Manaus - AM), assinado entre o INCRA, SEBRAE, EMBRAPA, IDAM, SUFRAMA e IBAMA. A partir destas experiências promissoras em relação ao uso de óleo vegetal como combustível, o governo entendendo a importância deste setor energético para o desenvolvimento do país, cria o PROBIODIESEL, instituído pela portaria n° 702 de 30.12.02, do MCT, dando origem mais tarde ao PNPB - Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel, através do decreto-lei n° 11.097/2005, criando a figura do Produtor de biodiesel e estabelecendo metas e obrigatoriedade da comercialização de B2 em 2008 e B5 em 2013, em todo território nacional.
A abundância da biomassa vegetal e animal na Amazônia fazem com que a região tenha um papel de destaque para o setor energético nacional. Um exemplo são as experiências dos estados do Amazonas, Acre e Pará, que com a utilização da biomassa vegetal tem proporcionado a constituição de pequenas ilhas energéticas na região, através da extração e uso direto de óleos vegetais, produzido mediante agricultura familiar e extrativista.
A utilização de biocombustíveis na Amazônia, embora com uma participação bastante restrita se levarmos em consideração o universo da demanda por energia na região, poderá possibilitar a melhoria das condições ambientais, geração de emprego e renda no meio rural, principalmente aquelas famílias que adotaram o cultivo de dendê com vistas a atender o mercado de biodiesel.
O dendê, por ser considerado uma das culturas mais versáteis que se tem conhecimento neste momento, tem demonstrado uma considerável participação no acréscimo da renda de 160 famílias no Pará, que trabalham em regime de contratos negociados com a Companhia Refinadora da Amazônia (única empresa de biodiesel na região norte com o selo do combustível social), neste momento a produção familiar, embora ainda em suas primeiras produções, tem alcançado a média mensal de 2.000 ton/CFF (Cacho de Fruto Fresco), com envolvimento direto de 100 famílias em aproximadamente
1.000 ha. O rendimento mensal médio destas famílias se aproxima a R$ 2.900,00 somente com comercialização de dendê. Pode-se esboçar através desta experiência piloto na Amazônia, que este cenário que o mundo moderno vem delineando nos últimos anos, com metas bem definidas entre países industrializados e em vias de desenvolvimento, com a utilização de biomassa para a produção de combustíveis ou geração de energia, deverá também, além de agregar mais renda para suas populações, gerar um ambiente mais limpo e sustentável em longo prazo.
Das reflexões apresentadas fica evidente que os caminhos a seguir são inúmeros, e de grande complexidade no contexto da utilização de biomassa para produção de biodiesel, ressalta-se que o grande desafio neste momento é aliar a política energética nacional em escalas regionais e locais, de modo a aproveitar as oportunidades do uso de biomassa como fonte alternativa de energia e contribuindo também para o desenvolvimento sustentável da região Amazônica.

MSC Kátia Fernanda Garcez Monteiro - Téc/Consultora-MDA/SZAMPEG
Correio eletrônico: kfgarcez@amazon.com.br

Decisão do TRF sobre Belo Monte abre portas para aplicação da Convenção 169 da OIT no Brasil

Decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região reconheceu a nulidade do Decreto Legislativo 788/05, que autorizava a construção da usina hidrelétrica [de Belo Monte, no Pará], e se fundamentou na necessidade de consulta específica, por parte do Congresso Nacional, aos povos indígenas afetados pelo empreendimento. Precedente deve modificar o rumo de outros projetos de autorização de aproveitamento hidrelétrico em terras indígenas em curso no parlamento nacional.

Por Raul Silva Telles do Valle
Ver texto completo em:
http://www.socioambiental.org/nsa/direto/direto_html?codigo=2007-02-13-151645

Violência no acampamento Boa Esperança, AM

No dia 8 de fevereiro, a Polícia Militar do estado do Amazonas, cumprindo mandado de reintegração de posse expedido pela juíza Katte dos Santos Gomes, queimou 40 casas do Acampamento Boa Esperança, ao sul do município de Lábrea, AM, e espalhou o medo e o terror entre as famílias. O acampamento, com 800 famílias, se situa numa área que faz divisa com os estados de Rondônia e Acre. O conflito se estende há mais de 5 anos com um saldo trágico: cinco mortos, um dos quais esquartejado, além de pessoas desaparecidas, somadas a um suicídio por depressão.
Por estar a área de conflito mais próxima da Capital do Acre, uma comissão formada por 14 entidades, alguns deputados estaduais, imprensa e o pró-reitor da UFAC e assessor da CPT do Acre, Elder Andrade, passaram mais de dez horas no acampamento e verificaram as denúncias. A lei que impera no local é a imposta pelas armas dos mais de 50 supostos pistoleiros, comandados pelo “jagunço” Márcio de Souza Gomes. O principal acusado pelo terror provocado é o senhor Waldair João Schneider, que agiria em nome de seu irmão Atanázio, residente no Rio Grande do Sul, mas que tem o controle da situação na região em conflito. Saloni dos Santos, conhecida como Rosa Sem-terra, uma das líderes do acampamento, esteve em Manaus procurando as autoridades e no dia 13 viajou a Brasília para uma audiência com o Ouvidor Agrário, Gercino José da Silva Filho, do Ministério do Desenvolvimento Agrário, MDA.

Fonte: http://www.cptnac.com.br/?system=news&action=read&id=1746&eid=8

18 fevereiro 2007

Homenagem do Instituto AMAS ao Padre Josimo Tavares, assassinado pelo latifúndio 20 anos atrás

Imperatriz, Maranhão.
Sábado, 10 de maio de 1986, 12h15min.
O padre Josimo Moraes Tavares, 33 anos, sobe a escada do edifício onde funciona a Comissão Pastoral da Terra (CPT).
O pistoleiro Geraldo Rodrigues aperta o gatilho do seu Taurus calibre 7.65.
Está a 5 metros de Josimo, o vê pelas costas e dispara dois tiros.
A primeira bala raspa no ombro direito de Josimo e vai alojar-se na parede.
A segunda perfura o rim e o pulmão e sai pelo peito.
O padre Josimo morria, duas horas depois, no hospital.
Duas semanas antes, durante a assembléia diocesana, em Tocantinópolis/TO, Josimo tinha deixado um testamento.
Estava sendo ameaçado de morte.
Ele dizia:
"Tenho que assumir.
Estou empenhado na luta pela causa dos lavradores indefesos,
povo oprimido nas garras do latifúndio.
Se eu me calar, quem os defenderá?
Quem lutará em seu favor?
Eu, pelo menos, nada tenho a perder.
Não tenho mulher, filhos, riqueza...
Só tenho pena de uma coisa: de minha mãe, que só tem a mim
e ninguém mais por ela.
Pobre.
Viúva.
Mas vocês ficam aí e cuidam dela.
Nem o medo me detém.
É hora de assumir.
Morro por uma causa justa.
Agora, quero que vocês entendam o seguinte:
tudo isso que está acontecendo é uma conseqüência lógica do meu trabalho na luta e defesa dos pobres, em prol do Evangelho, que me levou a assumir essa luta até as últimas conseqüências.
A minha vida nada vale em vista da morte de tantos lavradores assassinados, violentados, despejados de suas terras, deixando mulheres e filhos abandonados, sem carinho, sem pão e sem lar".

Fonte: http://www.dhnet.org.br/w3/cdhcto/josimo/josimo.htm

Araguaia - Tocantins: memórias da luta

Três fatos que marcam a história da trajetória camponesa do Bico do Papagaio, norte do Tocantins, sul do Pará e oeste do Maranhão, completam décadas de vida. No próximo mês de maio [texto escrito em 2006], dia 10, a execução do Padre Josimo Tavares, assassinado com um tiro pelas costas, no município de Imperatriz, oeste do Maranhão, completa duas décadas. Já em abril, no dia 17, o Massacre de Eldorado soma a primeira. O episódio tem a chancela da impunidade, onde todos os envolvidos estão em liberdade. O capítulo da triste página de nossa história ocorreu no sudeste do Pará. Estado que ocupa o primeiro lugar no ranking de violência contra camponeses. Os quase oitocentos casos de mortes registrados, ao longo de 30 anos, tem perto de cem por cento de impunidade.
O massacre ocorreu em pleno regime dito democrático, sob as ordens de dirigentes do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB). Presidia o país o doutor em sociologia Fernando Henrique Cardoso, e o estado do Pará era dirigido pelo médico Almir Gabriel.

A coerção pública e privada tem marcado a luta pela terra e os recursos naturais nessa faixa da Amazônia, contra os camponeses e suas variadas formas de organização. Não raro com gente assassinada somente num extremo, o que descaracteriza o enquadramento de conflito.
A tese de conflito é desqualificada ainda, ao se analisar a diferença de forças. E mesmo a atitude do poder Judiciário que, sempre ágil na expedição de liminares de reintegração de posse, revela-se sonolento no encaminhamento dos processos que envolvem execução de dirigentes camponeses, sem terra e assessores.
Pe. JOSIMO
Ordenado em 1979, Pe. Josimo foi morto muito jovem. O religioso somava apenas 33 anos. Negro e pobre, fez a opção pelos pares camponeses. Na obra da inglesa Binka Le Breton, "Todos Sabiam", lançada pela Loyola (2000), a autora ressalta que a ação de Josimo não tinha unanimidade.
O padre que escapou de um atentado, teve a vida marcada por denunciar a ação dos fazendeiros e grileiros. A atitude do padre frente às atrocidades cometidas contra posseiros se alinhava com um segmento da Igreja Católica, que em prática e discurso havia feito a opção pelos oprimidos.

Rogério Almeida é autor do livro Araguaia-Tocantins: fios de uma história camponesa/2006. Mestre em Planejamento do Desenvolvimento pelo Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA) da Universidade Federal do Pará (UFPA), e colaborador da rede Fórum Carajás: www.forumcarajas.org.br
Correio eletrônico: araguaia_tocantins@hotmail.com
Para receber a versão integral deste texto envie mensagem para institutoamasblog@yahoo.com.br

Foto: Dion Monteiro

17 fevereiro 2007

CPT denuncia ameaças sofridas por trabalhadores acampados na fazenda Rio Vermelho no Pará

Desde o início do ano de 2007, trabalhadores acampados há quase um ano na fazenda Rio Vermelho, município de Sapucaia, sul do Pará, supostamente de propriedade do Grupo Quagliato, vem sofrendo ameaças de indivíduos armados infiltrados no acampamento para pressioná-los a sair da terra. Estes se apresentam como pistoleiros e emissários do fazendeiro Roque Quagliato e chegam a oferecer dinheiro a algumas famílias para que elas deixem a área, caso contrário, irão seqüestrar as principais lideranças do acampamento e matá-las em seguida. Essas ameaças se repetiram inúmeras vezes nas últimas semanas e foram testemunhadas por diversas pessoas que fizeram um Boletim de Ocorrência Policial na Delegacia de Xinguara, PA. Devido a isso, a Comissão Pastoral da Terra do Sul e Sudeste do Pará fez uma carta-denúncia no dia 15 de fevereiro para cobrar a averiguação desses fatos e a regularização das famílias do acampamento intitulado João Canuto o quanto antes.
O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) já constatou que pelo menos parte das terras da fazenda Rio Vermelho pertence à União, mas não definiu, ainda, a dimensão dessas terras. Por isso, a CPT cobra mais urgência nessas definições por parte do INCRA.

Fonte: www.cptnac.com.br

As mártires do campo

Várias pessoas se destacam na histórica luta pela terra. Em um ambiente marcado por repressões hostis àqueles que levantam a voz contra a exploração e em nome de um bem comum, vidas são ceifadas. Vítimas do autoritarismo e da impunidade que ainda domina o país. Dentre todas as histórias desses que se tornaram figuras de grande simbologia, os mártires da terra, destacam-se aquelas que tiveram um importante papel dentro das lutas agrárias. São mulheres que lutaram não só pela terra, mas contra o preconceito e as dores da perda de maridos e filhos, que não abalaram a sua credulidade na luta e no significado da tão esperada reforma agrária no Brasil. Algumas serão, aqui, lembradas pelos seus feitos e sua importância na história, outras, talvez não sejam citadas, mas não são esquecidas e nem menos importantes para quem está na luta.

Acesse o link abaixo, da CPT, para ver a história de algumas dessas mulheres:
http://www.cptnac.com.br/?system=news&action=read&id=1497&eid=16

15 fevereiro 2007

Disputa por terra na Amazônia: de que lado a Justiça samba?

No mês do carnaval faz dois anos da execução da missionária Dorothy Stang. Na mídia nada de muito relevante. A banalização tem sido a linha desses casos que envolvem disputa pela terra na Amazônia. Para brasileiros do centro do poder ainda uma terra incógnita. E mesmo para muitos que moram na região. Rico ou pobre.
Quando ocorrem esses casos por cá, nunca tive a honra de verificar linhas indignadas nos editoriais nos jornalões. Seria pedir demais também. O processo do crime é histórico. Num prazo inferior a um ano a raia miúda foi presa, julgada, condenada e ainda não fugiu da cadeia. Já os tubarões a lei não alcançou.
Creio não restar dúvida que a origem da missionária ajudou a sacudir o Judiciário paraense. Nunca célere nessas empreitadas. A exemplo do caso de Dezinho (José Dutra da Costa), sindicalista de Rondon do Pará executado em 2000.
Seis anos separaram o dia do crime ao dia do julgamento. Isso porque o pistoleiro foi preso por populares no instante do crime. Ainda hoje o principal suspeito, o fazendeiro Delsão não foi a julgamento. Ocorre interrogar se os mandantes continuam a escapar do banco dos réus.
Outros casos não tiveram a mesma sorte. Como no caso do sindicalista de Rio Maria, João Canuto, que precisou de quase duas décadas para que os mandantes fossem a julgamento. Por serem primários e possuírem, segundo a lei, bons antecedentes, gozaram do privilégio de responder em liberdade e depois fugiram.
Canuto e outros familiares foram mortos na década de 1980. Tal como Expedito Ribeiro, também do mesmo sindicato de João. A década é a mais sangrenta do sul e sudeste do Pará. Trata-se de anos de ação da UDR. Nela ocorreram inúmeras chacinas. Muitas sequer possuem processo.
Em certa medida o modelo de ocupação da região ajuda a elucidar a questão. O mesmo concentrou terra e renda nas mãos de poucos. Ao se pontuar a agenda pra Amazônia, percebe-se que um filme se repete.

Rogério Almeida colabora com a rede www.forumcarajas.org.br
Correio eletrônico: araguaia_tocantins@hotmail.com
Foto: Ivonete Coutinho (Quadro sobre a violência no campo, STR de Brasil Novo/PA)

MST denuncia extração de madeira ilegal no Pará

O MST ocupou hoje, 14, a sede da Fazenda Peruano, em Eldorado dos Carajás, no Pará, para denunciar a extração ilegal de madeira pelo grileiro Evandro Mutran. O fazendeiro também sofre processo por uso de trabalhadores escravo.
As 450 famílias Sem Terra estão acampadas desde 2004 na área, que tem 12 mil hectares e está em processo de desapropriação pelo Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra). O MST pede que o Incra junto com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), e o Instituto de Terras do Pará (Iterpa) realizem uma inspeção na área para constatar o crime ambiental na fazenda.
"Queremos impedir a continuidade da devastação, um crime ambiental, e a venda ilegal de madeira", disse Maria Raimunda, da direção nacional do MST.
Os lavradores cobram também a aceleração do processo de criação do assentamento, que desde o ano passado está parado no Iterpa. De toda a área da fazenda, metade pertence ao Estado do Pará. A outra parte foi grilada por Evandro Mutran.
"O Incra já terminou o levantamento da área. Agora falta vontade política do governo do Pará e do Iterpa para assentar as famílias", disse Maria Raimunda.
Evandro Mutran foi autuado pelo Ministério do Trabalho em 2001 por utilização de mão-de-obra em condição análoga à escravidão em duas propriedades rurais: a própria Peruano e a fazenda Cabaceiras, em Marabá.

Fonte: www.mst.org.br
Foto: Fabiano Bringel

14 fevereiro 2007

Trabalho desenvolvido por freira melhora assentamentos

2 anos após assassinato de Dorothy Stang em Anapu (PA), Projetos de Desenvolvimento Sustentável que ela ajudou a criar crescem em organização e produtividade, mas morosidade do Estado ainda atrapalha.

Verena Glass - Carta Maior
http://cartamaior.uol.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=13511

Bico do Papagaio: dias de sangue, dias de UDR, 20 anos atrás

A defesa intransigente na manutenção de grandes extensões de terras na região de fronteira, integrou o DNA da formação da União Democrática Ruralista (UDR). A mesma veio a nascer no imortalizado Bico do Papagaio, quando o norte do atual estado do Tocantins, pertencia ao estado de Goiás. O Bico se completa com o sul do Pará, e o oeste do Maranhão.
Região cantada em prosa, verso, pesquisas, reportagens, onde mais se matou camponeses na disputa pela terra no Brasil. No extenso obituário de camponeses, uma parcela significativa é creditada ao escudo da UDR. Ainda hoje a região é palco de execuções de trabalhadores(as) rurais que defendem a reforma agrária. Passadas duas décadas, tal latitude do país continua a registrar índice alarmante de trabalhadores em condições análogas à escravidão.
A UDR surge no cerrado goiano em 1985, a partir da reunião de dirigentes da Federação da Agricultura de Goiás, da Associação dos Criadores de Gir, Nelore e Zebu de Goiás, da Associação dos Fazendeiros de Araguaína e da Associação dos Fazendeiros do Xingu. No ninho de animadores destacam-se: Ronaldo Ramos Caiado, estrela de primeira grandeza da sigla, Jairo de Andrade, um dos organizadores da “Marcha com Deus, pela Família, pela Liberdade”, idos de 1964, mineiro do município de Passos, Altair Veloso e Salvador Farina, donos de terras em Goiás. Único fazendeiro de fora da região a integrar a UDR foi o engenheiro agrônomo Plínio Junqueira Júnior, de tradicional família paulista.
As informações aqui elencadas tomam como base a obra “Donos de Terras: trajetória da União Democrática Ruralista (UDR)”, da pesquisadora Marcionila Fernandes, publicada em 1999, em Belém/Pará. A obra resulta de pesquisa de dissertação defendida no Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA), da Universidade Federal do Pará (UFPA), no de 1992.

Rogério Almeida é colaborador da rede www.forumcarajas.org.br e autor do livro: Araguaia-Tocantins: fios de uma História camponesa/2006.
Para receber a versão integral deste texto envie mensagem para institutoamasblog@yahoo.com.br

Amazônia: haverá primavera?

A Amazônia é uma floresta urbana. 70% da população ocupam as grandes e médias cidades. Berta Becker, geógrafa da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), chacoalhou o debate na academia quando fez a afirmação em tempos idos.
A pesquisadora recordou o fato quando esteve em Belém, durante um seminário internacional, “Cidade na floresta”, organizado pelo Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA), da Universidade Federal do Pará (UFPA), entre 29 de novembro a 01 de dezembro. Além de debater a questão, a geógrafa foi homenageada. O seminário foi possível por conta da associação com uma pororoca de organizações.
Refletir a cidade foi o desafio imposto ao encontro. A superação entre a dicotomia entre urbano e rural, serviu de princípio. Afinal, os dias são de rompimento das fronteiras de espaço e tempo. O pacto colonial tem nova tintura. Uns chamam de globalização.
O cimento sobre os rios
A indiferença aos recursos hídricos foi revelada em posição de diferentes debatedores. Tanto Belém, quanto Manaus, são cidades que cresceram de costas para o rio. Logo ele que na capital paraense aflui com tanto vigor. As janelas que permitem partilhar do mesmo são estreitas. Logo Belém que poderia muito bem, como Veneza, respeitar tal recurso. Logo Belém, quase uma ilha.
As cidades crescem sobre os igarapés. Cimento sufoca as veias dos rios. As cidades se verticalizam. Os condomínios verticais ou não, despontam como signos da tragédia social que conforma o país. As cidades se avolumam sem saneamento básico. Favelas pipocam sobre os rios. Haverá primavera na selva de cimento?
As cidades médias, tais como Marabá e Santarém no Pará, e Tefé no Amazonas, revelam-se importantes centros burocráticos, econômicos e políticos. Desdobramento do avanço do processo de produção capitalista sobre a fronteira. Caminhada que desordena laços de solidariedade, redimensiona o espaço, redefine territórios, altera o poder.
No campo, os elementos de tal processo são expressos através da destruição ambiental, grilagens de terras, trabalho escravo, aguda disputa pelo território, morticínio de camponeses, reconfiguração da identidade indígena. No campo, o agronegócio avança.
A cidade é o espaço do negócio, da disputa política, das marchas dos sem terra e da festa agropecuária. “A cidade não pára. A cidade só cresce. O de cima sobe. E o de baixo desce”. A cidade é o espaço da informalidade. A cidade é o espaço do rapa, das meninas violadas na precocidade.
A integração regional dos milicos primava em pólos de integração de produção. Assim foram impostos os projetos de pecuária, mineração, siderurgia e madeira. No presente a integração desejada é via eixos. Comunicação, transporte e energia são as colunas.
Assim Coari, no coração do Amazonas, tem agenda pautada por projetos da Petrobrás, que explora gás e petróleo. Assim a bacia do Araguaia-Tocantins, a maior em potencial de produção de energia, conta as barragens erguidas. Mede os trilhos das ferrovias e o asfalto sobre a mata. Sem renegar os hectares das monoculturas.
Sendo assim, interroga-se: é possível a reprodução ampliada da vida?

Rogério Almeida é colaborador da rede www.forumcarajas.org.br
Correio eletrônico: araguaia_tocantins@hotmail.com