29 abril 2007

Mortes no campo aumentam 50%

A violência no campo paraense teve aumento de 50% no número de assassinatos entre 2005 e 2006. Foram 16 mortes ocorridas em 2005 contra 24 no ano passado. Em todo o país, no mesmo período, ocorreram 39 mortes. O levantamento, feito pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), impressiona porque coloca o Pará, mais uma vez, na triste condição de campeão nacional de mortes e conflitos em razão da disputa pela terra. Prova, também, que a reforma agrária ainda é peça de ficção no país, particularmente no Estado, onde as invasões de fazendas ocorrem com freqüência.
Para a CPT, os números reafirmam que permanecem intocados os alicerces da concentração da propriedade, sua defesa como valor quase absoluto, a 'truculência dos que dela se apropriaram e, sobretudo, a impunidade'. Os mais pobres, que buscam na terra um meio de garantir a moradia e a própria sobrevivência, continuam sendo as maiores vítimas. O relatório mostra que, no país, houve um aumento de 176% das tentativas de assassinato em relação a 2005. Foram 72 no ano passado e 26 em 2005. O número de prisões também sofreu aumento de 251,34%, no mesmo período (de 261 trabalhadores em 2005 para 917 no ano passado).
A impunidade dos assassinos, muitos dos quais têm seus processos paralisados na Justiça, diz a CPT, contribui para o agravamento da violência. Nos últimos 20 anos foram registrados 1.104 conflitos com assassinatos. Nestes conflitos, morreram 1.464 trabalhadores. Destas ocorrências, somente 85 foram levadas a julgamento, que resultaram na condenação de 71 executores e de somente 19 mandantes. 'É preciso que a sociedade brasileira exija do Poder Judiciário uma atuação mais rigorosa', salienta a entidade.
Um exemplo de impunidade, segundo ela, é o massacre de Eldorado dos Carajás, onde 19 sem-terra foram mortos. Mesmo condenados, o coronel Mário Colares Pantoja (a 228 anos de prisão) e o major José Maria Oliveira (a 158 anos) conseguiram habeas corpus e hoje aguardam o julgamento de recursos em liberdade.

CONFLITOS
No ano passado, foram registradas 1.212 ocorrências de conflitos relacionados com a posse, uso, resistência e luta pela terra. Ao todo estiveram envolvidas 140.650 famílias. Quase 20% destas ocorrências envolveram comunidades e povos tradicionais como indígenas e quilombolas. O número representa uma diminuição de 7,82% em relação a 2005, quando foram registrados 1.304 conflitos.
Já as ocupações apresentaram diminuição de 12,13% (384 em 2006; 437 em 2005). Ainda maior (25,56%) foi a diminuição dos acampamentos (67 em 2006; 90 em 2005). Nesses conflitos foram despejadas 19.449 famílias com ordem judicial e expulsas outras 1.809 pelos fazendeiros.
Estes números representam uma redução de 24,08% em relação ao número de famílias despejadas em 2005 (25.618 famílias) e de 58,57% em relação às famílias expulsas (4.366 em 2005). Os despejos judiciais não atingem somente ocupações novas, mas áreas ocupadas de longa data.
Chamou a atenção, no ano passado, o despejo de toda uma comunidade quilombola, a de São Malaquias, no município de Vargem Grande (MA). As famílias viviam na área há mais de cem anos. O corpo de um morador que havia falecido no dia do despejo teve que ser levado para outra comunidade para ser velado, enquanto sua casa era destruída. Entre os casos de expulsão destaca-se o acontecido em Murici (AL), onde 29 famílias foram expulsas pela ação da família Calheiros, que domina o poder político.
A leitura desses números, relacionando-os com a população rural de cada estado ou região, observa a CPT, revela uma outra visão do problema fundiário. Onde ocorre o maior número de ocupações e acampamentos, no Centro e no Sul do País, o número de assentamentos é menor. Por outro lado, os índices de violência sofrida pelos trabalhadores são bem maiores nas regiões onde a ação dos movimentos é menos intensa, como na Amazônia. 'Com isso, fica patente que a violência no campo não pode ser creditada ao aumento da pressão dos movimentos do campo, mas continua diretamente vinculada à truculência histórica do latifúndio, travestido hoje de agronegócio', critica o relatório.

Carlos Mendes - Da Redação de "O Liberal"
Fonte: Jornal “O Liberal” - Edição: Ano LXI - Nº 31.734 - Belém, Domingo, 29/04/2007

28 abril 2007

Pistoleiros expulsam famílias sem terra de fazenda em Parauapebas

Um grupo de pistoleiros fortemente armado espancou e expulsou 30 famílias de trabalhadores rurais sem terras ligados à FETAGRI - Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Pará, que estava acampado na Fazenda Juazeiro, município de Parauapebas, no Sudeste do Pará.
Segundo os trabalhadores, no início da manhã do dia 24 de abril, foi grande a movimentação de diversos fazendeiros, em suas camionetes, na estrada vicinal que dá acesso à sede da fazenda. Por volta das 11:00h, sete homens encapuzados e fortemente armados prenderam dois trabalhadores, membros do acampamento e renderam as famílias de sem terra depois de dispararem, diversas vezes, suas armas sobre as pessoas. Um dos trabalhadores foi agredido e muito espancado na frente de sua família. Os trabalhadores que não conseguiram escapar foram levados pelos pistoleiros para a sede da fazenda. Lá alguns deles foram trancados nos banheiros enquanto os pistoleiros traziam os outros. Na sede da fazenda foram colocados numa camionete F350, Placa MVV 0706, que era conduzida pelo gerente da fazenda, o Sr. Moisés Gonçalves Ferreira, e foram levados para a Delegacia de Parauapebas. De acordo com as informações prestadas pelos trabalhadores, os sete pistoleiros encapuzados e armados, seguiram a camionete até próximo da rodovia que liga Parauapebas a Cannã dos Carajás. Tão logo chegaram à rodovia se encontraram com soldados da Policia Militar aos quais o gerente da fazenda entregou os trabalhadores. De lá todos foram conduzidos para a delegacia de polícia e autuados pelo Delegado André Luiz Nunes Alburqueque. Vinte e dois adultos e diversas crianças ficaram detidos das 14:00h do dia 24 até as 12:00h do dia 25 de abril. Além da violência física sofrida pelos trabalhadores, muitos tiveram suas casas e pertences incendiados e totalmente destruídos. Até o momento, informações vindas de Parauapebas dão conta de que pelo menos cinco trabalhadores estão desaparecidos.
As pessoas expulsas fazem parte de um grupo de 30 famílias de trabalhadores rurais sem terra que estão acampadas desde o final do ano passado na Fazenda Juazeiro, que seria de propriedade de Maria do Socorro Mangabeira Marques. Segundo os trabalhadores a fazendeira concordou com o acampamento porque pretendia negociar com o INCRA a desapropriação do imóvel. Ainda em 2006 os advogados da fazendeira tinham entrado com Ação de Interdito Proibitório junto à Vara Agrária de Marabá e esta teve indeferida a liminar. Depois da ocupação da fazenda a ação foi convertida em Reintegração de Posse e o juiz da Vara Agrária, Dr. Líbio Araújo Moura, mais uma vez negou a liminar. Diante dessa situação, a fazendeira Maria do Socorro, contando com a solidariedade de diversos fazendeiros da região de Canaã dos Carajás, Parauapebas e Curionópolis, contratou pistoleiros e expulsou as famílias de sem terra que estavam na área.
Segundo informações colhidas em Parauapebas, a ação perpetrada pelos pistoleiros na fazenda Juazeiro no último dia 24, teria sido articulada pelo ex-major do exército brasileiro e atual prefeito da cidade de Curionópolis, Sebastião Moura, o Curió, e pelo atual presidente do Sindicato dos Produtores Rurais de Parauapebas (SINPRODUZ), Sr. Lázaro de Deus Vieira Neto.
Os municípios de Parauapebas, Curionópolis e Canaã dos Carajás, estão na área de influência do Projeto de Ferro Carajás e abrigam grande parte dos latifúndios improdutivos da região sudeste do Pará. Enquanto a terra e a renda se concentram nas mãos de poucos, a grande maioria da população continua pobre. Segundo os dados do IBGE (2000), estes municípios contam com uma população 101.196 habitantes. Destes 10.587 são sem instrução e menos de um ano de estudo; 18.669 estudaram da primeira a sétima série; 13.655 recebem até um salário mínimo e 38.294 estão dentro da categoria “sem rendimento”. As famílias que estavam acampadas na Fazenda Juazeiro, em sua grande maioria são originárias do Estado Maranhão e chegaram à região atraídas pelo garimpo de Serra Pelada e pela extração de minério na Serra dos Carajás. Como são pobres e sem perspectiva de emprego não resta outra alternativa senão a ocupação de grandes latifúndios improdutivos na região.
Os fatos aqui relatados estão sendo apurados pela Delegacia de Conflitos Agrários (DECA) de Marabá. No entanto, é pertinente ressaltar que o Batalhão Especial da Polícia Militar de Belém se encontra na região de Parauapebas desde o último dia 17 de abril, e não conseguiu evitar a ação dos pistoleiros a mando da proprietária da fazenda Juazeiro. Este acontecimento é idêntico ao ocorrido em 18 abril de 2005, quando um grupo de fazendeiros fortemente armados, que, de acordo com informações que circulam em Parauapebas, teriam sido coordenados por Sebastião Curió e pelo Presidente do SINPRODUZ, Lázaro Vieira Neto, expulsou 80 famílias de trabalhadores rurais sem terra da fazenda São Luiz, no município de Canaã dos Carajás. Naquela ocasião os fazendeiros conduziram os trabalhadores até uma barreira policial, montada na rodovia que liga Parauapebas à cidade de Canaã dos Carajás. Foram presos 21 trabalhadores, entre eles, 3 menores de idade.
Diante desses últimos acontecimentos, exigimos que a Secretaria de Segurança Pública do Estado do Pará proceda a uma séria e criteriosa investigação para que se chegue aos responsáveis pelas atrocidades cometidas contra os trabalhadores acampados na Fazenda Juazeiro, bem como, que o Governo Federal, através do INCRA, desaproprie a área para assentamento das famílias que lá se encontram. É inaceitável que a polícia aja com a maior eficiência quando é para prender trabalhadores, e não adote a mesma prática em relação a fazendeiros que cometem crimes contra famílias sem terra.

Marabá, 27 de abril de 2007
Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Pará – FETAGRI
Comissão Pastoral da Terra de Marabá – CPT
Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos – SDDH – Seção Marabá

25 abril 2007

Polícia prende pistoleiro que mataria viúva de sindicalista [Dezinho]

A Polícia Civil prendeu, no município de Rondon do Pará, um homem que teria sido contratado para assassinar a viúva do sindicalista José Dutra da Costa, o Dezinho, Maria Joel Dias da Costa. Segundo a viúva, o acusado, Luiz Gonzaga Silva, procurou por ela - também jurada de morte - no final da tarde de terça-feira (24), na sede do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Rondon do Pará. 'Ele disse que tinha sido contratado para me matar, mas que conhecia o meu trabalho no sindicato, que não faria isso. Depois de muita conversa, ele me pediu R$300,00 e disse que se eu desse esse dinheiro, ele me contaria quem mandou fazer o serviço', explicou em entrevista por telefone ao Portal ORM.

A viúva prometeu levantar o dinheiro pedido pelo pistoleiro e contactou a polícia. 'Procurei a delegada Daniela, que está fazendo um trabalho aqui na cidade e ela me orientou a procurar a delegacia. A polícia me orientou e montou o flagrante', continuou. A prisão de Luiz Gonzaga ocorreu hoje de manhã por volta das 8h30, na sede do sindicato. O pistoleiro chegou a receber o dinheiro. 'Depois que dei o dinheiro, ele contou que o mandante tinha sido o Décio José Barroso Nunes, o Delsão, mesmo homem que mandou matar o meu marido', explicou.
Depois de ter sido preso, o homem prestou depoimento ao delegado Sílvio Maués, titular da delegacia de Paragominas. No interrogatório, ele confirmou a informação dada à viúva do sindicalista. O acusado será transferido para Belém. Maria Joel da Costa também prestou depoimento. Ela foi ameaçada de morte outras vezes e por isso recebe proteção policial. A viúva, no entanto, ainda não decidiu o que fará diante de mais esta ameaça. 'Ainda não tive muito tempo para pensar, não sei se vou sair de Rondon, mas por enquanto continuo por aqui', disse.
Décio Barroso Nunes é acusado também de ser o mandante do assassinato de Dezinho, ocorrida em Rondon do Pará, em novembro de 2000. O sindicalista José Dutra da Costa foi assassinado pelo pistoleiro, Wellington de Jesus Silva, já condenado a 29 anos de prisão. Dezinho foi assassinado em frente da sua casa e havia sido ameaçado de morte por várias vezes.
A denúncia oferecida pelo Ministério Público apontou que o crime, pelo qual o acusado receberia a quantia de R$ 2 mil, teria sido encomendado pelo fazendeiro Décio José Barroso Nunes, conhecido como 'Delsão' e intermediado por Ygoismar Mariano da Silva e Rogério de Oliveira Dias. Os dois últimos tiveram prisão preventiva decretada e estão foragidos.

Fonte : www.orm.com.br - Redação Online (Postado em 25/04/2007 - 18h25m)
Foto acessada em http://www.rel-uita.org/internacional/ddhh/violencia_cero/premio_joelma-por.htm (Foto da sindicalista Maria Joel Dias da Costa)

24 abril 2007

Justiça quer explicação da Eletrobrás e Ibama sobre Belo Monte

O juiz Herculano Martins Nacif, da Vara Única de Altamira (PA), determinou nesta quarta-feira (18) que a Eletrobrás e o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Renováveis (Ibama) devem prestar esclarecimentos em 72 horas sobre a ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal (MPF) no Pará. A ação pede a paralisação do estudo e do relatório de impacto ambiental (EIA-Rima) da usina hidrelétrica de Belo Monte no rio Xingu. A Eletrobrás iniciou o estudo sem o termo de referência, que estabelece critérios para realizar o EIA-Rima e deve ser editado pelo Ibama.
A Justiça determina que ou o Ibama apresente o termo de referência, ou tome as providências necessárias para que seja concluído com prazo pré-determinado. O não cumprimento da determinação valerá uma multa diária de R$ 50 mil.
Segundo a Eletrobrás, a estatal entrou com um processo para iniciar o EIA-Rima em 2006, mas devido ao embargo judicial, o estudo foi iniciado em janeiro deste ano e está na sua fase inicial, referente ao levantamento físico da área impactada.
De acordo com a Resolução do Conama n.º 001 de 1986, o órgão ambiental - no caso, o Ibama - deve dar os critérios para orientar o EIA-Rima: “Ao determinar a execução do estudo de impacto Ambiental o órgão estadual competente; ou o Ibama ou quando couber, o município, fornecerá as instruções adicionais que se fizerem necessárias, pelas peculiaridades do projeto e características ambientais da área”.
Contudo, a Eletrobrás afirma que o termo de referência não é uma exigência para se iniciar o estudo. “O termo de referência não é documento legal necessário para o início da elaboração do EIA-Rima, que é o primeiro passo para a obtenção da Licença Prévia (LP). Não há impedimento legal para que qualquer investidor inicie um EIA-Rima de qualquer aproveitamento hidrelétrico antes de receber o termo de referência do Ibama”, afirma a empresa.
Mesmo entendendo que o termo não é uma condição necessária, a Eletrobrás informou que entregou uma proposta deste documento ao Ibama. “A empresa, que já cumpriu a determinação legal de apresentar a proposta de termo de referência ao Ibama, está livre para começar os estudos”.
Segundo Felício Pontes, um dos procuradores da República responsáveis pela ação do MPF, a Eletrobrás pode propor um termo de referência ao Ibama, mas a instituição deve analisá-lo e apresentá-lo à sociedade. A partir disso, alterações podem ser feitas no documento pelo órgão ambiental.
De acordo com o diretor de Licenciamento Ambiental do Ibama, Luiz Felippe Kunz Júnior, a empresa pode fazer o estudo “por conta e risco deles”. Para ele, não há problemas em a Eletrobrás adiantar o processo, realizando estudos e pesquisas antes da edição do termo, mas isso não significa que esse levantamento não tenha que ser readequado, refeito ou aprofundado segundo critérios ambientais estabelecidos pelo Ibama. Kunz concorda que o EIA-Rima apenas é valido se houver um termo de referência editado pelo órgão ambiental. “Não vamos receber nenhum estudo que for entregue se não tiver o termo”, afirma.
Para o MPF, o fato de a Eletrobrás ser uma estatal é um problema neste caso. “O empreendedor está se arriscando a perder dinheiro, já que esses estudos podem não servir por não contemplarem os critérios propostos pelo Ibama. A Eletrobrás conta com o dinheiro público para o investimento na obra, inclusive para a realização do EIA-Rima”, explica Felício Pontes.

Sobre a ação pública
Para Luiz Felippe Kunz Júnior, diretor de Licenciamento Ambiental do Ibama, “a ação do MPF é incompreensível. A Justiça está se intrometendo em questões administrativas, que estão sob total controle do Ibama”. Segundo ele, as reuniões públicas referentes ao termo de referência e o EIA-Rima da Eletrobrás estão previstas entre maio e junho deste ano.
“A Eletrobrás tem respondido todos os questionamentos do MPF nos prazos concedidos. Sobre a presente ação, o Departamento Jurídico da empresa está estudando os passos a serem dados”, responde a estatal.

Pressa
Em sua ação civil pública, o Ministério Público Federal descreve o conteúdo do documento da empresa E.labore, contratada para realizar os estudos de interação social do empreendimento, que foi entregue em janeiro deste ano ao gerente do Ibama em Altamira. A E.labore é acusada por lideranças sociais contrárias a Belo Monte de “espionar” suas atividades para instrumentalizar os discursos da Eletrobrás.
No documento, a empresa menciona a ausência do termo de referência e recomenda que se mude, “devido às circunstâncias emergenciais, o escopo do nosso discurso estratégico, se provocados pela mídia e/ou sociedade, para explicar a realização dos atuais estudos, antes da consolidação do Termo de Referência”.
Na ação, os procuradores da República Marco Antonio Almeida e Felício Pontes criticam essas solicitações: “O licenciamento ambiental de um empreendimento que irá afetar diversas comunidades indígenas e populações tradicionais e custará bilhões de reais é tratado como mera formalidade a ser cumprida para a desejada implantação. Se existe alguma deficiência basta ludibriar a população e comunidades afetadas, ou, numa linguagem mais apropriada, mudar, devido às circunstâncias emergenciais, o escopo do discurso estratégico", denunciam.

Natalia Suzuki - Carta Maior
Fonte: http://www.agenciacartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=13900

21 abril 2007

Amazônia - cadeia produtiva do Alumínio

Compreender a complexidade da cadeia produtiva do alumínio integra a agenda da recente criada Comissão da Amazônia da Central Única dos Trabalhadores (CUT). Nos dias 12 e 13 de abril, Barcarena/Pará sediou um dos debates. No elenco contou com as centrais sindicais nacionais da área de mineração, siderurgia e dos químicos.
Representantes de São Paulo, Pernambuco, Minas Gerais, Espírito Santo, Maranhão participaram do debate. A Comissão visa encontrar pontos comunais das três categorias do setor para unificação de pauta. A assessoria é do Observatório Social. Além do debate a Comissão visitou a região do Trombetas e fábricas. A terceira rodada será em São Luís, em maio.

Juruti na pauta
A comissão esteve em Juruti, oeste do estado do Pará, onde uma das maiores multi-nacionais do setor, a ALCOA, vai explorar uma mina de bauxita, matéria prima para a produção do alumínio. Na mesma região, só que no município de Oriximiná, a Companhia Vale do Rio do Doce (CVRD) explora uma mina que abastece as suas fábricas no município de Barcarena, Alunorte e Albrás, e uma da ALCOA, em São Luís/Maranhão. A CVRD explora ainda mina no município de Paragominas, no nordeste paraense. O minério será transportado até suas fábricas através de dutos.
A cadeia produtiva do alumínio registra um vertiginoso aumento no processo de exploração. O palco principal tem sido a Amazônia, que além da bauxita possui um dos maiores potenciais de produção de energia do país. Não é à toa que a ALCOA é associada em vários empreendimentos de geração de energia na região, como na hidrelétrica de Estreito, oeste do Maranhão. Diz-se que lingote de alumínio é exportação de energia.
Fragilidade do estado ante a força do capital, abundância de recursos naturais, falta de conhecimento aprofundado das populações nativas sobre a questão, tem cimentado o ciclo do saque aos recursos naturais dos grandes projetos na Amazônia. São as tragédias sociais e ambientais que tem aproximado os afetados (as) da cadeia produtiva.
Ao mero rumor de grandes projetos o primeiro caos que se vivencia são os inchaços das cidades. Seguido de expulsão das populações consideradas tradicionais. Não raro seguido de violência de todas as ordens, como grilagens de terras, ou quando ocorre aquisição a preço de banana, como deseja a ALCOA em Juruti, a sugerir o 0,05 centavos de reais por cada metro quadrado de terra.

Meio ambiente e outras cositas mais
Existe uma série de passos para que a empresa possa fazer a exploração da bauxita, bem como construir hidrelétricas. A empresa é obrigada, para que possa obter licenças ambientais, em produzir estudos e relatórios de impactos ambientais (EIA-RIMA). Via de regra omitem dados sobre as populações nativas, da fauna e flora. No caso de Juruti, e da hidrelétrica de Estreito, é a paulistana CNEC Engenharia a responsável pelos estudos.
Nos dois casos houve denúncia de omissão de informação. Sobre Estreito, além de erro no local exato da construção da hidrelétrica, houve a inversão dos afluentes dos rios e a negativa que as áreas indígenas da região seriam afetadas. E ainda a inexistência de mata primária.
Os estudos e relatórios são apresentados em audiências públicas. A capacidade em cooptar alguns segmentos nativos tem marcado o processo. Vivencia-se um discurso a favor do empreendimento nas audiências. Como títeres ávidos por algum posto no projeto a maioria diz sim. Mesmo de políticos e representantes dos segmentos mais ou menos organizados, antes contrários ao projeto.

A voz dissonante
A voz dissonante no debate, se é que podemos chamar assim, tem sido a do promotor estadual Raimundo Moraes. Ele alerta para limites (omissões), enfatizando as comunidades residentes no platô a ser explorado, e os recursos naturais (castanha do Pará, leite do amapá, copaíba, açaí, uxi, piquiá) nele existente.
Como fonte de proteína animal os moradores de Juruti caçam: cutia, paca, veado, queixada, caititu, jabuti, tatu, mucura, porco-espinho. E pescam peixes regionais do rio Amazonas, entre eles: jaraqui, tambaqui, tucunaré, acari (bodó), curimatã, às vezes pirarucu e acaré. Tudo isso deverá ir para o espaço.
Moraes preocupa-se ainda com a questão fundiária não contemplada pelo EIA. Tal questão pontua o Pará como o estado onde mais se mata sem terra no país. Outro limite levantado recai sobre os valores simbólicos relacionados com as comunidades a serem afetadas pelo projeto.
Quanto às medidas mitigadoras o promotor salienta sobre a necessidade de serem revistas. Moraes insistiu para a criação de um fundo compensatório e a identificação da fonte de recursos. Ainda que admita os passivos sociais e ambientais do projeto, a empresa desloca a responsabilidade para órgãos públicos.

Matemática do extrativismo mineral
O Pará ocupa o quarto lugar no ranking nacional da balança comercial. O extrativismo mineral tem sido o vetor de tal impulso. Até cinco anos espera-se que o estado seja líder nacional do setor. Tal quadro não tem colaborado para alteração do mapa da pobreza. Na contramão do crescimento das exportações crescem os índices de desenvolvimento humano. O que isso nos revela?
Cidade secular com população estimada em 30 mil habitantes, Juruti será sacudida com projeto estimado em 1 bilhão de reais para produzir 4 milhões de toneladas de bauxita, previsão inicial até 2008. Com tal possibilidade a Alumar, empresa sediada em São Luís, da ALCOA, deixará de ser abastecida pela cidade vizinha, Oriximiná, pela empresa Mineração Rio do Norte (MRN), da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD).
Em linguagem vulgar diz-se que estão passando o rodo. Ou seja, não há saída fora do discurso e lógica de desenvolvimento ora posta na Amazônia, em particular no Pará. Outra empresa americana, Cargil, do setor de grãos (soja), instalou em Santarém/Pará um porto para a exportação do produto em total desprezo à legislação ambiental brasileira.

Abuso do poder econômico
Ferrovia, rodovia e porto integram a infra-estrutura no projeto em Juruti. A comissão que esteve no município informa sobre a derrubada da mata nativa, problemas fundiários, e não aquisição de mercadorias no comércio local. Informou ainda do abuso do poder econômico da empreiteira Camargo Correa.
Segundo a comissão, a empreiteira contabiliza negativamente os dias não trabalhados quando ocorrem intensas chuvas, que impossibilita operação nos canteiros. Diante dessas questões a comunidade se agitou no começo do mês na direção contrária à Alcoa. Posto tudo seguir na direção inversa ao mar de rosas apresentado nas audiências.

Rogério Almeida é colaborador da rede www.forumcarajas.org.br
Correio eletrônico:
araguaia_tocantins@hotmail.com

América Latina e Amazônia, quem banca os grandes projetos ?

O Brasil é membro associado do Grupo Banco Mundial, do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), do Fundo Monetário Internacional (FMI) e da Corporação Andina de Fomento (CAF), entre outras. Os bancos multilaterais são instituições financeiras. E ganham vida com os países membros, que são os sócios majoritários. Cada instituição tem uma representação dos governos associados.
O Grupo Banco Mundial (GBM) é composto por diferentes organismos, como o Banco Mundial, que é voltado ao financiamento das ações governamentais e a Corporação Financeira Internacional (CFI). O braço do GBM que financia somente a iniciativa privada. Esta, por exemplo, foi quem efetivou um empréstimo ao Grupo Bertin que adquiriu por R$ 30 milhões a unidade do Frigorífico Marabá, localizada em Marabá, no sudeste paraense, que tem capacidade de abater mil animais/dia.
O Grupo Bertin pretende consolidar a sua verticalização através da instalação um curtume próximo a unidade de Marabá para a produção de couros semi-acabados. Então, podemos imaginar as prováveis conseqüências desse financiamento para esta região por conta do incentivo que o mesmo gera à expansão da atividade pecuária.
O problema é que os financiamentos da CFI não passam pela aprovação do parlamento brasileiro, diferentemente do que ocorre com os empréstimos aos governos. Ou seja, os termos dos contratos de empréstimos firmados entre as partes são completamente desconhecidos da sociedade. A questão é grave, a se considerar a capacidade dos impactos negativos sobre a população e o ambiente dos empreendimentos privados beneficiados.
O BID, por sua vez, financia a execução de diversos projetos na Amazônia, como o PROSAMIN. O programa é um empreendimento de urbanização de áreas alagadas de Manaus, capital do Amazonas. O interessante nesse caso é que o saneamento manauara foi privatizado, tendo sido repassado a um grande grupo francês que atua nesse setor em diferentes países. Ou seja, o governo estadual contraiu um empréstimo em dólar para executar obras de infra-estrutura urbana em Manaus. Mas quem vai ganhar com isso tudo é a concessionária privada que não terá que desembolsar recursos para realizar tal empreendimento. Enquanto que o poder público, ou melhor dizendo, a sociedade amazonense, terá que arcar com os custos do empréstimo. Isso é que é parceria público-privado! Em outras palavras, o estado socializa as despesas com a sociedade, e a empresa pública capitaliza os lucros.
Vale registrar que o Brasil tem enorme poder tanto dentro do BID, pois está entre os maiores acionistas da instituição. Tem peso decisivo na definição das políticas implementadas por esse banco na América Latina. Com o Grupo Banco Mundial a regra se repete. O país é um acionista relevante, e um grande tomador de empréstimos além de excelente cliente.
Também é preciso dizer que somente o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) tem mais recursos para investimentos do que o BIRD [Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento] e o BID juntos. Somente a carteira de projetos do BNDES possui mais de R$ 60 bilhões para 2007. O que o BIRD e o BID dispõem para o Brasil no mesmo período pode ser considerada uma ninharia diante dessa soma. Então, por que continuamos a pegar empréstimos dessas instituições?
Em relação ao Brasil, o BID, o BIRD e mesmo o FMI na atualidade não são importantes por causa dos empréstimos. E sim pelo fato que são grandes produtores de conhecimentos e formuladores de políticas que são implementadas no país. Além de formarem boa parte da elite tecnoburocrática brasileira. O poder dessas instituições é tão forte que alguns dos conceitos elaborados no seu interior acabam sendo incorporados até mesmo por movimentos sociais e ongs, como a idéia de boa governança.
No caso do BNDES, este banco há muito deixou de atuar somente no Brasil, posto que financia empreendimentos em diferentes países ao redor do planeta. É o principal instrumento do Brasil para garantir a efetivação da Iniciativa para a Integração da Infra-estrutura Regional Sul-Americana (IIRSA). Um conjunto de ações e arranjos institucionais para viabilizar a integração econômica dessa parte da América. É o BNDES o principal financiador dos empreendimentos previstos pelo Programa de Aceleração da Economia (PAC).
Na Amazônia, o Complexo Rio Madeira, em Rondônia, a expansão das monoculturas de exportação e para a produção de biocombustíveis, abertura de estradas, a expansão e a modernização das redes de portos e aeroportos contarão efetivamente com recursos desse banco. Não obstante, não existe atualmente qualquer mecanismo de controle social sobre as ações do BNDES. Que, nesse caso, chega ser mais conservador do que o BIRD e o BID.
É o BNDES também quem financia diversos empreendimentos nos países sul-americanos que interessam diretamente ao Brasil, como o asfaltamento de estradas no Peru, a fim de viabilizar o escoamento da soja nacional para os países asiáticos pelos portos daquele país no Pacífico. Bem como muitos outros projetos nos demais países da região que interessam fundamentalmente ao setor privado brasileiro e/ou articulados a grandes grupos econômicos internacionais - Cargil, por exemplo.
Para atingir esse objetivo o BNDES tem efetivado parcerias com a Corporação Andina de Fomento, cujos sócios majoritários são a Colômbia, Peru, Bolívia, Equador e Venezuela, para garantir os financiamentos necessários à implementação da IIRSA. Portanto, não foi mera coincidência o fato de o Brasil ter se tornado sócio da CAF, através da aquisição de cerca de 10% das ações daquela instituição, e de alguns setores do governo federal levantarem a proposta de que o Banco do Sul, proposto por Chaves, se constitua a partir da maior integração entre o BNDES e a CAF.
Como se vê o Brasil tem tido um papel ativo na estratégia de integração econômica sul-americana, definido de modo claro no atual Plano Plurianual do governo federal, e age com desenvoltura no interior dos bancos multilaterais para atingir esse objetivo. Nesse sentido, precisamos romper com a idéia de que o nosso país é vítima dessas instituições.
Posto que nosso país participa da formulação das políticas apoiadas pelas mesmas no nosso continente. E não sermos um sócio qualquer no interior delas. Cabe aos movimentos sociais e ongs colocarem em sua pauta o debate sobre os bancos multilaterais, desenvolver ações de pressão sobre elas e tirar o parlamento brasileiro da letargia quando se trata dos acordos internacionais.

Guilherme Carvalho é Técnico da FASE Amazônia, e ex-coordenador da Rede Brasil sobre Instituições Financeiras

17 abril 2007

Pará é recordista em assassinatos no campo em 2006

O Pará é novamente recordista nacional em assassinatos no campo com 24 casos registrados em 2006. A informação foi divulgada pela CPT (Comissão Pastoral) em entrevista coletiva realizada em Belém na tarde desta segunda-feira (16). O número é 50% maior que o registrado em 2005, quando ocorreram 16 assassinatos no campo.
A advogada da CPT, Rosilene Silva, credita o aumento ao fato de que no ano passado a questão do crime agrário ter sido menos destacado na mídia. 'Em 2005 foi o ano que Dorothy Stang morreu, desceu toda aquela força-tarefa para o Estado, presença do Exército em Anapu; tudo isso criou um impacto e inibiu ações nesse sentido. Já em 2006 houve um distanciamento e nós voltamos a viver a realidade que conhecemos, sem tanta mídia. Daí esse aumento', explicou.
Em todo o Brasil foram registrados 39 crimes motivados pela questão da terra. Do número geral do país, o Norte registrou 28 mortes e o Pará 24. A Comissão, diz que apesar do aumento, todos os assassinatos tiveram resposta tanto da polícia, quanto da Justiça. 'Todos os assassinatos passaram pela fase de inquérito e ação penal e agora aguardam um posicionamento da Justiça', disse a advogada da entidade, Rosilene Silva.
O Estado também foi recordista nacional de outra estatística: a do número de ocupações. No ano passado, cerca de 18.561 famílias de trabalhadores sem terra participaram de 151 ocupações à propriedades. O dado coloca o Pará no topo da lista, apesar da região Nordeste ter sido a que mais registrou casos do tipo. O balanço da CPT também contabiliza o número de famílias expulsas de ocupações de maneira ilegal por pistoleiros e polícia. Ao todo foram registradas 1.058 expulsões deste tipo. Já os despejos com ordem judicial chegaram a 2.294 no ano passado.
A advogada da CPT acredita que a sensação de impunidade, além da falta de andamento no processo de reforma agrária é o que motiva o crime agrário. O último caso que teve resposta judicial - ao menos em parte - foi o sindicalista Dezinho, cujo executor Wellington de Jesus Silva foi condenado a 29 anos de prisão em julgamento ocorrido em Belém na semana passada. O mandante do crime apontado pelo Ministério Público, o fazendeiro Décio José Barroso Nunes, conhecido como 'Delsão', está foragido.

Fonte: www.orm.com.br - Redação Online (postada em 16/04/2007 às 17h5m)

Uma justiça de classe

UM SISTEMA de justiça penal incapaz de produzir uma sentença definitiva após onze anos de tramitação sem dúvida padece de defeitos estruturais graves. Independentemente da competência e da respeitabilidade de muitos de seus integrantes, esse sistema precisa ser inteiramente reformado.
Veja-se o caso do processo-crime movido pelo Ministério Público contra os dois oficiais responsáveis pelo massacre de trabalhadores sem terra, em Eldorado do Carajás, Estado do Pará. O crime foi cometido há onze anos - no dia 17 de abril de 1996.
Nesse período, a Justiça não decidiu se os réus - autores da ordem de disparo contra as vítimas - atuaram no estrito cumprimento do dever; ou extrapolaram suas funções; ou obedeceram ordens de autoridades superiores (as quais, diga-se de passagem, nem sequer foram denunciadas pelo Ministério Público).
Será necessário tanto tempo para a Justiça decidir essas questões, mesmo tratando-se de um crime fotografado, filmado e presenciado por centenas de pessoas? De um crime que deixou 19 mortos, 69 mutilados e centenas de feridos?
Dos 144 réus, dois - o comandante e o subcomandante do massacre - foram condenados pelo Tribunal do Júri a 228 e 154 anos de reclusão. Pura pirotecnia para aplacar a opinião pública! Até hoje, o processo criminal perambula pelos tribunais do país e os condenados continuam livres.
No cível, a mesma coisa: até agora as ações de indenização por perdas sofridas pelas vítimas não produziram resultado algum.
A população rural - enorme segmento da população brasileira - não consegue ser ouvida por nenhuma instância do Estado: o Executivo não avança na reforma agrária; o Legislativo só se lembra dela para tentar criminalizar suas entidades representativas; e o Judiciário, tão rápido na concessão de ordens de despejo, não prende os que assassinam suas lideranças nem resolve em tempo razoável os processos de desapropriação e de discriminação de terras públicas.
A trágica ironia é que os mesmos sem-terra estão legalmente assentados no mesmo imóvel que estavam ocupando quando foram despejados à bala para cumprimento de uma ordem de despejo. Em outras palavras: o Estado reconheceu que o imóvel não cumpria a função social da propriedade e, portanto, enquadrava-se perfeitamente nos casos em que o governo federal está autorizado a desapropriá-lo para fins de reforma agrária, como prescreve a Constituição.
Se, em vez de decretar um despejo a toque de caixa, a Justiça e o Executivo tivessem agido nos termos da lei, dezenove vidas teriam sido poupadas e 69 pessoas não teriam sido mutiladas.
As classes dominantes recusam-se a compatibilizar o ritmo da reforma agrária com a urgência das medidas necessárias para deter o processo de empobrecimento que está levando as populações rurais ao desespero. O Judiciário, que poderia contribuir para minorar o problema, só faz agravá-lo.
Em um país que se pretende democrático, não cabe uma justiça de classe: atenta e prestativa às camadas ricas da população; míope para ver o direito dos pobres; e surda para os seus clamores.
Muitas cartas indignadas chegam às redações dos jornais reclamando da selvageria dos sem-terra quando eles ocupam edifícios do Incra, fecham estradas, depredam postos de pedágio, ocupam terras.
Os que assim reclamam - se não são interessados ou hipócritas - deviam atentar para o óbvio: todos esses atos não passam de gestos destinados a chamar a atenção da sociedade para o drama dos sem-terra.
Afinal, o que querem as pessoas investidas no poder do Estado brasileiro? Uma nova Colômbia?

PLÍNIO DE ARRUDA SAMPAIO , 75, advogado, é presidente da Abra (Associação Brasileira de Reforma Agrária). Foi deputado federal constituinte pelo PT-SP.
FÁBIO KONDER COMPARATO , 70, advogado, professor titular aposentado da faculdade de Direito da USP e presidente da Comissão de Defesa da República e da Democracia do Conselho Federal da OAB.
JOSÉ AFONSO DA SILVA , 81, advogado, professor aposentado da faculdade de Direito da USP, é autor de "Curso de Direito Constitucional Positivo", entre outras obras. Foi secretário da Segurança Pública no governo Covas.

Fonte: Jornal Folha de São Paulo – Caderno Opinião (São Paulo, terça-feira, 17 de abril de 2007).

15 abril 2007

A Cultura de dendê (Elaeis guinnensis) e seus aspectos mercadológicos para o Brasil

O dendezeiro é a oleaginosa que mais produz óleo por área plantada dentre as diversas oleaginosas mapeadas e existentes no Brasil (Silva, 2005). Além de contribuir para a fixação do homem no campo, constitui uma alternativa viável e rentável para a recuperação de áreas alteradas, incluindo ser uma cultura extremamente versátil, sendo dela aproveitado os óleos da semente (óleo de palma) e do mesocarpo (óleo de palmiste), os cachos, os resíduos do processo de extração de óleo (glicerina), entre outros usos.
Neste contexto, o Brasil possui cerca de 70 milhões de hectares adequados para essa cultura, estas áreas encontram-se na região norte, com predomínio de 50 milhões no Estado do Amazonas e 20 milhões no Pará (Embrapa, 2000), e em concentrações menores nos estados do Amapá, Rondônia e Roraima. Segundo a Embrapa (1995) já apontava, cerca de 23,7% das áreas do Estado do Pará estão aptas para o cultivo do dendê. Podendo ser indicada como cultura predominante da região norte para a produção de combustíveis alternativos e bioeletricidade. O dendê é uma planta originaria da África, trazida ao Brasil, pelos escravos, que se adaptou bem ao clima tropical úmido do litoral baiano e região norte do Brasil. Silva et al. (2003) também consideram que a totalidade de áreas ou zonas classificadas como de alta e média potencialidade correspondem aproximadamente a 23,7% do território paraense, essas áreas têm condições de produzir dendê para absorver grandes demandas internas e externas, o que tornaria o Estado do Pará e o Brasil, no ranking mundial, o maior produtor e exportador de óleo de palma do mundo.
O óleo de dendê foi apontado como umas das soluções tecnicamente satisfatórias para substituir o óleo diesel. Observou-se que
1 litro de óleo vegetal pode substituir 1 litro de óleo diesel, para cuja produção seriam necessários 2,2 litros de petróleo bruto (Brasil, 2005). Os subprodutos da indústria extratora têm grande potencial para serem utilizados na co-geração de energia elétrica em uma região bastante carente, e com baixa aptidão para a instalação de hidroelétricas, no caso de regiões isoladas na Amazônia. O óleo bruto que é produzido atualmente pela indústria paraense está entre os melhores do mundo, com grau máximo inferior a 3% de acidez, em relação a 3,5 a 5% na média mundial. Com a verticalização da cadeia produtiva, o óleo de dendê poderá ser envasado e comercializado a partir do Estado do Pará, que poderá também fabricar sabonetes, margarinas, gorduras vegetais e outros produtos alimentícios, e biocombustíveis a partir de seus resíduos industriais (SUDAM, 2000). Neste cenário, o Estado do Pará despontava as primeiras produções em 1975 com culturas em caráter experimental com agricultores familiares em 355 ha, distribuídos por 25 propriedades agrícolas, as quais estavam associadas à cooperativa Agrícola Mista Paraense (COOPARAENSE) (Monteiro et al., 2006). Atualmente o Pará lidera a produção nacional de óleo de palma e possui potencial para expansão desta importante cadeia produtiva. No ano de 2006 o estado do Pará registrou índices de cultivos de dendê de aproximadamente 46.963 ha de área plantada com uma produção de 747.666t/CFF1/ano (SAGRI, 2006).
A perspectiva de plantio em regiões alteradas na Amazônia pode ser uma estratégia importante para estimular o crescimento da cultura da palma na região e inserir a região norte nas metas estabelecidas para a produção de biodiesel especificadas pelo Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel.
O óleo de palma tem ocupado, nos últimos anos, lugar de destaque na produção mundial de óleos e gorduras. Prova disso foi o expressivo crescimento experimentado na participação deste tipo de óleo no mercado mundial. Segundo dados de Malysian Palm Oil Counci (MPOC), em março de 2007, destacou-se que a produção mundial de óleo de palma, neste momento, alcança 149.116 MT, contando com a participação expressiva deste commodities no cenário internacional de óleos, tendo como principais países produtores de óleo de palma no ranking mundial: Indonésisa, com 18,366 MT; Malaysia, com 18,139 MT (em área cultivada somada a 4 milhões de hectares); Argentina, 8,222 MT; Brasil, com 7,222 MT, Colômbia, 867 MT, etc. Sendo seus principais mercados consumidores em expansão mundial, a UE, EUA, China e Japão com grandes perspectivas de assimilar a produção de biocombustíveis de origem de palma.
Frente às demais oleaginosas, o dendê exibe perspectivas otimistas no mercado mundial futuro, principalmente para os setores alimentícios e de combustíveis alternativos. O momento é oportuno para a região Amazônica, e para o nosso país, pois podemos mostrar ao resto do mundo as extraordinárias condições que este espaço geográfico dispõe para contribuir com a economia nacional na exploração desse importante produto, a produção de biodiesel a partir de espécies oleaginosas nativas ou exóticas da região, como o dendê, como fonte alternativa de energia para o processo de desenvolvimento socioeconômico do país, e principalmente, apoiado em bases produtivas da agricultura familiar, com a geração de emprego e renda para os milhares de trabalhadores e trabalhadoras rurais deste fantástico espaço geográfico, chamado de Amazônia.

Prof. Msc Katia Fernanda Garcez Monteiro
Correio eletrônico:
kfgarcez@amazon.com.br
Este texto é um resumo expandido do artigo original. Para receber a versão integral do mesmo (em PDF) envie mensagem para institutoamasblog@yahoo.com.br

11 abril 2007

No Oeste paraense soja não combina com respeito ao ecossistema

Aquilo que antes certos meios de comunicação divulgavam como uma pendenga entre ambientalistas e sojeiros, entre "nacionalistas" que diziam que a Amazônia é dos brasileiros, defendendo a multinacional Cargill, norte americana de Minesota e acusavam as ONGs [de serem] teleguiadas pela ONG estrangeira Greenpeace, agora cai a fantasia e o tribunal de Justiça federal de Brasília revela quem mesmo é o vilão da destruição da agricultura familiar e das matas da região Oeste do Pará. E quem é? Ela mesma, a Cargill Cereais, que de 2003 até hoje, transportou mais de dois milhões de toneladas de soja pelo seu moderno porto graneleiro instalado ilegalmente bem em frente da bela cidade de Santarém. 95% dessa exportação veio do Mato Grosso, por barcaças via rios Madeira e Amazonas até o armazém de Santarém. Esses 95% revelam que o porto de Santarém é apenas um entreposto de transporte, sem deixar rendimentos ao município, menos ainda ICMS, já que pela lei Kandir os produtos primários para exportação estão isentos.
Parece pouco, 5 % da soja transportada da região Oeste do Estado. Mas isso tem dois agravantes. Um, são mais de 25 mil hectares de terras utilizadas para soja aqui na região. Para se ter uma idéia, isso significa cerca de 25 mil campos de futebol desmatados. Esse descampado lá nos pampas do Rio Grande pode parecer coisa pouca, mas aqui na floresta Amazônica tem um efeito terrível no ecossistema. Ou será que tem alguém ainda pensando que a seca incomum e logo a cheia também incomum dentro de seis meses no ano passado, de fevereiro a junho e de agosto a dezembro foi obra do destino ou castigo de Deus?
Outro agravante tem sido o êxodo rural pela compra e venda dos lotes da produção familiar. Famílias que viviam secularmente na pobreza, apesar de trabalhar a terra na produção de mandioca, milho, arroz, feijão, laranja, manga, coco e outras plantações, se deixaram atrair pela sedução de oferta de 30, 40 e até 50 mil reais. Venderam suas terras que os sojeiros logo devastaram tudo, inclusive as casas e meteram as máquinas modernas com monocultura da soja. Detalhe, soja aqui na região de Santarém até 1999 só se conhecia em produtos de supermercado. Nesta região de floresta soja é planta exótica.
O que fez essa nova fronteira agrícola acontecer tão de repente? Dois fatores explicam: A alta da commodities soja no mercado internacional, devido o mal da vaca louca na Europa e o boon econômico da China. O preço da soja no mercado disparou de 12 para 34 dólares o saco de 60 quilos. O sul e o Centro Oeste já estavam devastados pelo cultivo da soja e outras commodities. O Oeste do Pará era o caminho do novo eldorado. Isto por causa da estrada Santarém Cuiabá, rasgada desde a época da ditadura militar e nunca concluída.
Ela chega ao porto fluvial de Santarém, com calado adequado para navios de até 50 mil toneladas e o porto mais próximo do mercado europeu e chinês, para produtos da Amazônia e do Centro Oeste brasileiro. Logo a multinacional Cargill antecipou-se às concorrentes e arrendou um lote da praia Vera Paz, ao lado das Docas do Pará. Ali existia uma praia cantada em versos e a mais favorável aos pobres da cidade que podiam se banhar nas águas ainda limpas do majestoso rio Tapajós, sem precisar pagar transporte.
O capital falou mais alto e a Sectam (Secretaria Estadual de Tecnologia e Meio Ambiente) logo deu uma licença ilegal para a multinacional construir seu "Monstro do lago Ness, digo do rio tapajós". Imediatamente alguns grupos do movimento popular e da pastoral da Igreja denunciaram ao Ministério Público Federal a desgraçada agressão ao rio, ao meio ambiente e à sociedade local. Os grupos foram criticados pela elite política e econômica, inclusive pela Câmara de Vereadores de Santarém.
Foram chamados a se explicar em sessão especial do porque da reação "anti desenvolvimento". As explicações de nada adiantaram, os grupos foram acusados de retrógrados. Até grupos de universitários iludidos de que teriam empregos futuros reagiram contra os defensores do meio ambiente. E a destruição da praia continuou, aterraram inclusive uma área de um sítio ecológico. O Ministério público abriu processo contra a multinacional. No ano 2.000 ela foi condenada pelo juiz federal local.
De nada adiantou a multinacional [estava] segura de seu poder econômico. Afinal ela é a segunda maior empresa graneleira do mundo, recorreu com liminares várias e foi concluindo a construção do porto. Em 2003 estava a invasão do rio Tapajós, em frente à cidade, com um porto de 20 milhões de dólares, privatizando uma praia e uma enseada de rio. Tudo isto com apoio da prefeitura, da elite econômica e política local e estadual. Mas o processo continuou na justiça federal em Brasília.
Finalmente no ano passado transitou em julgado e a sentença do tribunal foi que a multinacional paralise o porto e execute o estudo e relatório de impacto ambiental (EIA RIMA), conforme manda a lei. Foi um Deus nos acuda. Os defensores da invasão estrangeira saíram em defesa da "coitadinha", que se diz vítima de perseguição do Procurador Federal, Dr. Felício Pontes. Agora imagine se uma empresa brasileira, ou venezuelana decidisse construir um porto particular em Carolina do Sul, sem as devidas licenças lá deles, o que aconteceria? No entanto aqui, mesmo a sentença tendo sido transitada e julgada em fevereiro de 2006, só um ano depois é que a sentença veio a ser cumprida, graças ao Dr. Felipe Fritz e Dr. Felício Pontes. Aquele, atual procurador federal em Santarém e este, procurador federal geral do Estado do Pará.
Os amigos da coitadinha lamentam os prejuízos que ela está tendo, os sojeiros em número de 130 na região estão em pânico, porque estão plantados cerca de 17 mil hectares de roças de soja, que devem ser colhidas em junho. Não têm onde depositar, nem vender. Estão inadimplentes com a multinacional que lhes financiou insumos na certa de receber os grãos e agora? Agora não podem alegar inocência nem eles nem a multinacional, pois todos sabiam que havia um processo em andamento na justiça federal. Desta vez a ética e a lei prevaleceram à sedução do capital e do tal crescimento econômico.
Salvou-se a Amazônia? Nem tanto. Muita degradação ambiental está feita. Mas essa paralisação do poder econômico estrangeiro, acostumado a invadir países pobres com a conivência de poderes corruptos para se enriquecer mais, agora tem um aviso de que há pessoas e grupos organizados na sociedade com consciência de sua dignidade. E que as lutas por pequenas que sejam podem ajudar a mudar o mundo.

Pe. Edilberto Sena é diretor da Rádio Educadora de Santarém e integra a Frente de Defesa da Amazônia.

10 abril 2007

CNBB se solidariza com religiosos

AMEAÇAS
Entre os cinco religiosos marcados para morrer no Pará estão um bispo e quatro padres. A Regional Norte da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) deve divulgar nos próximos dias uma nota de solidariedade aos bispos e religiosos ameaçados de morte na Amazônia. Três bispos integram a lista dos jurados de morte na Amazônia, revelando um aumento das ameaças contra religiosos envolvidos em questões sociais e ambientais, fato que vem preocupando a Igreja. Informações da Secretaria Nacional de Direitos Humanos e de pastorais sociais dão conta da existência de uma lista com dez nomes de pessoas marcadas para morrer, todos da região amazônica e todos envolvidos com questões sociais e ambientais. Três deles são bispos. A situação preocupa tendo em vista a proximidade da chegada do papa Bento XVI ao Brasil, prevista para maio.
O Pará, onde a irmã Dorothy Stang foi assassinada em 2005, é o Estado com maior número de ameaçados: cinco pessoas da lista são daqui. Rondônia aparece em segundo lugar, com três nomes; e Mato Grosso em terceiro, com dois.
Na prelazia paraense do Xingu, que engloba o município de Anapu, onde irmã Dorothy vivia, o bispo Erwin Kräutler está sendo obrigado a fazer as visitas pastorais com um agente de segurança da Polícia Militar ao seu lado. O mesmo ocorre com o frade dominicano e advogado Henri des Roziers, que trabalha no escritório da Comissão Pastoral da Terra (CPT) de Xinguara, também no Pará.
O padre Amaro, que trabalhava em Anapu juntamente com irmã Dorothy, dispensou esquema de segurança, que contava com dois PMs, em razão de que as despesas com os seguranças teriam que correr por sua conta. Os padres Edilberto Sena e José Boeing, ambos de Santarém, completam a lista e contam com escolta policial apenas quando realizam grandes deslocamentos.
Além de d. Erwin, os bispos que receberam ameaças foram d. Geraldo Verdier, da Diocese de Guajará-Mirim, região de Rondônia localizada na fronteira do Brasil com a Bolívia; e d. Antônio Posamai, de Ji-Paraná, no mesmo Estado.
Orlanda Alves, secretária da CNBB, disse na tarde de ontem que a conferência defende uma igreja cada vez mais engajada nas causas do povo. “Não podemos abandonar a missão que Deus nos Deu. Vamos lutar por uma igreja mais justa e igualitária na Amazônia. Jesus morreu na cruz para nos salvar e defendendo esses ideais. Não podemos desistir”, afirma.
Mary Cohen, presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-PA, lembra que os religiosos ameaçados são contra os sojeiros na Amazônia, contra os grileiros e até contra a viabilização de projetos como a construção da hidrelétrica de Belo Monte. “Essa posição contraria grupos poderosíssimos daqui e de fora do Brasil e gera essas ameaças. Não queremos o confronto, mas apenas o debate de idéias. Como esses grupos não possuem argumentos, partem para a violência”, ressalta.

Luiz Flávio – Diario do Pará
Fonte: http://www.diariodopara.com.br/Regional/Re_01.sp (publicado em 10.04.07)

09 abril 2007

Siderurgia em Carajás - 20 anos de destruição

Já no século VII tem-se registro da atividade de siderurgia no mundo. No século XIX, a indústria impulsionou a economia dos Estados Unidos. No Brasil a atividade ganha relevância no início dos anos de 1930, tempos de Getúlio Vargas. A atividade que carrega em sua canga o cavaleiro da destruição aporta no Pará nos anos 1980, através do Programa Grande Carajás (PGC), ao apagar da ditadura militar.
Em resumo o PGC foi um pacote de saque aos recursos naturais da Amazônia, em particular no Pará. Além da exploração da reserva mineral de Carajás, ergueu a hidrelétrica de Tucuruí, para produzir energia quase de graça para as empresas estrangeiras e nacionais da produção de alumínio. Rasgou a floresta com uma ferrovia que leva minério do Pará até o porto do Itaqui, em São Luís , Maranhão, de onde atravessa mares até chegar aos países mais ricos. No pacote tinha ainda a exploração da floresta através de madeireiras e a instalação de siderurgias. No lugar da mata destruída foi plantada uma de eucalipto lá nas bandas do Maranhão.
Tudo financiado pelo Estado. Empresas nacionais e estrangeiras viveram um mar de rosas. 20 anos passados o saldo que se tem é a destruição da floresta, poluição de igarapés e rios. A região é a que mais tem registro de trabalhadores em condição de escravos no país, nunca se matou tanto dirigente como naquela época. A região é conhecida dentro e fora do país por conta disso.

O começo da destruição
O Conselho Deliberativo do PGC aprovou 22 projetos em diferentes atividades entre os anos 1984 até 1988. Além dos 22, mais 08 projetos estavam em avaliação. No pacote a maioria aprovada era para a produção de ferro-gusa e ferro-liga, nos Estados do Pará e Maranhão, ao longo da ferrovia.
Até 1988 quatro siderúrgicas foram implantadas. Duas em Açailândia (MA), Viena Siderúrgica e Cia. Vale do Pindaré; e duas em Marabá (PA), COSIPAR – Companhia Siderúrgica do Pará e SIMARA – Siderúrgica Marabá. Atualmente são 14, sendo 08 no Pará e 06 no Maranhão. Todas produzindo ferro-gusa.

O lixo da siderurgia e a destruição da floresta
A produção siderúrgica é uma máquina de fazer lixo. A produção de ferro-gusa produz lixo sólido, líquido e gasoso. Sem um destino adequado funcionam como uma fonte de poluição do solo, da água e do ar. Como ocorre em sua maioria em Carajás. Os principais poluentes são: sólidos em suspensão; cianeto; fenol; amônia; óleos; graxas; escória do alto forno; finos de carvão; lama de lavagem de gases; e pó de balão. Estes poluentes podem provocar intoxicação, problemas circulatórios e respiratórios, e outros muito mais graves.
É o carvão vegetal que aquece os alto-fornos das siderúrgicas, para que ocorra o processo de redução, que transforma o minério bruto em gusa. 100% do carvão tem origem na mata nativa em quase sua totalidade ilegal. Resíduos de serrarias também ajudam. Para a produção de uma tonelada de ferro gusa a proporção aproximada é de uma tonelada de carvão.
A produção de carvão teve inicio nas proximidades dos distritos industriais, em áreas de floresta adquiridas pelas siderúrgicas ou por terceiros que produziam e vendiam o carvão. Posteriormente espalhou-se para um raio de até 200 Km do eixo do corredor da ferrovia. Atualmente ajuda a destruir o cerrado a oeste e sul do Maranhão.
A produção de carvão era feita por famílias de trabalhadores trazidas dos Estados de Espírito Santo e Bahia. Entre adultos e crianças, todos trabalhavam na condição análoga a escravo. Hoje ainda existe esta condição, como também a de exploração da mão-de-obra e degradação da mata de agricultores. “Rabo quente” é o apelido dos fornos onde a floresta é queimada. No setor de carvão é raro encontrar algum trabalhador com carteira assinada.

Destruição em número
Em 2005 o consumo de carvão vegetal pelas siderúrgicas do Pólo Carajás (Pará e Maranhão) foi em torno de três milhões de toneladas. Segundo o IBAMA seriam necessários 550.000 hectares de floresta para gerar o volume de carvão consumido pelas siderúrgicas.
As empresas nunca obedeceram às leis ambientais as quais se submetiam para terem acesso aos incentivos ficais e para receberem a Licença de Operação. É tanto que a COSIPAR, depois de cinco anos de operação (1993), foi cobrada pelo Ministério Público Federal, através de AÇÃO CÍVEL PÚBLICA, para adequar-se ao cumprimento da Lei.
O MPF requereu a concessão de medida liminar, “para que seja conferido prazo de trinta (30) dias à empresa Ré para obter a aprovação de seu Plano Integrado Floresta Indústria – PIFI, junto ao IBAMA, bem assim, proveja a necessária Licença Ambiental perante o órgão estadual competente – Secretaria Estadual de Meio Ambiente, onde também se encontra deficitária.”
Em 2005, o IBAMA realizou inspeção nas siderúrgicas do Pará e Maranhão. As informações prestadas pelos representantes das siderúrgicas foram cheias de contradições, principalmente quando se trata de números.
Uma delas é quando trata de resíduos de serrarias, cita o relatório: “No ano de 2004 seriam então necessários 22.171.947,80 metros cúbicos de toras para produzir o carvão de resíduos informado para aquele ano. Segundo dados do IBGE a produção nacional de toras para serrarias girou no mesmo ano em torno de 26 milhões, sendo que o Estado do Pará, o maior produtor de toras, teria contribuído com cerca de 11 milhões”.
As siderúrgicas foram multadas em R$ 550 milhões, que poderia chegara a até R$ 770 milhões, se fosse aplicado o que rege o Código Floresta e a Lei de Crime Ambiental. Hoje, só no Distrito Industrial de Marabá estão em funcionamento oito siderúrgicas, perfazendo um total de 17 alto fornos, para uma produção de quase três milhões de toneladas de ferro-gusa. Existem mais três a entrarem em funcionamento até o meio do ano, com mais 4 alto fornos.
Quem tem pago a conta em todos os sentidos são os nativos. As populações tradicionais, os povos indígenas, os agricultores, pela expansão do desmatamento, pela falta de políticas de reforma agrária e pela inoperância dos órgãos públicos para fazer cumprir as leis. O problema deixa de ser apenas dos diretamente ou mais afetados e passa a ser de toda a sociedade, porque somos todos nós que pagamos o preço da destruição à medida que somos atingidos pela poluição em geral, exaustão dos recursos naturais e o aquecimento global.
São vários os estudos que comprovam o caráter de destruição do meio ambiente pelas siderurgias em Carajás. O mesmo já ocorreu num dos principais pólos do país, no Vale do Rio Doce, em Minas Gerias. Sem falar que não dinamiza a economia local. [...] o nível de qualificação elementar, empurra os nativos para os cargos que pagam pouco.

Raimundo Gomes da Cruz Neto é agrônomo e cientista social (Marabá/PA)

08 abril 2007

Caso Dorothy Stang - julgamento de fazendeiro será em maio

Vitalmiro Bastos de Moura (o Bida), um dos fazendeiros acusados de encomendar a morte da missionária Dorothy Stang, vai a julgamento nos dias 14 de maio, em Belém. Stang foi assassinada em Anapu, oeste do Pará, por dois pistoleiros no dia 12 de fevereiro de 2005. A fama de truculência de Bida vem desde o sudeste paraense, quando morava em Cumarú do Norte.
Regivaldo Pereira Galvão, vulgo “Taradão” é o segundo fazendeiro envolvido no caso. Taradão responde o caso em liberdade. Em junho de 2006 foi solto num apertado julgamento no Superior Tribunal Federal (STF), 3X2. O relator, ministro Cezar Peluso, em seu voto, considerou “a prisão preventiva absolutamente ilegal”. Seu voto foi acompanhado pelos ministros Sepúlveda Pertence e Marco Aurélio Melo. Votaram contra a concessão, os ministros Ricardo Lewandowski e Carlos Ayres Brito.
A formação de consórcio contra dirigentes, militantes e apoiadores do meio ambiente e da reforma agrária é a tese sustentada pelos movimentos sociais da região Xingu. Antes do assassinato de Dorothy, os militantes Dema e Brasília foram assassinados. A região do Xingu é a derradeira reserva de mogno, madeira de elevado valor no mercado internacional. E que tem motivado a grilagem de terra.
Uma exceção! Assim deve ser percebido o processo da missionária, no rastro de sangue que corta a história de luta pela terra no Pará. Dez meses separaram a execução da religiosa e ativista ambiental americana do julgamento que condenou os pistoleiros Rayfran das Neves Sales e Clodoaldo Carlos Batista, condenados a 27 e 17 anos de prisão, respectivamente, em setembro do ano passado.
Já o intermediário, Amair Feijoli da Cunha, o “Tato”, foi condenado a 27 anos em abril do ano passado. Em depoimento dado no presídio de Santa Isabel, o agricultor havia confessado a mediação entre os fazendeiros e os pistoleiros. Posição que manteve no julgamento. Por conta da colaboração dada à Justiça, “Tato” teve redução de 1/3 da pena.

Rogério Almeida é autor do livro Araguaia-Tocantins: fios de uma história camponesa/2006. Mestre em Planejamento do Desenvolvimento pelo Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA) da Universidade Federal do Pará (UFPA), e colaborador da rede Fórum Carajás: www.forumcarajas.org.br
Correio eletrônico: araguaia_tocantins@hotmail.com
Foto: Ivonete Coutinho (Foto no túmulo de Dorothy Stang)

06 abril 2007

A mobilização contra Belo Monte continua

A ameaça da implantação da Hidrelétrica de Belo Monte continua a mobilizar os movimentos sociais na região do rio Xingu no Pará. A hidrelétrica de Belo Monte faz parte de um conjunto de outras barragens, previstas para o rio Xingu, que se forem de fato executadas, trarão sérios impactos as terras de milhares de povos da região desde os indígenas até os ribeirinhos e os próprios moradores da principal cidade da região, que é Altamira (Pará).
O discurso governamental é alarmista, alega que, se Belo Monte não for construída, o país corre sério risco de sofrer novos “apagões”. Na visão estreita dos governos Federal e estadual, o crescimento econômico está acima dos interesses dos povos amazônicos. Eles retomam um discurso e uma prática típicos de regimes autoritários e investem na imagem de um governo preocupado em mitigar os efeitos negativos que se abaterão sobre a população da região.
O modelo energético é fundado sobre grandes barragens, mesmo a sociedade brasileira já tendo discutido, desde a década de 90, modelos alternativos de geração de energia que causassem menos impactos sociais e ambientais. O governo, efetivamente, pouca atenção e investimento deu a essas propostas.
O modelo energético brasileiro é também injusto, pois de um lado garante energia a preços baixos e subsidiados pelo Estado para grandes consumidores como as indústrias eletrointensivas, que são as principais interessadas, junto com as empreiteiras, na construção de grandes barragens. No outro extremo, estão as populações que vivem próximas às hidrelétricas que invariavelmente dispõem de um serviço de péssima qualidade oferecido pelas distribuidoras de energia. E, no meio disso tudo, fica a sociedade brasileira pagando altas taxas pelo consumo de energia elétrica nas suas casas.
Para evitar essa perspectiva sombria é que as populações da Amazônia estão se mobilizando, como aconteceu no último dia 14 de março em Altamira, no Seminário sobre Belo Monte.
Estiveram presentes 12 lideranças Kaiapó Xikrin da região do rio Bakajá e também representantes do povo Arara, da aldeia Cachoeira do Maia (TERRÃ-WANGÃ). A participação deles no encontro foi fundamental. O seminário começou com a formação de uma mesa a qual os índios fizeram questão de participar. As comunidades Kaiapó afirmaram nunca aparecer em qualquer estudo realizado pela Eletronorte.
Na apresentação, o cacique Bekatenti Xicrin, da aldeia Morotiidjan, declarou que a comunidade Kaiapó é contra essa barragem e que estão preocupados com o futuro do rio Bakajá, porque é dele que eles dependem para comer, beber e se deslocar para cidade. O Bakajá, segundo estudos paralelos, tende a secar de tal maneira que nenhum tipo de navegação será possível.
Bekatenti disse ainda que o objetivo da presença deles era de mostrar para todos que eles existem e que estão prontos para lutar pela sua sobrevivência. Em seguida, perguntou por que não tinha ninguém da Eletronorte para falar com eles.
As atenções estavam voltadas para qualquer pronunciamento dos índios, porque estavam todos pintados e armados com suas bordunas e tomaram toda primeira fila do auditório.
O seminário encerrou-se com um abraço no rio Xingu e com a dança dos índios em frente ao Centro Cultural da Eletronorte na beira do Cais da Cidade. Eles queriam mesmo dançar dentro das instalações da empresa e mostrar toda sua resistência a este projeto.
A participação indígena foi muito positiva, porque dessa vez os índios não serviram apenas de “papel de parede”, mas participaram como os principais atores da discussão.

Luiz Cláudio (CIMI – NORTE II) e Nilda Ferreira da Silva Ribeiro
Fonte: http://www.cimi.org.br/?system=news&action=read&id=2447&eid=257

04 abril 2007

Seminário debate anulação da privatização da CVRD e grandes projetos na Amazônia

Formação de comitês nas principais regiões do Estado, realização de jornada de luta contra o modelo econômico no mês de maio, realização de ato no dia do trabalhador e uma ação de formação de base estão entre os encaminhamentos do seminário de Preparação ao Plebiscito Nacional pela Anulação do Leilão da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), realizado em Belém, nos dias 30 e 31 de março, no Centro Integrado de Necessidades Especiais (CISNE).
Mulheres, homens, crianças, senhores(as), da diversidade social que dá massa aos movimentos de quilombolas, pescadores, assentados da reforma agrária, indígenas, ambientalistas, educadores, ribeirinhos, religiosos(as), sem terra aprofundaram por dias o debate sobre a privatização da CVRD e os grandes projetos na Amazônia.
Os 500 participantes oriundos de 60 municípios tiveram que enfrentar grandes distâncias, como ocorre com os que se deslocam de Santarém, oeste paraense, que enfrentam cerca de 780 km para chegar a capital. Ou ainda as 10 horas de viagem de ônibus em estradas em precário estado de conservação, caso dos que moram em Marabá, no sudeste do estado. Uma mobilização como a tempos não se via.
A mobilização no estado de dimensões continentais, caso do Pará, segundo em extensão territorial do país, desponta como um dos limites na mobilização dos trabalhadores e trabalhadoras, avalia a comissão do evento, que teve entre os membros, MST, Caritas Brasileira, FASE, Consulta Popular, Via Campesina, Fórum Metropolitano de Reforma Urbana, Fórum da Amazônia Oriental (FAOR) e Fórum Carajás. O evento é o desdobramento de debates que se avolumam desde 2004, e vão desaguar no Plebiscito a ser realizado na primeira semana de setembro.

Grandes projetos na Amazônia
Os impactos ambientais e sociais gerados pelos grandes projetos sobre as populações tradicionais, a exemplo da construção de hidrelétricas no Xingu, Madeira e Araguaia-Tocantins, a exploração de bauxita no município de Juruti, a oeste do Pará pela ALCOA, e a bauxita no município de Paragominas, nordeste do Pará, via o duto pela CVRD foram refletidos. Bem como a monocultura de soja, que devasta a floresta no oeste paraense, que tem na empresa americana Cargil o principal indutor.
A soja é uma das principais ameaças para a Amazônia, avalia o procurador da República, Felício Pontes, um dos debatedores no seminário. Sobre o processo contra as irregularidades na construção do porto da Cargil no município de Santarém, o procurador alerta que tem como pano de fundo o modelo de desenvolvimento instalado na Amazônia ao longo da história, que destrói o meio ambiente e não respeita os moradores da região.
Na perspectiva do magistrado a vocação da região é o modelo sócio-ambiental, que contemple o complexo universo amazônico com base no extrativismo. Floresta e a população nativa e migrante, não podem ser percebidas como um problema ao desenvolvimento da região, reflete o procurador.
Sobre a possibilidade de um modelo que mantenha o uso equilibrado dos recursos naturais, Pontes lembra a experiência de Projeto de Assentamento Sustentável (PDS), que tem na pessoa da missionária Dorohty Stang, um dos animadores. Por sua ação a favor dos PDS´s a missionária foi assassinado em fevereiro de 2005.
Um outro exemplo pontuado por Felício Pontes é o caráter combativo dos quilombolas no reconhecimento de seu território. O Pará hoje é o estado com o maior número de áreas reconhecidas. A definição jurídica possibilita acesso ao crédito, assistência técnica, a emancipação, com pouco custo para o Estado. Isso inverte uma lógica que norteou a ação do Estado, como o ocorrido com a experiência da Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM) afirma Pontes.

Re-estatizar a CVRD é preciso
Um crime contra a soberania do país, assim foi avaliado o processo de privatização da CVRD, ocorrido há 10 anos, por iniciativa do então presidente da República, Fernando Henrique Cardoso. A empresa foi repassada ao capital privado por 3.3 bilhões de reais. Na análise do economista Aloísio Leal, da Universidade Federal do Pará (UFPA), somente a reserva mineral de Carajás, cada tonelada negociada a 50 centavos de dólar, é duas vezes o preço que foi “vendida” a empresa. Na época o preço estimado era de 92.64 bilhões de dólares.
Ainda conforme o professor, a empresa tem redirecionado a sua ação para o setor de logística. Hoje a CVRD conta com uma infra-estrutura no setor de transporte, e é associada a vários projetos de geração de energia com empresas nacionais e internacionais.
O interesse da empresa no setor de geração de energia se explica pela chegada ao topo do ranking na produção de alumínio através da Alunorte, localizado no litoral norte do Estado. A energia é o principal insumo na produção do alumínio. Cada mega watt custa a Eletronorte, através da hidrelétrica de Tucuruí, 24 dólares.
O mega watt é repassado para Alunorte e ALCOA por 15 dólares. Tucuruí foi erguida na década de 1980, no sudeste do Pará, com a finalidade de gerar energia para as empresas da CVRD e a ALCOA, em São Luís, Maranhão. A assembléia avaliou que somente a ação coletiva dos atores da base pode inverter a agenda do modelo de desenvolvimento marcado pela destruição dos recursos naturais, concentração de terra, renda, poder, violência e impunidade.

Site contra a privatização da CVRD: www.avaleenossa.org.br

Rogério Almeida é colaborador da rede www.forumcarajas.org.br
Correio eletrônico:
araguaia_tocantins@hotmail.com

03 abril 2007

O desafio da mudança, não apenas pela mudança

O desafio em transformar a sociedade não é simples e muito menos fácil, para isso são necessárias entre outras coisas: a participação, a organização social e também coragem para mudar. E nesse processo de construção e busca por uma sociedade organizada, talvez seja necessário pensarmos em um outro sistema diferente do que estamos vivendo - o capitalismo. Mas que outra alternativa teríamos ao capitalismo? O Socialismo? Talvez, quem sabe; ainda não temos resposta, respeitando claro os que defendem esse modo de organização como alternativa ao atual. E como sair desse sistema atual? Também não temos resposta. Será pela revolução? E que tipo de revolução? Também estamos em busca dessa resposta.
O importante, nessa caminhada, é que existem pessoas e/ou grupos dispostos a buscar, a lutar em defesa de um novo modelo de organização, que possa, quem sabe, primar por uma democracia diferente da que está instalada, ou seja, por uma democracia não mais representativa, por um sistema de iguais. Sem diferenças, sem dor, sem desigualdades, uma proposta talvez utópica, porém não impossível.
Acredita-se que um dos instrumentos de transformação social seja a educação, e nesse cenário, destaquemos Paulo Freire, personalidade que merece ser lembrada, por defender a educação como um instrumento de conscientização e libertação, de democratização das relações.
Nesse contexto, aproveito para homenagear essa Organização que se constituiu há dois anos, precisamente em 03 de abril de 2005, e que com esforço, perseverança e esperança, e também com muita dificuldade, vem resistindo e tentando justificar sua Missão - a de intervir na sociedade, pautando-se na democracia popular, na geração de conhecimentos e no desenvolvimento local sustentável, com uma perspectiva de transformação nas relações econômicas, ambientais, sociais, políticas e culturais, de forma integrada, almejando-as justas e igualitárias - o Instituto Amazônia Solidária e Sustentável (Instituto AMAS).
E como foi citado no início, transformar não é simples e muito menos fácil, muitas vezes é preciso sacrifícios. Mas um fator importante permite que mantenhamos essa ideologia no Instituto, qual seja, a união de seus membros (associados e colaboradores).
Nesses dois anos, muitos do grupo precisaram se afastar, por razões diversas, mas os laços de amizade e de respeito ainda são mantidos. Destaque para os que fazem o Instituto: Aldecy, Dion, Elen, Léia, Lucilene, Neide e Roselene. Não esqueçamos dos que participaram deste, deixando suas marcas: Augusto, Nao, Patrícia, Margareth e Leonice; também alguns colaboradores como: Wany, Margarida(Marga), Paulo, Josué e Joseni, entre outros.
Peço licença às regras de metodologia científica para finalizar este simples texto, mas feito com muito carinho para esta Organização, a qual acredito e tenho muito respeito, com um trecho de Rubem Alves que diz: “Todo início contém um evento mágico, um encontro de amor, um deslumbramento no olhar... É aí que nascem as grandes paixões, a dedicação às causas, a disciplina que põe asas na imaginação e faz os corpos voarem. (...) Não, não se espantem, mitos e magia não são coisas de mundos defuntos. E os mais lúcidos sabem disso, porque não se esqueceram de sonhar”.
A todos os associados(as), colaboradores(as) e amigos(as) do Instituto AMAS, muito obrigada pela dedicação, e por conseguirmos manter esta relação de confiança e parceria.

Elen Pessoa (Associada do Instituto AMAS), em 02.04.2007.

Sindicalista ameaçada de morte no Pará

Maria Ivete Bastos é presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Santarém e tem se destacado na resistência contra o processo de grilagem de terras, expulsão de pequenos agricultores e desflorestamento para a plantação de soja nessa região do Pará, e foi homenageada em Nova Delhi, na Índia, em setembro do ano passado, com o prêmio Mahatma Gandhi, tanto por esta luta sócio-ambiental quanto por representar o empoderamento das mulheres da Amazônia.
Por essa atuação destacada, Ivete está marcada de morte pelos “grandes” da região - latifundiários e a elite política. “Em Santarém, cheguei a receber a ameaça pessoalmente e, depois de embates com empresários, casas foram queimadas e meu nome foi parar numa lista de marcados para morrer”, relata Ivete. A sindicalista chegou a fazer um depoimento na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) da Terra, quando fez denúncias públicas contra latifundiários, homens públicos e um delegado local. “Os empresários estavam todos lá. Depois disso, vi um dos pistoleiros bem próximo da casa onde eu estava morando”.
A sindicalista alerta que, neste ano, foi descoberto que os grupos estavam matando pessoas até na área urbana, todas relacionadas ao problema de terra na Gleba Pacoval (região de Curuá-Una, oeste do Pará)”. O Conselho Nacional dos Seringueiros elaborou um abaixo-assinado internacional, solicitando ao ministro Paulo Vannuchi, da Secretaria Especial de Direitos Humanos, que Maria Ivete Bastos seja incluída no Programa Nacional de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos, e que outros líderes da luta por reforma agrária e Direitos Humanos da região também recebam proteção.
Segundo a CPT, em 2004, entre os 284 ameaçados de morte por questões agrárias em todo o Brasil, 103 residiam no Pará. E mais: entre os 777 conflitos agrários notificados no Brasil, 135 estavam no Estado da Região Norte. Ivete assinala que os empresários comandantes do “consórcio da morte”, na região de Santarém, nunca foram punidos.

Enfrentar os “grandes”
Em 27 de fevereiro, a Organização de Estados Iberoamericanos (OEI) divulgou um estudo elaborado junto ao Ministério de Saúde do Brasil, segundo o qual as áreas de maior violência no país coincidem com aquelas onde existe conflito por terras, desmatamento florestal e trabalho escravo. Dados da CPT e da ONG Repórter Brasil revelam que, entre os 100 municípios mais violentos do Brasil, pelo menos 15 deles se detectam casos de trabalho escravo. Estas localidades se concentram em quatro estados: Mato Grosso, Pará, Roraima e São Paulo.
O início do aumento da violência, sobretudo a partir de 1999, tem sido causada por uma corrida pela produção de soja com os efeitos conhecidos como desmantamento florestal e expulsão das comunidades e famílias camponesas.
“A maioria dos fazendeiros quer soja. Foi o que estimulou o êxodo rural e os conflitos. Existem áreas onde houve gravíssimos conflitos, com casas incendiadas. Não tivemos a oportunidade de fazer nem sequer uma denúncia contra o “grande”, pois a Justiça fez 'vista grossa'. Várias vezes fui vítima desse sistema. Chegaram a se reunir 27 sojicultores para mover uma ação contra mim”, relata Ivete, com indignação.
A sindicalista conta que o “extermínio” dos camponeses se amplificou com a chegada da Cargill e com a implantação do Porto de Santarém. Assinala que a região de Santarém possui um dos maiores índices de grilagem de terras no Brasil. “Existem áreas como a Corta Corda, um assentamento de reforma agrária, que tem 42 mil hectares nas mãos do 'grande', e a maior parte dessas terras foram adquiridas por meio da grilagem”, explica.
Mesmo com o aumento do número de pecuaristas e de madeireiros, “a soja é o que planta o maior impacto social e ambiental na verdade”, de acordo com Ivete. “A maioria dos camponeses que saem de suas comunidades não tem qualificação profissional porque estão acostumados a trabalhar no campo e, quando vão para a cidade, são marginalizados”, denuncia. Ela conta que a extração madeireira também se prolifera de modo ilegal. Na região da Gleba Nova Olinda, território de administração do governo do Estado, foram liberadas as áreas para plano de manejo sem considerar, mais uma vez, 14 comunidades tradicionais.

Eduardo Sales de Lima – Brasil de Fato
Fonte: http://www.brasildefato.com.br/v01/agencia/nacional/sindicalista-ameacada-de-morte-no-para

02 abril 2007

Migração e trabalho escravo no Maranhão

A realização do estudo “Migrações no Maranhão Contemporâneo”, através de uma parceria entre a Comissão Pastoral da Terra e o Grupo de Estudos Rurais e Urbanos da UFMA, está revelando características importantes sobre o processo migratório no Estado.
O primeiro aspecto que a pesquisa realizada nos municípios de Timbiras, Codó e São José dos Basílios revela é a importância do fenômeno migratório. Das famílias entrevistadas em Timbiras, 63% têm pelo menos um membro trabalhando fora do município. Em São José dos Basílios, este percentual é de 42%; e de 24% em Codó, cujo percentual bem menor está associado ao fato da cidade possuir algumas indústrias instaladas e funcionar como centro regional, portanto com capacidade de geração de ocupação e empregos.
São Paulo e Goiás são os estados para onde se dirige a maioria dos migrantes de Timbiras e Codó. No caso de São José dos Basílios aparecem como destaque os estado do Mato Grosso e Pará. Essa diferença de destino traz consigo uma diferença de atividades realizadas, pois o deslocamento para São Paulo está associado ao trabalho na lavoura de cana-de-açúcar, para Mato Grosso na lavoura da soja e para o Pará nas atividades da pecuária, exploração madeireira e garimpo.
Um terceiro aspecto importante no estudo são os dados referentes à composição da renda dos chefes de famílias. O dado que mais sobressai é a importância da atividade agrícola. Além desta, outra importante fonte de renda para as famílias é a aposentadoria rural, ocupação principal de 10,1% dos chefes de família em Codó, 10,1% em São José dos Basílios, e 20% em Timbiras.
Quando se adiciona a esses dados as informações relativas a cobertura dos programas de transferência de renda do governo federal ( Bolsa Família, PETI, etc) – 54,3% das famílias de Codó; 55,8% de São José dos Basílios e 44,7% em Timbiras – verifica-se a importância das políticas sociais para a reprodução econômica dessas famílias.
O penúltimo fato relevante no estudo é a caracterização da forma de acesso à terra trabalhada. Nos três municípios o principal mecanismo de aceso à terra ainda é o arrendamento: - 70,7% dos entrevistados em São José dos Basílios, 74,5% em Codó e 54% em Timbiras.
Por fim, é importante observar como se dá o processo de mobilização dos migrantes para o trabalho fora do município. Há, neste caso, uma maior diversidade de situações, pois enquanto em Timbiras a maior parte é mobilizada através de amigos/vizinhos e familiares, em São José dos Basílios a maioria desloca-se por conta própria – 50 % do total – e em Codó destacam-se os empreiteiros.
Um elemento central para a compreensão da disponibilidade desses trabalhadores é a situação vivenciada por suas famílias no local de origem, marcada pelo não-acesso aos recursos produtivos de que dispõe o município, de forma particularmente importante o não-acesso à propriedade da terra. Por conseguinte, pode-se afirmar que o fenômeno migratório está em grande parte associado ao monopólio da terra por parte de poucos e da existência do arrendamento como mecanismo de acesso dos trabalhadores aos meios de sobrevivência.
Nessa perspectiva, pensar a construção de uma alternativa para essas pessoas ao destino do trabalho na cana, passa pela intervenção do estado na distribuição dos recursos fundiários da região – desapropriação ou arrecadação de terras, estabelecimento de projetos de assentamento – como está estabelecido no « Plano MDA/INCRA para a Erradicação do Trabalho Escravo, que sugere como primeira medida ao combate da produção de migrantes nas regiões de aliciamento para o trabalho escravo.
A aplicação das ações de reforma agrária nesse municípios, tal como preconizado pelo MDA/INCRA, constitui-se numa ferramenta fundamental para o atenuamento do movimento migratório e, dessa forma, diminuição do fluxo de trabalhadores para regiões de fronteira agrícola, nas quais eles acabam sendo atraídos para atividades econômicas em que predominam o trabalho escravo contemporâneo.

Por Marcelo Carneiro
Fonte: http://www.forumcarajas.org.br/artigos2.php?id=145